terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Maio de 1968: um convite ao debate. Por Erick Corrêa



Cinquenta anos depois, é ainda mais necessário examinar em profundidade um movimento que indicou o esgotamento do capitalismo mas inspirou, ao mesmo tempo, a “renovação” pós-moderna do sistema



Por Erick Corrêa, no Outras Palavras
1968 constitui um evento de dimensão histórico-mundial (Wallerstein), assim como 1789-91, 1848, 1917, 1989-91, pois assinala um ponto de virada histórico suficientemente persuasivo para instaurar um novo world time (Eberhard). Particularmente contagiante, a expressão francesa da crise internacional, detonada em Paris no mês de maio, funcionaria como uma espécie de catalisador de outras revoltas antissistêmicas em arenas locais distantes como Varsóvia, Praga, Dublin, Berlim, Tóquio, São Paulo, Cidade do México ou Lima.
Devido a esta repercussão mundial da experiência francesa, convencionou-se nos meios jornalísticos e até mesmo acadêmicos reduzir 68 ao maio de 68, uma referência ao mês no qual a contestação de setores esquerdistas do movimento estudantil universitário explodiu nas barricadas da Rua Gay-Lussac, no entorno da Sorbonne em Paris. Já a referência a maio-junho de 68 incorpora o desfecho conclusivo da crise, quando o impacto causado pelos Acordos de Grenelle – pactuados, no fim de maio, pelo Ministério do Trabalho com a Confederação Geral do Trabalho (CGT), sob a direção do Partido Comunista Francês (PCF) –, somado à proibição das organizações revolucionárias mediante decreto governamental de 12 de junho, e a subsequente vitória eleitoral de De Gaulle, conseguiram finalmente canalizar as energias revolucionárias do movimento para saídas reformistas.
Contudo, este ano turbulento não começou nem terminou em 1968, algo que a expressão anos 68 também tenta exprimir. Na Itália, por exemplo, a contestação eclodiu um ano antes da rebelião na França, arrastando-se por mais dez anos.
A cada decênio, repõe-se uma situação de disputa pela memória e significado de 68, sempre renovada por uma série de publicações acadêmicas e editoriais jornalísticos que polemizam sobre o anacronismo ou, pelo contrário (a depender do ponto de vista), sobre a atualidade ou contemporaneidade das aspirações libertárias e energias revolucionárias liberadas naquele ano.
Não há também consenso quanto ao seu impacto sobre a vida social, se este foi subestimado ou superestimado pelos protagonistas daquela geração. Afinal, 68 foi uma revolução social derrotada, ou tudo não passou de uma intentona hedonista e iconoclasta de perturbação do status quo pela juventude revoltada? 68 resultou na vitória da heteronomia e do individualismo pós-moderno ou simboliza um importante marco temporal nos processos de descolonização e de emancipação das populações submetidas às mais diversas formas históricas de opressão (patriarcal, heteronormativa, xenofóbica, étnico-racial, política)?
Algumas interpretações mais dogmáticas chegam a reduzir a história de 1968 a um tudo ou nada maniqueísta, incapaz de perceber a sua dimensão histórica real.
É nesse sentido, nos parece, que a provocação lançada pelos filósofos franceses Gilles Deleuze e Félix Guattari (1984), de que o Maio de 68 não aconteceu, deve ser entendida: pois, se a luta não começou nas barricadas dos dias 10 e 11 de maio, tampouco ela terminou com as eleições de 23 e 30 de junho, mas se desenvolveu posteriormente também nas trincheiras do campo simbólico, isto é, nos conflitos ideológicos pela memória do evento. De fato, as interpretações sobre 68 dividem-se mesmo no interior de campos políticos afins, principalmente à esquerda do espectro sociopolítico, sobretudo na França, país onde o evento despertou as reações mais furiosas e apaixonadas. O caso dos antigos fundadores da revista Socialismo ou Barbárie (1949-67), Claude Lefort e Cornelius Castoriadis, é exemplar nesse sentido. Para o primeiro, 68 foi uma revolta bem sucedida, enquanto que para o segundo, não passou de uma revolução fracassada.
Guy Debord, fundador de uma pequena, porém influente organização, a Internacional Situacionista (IS, 1957-72), constatou em 88 que nada havia sido até ali “tão dissimulado com mentiras dirigidas” quanto a história de 68. De fato, naquele mesmo ano, surgia pela primeira vez na França um livro sobre 68 produzido pelo campo néocon (neoconservador), chamado O pensamento 68, dos ideólogos Luc Ferry e Alain Renaut.
Vinte anos depois, no livro O pensamento anti-68 (2008), o filósofo Serge Audier alertava para o que chamou de trabalho de deslegitimação de 68, realizado por três atores principais, oriundos de campos políticos e intelectuais distintos, mas que convergiram na interpretação sobre aquele episódio: os gaullistas (retórica do “complô internacional”), os comunistas (retórica das “provocações esquerdistas”) e os neoconservadores (como o ex-presidente Nicolas Sarkozy), que pretendia liquidar a herança de maio de 68.
Em 2018, o atual presidente da França, Emmanuel Macron, restaurou a polêmica sobre o legado de 68 desde um ponto de vista modernisateur que, longe de liquidar com a herança de 68, pretende instrumentalizá-la, ressaltando as supostas características liberal-modernizantes do evento, enquanto oculta seus aspectos mais selvagens (como a greve geral de 10 milhões de trabalhadores com ocupação de fábricas e universidades).
Para os situacionistas[1], “de todos os critérios parciais utilizados para acordar ou não o título de revolução a tal período de perturbação no poder estatal, o pior é seguramente aquele que considera se o regime em vigor caiu ou se manteve. Esse critério […] é o mesmo que permite à informação diária qualificar como revolução qualquer putsch militar que tenha mudado o regime do Brasil, de Gana ou do Iraque”. A “prova mais evidente” do caráter revolucionário de 68, continuam os situacionistas, “para aqueles que conhecem a história do nosso século, ainda é esta: tudo o que os stalinistas fizeram, sem recuo, em todos os estágios, para combater o movimento, prova que a revolução estava lá”[2].
Debord, por sua vez, identificaria justamente na reação a 68 a origem do novo ciclo de dominação da sociedade do espetáculo, denominado espetáculo integrado, quando países de economia capitalista mais avançada (como França e Itália) passaram a incorporar, na tentativa de frear o avanço das forças revolucionárias liberadas internamente no decurso dos anos 1960-70, algumas das técnicas de governo empregadas tanto pelos regimes concentracionários de Stalin e Hitler, como pelas ditaduras militares dos países de economia capitalista mais atrasada (como Portugal, Espanha, Grécia, Chile, Argentina e Brasil) – sem, contudo, uma correlata supressão dos arranjos institucionais do chamado Estado de direito. Ao comentar a “estratégia da tensão” aplicada pelo Estado italiano contra o movimento del ‘77, Debord notou que “só se ouviu falar com frequência de ‘Estado de direito’ a partir do momento em que o Estado moderno, chamado democrático, deixou de ser democrático” (Comentários sobre a sociedade do espetáculo, § XXVI, 1988).
Como vimos, 68 não se restringe temporalmente aos meses de maio e junho, nem espacialmente à França. No Brasil, diferentemente de países formalmente democráticos como Estados Unidos, França e Itália, em 1968 a exceção se encontrava mais à vontade para mostrar o seu próprio rosto, dado que um processo de ruptura democrática já estava em curso no país há quatro anos. Mesmo assim, o ano de 68 foi marcado pela ascensão da resistência à ditadura instaurada em 64.
A luta dos secundaristas cariocas contra o aumento no preço das refeições, no início de 1968, que resultou na morte do estudante Edson Luís e nas mobilizações subsequentes, culminariam na Passeata dos Cem Mil, em junho. A partir do segundo semestre ocorreu a contra-ofensiva dos militares e dos apoiadores civis do regime. Em julho, a ocupação da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP), na Rua Maria Antônia, foi destruída por forças militares e paramilitares de orientação anticomunista como o Comando de Caça aos Comunistas (com saldo de mais um estudante morto). Em agosto, forças de repressão invadiram a Universidade de Brasília (UnB), prendendo e espancando estudantes e professores. Em outubro, os militares invadiram o XXX Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE) em Ibiúna, prendendo centenas de lideranças do movimento estudantil. Em dezembro, a decretação do Ato Institucional n° 5 (AI-5) fecharia ainda mais o regime, dando início aos chamados anos de chumbo. Com a posse do general Emílio Garrastazu Médici, então chefe do SNI [3], em 30 de outubro de 1969, o regime atinge o ponto de indistinção total onde “o serviço secreto não seria apenas mais um órgão da Presidência da República; seria a própria Presidência da República”[4].
Aos ouvidos brasileiros pós-2013, esse debate (pós-68) parece assumir contornos familiares. Afinal, é inquestionável o fato de que tanto 1968 quanto 2013 marcaram, guardadas suas respectivas particularidades históricas, períodos de acirramento das lutas sociais. Parece-nos que o traço mais distintivo entre uma conjuntura e outra, mais do que nas formas e conteúdos da contestação sociopolítica e da repressão policial, consiste no fato de que a violência estatal de 2013 foi operada, desta vez, não por um regime formalmente ditatorial como em 1968, mas por um regime formalmente democrático.
Se se quiser aplicar a crítica teórica do espetáculo – crítica essa fundamentalmente nucleada pela experiência de 68 – à crise sociopolítica brasileira de 2013-18, deve-se ler com especial atenção os escritos de Guy Debord nos anos 1980. Pois a crise e o esgotamento da chamada Nova República testemunham justamente a entrada definitiva do Brasil na era do espetáculo integrado.
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[1]As críticas téorica e prática dos situacionistas, indissociáveis da crise revolucionária francesa de maio-junho, ainda são pouco lembradas por nossa historiografia sobre 68. Quando mencionadas, incorre-se em algumas imprecisões. Olgária Matos reconhece, por um lado, que “foram os situacionistas que numa mescla de marxismo, anarquismo, surrealismo, fizeram a crítica mais certeira à sociedade ‘espetacular mercantil’, onde tudo se dá sob a forma da mercadoria e esta se dá como espetáculo” (1981, p. 68). Mas erra ao afirmar que “o dia 22 de março marcou a fusão entre o leninismo, o anarquismo e o situacionismo” (Idem, p. 69). De fato, o grupo 22 de Março ao qual ela se refere (fundado em 22/03/68), resultou de uma agremiação eclética que amalgamava, de modo geral, anarquistas, trotskistas e maoístas, mas não os situacionistas. A IS também não “se formou em Strasbourg” (Idem, p. 66), como afirma a autora, mas na Itália em 1957. Os situacionistas foram os pivôs do chamado Escândalo de Strasburgo, em 1966, um dos episódios antecipadores da crise de maio. Porém, apenas um dos membros da IS, Mustapha Kayathi (autor do manifesto A miséria do meio estudantil), detinha contato com estudantes radicais de Strasbourg. Cf. Paris, 1968: As barricadas do desejo. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1981. Já Daniel Aarão Reis Filho alude a “um texto dos anos 60” (A sociedade do espetáculo, de Guy Debord), para se compreender “o caráter mediático que a política assume desde então” (1999, p. 67). Ocorre que o livro de Debord é de 1967, e não explica 68 a posteriori, mas o antecipa em diversos aspectos, inclusive para além da questão “mediática”. Cf. “1968, O curto ano de todos os desejos”. In: GARCIA, Marco Aurélio; VIEIRA, Maria Alice. Rebeldes e contestadores. 1968: Brasil/França/Alemanha. São Paulo: Ed. Perseu Abramo, 1999.
[2]Cf. “O começo de uma época”. In: Internacional Situacionista, n° 12, 1969, p. 13 (Tradução nossa).
[3]O Serviço Nacional de Informações é o serviço secreto brasileiro, vigente entre 1964-90. A partir de 1990, mudaria de sigla outras três vezes. Foi o efêmero DI (Departamento de Inteligência) entre 1990-92, SSI (Subsecretaria de Inteligência) entre 1992-99 e, desde então, Abin (Agência Brasileira de Inteligência).
[4]Cf. FIGUEIREDO, Lucas. Ministério do Silêncio. A história do serviço secreto brasileiro de Washington Luís a Lula (1927-2005). Rio de Janeiro: Record, 2005, p. 186.

