segunda-feira, 7 de outubro de 2024

O crime organizado, a política e as redes sociais, por Luís Nassif

 

Ou se monta uma grande frente contra o crime organizado ou, em breve, este país se converterá em uma grande Colômbia

Do Jornal GGN:



O caso Pablo Marçal precisa ser encarado de frente pelas autoridades. Não propriamente pelas autoridades eleitorais, mas judiciárias e policiais. Marçal vem do submundo extra-legal. Especializou-se em toda sorte de golpes, tendo como instrumento-mãe o controle das redes sociais.

Recentemente, The Intercept enviou o repórter Paulo Motoryn à África e ao Nordeste. Na África para levantar o que foi feito com quase R$6 milhões captados junto ao público para a construção de casas em uma aldeia africana. Não foram entregues nem 10%. Depois, foi para uma cidadezinha do Nordeste, onde supostamente estariam localizadas duas ONGs que receberam as doações. Eram ONGs fantasmas.

Este foi apenas um dos golpes aplicados por Marçal e identificados pelo jornalismo – não pelo sistema judicial. Toda sua fortuna e carreira foram moldados nesse submundo, onde não entra a fiscalização oficial.

O empreendedorismo de Marçal abarca todas as formas de arrancar dinheiro de incautos, todos os modelos de estelionato.  Manobra a crença dos seus seguidores, vende livros de autoajuda, simula milagres divinos, levanta dinheiro para as causas mais nebulosas, tem negócios de toda espécie, até em Angola, além de parcerias virtuais com influenciadores acusados de ligações com o tráfico.

Há estelionatos de toda espécie, que culminaram com o falso diagnóstico de consumo de cocaína por um adversário político. O parceiro é um médico envolvido em outros estelionatos. E a tentativa de assassinato reputacional de um adversário, revela o modus operandi das grandes organizações criminosas.

Em um mundo onde o PCC e outros grandes grupos movimentam bilhões com tráfico e outras formas de ilegalidades, quem sabe até onde vão as parcerias dos empreendedores digitais, se nem Receita, nem Polícia Federal têm a menor ideia sobre seu fluxo de faturamento?

Em suma, as redes sociais permitiram a proliferação de golpes por todos os poros. Permitiram a expansão das organizações criminosas bancando candidaturas municipais, explorando o universo das organizações sociais. E, agora, surge um organizador geral ambicionando o poder político, trazendo atrás de si a parceria com estelionatários de todos os tipos, os religiosos, os vendedores de auto-ajuda, os vendedores de solidariedade.

As redes lhes deram poder de dar golpes, ameaçar pessoas, criar seguidores cegos, unidos por crenças e por relações de subordinação emocional, tudo, enfim, o que caracteriza o modus operandi das grandes organizações criminosas. E essa atividade foi naturalizada pela mídia, cobrindo o “fenômeno”, como se fosse um empreendedor em atividades legais.

A ascensão do fenômeno Marçal acende todas as luzes amarelas da democracia. E exigem medidas rápidas e profundas:

  1. Levantamento de todas as formas de negócios desenvolvidas por ele, para identificar suas ramificações e ilegalidades.
  2. Acelerar a legislação de controle das redes sociais.
  3. Convocar a Polícia Federal, policias civis estaduais, Ministérios Públicos Estaduais para uma ação concatenada contra o crime organizado, especialmente contra o que explora organizações sociais. 

Conheço melhor apenas duas cidades do interior: Poços de Caldas e São João da Boa Vista. Em ambas as cidades, há golpes frequentes das prefeituras locais com organizações sociais golpistas. E, em ambos os lugares, sob beneplácito dos promotores estaduais. Agora, com o auxilio generoso das bets, abre-se mais uma frente de consolidação desse país paralelo.

Ou se monta uma grande frente contra o crime organizado ou, em breve, este país se converterá em uma grande Colômbia.

Lava Jato: Sucessor de Moro na 13ª Vara conta, Eduardo Appio os bastidores podres e criminosos da operação

 

Do Canal da Carta Capital no Youtube:

O juiz Eduardo Appio ganhou os holofotes em sua breve passagem pela 13ª Vara Federal de Curitiba - a Vara da Lava Jato - em 2023. Em cerca de três meses, retirou do armário alguns esqueletos da operação e lançou nova luz sobre casos nebulosos, como as acusações do advogado Rodrigo Tacla Durán e o grampo ilegal na cela do doleiro Alberto Youssef. Foi fundamental, também, para o Conselho Nacional de Justiça iniciar uma investigação na 13ª Vara e no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, responsável pelos processos da Lava Jato na segunda instância. O material, que apontou uma "gestão caótica" do dinheiro de acordos de leniência, já está no Supremo Tribunal Federal. O juiz é o protagonista do recém-lançado livro "Tudo por dinheiro: a ganância da Lava Jato segundo Eduardo Appio" que concedeu, nesta sexta-feira 4, uma entrevista ao vivo ao canal de CartaCapital. Assista!




terça-feira, 1 de outubro de 2024

ENTREVISTA: Eduardo Appio revela bastidores da 13ª Vara e lembra esqueletos podres no armário de Sergio Moro

 

Em primeira entrevista ao GGN após ser afastado da Lava Jato, Appio narra detalhes da batalha que enfrentou tentando abrir a caixa de pandora


Do Jornal GGN:

Em primeira entrevista ao jornalista Luis Nassif desde sua ascensão e queda da 13ª Vara Federal de Curitiba, o juiz federal Eduardo Appio revelou detalhes dos batidores da batalha para tentar passar um pente-fino na Operação Lava Jato.

