terça-feira, 7 de junho de 2016

Um prêmio internacional para o escritor brasileiro anti-golpe Raduan Nassar


Ao atribuir maior prêmio da literatura lusófona ao escritor brasileiro, júri reconhece importância de uma obra incomum e amplia isolamento internacional de governo ilegítimo.

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Camões para Raduan: refinado, recluso e antigolpe


Por Isabel Lucas e Luís Miguel Queirós, no Público (Portugal)
O Prêmio Camões 2016 foi atribuído nesta segunda-feira, por unanimidade, ao escritor Raduan Nassar, de 80 anos, o 12.º brasileiro a receber aquele que é considerado o mais importante prêmio literário destinado a autores de língua portuguesa. O júri sublinhou “a extraordinária qualidade da sua linguagem” e a “força poética da sua prosa”.
“Através da ficção, o autor revela, no universo da sua obra, a complexidade das relações humanas em planos dificilmente acessíveis a outros modos do discurso”, justificou o júri, acrescentando que “muitas vezes essa revelação é agreste e incômoda, e não é raro que aborde temas considerados tabu”. O júri realçou ainda “o uso rigoroso de uma linguagem cuja plasticidade se imprime em diferentes registos discursivos verificáveis numa obra que privilegia a densidade acima da extensão”.
Com apenas três livros publicados – os romances Lavoura Arcaica(1975) e Um Copo de Cólera (1978) e o livro de contos Menina a Caminho (1994) –, a exiguidade da obra não impede que Raduan Nassar seja há muito considerado pela crítica um dos grandes nomes da literatura brasileira, ao nível de um Guimarães Rosa ou de uma Clarice Lispector.
Se a singularidade de Nassar lhe garantiu desde cedo um círculo de admiradores fiéis, e se os seus romances alcançaram algum sucesso internacional já na primeira metade dos anos 80, quando foram traduzidos para francês, espanhol e alemão, a popularidade da sua obra aumentou significativamente com a adaptação cinematográfica de Um Copo de Cólera, em 1999, numa realização de Aluizio Abranches, e deLavoura Arcaica, em 2001, num filme de Luiz Fernando Carvalho.
Já este ano, Raduar Nassar foi um dos 13 escritores escolhidos para a longlist do Man Booker International Prize, com a tradução inglesa de Um Copo de Cólera, mas não chegou à lista de seis finalistas, que incluiu o angolano José Eduardo Agualusa.
Nassar é conhecido pela extrema raridade das suas aparições públicas, o que veio conferir um peso particular à sua presença, junto de Dilma Rousseff, no Palácio do Planalto em Brasília, a 31 de Março, num Encontro com Artistas e Intelectuais em Defesa da Democracia. “Os que tentam promover a saída de Dilma arrogam-se hoje, sem pudor, como detentores da ética mas serão execrados amanhã”, afirmou então, citado pela Folha de S. Paulo. Embora o reconhecimento da qualidade do autor seja francamente consensual, esta sua recente intervenção vem também dar à sua escolha para o prémio Camões deste ano uma inevitável dimensão política. Com um valor pecuniário de cem mil euros, o prêmio foi anunciado ao fim da tarde de segunda-feira no Hotel Tivoli pelo secretário de Estado da Cultura, Miguel Honrado, após a reunião do júri, que este ano incluiu a professora e ensaísta Paula Morão e o poeta e colunista Pedro Mexia, os professores universitários, críticos e escritores brasileiros Flora Süssekind e Sérgio Alcides do Amaral, e ainda o autor moçambicano Lourenço do Rosário, reitor da Universidade Politécnica de Maputo, e a ensaísta são-tomense Inocência Mata, atualmente radicada em Macau.
Um lado secreto
Raduan Nassar foi informado de que lhe tinha sito atribuído o prémio no valor de cem mil euros por Miguel Honrado. Ao telefone, ter-se-á mostrado “surpreendido e satisfeito”, contou o presidente do júri, Sérgio Alcides do Amaral. “Ele é muito recluso, mas uma pessoa simples. Não é recluso por arrogância. Espero que possa ter um público maior agora”, sublinhou.




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