Ex-Chanceler Celso Amorim escreve sobre o 18 Brumário de Michel Temer



Além de cuidar dos interesses dele e de sua turma, o presidente ilegítimo entrega o país àqueles dos EUA. Nem por isso Tio Sam se comove

O texto de Celso Amorim foi publicado pela CartaCapital:

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Perry não deixou de visitar o Brasil em 1994. Agora, Tillerson nem passa perto de Brasília
Em 1994, o secretário de Defesa dos Estados Unidos William Perry visitou o Brasil. Na ocasião, eu servia como ministro das Relações Exteriores de Itamar Franco. Como o Brasil não tinha ainda um Ministério da Defesa, coube a mim ser o anfitrião do secretário, atuando de forma coordenada com os então ministros das três forças singulares.
Àquela época, alguns anos após o fim da Guerra Fria, Washington “atualizara” sua visão do papel das Forças Armadas na América Latina. O inimigo deixara de ser o comunismo internacional e se tornara o crime organizado, especialmente o narcotráfico, percebido pelos Estados Unidos como a maior ameaça à sua própria segurança. Este deveria, assim, tornar-se o foco principal da atenção e das ações das nossas forças.
Recordo-me claramente da preocupação dos meus três colegas de farda com a percepção de que Perry teria vindo ao Brasil com a intenção de obter nossa adesão à nova doutrina, incompatível com a concepção que tinham da função mais nobre (de defesa da Pátria) das corporações que dirigiam.
Estávamos nas vésperas da Primeira Cúpula das Américas, que se realizaria no fim do ano em Miami, e havia o temor de que fosse consagrada uma nova doutrina de segurança para o continente, o que afinal não ocorreu. Foi nas conversas com os três ministros, em preparação dos encontros com o secretário americano, que ouvi, pela primeira vez, o cuidado dos chefes militares em evitar a “contaminação” com o narcotráfico, a exemplo do que já vinha ocorrendo em outros países, notadamente no México.
Leia também:
Há poucas semanas, o atual secretário de Estado, Rex Tillerson, visitou alguns países latino-americanos. De forma quase acintosa (é difícil ignorar o Brasil, nem que seja pela extensão territorial), Tillerson, ao longo de seu périplo, que incluiu três países da América do Sul, passou ao largo de Brasília.
Jato sueco
O jato sueco e o submarino atômico em parceria com a França incomodam os EUA
Fizeram-se ouvir alguns muxoxos de diplomatas, falando em off, mas oficialmente o governo Temer não passou recibo da omissão humilhante. Entretanto, não é provável que o desprezo demonstrado por Washington tenha sido totalmente ignorado pelos poucos estrategistas que restam no Planalto. O golpe que levou à queda de Dilma Rousseff e à perseguição judicial-midiática do ex-presidente Lula não foi obra do acaso. Oportunismos individuais à parte, ele se inseriu em um quadro mais amplo de reafirmação da hegemonia americana na região.
Posso estar enganado, mas o segundo golpe, representado pela intervenção no Rio de Janeiro, poucas semanas depois das ações em Roraima, na fronteira com a Venezuela, teve e tem, como um dos seus objetivos, posicionar o grupo mais próximo do poder em Brasília em relação ao processo em curso de afirmação do domínio do grande capital – especialmente o capital internacional – sobre nossa economia e de redesenho geopolítico no mundo e na região.
Por que citei a viagem, há quase um quarto de século, do secretário Perry? Justamente porque naquela época o Brasil rejeitava uma visão do papel subalterno das Forças Armadas, que agora parecemos assumir como nossa: prioridade ao combate à criminalidade, deixando-se para segundo plano projetos ambiciosos de um Brasil-Nação, obviamente incômodo para a potência dominante, tais como o submarino nuclear e os caças supersônicos, ambos realizados em parceria com países relativamente independentes de Washington. O primeiro está agora ameaçado pela política de austeridade fiscal; o segundo, além disso, corre o risco de ser um “dano colateral” da planejada absorção da Embraer pela Boeing. 
Rio
A intervenção no Rio depois das operações da fronteira com a Venezuela. Proximidade estranha (Foto: Fabio Gonçalves /Fotoarena/Folhapress)
Ao mesmo tempo em que aceita uma agenda de subserviência nos planos político, econômico e militar, o governo Temer, ao enfatizar a dimensão de segurança em uma situação de crise humanitária, dá a sua “modesta” contribuição ao isolamento da Venezuela, passo preparatório, ainda que lateral, para legitimar um golpe no nosso vizinho, abertamente pregado pelo secretário de Estado, na esteira de declarações belicistas do próprio presidente dos Estados Unidos a respeito de Caracas.
Ao alinhar-se ainda mais claramente aos objetivos estratégicos de Washington, com uma espécie de 18 Brumário em versão tupiniquim, o grupo no poder visa obter o apoio de quem está de fato no comando das ações, apelando para um tema com óbvia ressonância na população. 
Além de tudo o que já foi falado, sob os aspectos político, jurídico, social, de direitos humanos etc., da intervenção no Rio de Janeiro, não acho inútil chamar atenção para a sua dimensão internacional. Não menos preocupante é o risco de fratura nas nossas Forças Armadas, cuja grande maioria, estou certo, está capacitada a perceber as razões da intervenção muito mais do que o oportunismo tático e a submissão estratégica dos que decretaram esse ato, sob todos os aspectos, temerário. 

