segunda-feira, 24 de junho de 2013

Curso básico de manipulação midiática, com traços de espontânea manifestação, no facebook (parte 2)

Parte 2

8. A associação maldosa da alma nacional com a criminalidade.
Dessa parte eu tenho até vergonha. Mas vamos lá.
“Ainda mais. O que você acha que vem com samba, festa e dança?”
Como brasileiro, vou tentar responder. Consigo pensar em alegria, congraçamento, companheirismo, papo alegre, piadas e gozações, cerveja, azaração (as mulheres brasileiras são bonitas — você é bonita por ser brasileira, não esqueça), e tantas outras atividades que combinam com a natureza alegre e festiva do brasileiro e que fazem nosso povo ser apreciado pelos estrangeiros. Aliás, em nossas festas sempre cabe mais um, e eles, em especial, são bem recebidos.
Agora você responde:
“Drogas.”
O quê?!
“E de onde você acha que essas drogas vêm? Adivinha. Os criminais (sic) não podem ficar muito longe.”
Por essa eu não esperava. Você associa “samba, festa e dança” a… drogas? Traficantes? Criminosos? Sempre?
E, vem cá, não dá para perceber um pouquinho de preconceito social nessa sua associação, Carla? Você não consegue imaginar um ambiente festivo epopular no Brasil sem drogas e sem crimes, é isso?
Procure conhecer mais sobre a falácia denominada “apelo a preconceitos”. Dê um google.
Depois resolva esse problema com a sua consciência moral. Continuemos.
9. As mentiras de Carla sobre as desapropriações.
“Tem mais. Muitas pessoas estão sendo expulsas das suas casas para dar espaço (sic) às Olimpíadas e à copa do mundo (sic), contra a vontade delas (sic). As casas estão simplesmente sendo marcadas todos os dias (sic) e sendo destruídas. É assim que está sendo feito. Essas pessoas não recebem segurança (sic), dinheiro, ou qualquer garantia, elas são simplesmente expulsas.”
Mais mentiras, Carla. Veja bem o que você escreveu: “Essas pessoas não recebem segurança (sic), dinheiro, ou qualquer garantia, elas são simplesmente expulsas“.
Jura que você pesquisou e procurou se informar? Jura que foi responsável ao divulgar essa informação para todo o mundo, falando em inglês? Se jurar, é falsa.
Há alguns problemas com as desapropriações, sim, mas em todas os cidadãos afetados recebem indenização pelo valor de mercado. Quando há conflito, o Ministério Público Federal entra em ação para defender os moradores. Bem longe, portanto, da situação de terra de ninguém que você sugere com sua descrição.
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A prefeitura fornece assistência associal às pessoas desalojadas, visando a sua adaptação ao novo lar.
Algumas desapropriações estão sendo negociadas na Justiça desde 2009.
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É absurdo espalhar irresponsavelmente para o mundo que elas são simplesmente expulsas, como se imperasse a barbárie no Brasil. Pega-se um monte de gente, despeja-se num lugar qualquer, e estamos conversados. Muitos espectadores estrangeiros do seu vídeo podem agir de forma tão irresponsável quanto você, passando adiante essa informação falsa sem procurar checar sua validade.
Nem preciso dizer que considerar alguns casos (ou seja, a exceção) como o procedimento padrão (ou seja, a regra), é um erro lógico primário.
10. O caso do Museu do Índio, no Rio.
“Índios brasileiros foram também expulsos do lugar que costumava (sic) ser a casa deles e o centro cultural indígena.
“Eles tentaram protestar, mas foram covardemente feridos por policiais com bombas, sprays de pimenta entre outras coisas (sic).
“Agora o centro cultural indígena vai ser transformado no museu do comitê olímpico (sic).
“Que tipo de democracia é essa?”
Mais uma encarada com a carinha zangada.
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Decididamente, falta apego à verdade em seus relatos, Carla. Nem mesmo a amadora Wikipédia você consulta antes de expor fatos distorcidos.
O lugar que os 18 índios ocupavam eram o antigo Museu do Índio, no Rio de Janeiro. Em 2006, 20 índios ocuparam o prédio do Museu, inativo desde 1978, e lá formaram a chamada Aldeia Maracanã.
