terça-feira, 4 de agosto de 2015

"Dirceu outra vez"... Artigo de Jânio de Freitas em sua coluna da Folha de São Paulo, seguido de artigo de Paulo Nogueira, do Diário do Centro do Mundo



  José Dirceu ficou, à espera. Não quis fugir. Isto tem um significado. Não há como deixar de tê-lo. As suposições a respeito podem variar, sobretudo ao compasso das posições políticas, mas só o próprio Dirceu mostrará qual é.

 Dirceu outra vez



 Texto de Jânio de Freitas, publicado na Folha de São Paulo




Charge de Laerte

A prisão de José Dirceu foi a menos surpreendente de quantas a Lava Jato faz desde março do ano passado. Se justificada ou não, vamos saber quando os integrantes da Lava Jato apresentarem em juízo o que veem como provas convincentes. A carga pesada de acusações apenas verbais, feitas pelo procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, desde logo criou uma imprecisão sujeita a reparo histórico e atual. Foi quando definiu Dirceu como "o instituidor e beneficiário" do "esquema" de corrupção na Petrobras.

Dizê-lo instituidor é aliviar de um grande peso acusatório os empreiteiros e ex-dirigentes da Petrobras que têm feito delação premiada e, por isso, são chamados pelos componentes da Lava Jato de "colaboradores". Ainda que não seja por deliberação, a transferência de responsabilidades, concentrando-as em um só, é como um prêmio adicional à delação já premiada.

A corrupção na Petrobras investigada pela Lava Jato seguiu o "esquema" praticado há décadas pelas grandes empreiteiras nas licitações e acréscimos de custo, em contratos com estatais e administração pública. Se houve um "instituidor" do "esquema", seu nome perdeu-se na desmemória do tempo.

Caso o Ministério Público e a Polícia Federal se dessem ao trabalho de verificações retroativas, tanto encontrariam histórias de honestidade como de vidas enriquecidas a partir de passagem por um cargo alto na Petrobras. Mas, no Brasil, nem por curiosidade é acompanhada a evolução das condições de vida de políticos e ex-dirigentes públicos.

Na geração atual dos funcionários elevados a dirigentes corruptos da Petrobras, Pedro Barusco, que é tido como o mais inteligente dos delatores premiados, já explicou que vem desde meados da década de 90, ao menos desde 1997, as transações com a atual geração de dirigentes de empreiteiras.

Também resulta como prêmio adicional aos delatores já premiados a ideia de que o "esquema na Petrobras repetiu o do mensalão". Um nada tem a ver com o outro. Na Petrobras, o dinheiro manipulado estava embutido no custo de obras e de serviços ou bens como sondas. No mensalão, os meios envolvidos foram banco e publicidade.

No caso pessoal de Dirceu, chama atenção a disparidade entre as toneladas de atribuições que o procurador Santos Lima lhe despeja e a sua espera quase passiva, em casa, pelos emissários da Lava Jato. Quem se soubesse autor de tantos e tão graves atos ilegais, e da gana de é que alvo, saberia também que o esperava uma condenação esmagadora. José Dirceu teve farta oportunidade de fugir. Com a experiência de quem entrou e viveu no Brasil da ditadura com rosto e nome mudados, e levou vida tranquila por anos, poderia evaporar por aí sem dificuldade.

José Dirceu ficou, à espera. Não quis fugir. Isto tem um significado. Não há como deixar de tê-lo. As suposições a respeito podem variar, sobretudo ao compasso das posições políticas, mas só o próprio Dirceu mostrará qual é.

A prisão de Dirceu dividiu ainda mais um país já rachado em dois. Por Paulo Nogueira


Precisava?
Precisava?
Mais uma vez, com a prisão de Dirceu, o juiz Sergio Moro promove uma divisão no Brasil.
Num país já visceralmente dividido, é uma péssima notícia.
Sobre a competência de Moro o tempo vai falar. Desde já está claro que ele tem um papel de divisor, e não de somador.
A direita festejou, como era de esperar. Nas redes sociais, antipetistas trataram Dirceu da forma como a mídia o retratou, com a ajuda milionária da Justiça, desde que o PT subiu ao poder: como um demônio.
Os fanáticos de direita não querem apenas que Dirceu seja preso. Querem que ele morra, que ele apodreça na cadeia.
Mas eles são apenas parte do todo.
Do outro lado, os progressistas ficaram extremamente incomodados com a prisão. Prender alguém que já estava preso? Preventivamente, como se Dirceu pudesse fugir para a Venezuela ou o que for?
E provas, onde as provas? Dirceu não pode efetivamente ter prestado serviços para as empresas, amparado em sua rede de relacionamento?
Ou é só gente do PSDB que recebeu, sempre, dinheiro limpo em consultorias depois de deixar o governo?
Moro tem uma questão de imagem a ser trabalhada. Para muitos brasileiros, seu rigor é unilateral. Ou melhor, é excludente. Exclui os tucanos.
O PSDB recebe doações. O PT propinas. Esta parece ser a visão de Moro e da Polícia Federal.
O mundo deve ser mais complexo que isso.
Pairou também sobre muitas pessoas a seguinte questão: Perrela está solto. Ricardo Teixeira está solto. Marin só foi preso por estar fora de sua zona de proteção no Brasil. Cássio Cunha Lima, o líder do PSDB no Senado, está solto, mesmo tendo sido flagrado comprando votos de desvalidos paraibanos com dinheiro público.
Pior.
Eduardo Cunha está solto. Com as ameaças contra quem podia desmascará-lo, com uma propina de 5 milhões obtida com métodos de gangster, com o depoimento em rede nacional de uma advogada que largou tudo para se livrar da sombra aterrorizante de Cunha.
E Dirceu preso. Sempre ele? Sempre petistas?
Alguma conta não fecha aí.
Não à toa, entre os progressistas floresceu a hipótese de que a prisão cumpria dois objetivos.
Um, tirar do centro das atenções o atentado contra o Instituto Lula. Dois, atiçar os ânimos dos antipetistas para o protesto contra Dilma em poucos dias.
Que Moro já mostrou gostar de estardalhaço para suas movimentações, está claro.
Isso não é nada bom para ele, que pode se achar mais importante do que é e depois, como Joaquim Barbosa, sofrer com a perda dos holofotes.
Mas é muito pior para a sociedade.
Se Moro não for capaz de provar que é mais do que um homem que divide, seu legado na história será melancólico.
A dúvida é se ele ainda tem tempo – e vontade — para reformar a imagem de juiz partidário.
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Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

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