quarta-feira, 30 de março de 2016

Lula, nem preso, nem livre


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Há anos, Noam Chomsky cunhou o termo “unpeople” (“não-pessoas”) para designar os que o poder global quer esquecer. É assim que a elite brasileira agora trata o ex-presidente
Por Antonio Martins - no Outras Palavras
Os abusos e ilegalidades cometidos por Sérgio Moro contra Lula foram tantos e tão graves que, agora, até mesmo os velhos jornais brasileiros [para os internacionais, clique nos links 1 2 3 4 5 6] enumeram as arbitrariedades do juiz – reconhecidas, aliás, por diversos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A coerção para depor, em 4/03 era incabível, porque não foi precedida de uma convocação. Na interceptação das conversas telefônicas, e em sua divulgação, as irregularidades, todas de caráter criminoso, acumulam-se. Os diálogos envolvendo a presidente da República precisam ser remetidos ao STF. As gravações relacionadas aos fatos investigados devem ser mantidas nos autos, mas em sigilo (foram escancaradas por Moro). O juiz deve destruir as conversas privadas (e não entregá-las os jornais). Depois de tantas violências, seria de esperar que a mídia defendesse reparação ao ex-presidente – ou, no mínimo, o fim das perseguições.
Só que não. Experimente ler os sites ligados à Folha, Estado, O Globo e Editora Abril ou, pior, ouvir os noticiários da TV. Por dias, todos reproduziram, incansável e espetaculosamente, as gravações ilegais, sempre editadas contra Lula. Foi como se, a cada 24 horas, se produzisse um episódio de manipulação semelhante ao do debate presidencial que, em 1989, levou Collor ao poder. Agora, todos os noticiários alimentam a expectativa pela prisão de Lula. O ato absurdo do ministro Gilmar Mendes, que devolveu o ex-presidente a Moro, é visto como natural. Assim como as negativas ou delongas de colegas de Gilmar [1 2 3], para conceder o habeas corpusque proibiria uma prisão arbitrária.
Lula está em Brasília desde ontem, porém acuado. Em sua ação repousam, hoje, as principais chances de evitar o impeachment. Mas como agir se sequer sua liberdade está assegurada; se não tem posto de ministro; se não pode falar ao telefone; se não sabe se acordará com a Polícia Federal batendo em seu quarto de hotel? À noite,jantou com Dilma. Teria cogitado desistir da Casa Civil. No PMDB, que prepara o desembarque do governo, o vice-presidente Michel Temer avisou que não o encontrará.
Para referir-se ao tratamento que Israel dispensa aos palestinos, ou o que Washinton reserva aos que mata por meio de drones, Noam Chomsky cunhou certa vez o termo unpeople – não-pessoas. É preciso desclassificá-los, despi-los dos direitos, para que as leis permaneçam válidas, mas não os protejam. Para a velha mídia, Lula converteu-se em não-pessoa. Para parte dos brasileiros, tornaram-se também os que vestem-se de vermelho, ainda que crianças ou bebês.

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