A desocupação à força, embora autorizada pela Justiça, foi um erro do governador Sérgio Cabral, sim (criticado pela ONU). Mas não há nenhuma previsão de construção de comitê algum no lugar. A demolição visa facilitar a mobilidade na área.
E este foi o único caso de conflito com indígenas por causa da Copa. A generalização apressada (“Que tipo de democracia é essa?”) também é uma falácia clássica, sabia?
11. As mentiras de Carla sobre os estádios e o emprego.
“Agora, não me entenda mal, eu acho que a copa (sic) e as olimpíadas (sic) são eventos ótimos, mas não são o que nosso país precisa agora.”
Quem disse que a Copa e as Olimpíadas são “o que nosso país precisa agora”? Já conversamos sobre o uso desse verbo. Depois, quem decide “o que a gente precisa”, Carla? Você, que está aí nos Estados Unidos (e parece conhecer muito pouco do que acontece aqui), ou nós?
“Olhem pras outras nações que sediaram a copa (sic), olhem para os custos para os custos de manter o que a gente construiu. Milhões, milhões por mês com o nosso (sic) dinheiro público.”
No vídeo, dois exemplos de desperdício: o centro de vôlei de praia em Pequim e o estádio para softball em Atenas. Duas andorinhas não fazem verão, mas para Carla dois exemplos definem uma argumentação.
“Dinheiro público” para manter o Maracanã? A Arena da Baixada? O Estádio Beira-Rio? O Mineirão? O Estádio Fonte Nova? Fale isso para os torcedores do Rio, Curitiba, Porto Alegre, Belo Horizonte, Salvador. Alguém explique a ela, por favor, o óbvio ululante.
Segue-se uma brilhante ilustração do pensamento digital, o famoso raciocínio tico-ou-teco, ou isso ou aquilo, porque os dois juntos, impossível. Em Lógica, esse artifício se denomina “falso dilema” ou “falsa dicotomia”. É uma falácia clássica.
“A gente não precisa de estádios, a gente precisa de educação. A gente não precisa que o Brasil impressione o mundo, a gente precisa que os brasileiros tenham comida e saúde. A gente não precisa de mais festas, a gente precisa de pessoas com trabalhos (sic) e vidas sustentáveis (sic).”
Um-dois, isso-ou-aquilo, tico-ou-teco. Campeonato de besteiras, Carla?
Mentes de pessoas inteligentes conseguem ir além dessa falsa dicotomia, dessa ilusória imposição de escolha entre duas opções. Ou estádios ou educação.  Ou impressionar o mundo ou comida e saúde. Ou mais festas ou “trabalhos e vidas sustentáveis (sic)”.
Falaremos de educação e saúde no próximo item.
Agora empregos.
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Enquanto isso…
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Percebeu como se faz, Carla? Tudo com fonte, nada de falar sobre o que não se sabe, nada de repetir argumentos vazios e memes desgastados.
Agora a melhor parte.
12. As mentiras de Carla sobre o uso alternativo dos recursos da Copa.
“Está provado, através dos bilhões que agora estamos gastando, que temos mais do que o suficiente para mudar nossa situação. Ou que pelo menos a gente tinha… Até a copa (sic) e as olimpíadas (sic).”
Este é o ponto. É a mesma noção equivocada reproduzida em centenas de cartazes nas manifestações. Mero resultado de uma brutal desinformação, arrogantemente exibida como exemplo de sabedoria pessoal. Vamos de novo, porque esta merece repeteco: “Está provado, através dos bilhões que agora estamos gastando, que temos mais do que o suficiente para mudar nossa situação”.
Vamos fazer umas continhas, Carla? Pegamos os 7 bilhões emprestados pelo governo federal para a construção dos estádios. Você viu aquele gráfico do Portal da Transparência, não viu? O governo federal não gastou um centavocom os novos estádios. Ele emprestou dinheiro para estados e municípios, dinheiro que voltará aos cofres públicos. Mas vamos considerar esses 7 bilhões como gasto federal.