Do Justificando: Busca e apreensão de Advogado e Professor da PUC por Lava Jato causa indignação


Do Justificando:


Busca e apreensão de Advogado e Professor da PUC por Lava Jato causa indignação

Busca e apreensão de Advogado e Professor da PUC por Lava Jato causa indignação

Foto: Rafael Valim/Justificando

A recente Operação Jabuti, mais um braço da Operação Lava Jato, tem sido intenso alvo de questionamentos na comunidade jurídica. Divulgada na mídia tradicional com o objetivo de investigar lavagem de dinheiro em contratos milionários de advocacia e a Fecomércio-RJ, a operação levantou suspeitas sobre uso do aparato jurídico e policial para promoção de perseguição a escritórios de advocacia ligados à defesa do ex-presidente Lula, bem como críticos à Operação. Os questionamentos se intensificaram após agentes da Polícia Federal irem ao escritório Marinho e Valim Advogados com mandados de busca e apreensão.
Valim é Professor Doutor de Direito Administrativo da PUC/SP, autor de uma série de livros e articulador na defesa do ex-presidente Lula, bem como de outros casos alvos da Lava Jato. Junto ao advogado Cristiano Zanin e Valeska Teixeira Martins, que representam o ex-presidente nas ações da Operação, criou o Instituto Lawfare em Londres, como observatório internacional aos arbítrios em curso no Brasil. Sua biografia reúne grande respeito na comunidade jurídica, seja como pesquisador, seja como advogado.
Valim advoga para a Fecomércio/RJ ao lado de grandes bancas e nomes do Direito Administrativo. Entretanto, somente seu escritório foi alvo da operação. Como resultado da operação, apreenderam recibos de serviços de advocacia, algo que já estava à disposição dos órgãos de controle. A infrutífera busca, no entanto, não impediu que seu nome fosse veiculado e o caráter sigiloso da busca fosse vazado para jornais da grande imprensa, como na coluna de Monica Bérgamo da Folha de S. Paulo.
Por força de lei, bem como da confidencialidade de documentos que lá se encontram, escritórios de advocacia gozam de uma série de proteções legais, que não foram observadas no caso. O episódio se soma a diversos outros de desrespeito à profissão do advogado, bem como às suas prerrogativas. Os casos são tantos que tramita no Congresso o Projeto de Lei de criminalização de violação de prerrogativas de advogados. O projeto de lei está para votação na Câmara dos Deputados.
Em nota, o Instituto dos Advogados Brasileiros denunciou e repudiou o ocorrido, o qual classificou como “impensável”, mesmo na ditadura militar: “Vivemos um momento de grande dificuldade para a administração da justiça e para o exercício da advocacia. Mas são os advogados que têm o monopólio da representação dos cidadãos perante o Judiciário. E é por isso que essas prerrogativas são vitais. Mesmo no período da ditadura militar, era impensável que um agente de polícia invadisse um escritório de advocacia para violar os arquivos. Hoje, juízes autorizam a violação da comunicação pessoal entre o advogado e o cliente e determinam busca e apreensão nos escritórios de advocacia”.
Fecomércio/RJ
Desde antes da operação, a Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro é palco de intensa disputa política e troca de acusações, como revelado por uma matéria da Carta Capital anterior à operação. A disputa de gigantes é entre a Federação carioca e a Confederação Nacional do Comércio. Orlando Diniz, presidente da Fecomércio/RJ é um dos alvos da Operação que chegou às portas de um escritório de advocacia. As matérias veiculadas após vazamento das instituições jurídicas e policiais informam que a Operação supostamente apura o repasse de Diniz a escritórios de advocacia.
Inclusive, a Folha estampou em sua capa o nome do escritório Teixeira Martins, que representa o ex-presidente Lula em uma série de ações. O escritório foi alvo outras vezes da Operação, quando, por exemplo, teve todas suas ligações interceptadas por decisão de Sérgio Moro, dentre outras iniciativas midiáticas de deslegitimação. Entretanto, quanto ao mérito em si dessa operação, as autoridades são muito questionadas sem resposta, já que a ação jurídico-policial foi unicamente estampada nos noticiários.
Além disso, também se encontra o problema inicial da Lava Jato, que é a super-competência, isto é o alcance da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar qualquer processo de seu interesse em todo território nacional. Essa questão vai ser historicamente alvo de muitos questionamentos à operação, pelo irrestrito poder concedido à força tarefa para atingir o que quer que ela quisesse, incluindo a Presidência da República, dentre outros alvos, como sua defesa.
Em gravação de drops para o Justificando, o Advogado Criminalista Anderson Lopes, explicou para o público a questão da supercompetência e como a conta da Lava Jato não fecha:
Outra crítica seria a questão da parcialidade da força tarefa da operação, que já registrou intensas disputas com a defesa do ex-presidente e tem casos ainda em curso na primeira instância, tomar a iniciativa injustificada de determinar busca e apreensão unicamente no escritório em questão, além de publicamente vazar para a mídia o nome apenas de advogados ligados à defesa do ex-presidente, embora o caso em questão tivesse outros defensores, conforme dito acima.

Bob Fernandes: A Suíça, mais uma vez, entrega o PSDB. Lula luta para não ser preso, enquanto FHC escuta clássicos de camarote...






Foi a Suíça que comunicou às autoridades brasileiras a existência de R$ 113 milhões movimentados por Paulo Vieira de Souza...
...Vulgo "Paulo Preto", diretor da DERSA por 5 anos. Nomeado por Alckmin em 2005.
A Folha informa: a Suíça mandou, não o Brasil foi buscar. E informações sobre R$ 113 milhões submergiram por meses num processo secundário em São Paulo.
Quando deveriam estar em inquérito no Supremo que investiga Serra e Aloysio Nunes. Ambos ligados a Paulo Preto, que serviu ao governo Serra e, na campanha 2010, ameaçou:
-Não se abandona companheiro ferido na beira da estrada…
Recado claríssimo, jamais investigado pra valer. Em 2012, CPI Cachoeira/ Delta, Paulo Preto escancarou, na revista Piauí:
-Por que a CPI proibiu a abertura das contas do eixo Rio-São Paulo? Porque se abrir as contas do eixo-Rio-São Paulo o Brasil cai.
De novo, silêncio cúmplice.
Oito anos depois da ameaça, seis depois da frase-síntese, Paulo Preto pode delatar. Não a tempo de julgamentos finais tirarem legalmente da eleição os citados.
E depois? Bem, ministros do Supremo se aposentam, se vão, novos são nomeados... Outra maioria se produz.
Recordemos. A emenda da reeleição de Fernando Henrique Cardoso teve votos comprados. Sem CPI, sem investigação pra valer.
Como na venda da Telefonia por R$ 22 bilhões. Com acertos gravados e expostos publicamente... ACM era o homem-forte do governo. Renan Calheiros, o ministro da Justiça de FHC.
Na Lava Jato, Cérvero tentou delatar: "...a Brasken é um escândalo do governo Fernando Henrique...". A autoridade que ouvia a delação interrompeu e fez Cerveró mudar de assunto:
-...bem, passados dois anos...
Como Lula, Fernando Henrique tem um Instituto. O de Lula, investigado por tudo e todos. O de FHC nasceu num jantar dentro do Palácio da Alvorada, ele ainda presidente.
Relato de Gerson Camarotti, na Época: Odebrecht, OAS, bancos, os de sempre, doaram R$ 7 milhões. Já haviam doado R$ 1,5 milhão para compra da sede.
Cerveró na Lava Jato? Instituto FHC...? Alega-se o de sempre, quando tucanos: já prescreveu...
Mas não prescreveu, não prescreve, não deveria prescrever para o jornalismo. Doadores, os de sempre, estão todos aí.
Agora a Polícia Federal indiciou, scaneia Jaques Wagner, hipótese B do PT.
Lula luta para não ser preso.
E Fernando Henrique assiste concertos clássicos. De camarote. Villa-Lobos, na última quinta-feira,22, na sala... São Paulo.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Lava Jato ataca Rafael Valim, professor da PUC-SP - por Miguel do Rosário


Veja primeiro o seguinte vídeo, de Paulo Henrique Amorim:



Leia a Reportagem de Miguel do Rosário:



O CAFÉZINHO via Folha SP: A nota publicada na coluna de Monica Bergamo, sobre a busca e apreensão, determinada pela Lava Jato, no escritório de Rafael Valim, advogado e professor na PUC, passou relativamente despercebida. Compreende-se. O circo lavajateiro terminou seu recesso e iniciou 2018 com força total. A imprensa foi novamente tomada por notícias de delatores, depoimentos, sítios, prisões espetaculares. Tanta coisa em poucos dias que foi difícil prestar atenção ao que aconteceu com Rafael Valim.
Blog O CAFEZINHO - Escrito por Miguel do Rosário, Postado em Redação - 24/FEV/2018 - foto capa: Rafael Valim e Lula do Jornal GGN. Foto abaixo, durante o lançamento do livro O CASO LULA. Da esquerda para direita: advogados Rafael Valim, Cristiano Zanin, Valeska T. Martins, Lula, Da. Marisa e o advogado inglês Geoffrey Robertson, contratado pela defesa de Lula para representá-lo na Comissão de Direitos Humanos da ONU.

Entretanto, estamos diante de um fato de extrema gravidade.
Em dezembro de 2017, Valim assinou, junto com Jesse Souza, um artigo na Folha denunciando o avanço do estado de exceção após o impeachment de Dilma Rousseff.
Há poucos meses, Valim participou, junto com os advogados Cristiano Zanin e Valeska Teixeira, do lançamento do Lawfare Institute, em Londres.
E algumas semanas atrás, logo após a condenação de Lula em segunda instância, Valim foi um dos organizadores de um debate, na PUC-SP, com presença de muitos intelectuais importantes, especialmente da área do direito, para denunciar a decisão do TRF4 como um atentado ao direito e à justiça.
É muito sintomático que as primeiras ações da Lava Jato em 2018 sejam totalmente políticas:
1) Sergio Moro começa o ano coordenando, sempre em sintonia com a mídia, uma série de ataques a Lula, através de depoimentos e entrevistas com testemunhas e “colaboradores” sobre o “sítio em Atibaia”, os quais são vazados imediatamente para a imprensa lavajateira, que trata de ordenar títulos e montar narrativas que prejudiquem o máximo possível o ex-presidente.
2) Lava Jato deflagra uma nova operação para envolver o ex-advogado da Odebrecht, Rodrigo Tacla Duran.
3) Lava Jato determina busca e apreensão no escritório de… Rafael Valim.
O ataque a Valim partiu de um dos tentáculos da Lava Jato no Rio de Janeiro, embora o escritório de Valim seja em… São Paulo.
A operação Jabuti, chamada de “nova etapa” da Lava Jato no Rio de Janeiro, não tem nada ver com desvios da Petrobras ou com algum posto de gasolina em Curitiba. O seu nome Lava Jato tem a função exclusiva de empoderar essa organização criminosa incrustrada dentro do sistema de justiça, com forte apoio do governo norte-americano.
Esse apoio do governo americano a Lava Jato não é mais teoria de conspiração, já que agora os próprios representantes do departamento de justiça de Trump tem se gabado de seu suporte à Lava Jato. Em julho de 2017, Kenneth Blanco, membro da cúpula do departamento de justiça dos EUA, em discurso (hoje registrado na página do departamento), declarou sem meias palavras que “é difícil imaginar uma relação de cooperação mais intensa na história recente do que a feita entre o Departamento de Justiça dos Estados Unidos e procuradores brasileiros [da Lava Jato]”.
Em seu último discurso de 2017 (também registrado no site da instituição), Blanco voltou a se referir à Lava Jato como exemplo da participação bem sucedida do Departamento de Justiça, inclusive se gabando pela condenação de Lula.
Esses fatos, que não deixam mais dúvida sobre a interferência americana sobre as ações da Lava Jato, apenas corroboram o que, para mim, é uma sólida convicção: a Lava Jato é coordenada por uma organização criminosa. Seus operadores são bandidos, que seguem uma agenda política estritamente orientada para beneficiar determinados interesses financeiros.
A busca e apreensão no escritório de Rafael Valim, no marco da mesma operação que prendeu o presidente da Fecomércio, mostra que o campo progressista deve resistir a todo custo ao populismo penal. A Lava Jato age sempre da mesma maneira: ela se “legitima” pela prisão de picaretas com alguma visibilidade midiática, para então impor a sua verdadeira agenda, que é inteiramente política.

Detalhe importante: Valim, assim como milhares de advogados, prestou algum tipo de serviço no passado para uma instituição qualquer do sistema S. Não é acusado de nenhum crime. Tratou-se apenas de uma brutalidade desnecessária, mas bem típica do regime de exceção em que vivemos.

Que poder é esse, quem está por trás dele e seus beneficiados, essas são as perguntas que, até então, tínhamos dificuldade de responder porque é (ou era) um poder relativamente invisível.

Hoje não. Hoje esse poder, que deu o golpe, já botou a cabeça acima da superfície. O aumento de 63% das verbas federais para a Globo em 2017, o crescimento vertiginoso das importações de óleo diesel norte-americano, a isenção fiscal de alguns trilhões de reais para as petroleiras a quem o novo governo entregou, de graça, o nosso pré-sal, tudo isso ajudou a esclarecer pontos que, até então, eram apenas especulações da nossa parte.
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Advogados lançam livro em espanhol sobre o caso Lula (foto acima) - Jornal GGN - QUI, 23/11/2017 - 08:29 - ATUALIZADO EM 23/11/2017 - 08:32

Jornal GGN - Os advogados Cristiano Zanin Martins, Valeska Teixeira Zanin Martins e Rafael Valim lançam uma coletânea de artigos escritos por 22 juristas sobre os processos que o ex-presidente Lula enfrenta na Lava Jato, após a repercussão do caso triplex.
Batizado de “O Caso Lula – A Luta pela Afirmação das Garantias Fundamentais”, a obra será divulgada em vários em países de língua espanhola, a começar pela Argentina, numa parceria entre a Editora Contracorrente e Astrea.
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Rafael Valim - Professor da PUC SP, lança livro em Avaré, sua cidade natal por Jornal do Nassif 22/ago/2017 
Acontece na próxima terça feira, 29/ago/2017 - no IFSP Avaré Instituto Federal de SP, o lançamento do livro "Estado de Exceção: a forma jurídica do neoliberalismo" de autoria do Advogado Dr. Rafael Valim - Doutor em Direito Administrativo pela PUC/SP e Professor de Direito Administrativo e Fundamentos do Direito Público da PUC/SP. O Dr. Rafael Valim é Avareense - onde moram seus pais, parentes e amigos...

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Como mostra o El País, o Aparheid é aqui


Do jornal El País:


Sem amparo legal, militares usam celulares pessoais para ‘fichar’ moradores de favelas

Militares tiraram fotos do RG e do rosto de pessoas em três comunidades na zona oeste do Rio.

ONG Justiça Global comparou ação ao apartheid e diz que ‘nem ditadura’ adotou esse procedimento


intervenção federal militar no RJ
Militar revista morador de comunidade fluminense  TÂNIA RÊGO
Homens do Exército com celulares pessoais registram o documento de identidade e o rosto de todas as pessoas que passam. Essa cena se repetiu por três comunidades do Rio de Janeiro na manhã desta sexta-feira, dia 23: Vila Kennedy, Vila Aliança e Coreia, todas na zona oeste do Rio.
A operação obedece a um decreto presidencial de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) assinado no ano passado, sem ligação oficial com intervenção federal anunciada pelo presidente Michel Temer (PMDB). O objetivo oficial era o de combater o tráfico de drogas local e retirar bloqueios nos becos e vielas que teriam sido feitos por criminosos para dificultar a entrada de autoridades. Os militares, porém, fizeram muito mais do que isso: segundo testemunhas, praticaram uma série de abusos, do “fichamento” informal da população à destruição de calçadas.
“O Exército estava tirando barricada na operação e do lado tinha a calçada do pai de uma amiga, não quiseram nem saber, passaram por cima, quebraram toda a calçada. Mesmo ele falando com os militares, foi ignorado ali na hora”, conta o fotógrafo Junior Santana, de 23 anos. Júnior viu os vizinhos serem abordados e “fichados” pelos policiais.
“Acho um desrespeito e humilhação puxar celular e começar a tirar foto das pessoas. Nem câmera profissional era. Se fosse e falassem que fariam um registro oficial, era outra coisa. Mas tirar um celular do seu uso e registrar no meio da rua é meio estranho, humilhante”, lamenta.
Os militares se encaminharam para as comunidades no período da manhã. Há relatos de pessoas impossibilitadas de irem para o trabalho por não portar o RG ou outro documento com foto. A ação é criticada por especialista, ao ponto de comparar a situação com a época do apartheid, regime de segregação racial imposto na África do Sul até os anos 1990.
“É uma ação totalmente arbitrária, uma violação de direitos. Violaram o direito de ir e vir, mais um pouco e passa a ser como a Lei do Passe da África do Sul na época do apartheid, quando se tinha uma carteirinha de onde você podia circular ou não. No Rio, é quase isso”, compara Lena Azevedo, especialista em segurança pública e pesquisadora da ONG Justiça Global.
Segundo a pesquisadora, não há registros de situações semelhantes ocorridas no período da ditadura militar brasileira, entre 1964 e 1985. “É totalmente um Estado de Exceção. Nem na ditadura me lembro desse tipo de fichamento. O que será feito? Evidentemente, o objetivo é o controle da população negra e favelada. Não se viu um fichamento em Copacabana”, diz.
A Justiça Global enviou um documento à ONU (Organizações das Nações Unidas) e à OEA (Organização dos Estados Americanos) pedindo o acompanhamento da situação no Rio de Janeiro por membros das entidades. No documento, consideram a intervenção cheia de “irregularidades e incompatível com tratados e convenções internacionais”, além de “ameaçar direitos e garantias individuais da população”.
Lena cita o caráter “de discriminação de teor racial” e lembra da época em que a Favela da Maré sofreu ocupação do Exército para citar transtornos causados aos moradores, como blitze em cada comunidade do Complexo. “Uma vez, um morador parou em 17 blitze em um dia só”, lembra.
“Casos como esse aconteceram em 2014, 2015, quando o Exército esteve na Maré. A prática de tirar foto das pessoas, revistar celulares, olhar as conversas, foi utilizada pelo Exército durante um ano e quatro meses que ficaram na comunidade”, cita Gizele Martins, jornalista e moradora da Maré desde a infância.
“Por dia, estamos sofrendo seis ou sete ações nas favelas. O resultado é: o número de violações têm aumentado. Quem vai responder por essas denúncias, para onde irão? É legal não é?”, provoca.
A Ponte entrou em contato por telefone com o Comando Militar do Leste, chefiado pelo interventor Walter Souza Braga Netto, para questionar sobre a operação do Exército. Contudo, as ligações da reportagem não foram atendidas. Ao G1, o chefe da comunicação social do setor disse que o procedimento já havia sido feito em outras ocasiões e que estaria amparado no decreto da GLO. O texto do decreto, porém, não menciona a fotografia nem o fichamento de pessoas.

sábado, 24 de fevereiro de 2018

Documentário que mostra a farsa do impeachment - ou seja, o Golpe midiático-parlamentar-jurídico de 2016 e que continua até hoje - é premiado em Berlim



Do site Falando Verdades:




O filme “O Processo”, documentário de Maria Augusta Ramos sobre o impeachment de Dilma Rousseff, foi premiado no início da tarde deste sábado (24) no Festival de Berlim. O longa ganhou o prêmio de melhor documentário escolhido pelo público na mostra Panorama, a segunda mais importante do evento.
“Quando a gente escolhe um tema pra investigar e fazer um filme, existe um desejo de dividir esse mergulho com o público. E depois, quando o filme fica pronto e recebe um prêmio do júri popular, eu arrisco dizer que talvez seja uma das maiores realizações como diretora. E é muito relevante também pelo filme ser sobre um episódio histórico do Brasil e estar sendo compreendido por audiências de outras latitudes”, disse a diretora ao UOL.
O filme se dedica a esmiuçar o processo político e jurídico que culminou com o afastamento de Dilma do poder, em agosto de 2016. Com imagens de bastidores e trechos de discursos da acusação e da defesa, “O Processo” defende que o impeachment teve motivação sobretudo política, e não apenas jurídica.
“O Processo”, que estreou em Berlim na última quarta-feira sob muitos aplausos ao final e gritos de “Fora, Temer!”, deve estrear no Brasil em junho. A cerimônia de entrega dos prêmios será no domingo à tarde e Maria Augusta estará presente.
A cerimônia com a entrega do Urso de Ouro e demais prêmios da mostra competitiva oficial do evento será a partir das 19h na hora local (15h, no horário de Brasília) deste sábado.

Do Le Monde Diplomatique: Intervenção no Rio e Venezuela: as estratégias para uma unidade forjada


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Foto: Folha de São Paulo

Um exemplo do retorno da Pedagogia da Opressão

As classes dirigentes vão novamente mobilizar as massas a se unirem contra um mal maior para, assim, controlar a indignação popular. Como o desejo de “pureza” que tocou a população alemã nos pródomos da Segunda Guerra Mundial, estamos mais uma vez submersos em uma situação que nos impele (de forma manipulada) a negar a liberdade em prol da segurança

Por Raphael Silva Fagundes, no Le Monde Diplomatique Brasil



“A maioria dos especialistas deu pouca atenção para os efeitos homogeneizantes da guerra”,[1] escreve a bióloga Barbara Ehrenreich, em sua obra que pretende encontrar as origens da guerra. Não há um instinto agressivo que legitime a guerra, segundo a autora, mas uma questão cultural, especificamente masculina, que se desenvolveu ao longo da história.

A guerra acontece quando a política não deu mais certo? Talvez. Mas se a guerra for uma estratégia da própria política? Discordaríamos de Hannah Arendt, mas chegaríamos muito mais próximo da realidade brasileira.

