terça-feira, 27 de setembro de 2016

Altamiro Borges: O golpe continua com Alexandre de Moraes e a mídia aparelhando e canalizando a Lava Jato


Por Altamiro Borges

Durante o governo Dilma Rousseff, que se jactava da sua ingênua postura “republicana”, a midiática Operação Lava-Jato serviu para desgastar a presidenta e para criminalizar seu partido. Agora, no covil de Michel Temer, ela serve para abafar as sujeiras dos golpistas e para seguir atacando o PT. Baita republicanismo! Neste domingo (25), Alexandre de Moraes – o carniceiro dos estudantes paulistas que hoje é ministro da Justiça – deixou explícito o aparelhamento da ação da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. Em qualquer outro país minimamente civilizado, ele seria imediatamente exonerado e processado por abuso de poder.

Segundo revelação do insuspeito “Estadão”, o fascistoide antecipou durante um comício do PSDB em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, que a Lava-Jato deflagraria novas prisões na véspera das eleições municipais. “Teve na semana passada e esta semana vai ter mais, podem ficar tranquilos. Quando vocês virem esta semana, vão se lembrar de mim”, afirmou o egocêntrico ministro – que não esconde seu desejo de disputar o governo estadual em 2018. Diante da repercussão negativa da declaração, que evidencia que a Lava-Jato foi transformada de vez em cabo eleitoral dos partidos golpistas, o Palácio do Planalto até tentou desmentir o episódio. 

Só que um vídeo vazado na internet, talvez devido às bicadas sangrentas no ninho tucano – o chamado “fogo amigo” –, confirmou a burrice. Temendo o total desgaste da já desacreditada Lava-Jato, o governo acionou a mídia chapa-branca para difundir que o ministro linguarudo seria “imediatamente” exonerado do cargo. Na sequência, Michel Temer recuou – o que já virou uma marca desta gestão errática. Em nota oficial, o Ministério da Justiça garantiu que a Lava-Jato é uma operação imparcial, que a Polícia Federal segue com a sua “atuação independente” e que a declaração da Alexandre de Moraes foi apenas uma “força de expressão”. Haja cinismo!

O discurso do fascistoide, porém, foi confirmado nesta segunda-feira (26), com a prisão cinematográfica do ex-ministro Antônio Palocci. A mídia golpista aproveitou o episódio para reforçar a sua cruzada contra o PT, confirmando que a Lava-Jato virou uma operação boca-de-urna – conforme denunciou certeiramente o ex-presidente Lula. O Judas Michel Temer, “ficha suja” que já foi citado em inúmeras delações premiadas, segue impávido no Palácio do Planalto. O carniceiro Alexandre de Moraes segue ministro. E a Lava-Jato, chefiada pelo “justiceiro” Sergio Moro, continua cometendo as suas atrocidades para servir aos propósitos da direita nativa.

Sobre a midiática Operação Lava-Jato vale conferir dois artigos publicados na Folha neste final de semana.

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É hora de barrar o arbítrio

Por André Singer

O juiz Sergio Moro colocou nesta quinta (22) a gota d'água no copo da escalada de arbítrio em curso no país. Curiosamente, o fez ao liberar, por razões humanitárias, o ex-ministro Guido Mantega depois de algumas horas na Polícia Federal de São Paulo, e não ao mandá-lo para a prisão por cinco dias ou dez dias, como havia decidido de início. Pois, se era possível soltá-lo, não havia necessidade de prendê-lo, e a arbitrariedade da detenção ficou evidente.

Não sou eu quem o diz, mas o insuspeito de petismo Reinaldo Azevedo. "Força-tarefa e juiz quiseram dar um recado: 'Mandamos soltar e prender quando nos der na telha'",escreveu o colunista. O recado foi entendido.

A justificativa de Moro revelou-se tão frágil que, desta vez, ninguém engoliu. "Considerando o fato de que as buscas nos endereços dos investigados já se iniciaram (...) reputo, no momento, esvaziados os riscos de interferência da colheita de provas", escreveu no despacho de soltura. Em outras palavras, bastava determinar a busca e apreensão, não precisava prender o investigado.

Cabe lembrar que, pela terceira vez, Moro apresenta explicações mal ajambradas para decisões gravíssimas. Depois da também desnecessária condução coercitiva de Lula, em 4 de março passado, emitiu nota na qual "lamentava" que as diligências tivessem levado a confrontos, "exatamente o que se pretendia evitar". Determinou a coerção para evitar conflitos? Quem acredita?