O governo federal gasta, só com o SUS (Sistema Único de Saúde), 136 bilhões de reais por ano. Quanto dá, então? Nem dois dias de SUS.
O portal UOL afirma que houve, sim, um gasto sem retorno da parte do governo federal: 1,1 bilhão de reais.
A notícia foi desmentida, com dados, pelo Palácio do Planalto (é um comportamento ético mostrar os dois lados de uma questão, viu, Carla?).
Vamos esquecer o desmentido. Digamos que o governo tenha gasto realmente 1,1 bilhão de reais, sem volta. Quanto dá? Nem ¼ do investimento em um dia de SUS.
O.K. Agora vamos exagerar: tudo. Peguemos os 26 bilhões de reais gastos com a Copa das Confederações e a Copa do Mundo, fingindo que os 19 bilhões investidos em aeroportos, infraestrutura e mobilidade urbana não são úteis ao país. Quanto dá? Nem cinco dias de SUS.
É esse montante que vai mudar nossa situação, Carla? É isso que vai resolver os problemas da saúde, da educação, da segurança e do transporte? É esse gasto que nos impede de resolver esses problemas agora, como você sugere em: “Ou que pelo menos a gente tinha”?.
Entendeu? Ou será que você, além de não gostar de pesquisar no Google, não se interessar pela veracidade das informações, não se preocupar em transmitir os fatos com precisão e não demonstrar apreço pela Lógica, também não sabe fazer contas?
Opa! Que burro sou eu! Esqueci que aquele total de 26 bilhões refere-se a um gasto de 7 anos (2007-2014). Quanto será mesmo o total gasto pelo governo federal somente no SUS, durante 7 anos? 910 bilhões de reais. É, realmente, agora eu me convenci: mais 26 bilhões em 7 anos (menos de 4 bilhões por ano) resolveriam todos os problemas do Brasil…
Nem tudo é dinheiro, Carla. Veja estes dados (percentual do PIB investido na educação):
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O Brasil, comparativamente, investe mais do que os Estados Unidos em educação. O problema é a qualidade do ensino. Você errou de novo o alvo. Não se trata de dinheiro.
 A propósito, sabe quanto foi o PIB nacional em 2012? R$4,4 trilhões.
Mais uma continha, então (nesta eu vou ter de pedir ajuda à calculadora do computador): 250 bilhões de reais por ano investidos na educação. É… aqui também, mais 26 bilhões em 7 anos resolveriam todos os nossos problemas…
A propósito, Carla, o seu “está provado”, que não provou nada, é… adivinha? Isso, uma falácia:  o apelo à autoridade anônima. Quem provou?
13. Mais equívocos de Carla.
“…eu sei que a informação [deste vídeo] precisa ser passada e que não há vídeos suficientes, não há informação suficiente.”
Há informação suficiente, Carla. Agora, se você e outros jovens não se interessam em procurar essa informação, não se dispondo a uma simples busca no Google antes de fazer afirmações categóricas e equivocadas, de quem é a culpa?
A informação que precisa ser passada não é esse amontoado de mentiras e imprecisões do seu vídeo. São os fatos.
“E é hora da gente começar a pensar nas nossas prioridades e no que realmente importa.”
Essas prioridades já foram “pensadas” há muito tempo, Carla. Elas estão sendo praticadas. Por que você acha que o Brasil evoluiu tanto nos últimos 10 anos? Quebramos três vezes no Governo FHC, mesmo tendo vendido quase todo o patrimônio nacional. Hoje, o Brasil é credor do FMI, vive uma época de pleno emprego, tem a inflação controlada em torno de 6%, ganha destaque por suas conquistas em organismos internacionais e…
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Por que tudo isso? Porque ele definiu essas prioridades há muito: inclusão e desenvolvimento. Inclusão por meio de programas como o Bolsa Família.
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O Bolsa-Família foi adotado por México, Venezuela, Bolívia, Peru, Equador, África do Sul, Gana, Egito, Turquia, Paquistão, Bangladesh e Indonésia, entre outros países. Resultado (dessa e de outras medidas): surgiu, no Brasil, a nova classe média.