Primeiro, temos que observar a importância da unidade para a política de qualquer nação. O ideal de unidade deve ser entendido como uma mitologia política agenciada por determinados grupos que buscam impor sua dominação. Desse modo, a concebemos como uma estratégia política de construção de um “mito” que desempenha um “papel de mobilização”, conforme os apontamentos de Raoul Girardet:

O mito político é fabulação, deformação ou interpretação objetivamente recusável do real. Mas, narrativa legendária, é verdade que ele exerce também uma função explicativa, fornecendo certo número de chaves para a compreensão do presente, constituindo uma criptografia através da qual pode parecer ordenar-se o caos desconcertante dos fatos e dos acontecimentos.[2]

Girardet assinala que um dos principais fenômenos que marca a história política ideológica é a oposição entre a autonomia individual com o sonho de uma sociedade homogênea. “Na unidade está a vida, fora da unidade a morte é certa”, declamava Jacques Bossuet, bispo e teólogo conhecido por ser um grande teórico do absolutismo francês. Aproximadamente duzentos anos depois, o político e historiador Michelet, um grande agente no combate ao comunismo e ao anarquismo, afirmava: “Sem unidade perecemos”.[3] O interesse de que o geral prevalecesse sobre o particular era o principal aspecto da política entre os séculos XVII e o XIX. Entretanto, os componentes retóricos para a divulgação e consolidação desse ideal sofreram alterações importantes.

A questão divina e civilizacional da unidade permaneceu como topos no discurso político. Na França, Raoul Girardet salienta que os ideólogos se aproveitaram dos “termos do velho vocabulário cristão, dos símbolos da antiga liturgia, das palavras dogma, santidade, redenção, relíquia ou sacrifício”.[4]Michelet, por exemplo, apreende o sagrado no nacional: “santa unidade fraternal da nação”, dizia.

É evidente que a ideia de se privilegiar o geral em detrimento do individual se espatifou com a pós-modernidade, assim como a sacralidade da identidade nacional, no entanto, ainda há uma questão que mobiliza as pessoas em prol da unidade: o sentimento de insegurança.

Dessa maneira, defendemos a hipótese de que a intervenção federal no Rio de Janeiro, carregando a bandeira da guerra contra o tráfico e a criminalidade em geral, funciona como uma estratégia para unir a população que visivelmente vem se fragmentando desde o golpe. 83% das pessoas apoiam a intervenção civil-militar. O governo encontrou uma forma de integrar a população de modo a desviar a indignação popular que se agigantava em relação ao “pacote de maldades” adotado pelo governo.

Outro elemento irá reforçar essa unidade: a luta contra a Venezuela. Uma estratégia, por seu turno, muito mais tradicional. Em relação, especificamente, à história do Brasil, foi a Guerra do Paraguai que mobilizou voluntários de várias partes do Império, forjando, definitivamente, o sentimento nacional.[5]Foi a primeira vez que as diversas regiões do país se encontraram, ou melhor, fundiram-se.

Hoje, como naqueles sangrentos anos, a mídia faz o seu papel. Os veículos de comunicação nacionais, ligados às grandes corporações midiáticas internacionais, chamam os venezuelanos que migram para o Brasil de “refugiados”. Além disso, a similaridade com a Guerra do Paraguai não é apenas para uma questão explicativa. Argentina, Colômbia e Brasil têm tudo para adotarem o perfil de uma nova Tríplice Aliança, agora em prol do neoliberalismo, para combater o governo de Maduro. As veias da América Latina continuam abertas e expostas às sanguessugas famintas pelas riquezas da região.

As classes dirigentes vão novamente mobilizar as massas a se unirem contra um mal maior para, assim, controlar a indignação popular. Como o desejo de “pureza” que tocou a população alemã nos pródomos da Segunda Guerra Mundial, estamos mais uma vez submersos em uma situação que nos impele (de forma manipulada) a negar a liberdade em prol da segurança.

A situação se altera drasticamente, todavia, quando organização significa o desmantelamento da ordem existente e sua substituição por um novo modelo de pureza. Agora, manter a pureza não pode reduzir-se à manutenção da rotina diária; pior ainda, a própria rotina tem a terrível tendência a se converter em “sujeira”, que precisa ser esmagada em nome da nova pureza.[6]

Ou seja, muitos já condenam a liberdade, alguns até acreditam que existe liberdade demais, e que já está virando bagunça. Uma parte da sujeira interna é a corrupção, que muitos, principalmente os defensores do juiz Sérgio Moro, acreditam que está sendo combatida. A outra parte da sujeira é a criminalidade, vista como causa de tudo, jamais como consequência. A sujeira externa, por sua vez, é a Venezuela que, por adotar um projeto anti-imperialista, vem sendo depreciada pela mídia. A situação está perfeita para o governo conseguir respirar ao longo do ano de 2018 e quem sabe prolongar sua política entreguista por mais quatro anos.

Cabe lembrar que tudo isso é acompanhado de uma retórica inebriante. “A retórica é a negociação da distância entre os homens a propósito de uma questão, de um problema”.[7] O filósofo Michel Meyer destaca que “tudo o que opõe ou reúne os homens, ainda que apenas por um momento, participa desta distância que é o objeto último da retórica”.[8] A retórica negocia a distância e promove a unidade. É função da retórica unir pessoas, por isso a mídia e o governo não deixariam de investir nas fascinantes estratégias persuasivas paralelamente ao ataque a democracia.

*Raphael Silva Fagundes é doutorando do Programa de Pós-Graduação em História Política da Uerj e professor da rede municipal do Rio de Janeiro e de Itaguaí.
[1] EHRENREICH, Barbara. Ritos de sangue: um estudo sobre as origens da guerra. Rio de Janeiro: Record, 2000, p.141.
[2] GIRARDET, Raoul. Mitos e mitologias políticas. Trad: Maria Lpucia Machado. São Paulo: Cia das Letras, 1997, p.13.
[3] Ibidem. p.144.
[4] GIRARDET, 1997, p.165.
[5] IZECKSOHN, Vitor. A Guerra do Paraguai. In: KEILA, Grinberg, SALLES, Ricardo (org.). O Brasil imperial. 1831-1870. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009, p.53-119. v.2.
[6] BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998, p.20.
[7] MEYER, Michel. Questões de retórica: linguagem, razão e seduçãoTrad: António Hall. Lisboa: Edições 70, 2007, p.27.
[8] Ibidem, p.31.