Cinco dias mais tarde, Moro divulgou as famosas escutas telefônicas entre o ex-presidente Lula e a então presidente Dilma Rousseff. Instado pela AGU a se manifestar a respeito do assunto, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki afirmou que a divulgação das fitas "comprometeu o direito fundamental à garantia de sigilo" e que era "descabida a invocação de interesse público da divulgação" feita por Moro. Em resposta, o juiz curitibano solicitou "escusas" ao STF e explicou que não tivera intenção de causar "polêmicas". Dá para acreditar?

Mas nesses episódios houve mobilização nas ruas para apoiar as atitudes de Moro. O objetivo era sustentar o impeachment, cuja aceitação foi aprovada pela Câmara um mês depois com base nas manifestações provocadas pelas "inocentes" derrapadas do juiz. Os atropelos constitucionais foram varridos para baixo do tapete.

Agora parece que Moro ultrapassou o limite do aceitável, mesmo para corações liberais e conservadores. Por isso, espero que o episódio Mantega represente um corte. A opinião pública viu a face do arbítrio. Se ficar conivente com ele, prestará contas à história. Quando um processo autoritário se explicita, todo mundo sabe como começa, mas ninguém sabe como termina.

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'Soluções inéditas' da Lava Jato têm um nome: Tribunal de Exceção

Por Janio de Freitas

A realidade não precisa de batismo nem definição, mas ambos tornam mais difundidas a sua percepção e compreensão. Esse é o auxílio que o país recebe de um tribunal do Sul, quando os fatos fora do comum se multiplicam e parecem não ter fim: a cada dia, o seu espetáculo de transgressão.

Foi mesmo um ato tido como transgressor que levou o tribunal, ao julgá-lo, a retirar a parede enganadora que separava a realidade de certos fatos e, de outra parte, a sua conceituação clareadora. Isso se deu porque o Tribunal Regional Federal da 4a Região (Sul) precisou decidir se aceitava o pedido, feito por 19 advogados, de "processo administrativo disciplinar" contra o juiz Sergio Moro. O pedido invocou "ilegalidades [de Moro] ao deixar de preservar o sigilo das gravações e divulgar comunicações telefônicas de autoridades com privilégio de foro [Dilma]". Parte das gravações, insistiu o pedido, foram interceptações "sem autorização judicial".

Se, entre os 19, alguém teve esperança de êxito, ainda que incompleto, não notara que recursos contra Moro e a Lava Jato naquele tribunal têm todos destino idêntico. Mas os 19 merecem o crédito de haver criado as condições em que o Judiciário reconheceu uma situação nova nas suas características, tanto formais como doutrinárias. Nada se modifica na prática, no colar de espetáculos diários. O que se ganha é clareza sobre o que se passa a pretexto da causa nobre de combate à corrupção negocial e política.

De início era apenas um desembargador, Rômulo Pizzolatti, como relator dos requerimentos. Palavras suas, entre aquelas com que apoiou a recusa do juiz-corregedor à pretensão dos advogados: a ação do que se chama Lava Jato "constitui um caso inédito no direito brasileiro, com situações que escapam ao regramento genérico destinado aos casos comuns". E o complemento coerente: a Lava Jato "traz problemas inéditos e exige soluções inéditas".

O "regramento genérico" é o que está nas leis e nos códigos, debatidos e fixados pelo Congresso, e nos regimentos e na jurisprudência criados pelos tribunais. O que "escapa ao regramento" e, em seu lugar, aplica "soluções inéditas" e apenas suas, tem nome no direito e na história: Tribunal de Exceção.

A tese do relator Rômulo Pizzolatti impôs-se por 13 votos contra um único desembargador. Não poderia ser tida como uma concepção individual do relator. Foi a caracterização –correta, justa, embora mínima– que um Tribunal Federal fez do que são a 13a vara federal de Curitiba, do juiz Sergio Moro, e "a força-tarefa" da Procuradoria da República no sistema judicial brasileiro, com o assentimento do Conselho Nacional de Justiça, do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do Conselho Nacional do Ministério Público e dos mal denominados meios de comunicação.

Fazem-se entendidos os abusos de poder, a arrogância, os desmandos, o desprezo por provas, o uso acusatório de depoentes acanalhados, a mão única das prisões, acusações e processos: Tribunal de Exceção.

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