Um espectro ronda o Brasil de 2014. Há conspiração política para
melar a Copa do Mundo e manipular eventuais protestos para provocar
instabilidade política, violências e, com isso, abrir caminho para a direita
chegar ao poder?
Sinceramente, prefiro tratar o assunto como pura teoria da
conspiração. O problema é que todas as teorias de conspiração – assim tratadas
– dos anos 60 e 70, sobre golpes da CIA no terceiro mundo, revelaram-se
verdadeiras. Teorias de conspiração me lembram famosa máxima espanhola,
imortalizada no clássico de Cervantes, Don Quixote: “yo no creo en brujas, pero
que las hay, las hay”.
Conspiração ou não, o tema é exótico e interessante, e já está
preocupando muita gente séria. É o caso de Gabriel Priolli, um experiente
jornalista e diretor de televisão que já editou o Jornal Nacional e chefiou o
jornalismo na TV Gazeta e TV Record. Priolli trata o assunto com seriedade e
extrema preocupação:
“Acumulam-se as evidências de que setores conservadores, descrentes de
sua capacidade de sedução do eleitorado pelas vias convencionais, cogitam se
lançar na aventura catastrofista da Copa. Pretendem que o maior evento já
realizado no país fracasse espetacularmente, para o máximo constrangimento e
desgaste do governo atual. Acham que colherão os louros dessa ação de
lesa-pátria.”
*
A Jogada da Copa
Seis meses depois dos protestos que tomaram inúmeras cidades
brasileiras, decantadas as insatisfações apresentadas pelos manifestantes e as
múltiplas soluções aventadas por todos os atores políticos para a estranha
crise que se formou, temos um quadro bem claro. A maioria da população quer
mudanças no país, mas prefere que elas sejam conduzidas por Dilma e não pela
oposição. A presidenta lidera em todas as sondagens de intenção de voto.
Falta muito tempo até as eleições, certamente, e já assistimos a
oscilações espetaculares de intenção de voto nos pleitos anteriores, inclusive
candidaturas que “atropelaram” na reta final e venceram. Tudo pode acontecer,
portanto, até que se proclamem os resultados. Mas, até segunda ordem, quem
lidera é Dilma. A soma dos votos de seus adversários não supera os votos da
candidata governista e tudo indica que a eleição será definida já no primeiro
turno.
Sim, mas há um outro roteiro possível para este ano. Nele, as
massas sairiam novamente às ruas em junho, em plena Copa do Mundo, e causariam
tal transtorno à competição que seria impossível ignorá-las. A mídia mundial
distribuiria a todo o globo imagens de multidões pedindo reformas, de black
blocs destruindo seus alvos habituais e das polícias reprimindo com a cortesia
conhecida.
As cenas passariam a impressão de um país sem governo e de um
governo sem legitimidade – impressões absolutamente falsas. Mas o que é mesmo a
verdade, nessas coisas da mídia e da enunciação de seus conteúdos?
Um governo “ilegítimo”, pressionado externamente, ficaria acuado
também pelos adversários internos. Estes amplificariam ao máximo possível os
protestos e tentariam conduzir a sua pauta, exatamente como fizeram em 2013.
Para criar um clima de megacrise, que nenhum ponto de contato tem com o real.
Mas o que é exatamente o real, quando se tem o controle do que a mídia diz
sobre ele?
Quem sabe se, em meio ao eventual fiasco da Copa – corre-corre e
pancadaria nas imediações dos estádios, os inevitáveis problemas organizativos
amplificados ao extremo, as queixas e angústias dos turistas constrangidos pelo
clima de guerra política no Brasil e, prêmio final, uma boa derrota da seleção
nacional -, os eleitores não embarquem na ideia de jogar toda a culpa em Dilma?
Quem sabe não escolham na urna uma alternativa de oposição?
Acumulam-se as evidências de que setores conservadores,
descrentes de sua capacidade de sedução do eleitorado pelas vias convencionais,
cogitam se lançar na aventura catastrofista da Copa. Pretendem que o maior
evento já realizado no país fracasse espetacularmente, para o máximo
constrangimento e desgaste do governo atual. Acham que colherão os louros dessa
ação de lesa-pátria.
É simplesmente doentia a ideia de que, para conquistar o poder
de “consertar” o país, alguém considere aceitável que a nossa imagem
internacional seja destruída. Que o Brasil seja penalizado por décadas, pela
“incapacidade” de realizar grandes eventos internacionais. E que isso aconteça
fundamentado em mentira e manipulação da opinião pública.
Mas, infelizmente, a possibilidade é bastante concreta. Daqui
até junho, provavelmente veremos novas convocatórias para que as massas voltem
às ruas e façam manifestações “espontâneas”. Assistiremos à incitação explícita
de atos destinados à desestabilização do governo. “Não vai ter Copa!”, bradarão
outra vez os carbonários – com todas as câmeras e microfones à sua disposição.
Dias atrás, na primeira vez em que externei essa preocupação,
recebi o previsível fogo de barragem. Disseram que é paranóia minha, exagero.
Que as convicções democráticas da oposição e de sua mídia são inquestionáveis.
E que a eleição transcorrerá dentro das regras, sem tentativas de tapetão.
Será mesmo? O pré-golpe de 1964, em que muitos não acreditavam
que a legalidade fosse demolida, talvez nos ensine melhor sobre os métodos do
conservadorismo para tomar o poder. E sobre como ele é campeão em destruir a
democracia, para “salvá-la” da ameaça dos governos populares.
Por que deveríamos confiar agora em quem não foi confiável no
passado e segue não sendo?
*
PS: Vinicius Freire, colunista da Folha, também considera a hipótese de protestos contra a
Copa se transformarem em arma eleitoreira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário