quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Com “fake news”, candidato extremista do partido Patriota incentivou as ofensivas contra venezuelanos em Roraima



"Com a chapa em temperatura máxima, bastou a ignição ser dada para a cidade entrar em convulsão. O responsável por acender o fósforo? Um candidato a deputado pelo Patriota. Ezequiel Calegari é seu nome." - Mauro Donato, jornalista

Do Justificando:
Com “fake news”, candidato do Patriota incentivou as ofensivas contra venezuelanos em Roraima

Terça-feira, 21 de agosto de 2018

Com “fake news”, candidato do Patriota incentivou as ofensivas contra venezuelanos em Roraima



Imagem: EBC
Ao restante do Brasil foi apresentada, nesta semana, a cidade de Pacaraima (RR). Uma cidade que nada mais é que uma invasão dentro de uma reserva indígena e que tem no comando ‘informal’ do município – quem de fato manda no pedaço – latifundiários (que fazem um imenso lobby pela extinção da reserva, por óbvio).
Um lugar onde o saneamento básico não chega para 80% da população e que não é interligado ao sistema elétrico nacional. A energia vem de onde? Da Venezuela. Irônico, não?
Com meros 12 mil habitantes e instalações precárias, a cidade teve, em poucos meses, um acréscimo de mais de 15% na população, por conta de refugiados venezuelanos. Era previsível que entraria em desequilíbrio em decorrência de um adensamento repentino.O instinto de sobrevivência fala mais alto nessas horas.
Soma-se a esse quadro o estado de espírito atual de parte da sociedade que saiu do armário: a extrema direita, resolvida a fazer justiça com as próprias mãos (e nesse cenário a Venezuela e venezuelanos representam o ‘comunismo’ para essa turma disposta a agredir até mulheres e crianças).
Com a chapa em temperatura máxima, bastou a ignição ser dada para a cidade entrar em convulsão. O responsável por acender o fósforo? Um candidato a deputado pelo Patriota. Ezequiel Calegari é seu nome.
Foi Ezequiel quem botou pilha nos revoltados por ocasião do assalto sofrido por um comerciante de Pacaraima, na última sexta-feira. Bem verdade que houve agressão ao comerciante, mas o patriota Ezequiel (que administra uma página anti-imigrantes), fez uma postagem mentirosa e exagerada, afirmando que a vítima havia sido esfaqueada, espancada e estava em coma, “entre a vida e a morte”.
Poucos dias antes, Ezequiel Calegari já tinha disseminado outra lorota. O candidato espalhou que uma grávida brasileira havia sido expulsa da maternidade em Roraima para dar lugar a uma imigrante venezuelana gestante. Nada disso era verdade. A moça não foi expulsa, saiu depois de dar a luz; O comerciante não tomou facada nenhuma e nunca esteve em coma. Mas aí já era tarde. Após o assalto, a população já estava eriçada graças às fake newse saiu para o confronto.
O Patriota é o partido pelo qual Bolsonaro tencionou candidatar-se. O capitão mudou de ideia, mas a legenda encontrou um clone: Cabo Daciolo. É, portanto, uma sigla que encampa os mesmos ‘valores’ bolsonaristas que agora deram para propagandear a versão brasileira do “Make America Great Again” de Donald Trump. Já se vê seguidores trajando camisetas ou bonés com “Faça o Brasil grande de novo”. Para esses lobotomizados, ‘expulsar o invasor’ é o que lhes cabe fazer.


Ainda que a governadora de Roraima, Suely Campos, tenha demonstrado xenofobia e pedido logo de cara o fechamento da fronteira, o alerta de que a situação caminhava para o caos estava dado há muitos meses. Michel Miguel Temer viu ali uma oportunidade de recuperar 0,0001% de popularidade e fez um discurso humanista, surfou na solidariedade aos refugiados, recusando-se a atender o pedido. Postura correta, mas nada mais fez. Não tomou providência alguma. Então agora age como dez em dez governantes brasileiros: nada fez preventivamente e depois das fezes federem envia forças policiais.
Temer é um espantalho inútil, espetado e imóvel, que mesmo com sua cara de vampiro não assusta ninguém. Após seu pronunciamento, um juiz de Roraima entrou com uma liminar e mandou fechar mesmo assim. Foi preciso o TRF entrar em campo para revogar a decisão.
Pobres irmãos venezuelanos, que atravessaram a fronteira fugindo da crise e tiveram o desgosto de encontrar uma outra venezuela (com ‘v’ minúsculo mesmo) em Pacaraima, onde não há Estado, onde as pessoas também andam com porretes para defender um pedaço de pão.

Mauro Donato é Jornalista, escritor e fotógrafo nascido em São Paulo

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