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Isso é desenvolvimento, também. E na educação?
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Inclusão também por meio das cotas sociais.
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Programas sociais melhoram a vida da população, Carla.
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Há muito mais. Basta você querer procurar.
14. A montagem do final do vídeo e a proposta irresponsável de Carla.
O final do vídeo é constrangedor: uma montagem amadora em que o discurso da presidenta Dilma, saudando os dirigentes da Fifa e mencionando avanços no país, é ilustrado tendenciosamente com cenas de pobreza, violência policial, descaso na área da saúde, criminosos presos, enchentes (!), ou seja, tudo de ruim — uma espécie de contraparte dos clichês positivos apresentados depreciativamente no início do vídeo. Nos clichês negativos, o fecho da mensagem subliminar do vídeo: O que o Brasil tem de bom não presta, e o que não presta é o que ele supostamente tem de bom.
A intenção de Carla é clara: provar que o Brasil não deveria sediar a Copa de 2014.
O.K. Vamos fingir que ela foi bem-sucedida. Você já fez um contrato, Carla? Então sabe que em todo contrato há uma cláusula relativa ao não cumprimento das obrigações. Sabia que o contrato da Copa já foi assinado, e que se o Brasil deixar de realizá-la, além de perder tudo o que iria ganhar com o torneio, terá de indenizar a Fifa, os detentores dos direitos de transmissão e os anunciantes? Já calculou quanto seria isso tudo?
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Além, obviamente, da humilhação internacional que o cancelamento geraria, e da pecha de “incompetente” que seria associada não ao Governo, Carla, mas ao povo. Não é isso que pensaríamos se a Copa fosse cancelada em outro país?
Repare como é curioso. Você afirma ser absurdo o lucro da Fifa, mas quer, com esse cancelamento, dobrar ou triplicar os lucros da entidade com a Copa de 2014… às nossas custas. Você afirma estar preocupada com os gastos do Brasil, mas sua “solução” daria um prejuízo gigantesco aos cofres públicos. Mais uma irresponsabilidade, Carla?
Sério mesmo, se há uma pessoa que tenha o mais intenso ódio ao nosso povo, dificilmente ela desejará as consequências danosas que sua proposta inevitavelmente geraria aos brasileiros.
Conclusão
Você, Carla não contou a verdade integral em nenhuma (0%) das informações que apresentou nas argumentações de seu vídeo. Não teve sequer o cuidado de usar o Google, afirmação que posso fazer porque a maioria dos desmentidos às suas falsidades aparece na primeira página de resultados.
Repare também que em mais de 6 minutos de vídeo não há sequer umamenção positiva ao nosso país. Tudo é negativo, tudo é ruim, nada presta. Vídeo perfeito para reforçar o complexo de vira-latas de muitos brasileiros e para  incentivá-los a manifestações masoquistas de desprezo à própria pátria. Já leu os comentários no YouTube? Talvez dessa festa agressiva você goste, já que a festa bonita da nossa gente você despreza.
Quantos espectadores estrangeiros do vídeo em inglês darão crédito à sua visão pejorativa e distorcida do Brasil, porque você se apresenta como brasileira, porque você tem boa apresentação, porque você recheou o vídeo de técnicas de convencimento, porque você usou seu conhecimento profissional de edição para conseguir o melhor efeito — e porque não terão acesso ao contraditório também em inglês?
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Qual a razão de tanto ódio pelo nosso país, Carla, ainda que travestido de preocupação bondosa com ele?
Você demonstrou que não entende nada de Brasil. Por caridade, reservo meus julgamentos sobre seus dotes intelectuais. Mas fico à espera de um segundo vídeo, em que, responsavelmente, você reconheça os erros que cometeu no primeiro. Prefiro crer que esses erros crassos de informação tenham sido resultado da sua natural empolgação, própria da idade. Tempo não faltou, já que você conseguiu as imagens que desejava, não é mesmo?
Agora, se não houver um segundo vídeo, Carla, serei forçado a concluir que, na verdade, esses erros não foram erros, mas enganações, e que eles foram resultado da sua má-fé.
E concluirei também que nosso país já produziu pessoas melhores.

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