quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Do El País: "A Europa não pode ficar indiferente a respeito do que ocorre com Lula”


Do El País:

“A Europa não pode ficar indiferente a respeito do que ocorre com Lula”

O membro do parlamento europeu Roberto Gualtieri visitou o ex-presidente petista, e criticou o processo de Moro


O eurodeputado Roberto Gualtieri.
O eurodeputado Roberto Gualtieri. 
O eurodeputado Roberto Gualtieri, membro do Partido Democrático Italiano, pisou em solo curitibano no final de julho para visitar o ex-presidente Lula com uma certeza: a de que há algo estranho no processo judicial que levou o petista a uma condenação de 12 anos e um mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex no Guarujá, no âmbito da Operação Lava Jato. "Eu li toda a sentença, e acho que aqui trata-se mais de um expediente para compensar a falta de provas do que uma qualificação genuína dos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção", afirma. "Pessoalmente eu não vejo nesse caso nada que indique um crime". O político romano não é estranho a estes delitos: Gualtieri ocupa a presidência da Comissão de Assuntos Econômicos e Monetários do Parlamento Europeu, responsável por, entre outras coisas, legislar sobre combate à lavagem de dinheiro, evasão de divisas e corrupção no bloco.
"Apontar as fraquezas de um caso judicial não é uma generalização ou um ataque à independência do Judiciário. Acho paradoxal que alguns juízes peçam apoio popular, como se fossem políticos", dispara o italiano, ciente do forte clima de polarização que tomou conta do Brasil desde o impeachment de Dilma Rousseff. Segundo ele, este discernimento é fundamental para proteger a reputação do Judiciário, combalida após uma série de decisões conflitantes - como a que mandou soltar Lula, revogada horas depois. "As maiores vitimas da politização da justiça são os juízes", afirma Gualtieri. "Isso me preocupa. Um Poder Judiciário forte, independente e com boa reputação é parte essencial das nossas repúblicas modernas. Se opor a uma decisão judicial não fundamentada não é se opor à luta contra a corrupção".
Não foi a primeira vez que um membro do Parlamento Europeu se manifestou contra a prisão do petista. Integrantes das bancadas portuguesa e espanhola do Legislativo já haviam criticado a sentença do juiz Sérgio Moro. Mas Gualtieri foi o primeiro a visitar o ex-presidente no cárcere. Ele defende que o parlamento europeu "tome passos adicionais" com relação à situação do Brasil. Sem mencionar quais seriam estas medidas, o deputado afirma que irá levar as informações coletadas no Brasil para seus pares em Bruxelas, capital belga que sedia o parlamento. "A situação do Brasil não é só um caso de solidariedade política dos socialistas europeus com o PT, é uma questão mais ampla, que afeta a qualidade do desenvolvimento internacional. É preciso estar atento, Europa não pode ficar indiferente a respeito do que ocorre aqui com relação à qualidade do processo democrático e ao presidente Lula", afirmou.
O mês de julho também foi marcado pela ampliação da repercussão política no exterior da prisão do ex-presidente à medida que se aproximam as eleições presidenciais - o petista, virtualmente impedido de concorrer pela Lei da Ficha Limpa, foi confirmado como candidato pelo PT neste sábado e segue liderando a disputa. No mês passado, 28 parlamentares americanos, incluindo o ex-pré-candidato presidencial democrata Bernie Sanders, lançaram carta questionando a condenação. Políticos chilenos, incluindo a ex-presidenta Michelle Bachelet, esquerdista moderada, também se manifestaram, dizendo que a eleição sem Lula "poderia ter sérios questionamentos de legitimidade e aprofundaria ainda mais a crise política".

"Não acho que a luta contra a corrupção é mero populismo"

Gualtieri, eleito pelo influente site Politico como o oitavo eurodeputado mais atuante em 2016, se orgulha de ter adotado, no comando da Comissão de Assuntos Econômicos, "a mais avançada legislação de combate à lavagem de dinheiro do mundo". "Eu não sou daqueles que acham que a luta contra a corrupção é mero populismo financiado por organizações internacionais", afirma. Para ele, no entanto, "o Judiciário não pode minar o poder político", da mesma forma como "o poder político não pode minar a independência dos outros poderes, dentre eles o Judiciário". 
Gualtieri se disse emocionado após a visita a Lula na sede da Polícia Federal na capital paranaense. "Lula é uma figura que você está acostumado a ver ao lado dos líderes mundiais, em encontros do G-20... Encontrar ele em um quarto de prisão produz uma forte emoção, de encontrar uma figura tão importante e carismática, uma referência, naquela situação", diz. O deputado, que veio ao Brasil como representante do Grupo Parlamentar Social Democrata da União Europeia e do Partido Socialista Europeu, afirmou que o petista estava "incrivelmente tranquilo, otimista, forte e determinado", longe de qualquer quadro de depressão que a prisão frequentemente impõe aos apenados.
O italiano é sutil ao abordar eventuais problemas dos Governos petistas - que ocuparam o Palácio do Planalto por mais de 12 anos - e uma eventual falta de autocrítica da legenda. "Existem problemas estruturais no sistema político que não nasceram com os governos do PT mas que foram herdados, e que provavelmente não tiveram atenção suficiente", diz. "Negar os problemas não é bom", completa. O romano diz ainda que "existe um fisiologismo que ocorre quando você está no poder por muito tempo, e erros são cometidos". Logo, "a autocrítica é muito importante. Mais importante que isso, no entanto, é buscar solucionar os problemas estruturais do sistema político, como financiamento eleitoral e a a fragmentação dos partidos". 
Já com relação a uma possível parcialidade das autoridades nas investigações de casos de lavagem de dinheiro e corrupção que não envolvem o PT, Gualtieri é mais incisivo. "Que eu saiba existem outros protagonistas do mundo econômico e político brasileiro que se envolveram em escândalos recentes como o dos Panamá Papers", diz. "Gostaria de ver o mesmo grau de engajamento das autoridades em investigar esses casos também". De acordo com ele, os documentos divulgados em 2016 "falam muito sobre onde grandes riquezas estão escondidas, e eu não vejo empenho em processar estas pessoas".

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