Appio foi removido em definitivo da Lava Jato após um acordo com o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), motivado por uma representação com as digitais de Sergio Moro e do desembargador Marcelo Malucci (pai do genro e sócio do canal Moro). Hoje, Appio atua numa vara cível, enquanto Moro aguarda julgamento no CNJ por atos envolvendo o “orçamento secreto” de cerca de 5 bilhões que ele mantinha sob sigilo na 13ª Vara.

Na entrevista exclusiva para o GGN, Appio avaliou que a imprensa foi a principal responsável por catapultar as figuras salientes da Lava Jato, como Moro e Deltan Dallagnol. O empoderamento artificial subiu à cabeça e levou a uma série de irregularidades que ainda hoje são investigadas e reavalidas pelo Judiciário.

Para Appio, “Sergio Moro é um peão no tabuleiro, como outros agentes políticos foram. Ele não é o homem por trás da cena. Não é o articulador maior que detém o domínio de tudo que acontece no Brasil. Isso é uma redução da complexidade dos fatos. Existe uma conjulgação – e o título do seu livro não poderia ser mais apropriado, ‘a cospiração lava jato’ – uma conjunção de fatores que levaram a tudo que ocorreu.”

Sem rabo preso com o lavajatismo, Appio sofreu resistência da turma leal a Moro e Dallagnol desde o momento em que decidiu se candidatar para substituir Luis Antonio Bonat. Houve pedido de remoção impugnado por lavajatistas que usaram, entre outros motivos, a participação de Appio no programa semanal TVGGN Justiça, onde Appio, como professor de Direito, fazia análises críticas a Lava Jato.

Uma vez dentro da 13ª Vara de Curitiba, Appio constatou que não teria vida fácil como juiz titular. “Os servidores eram a memória viva da Lava Jato desde 2014”, mas seu time de assessores diretos foi esvaziado de propósito.

“O fato é que eu cheguei e só tinha uma assessora, que tive que colocar em indisponibilidade porque o Tacla Duran alegou que ela cometeu uma espécie de infidelidade funcional”, jogando nas mãos da Gabriela Hardt uma ação que questionava justamente sua atuação no caso dele, comentou Appio.

Depois de meses sobrecarregado, Appio pediu reforços à direção geral, à superintendência, ao TRF-4. “Eles nunca ajudaram em nada, lavaram as mãos. Depois tiraram as gratificações aos servidores da Vara, deixando todos com o salário pela metade de uma hora para outra. Depois, mandaram distribuir mais processos para a vara. Foi o caos. Em 2023 eu notifiquei o CNJ de que estávamos entrando em colapso e não sabia mais o que fazer.”

Mas tampouco o CNJ agiu para desafogar o juiz que prometia revirar os esqueletos no armário de Sergio Moro.

TACLA DURAN

Entre os esqueletos deixados por Moro em Curitiba, está o caso Tacla Duran, que acabou sendo o pivô do afastamento de Appio da Lava Jato.

Tacla Duran foi advogado da Odebrecht, uma das empresas investigadas na Lava Jato, e acusou Moro e seu padrinho de casamento, Carlos Zucolotto, de ter tentato extorção em troca de negociar um acordo de delação premiada com os procuradores liderados por Dallagnol.

Appio tentou viabilizar as condições para Tacla Duran depor sobre o caso, mas o desembargador Malucelli – cujo filho é sócio e genro do casal Moro – passou a decidir contrariamente. Foi quando Appio tentou apurar as ligações familiares entre os Moro e os Malucelli, colocando a suspeição do desembargador em pauta.

Quando lembra do caso Tacla Duran, Appio se pergunta: “se Tacla Duran não tivesse nada de relevante, por que essa resistência titânica em ouvi-lo?”

O juiz também conversou com Nassif sobre outros casos embaraçosos para Moro, como o do doleiro Dario Messer, do empresario Tony Garcia e do advogado Roberto Bertholdo.

Segundo Appio, a Lava Jato fez investigações seletivas, muitas vezes poupando doleiros ou grandes bancos, e em outras, perseguindo seus desafetos ou alvos políticos. E o pior: desvirtuando a aplicação das leis e lançando mão de expedientes como a tortura, para conseguir os famigerados acordos de delação premiada.

Appio lembrou que ao tomar posse da 13ª Vara, se deparou com casos de réus qe ficavam cinco dias sem tomar banho ou tomar sol, e eram isolados nas piores condições possiveis na carceragem da PF do Paraná, tendo familiaes ameçados pelas autoridades o tempo tudo. Tudo com a finalidade de induzir o investigado a delatar. “Chegamos a esse tipo de selvageria”, disse.

Para o juiz, foi o trabalho do ministro Luis Felipe Salomão que abriu caminho para que as figuras mais proeminentes da Lava Jato respondam por eventuais erros. “Agora uma luz se abriu.”

Appio narrou mais bastidores da Lava Jato no livro “Tudo Por Dinheiro: a ganância da Lavajato segundo Eduardo Appio”, de autoria de Salvio Kotter, a ser lançado pela editora Kotter a partir de outubro. A obra está em pré-venda e pode ser encomendado aqui.

Assista a entrevista completa de Eduardo Appio no canal TV GGN abaixo: