quarta-feira, 16 de março de 2016

Sérgio Moro deixa bem claro a quem serve a Lava Jato

Juiz discursa para empresários milionários, em seu retorno a reduto tucano no Paraná, elogia especuladores e ignora redução da pobreza no país, mas afirma ser "apartidário"


por Helena Sthephanowitz, para a RBA publicado 11/03/2016 16:45, última modificação 11/03/2016 19:02
FABIO R. POZZEBOM / ABR / FOTOS PÚBLICAS
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Sérgio Moro, condutor da Lava Jato: paralisia econômica e corte de empregos abrem caminhos para privatizações
Na quarta-feira (9), o juiz Sérgio Moro participou de um jantar-debate, em Curitiba, na sede do Lide (sigla para Grupo de Lideranças Empresariais), entidade do tucano João Doria Júnior, pré-candidato a prefeito de São Paulo, e que só aceita como associadas empresas brasileiras e multinacionais com faturamento igual ou superior a R$ 200 milhões anuais.
No evento, o juiz discursou para uma plateia de 200 empresários do "clube dos 1% mais ricos" – bem menos de 1% na verdade – e quando se aventurou por temas não jurídicos no fim do discurso, não decepcionou a plateia neoliberal adepta da elevada e imoral concentração de renda (assista ao vídeo).
Moro disse não acreditar que a Operação Lava Jato tenha culpa no quadro de recessão e desemprego, alegando que "até os movimentos favoráveis do mercado, quando existe alguma diligência da Lava Jato, são indicativo de que a operação não é exatamente um problema".
Quanto à culpa, é óbvio que só a Lava Jato não é responsável pela desaceleração da economia chinesa, pela estagnação da Europa, pelo comércio mundial ter refluído, nem da queda do preço do petróleo, do minério de ferro e das mercadorias em geral. Mas, da forma como está sendo conduzida, a operação é como jogar gasolina na fogueira da crise interna.
Se o juiz consultar engenheiros do Brasil inteiro, receberá críticas severas quanto à condução da operação, por não tomar os devidos cuidados para preservar a continuidade de obras e manutenção de empregos. Se conversar com os empresários e executivos verá que há queixas quanto à insegurança jurídica nos inquéritos criminais, o que afasta investimentos no Brasil e está levando algumas empresas brasileiras a instalarem suas sedes no exterior.
Quanto a "movimentos favoráveis do mercado", estes são apenas o rebuliço que operações da Polícia Federal provocam na Bolsa e no câmbio. O elogio ao "mercado", da forma que foi colocado por Moro, revela um pendor neoliberal da visão de mundo do juiz.
No caso da Petrobras, o fato de as ações subirem quando aumenta a iminência de um "golpe paraguaio" para derrubar o governo não é expectativa de que a empresa venha a gerar mais empregos. É, isso sim, de pagar mais dividendos para acionistas, reduzindo seu investimento no desenvolvimento nacional.
A Sabesp sob gestão tucana deixou de investir no abastecimento de água de São Paulo para pagar mais dividendos a acionistas. Fez menos obras necessárias, criou menos empregos – "gastou menos", diriam economistas – e as ações subiram até mesmo com a chegada da crise hídrica. É possível ações subirem sem aumentar a produção e sem que a empresa venda nem um parafuso, por simples movimentos especulativos, ou expectativas de lucros para acionistas, em detrimento da produção, do emprego, da arrecadação de impostos, enfim, da nação.
Outro erro grosseiro de análise é não identificar e separar movimentos especulativos, oportunistas, que fazem as cotações subirem rápido, mas não se sustentam caindo de novo em seguida, até a próxima "bomba" da Lava Jato. Se fosse positivo para a economia, as cotações das ações apresentariam uma trajetória consistente de subida.
O que Moro não enxerga é que as operações e vazamentos "espetaculosos" trazem fortes indícios de também serem usados por especuladores inescrupulosos para manipular o mercado. Já passou da hora de investigar se está ocorrendo a prática criminosa de inside information, ou seja, informação sigilosa vazada clandestinamente, sabe-se lá por quem, para investidores saberem de antemão a hora de comprar e de vender as ações e aplicar em fundos derivativos, fazendo fortunas em poucas horas. E sem precisar colocar um único tijolo que seja em obra nenhuma.
Não custa lembrar que um banqueiro do banco BTG Pactual foi preso – ainda que sem provas, bem no padrão Lava Jato – por supostamente ter cópia da delação premiada do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. Quantos investidores têm tido acesso antecipado aos mesmos vazamentos concedidos a jornalistas de alguns veículos de imprensa, e que provocam movimentos nas bolsas de valores?
Investidores capitalistas também farejam jeito de ganhar (muito) dinheiro metendo a mão no patrimônio público do país, aproveitando-se de um governo dócil aos "mercados". Em jogo, o petróleo do pré-sal, as reservas monetárias de US$ 370 bilhões no Banco Central, a gestão da dívida pública, fatias do comércio mundial que o Brasil disputa, acesso privilegiado ao gigantesco mercado interno brasileiro e outras rodadas da privataria tucana. Tudo isso, sob um governo neoliberal, significa lucros astronômicos para investidores às custas do empobrecimento do povo brasileiro.
Voltando à festa no Lide. Moro também tentou passar uma mensagem de, digamos, otimismo à plateia de milionários. Disse que "nós já superamos crises econômicas pretéritas terríveis. Já vencemos duas ditaduras do século 20 (Estado Novo e ditadura civil-militar). Nós tivemos o trunfo contra a hiperinflação nos anos 1980 e 1990, nós tivemos a crise da dívida também nos anos 1980, nós superamos todos esses problemas (...)".
E parou por aí. Esqueceu de dizer que vencemos a crise das três quebradeiras impostas pela condução temerária da economia brasileira durante o governo FHC.
Mas o mais sintomático foi Moro ter desprezado o processo de inclusão social, de redução da pobreza e melhora da distribuição de renda, todos conquistados nos últimos 13 anos e que foi o grande motor do crescimento econômico recente e continua sendo a porta de saída da crise.
Também causou uma certa estranheza que, mesmo após essa omissão, de inúmeras indicações de que sua atuação à frente da Lava Jato tem como objetivo atingir o ex-presidente Lula, o governo de Dilma Rousseff e o PT, além do fato de que foi a segunda vez que esteve na entidade de João Doria Júnior, Moro disse que não é tucano: “Posso assegurar a todos que as motivações minha nunca foram partidárias. Tenho zero ligação com partido ou pessoas ligadas a partido”.

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