terça-feira, 31 de maio de 2022

O aberrante Bolsonaro e a luta da civilização e do bem contra a barbárie do mal autoritário. Por Fernando Castinho

 

O país não suportará mais quatro anos de processo de destruição das instituições, dos direitos humanos e da civilização.

Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo

Bolsonaro e a luta do bem contra o mal

por Fernando Castilho

Todos acompanhamos, num misto de incredulidade e horror a execução do sergipano, Genivaldo de Jesus Santos e muita gente já escreveu sobre o ocorrido.

Tentarei não ser mais um, somente.

A índole cruel e opressora do Estado sempre acompanhou a evolução do ser humano. Algumas vezes ela recua, outras épocas, recrudesce.

O recrudescimento se deu durante a Santa Inquisição, a Segunda Guerra Mundial – quando foram executados mais de seis milhões de judeus, a maioria em câmaras de gás como a que encerrou a existência de Genivaldo – e, parece que volta, após uma pausa, ao mundo e, lógico, também ao Brasil comandado por Jair Bolsonaro.

Não à toa o mandatário da nação procurou minimizar o crime defendendo hoje a PRF (Polícia Rodoviária Federal) e dizendo querer “justiça sem exageros”.

Mas, o que seria uma justiça sem exageros? A mesma que os policiais fizeram com Genivaldo? Uma barbárie?

Continuou: “Sem exageros e sem pressão por parte da mídia, que sempre tem um lado: o lado da bandidagem. Como lamentavelmente grande parte de vocês [jornalistas] se comportam, sempre tomam as dores do outro lado. Lamentamos o ocorrido e vamos com seriedade fazer o devido processo legal para não cometermos injustiça e fazermos, de fato, justiça”.

Ora, ora, ora. Lógico que o capitão poupa a PRF porque tem entre seus agentes muitos eleitores. Ou seja, Bolsonaro usa a morte de Genivaldo pra fazer campanha eleitoral. E trata a vítima como bandido, sendo que bandidos foram os que a assassinaram.

Sergio Moro, o atual ex-tudo, também se manifestou sobre o fato de maneira cínica ao condenar a ação da PRF, ele que defende a excludente de ilicitude que nada mais é do que atirar primeiro e depois perguntar, o mesmo que os agentes fizeram, apesar de utilizarem gás lacrimogênio e não armas de fogo.

O fato é que há algo de podre, não só nessa corporação, mas nas polícias em geral, haja vista a chacina cometida pela Polícia Militar do Rio de Janeiro quando matou mais de vinte pessoas na Vila Cruzeiro.

Vejam que até surgiu um vídeo de um professor de cursinho preparatório para concurso da PF ensinando a tortura com gás lacrimogênio dentro da viatura como método de amansar os presos mais exaltados.

Se há instituições corrompidas no Estado, as polícias, pelo seu aparelhamento, são as campeãs. E as mais perigosas porque portam armas.

Muito se fala que, caso o capitão não vença as eleições, poderá tentar um golpe, mas não conseguirá contar com a totalidade das Forças Armadas.

Na verdade, o que se observa é um movimento do capitão para conseguir apoio das polícias, embora isso também pareça um tanto distante no horizonte.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, afirmou apenas que a “apuração será a mais breve possível”, mas a PF já adiantou que o inquérito para apurar responsabilidades só estará concluído em 30 dias. Um caso que é um flagrante. Lógico que a expectativa é de que nesse prazo o caso seja esquecido pela imprensa e por nós.

Toda essa onda de barbáries cometidas quase todos os dias, que já começam a ser naturalizadas pela mídia e até por nós que não fomos capazes de sairmos às ruas como os americanos fizeram quando da execução por métodos semelhantes de George Floyd, é responsabilidade daquele, que na condição de chefe maior da nação, prega a violência, o armamento da população e a falta de empatia.

O país não suportará mais quatro anos de processo de destruição das instituições, dos direitos humanos e da civilização.

É preciso um outro Brasil para nossos filhos e netos, um Brasil de respeito ao ser humano, seja branco ou negro, como Genivaldo.

É urgente uma mudança.

Fernando Castilho é arquiteto, professor e escritor

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para dicasdepauta@jornalggn.com.br.

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sexta-feira, 27 de maio de 2022

Henry Bugalho: Bolsonaro, a abominação, está desesperado ante a nova pesquisa Datafolha de 26 de maio, com Lula com 48%

 

Do Canal de Henry Bugalho:




Bolsonarismo, neofascismo, milicianismo, militarismo autoritário, tortura e a câmara de gás da PRF... A crueldade e a tortura autoritária representado pela morte de Genivaldo na câmara de gás da PRF em vídeo do Meteoro Brasil

 

Do Canal Meteoro Brasil:

A Polícia Rodoviária Federal improvisou uma câmara de gás para assassinar um inocente. Em nota, a PRF lidou com o caso com um cinismo tão grotesco quanto a cena protagonizada por seus agentes.




Reinaldo Azevedo: A morte de Genivaldo na câmara de gás da PRF bolsonarizada é a morte de Jesus

 

Da Band News FM:




Militares autoritários criaram um “Projeto de Nação” para 2035 nos moldes da ditadura. Por Patricia Faermann

 


Bolsonaro em evento com militares
Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

Setores militares publicaram uma proposta que prega o governo militar no Brasil até 2035, um aparato de estrutura “político-estratégica” nos moldes da ditadura e uma série de medidas, como o fim da gratuidade do SUS (Sistema Único de Saúde) em 2025.

Trata-se do “Projeto de Nação – O Brasil em 2035”, de 93 páginas, assinado por três organizações militares e que contou com um evento especial de lançamento, na última quarta-feira (19), em Brasília.

Em coluna ao Estadão, o repórter Marcelo Godoy narrou que o evento contou com a apresentação pelo Regimento de Cavalaria de Guardas da música “Eu Te Amo, Meu Brasil”, a mesma que tocava durante os anos 70 para celebrar a ditadura do regime militar no país.

O evento e documento de lançamento do que narram que será o Brasil daqui a mais de uma década foram uma articulação de militares do Instituto Villas Bôas, do Instituto Sagres e Instituto Federalista.

MILITARES QUE CRIARAM O PLANO


Um dos autores e lideranças desse projeto, Luis Eduardo Rocha Paiva, é o diretor do Instituto Sagres. Ele foi presidente do grupo “Terrorismo Nunca Mais” (Ternuma), criada pelo torturador da ditadura Carlos Alberto Brilhante Ustra.

O Instituto General Villas Bôas (IGVB) é do ex-general do Exército Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército, que durante o golpe contra Dilma Rousseff no processo de impeachment escancaradamente incitou a queda da ex-presidente e também ameaçou o STF (Supremo Tribunal Federal) em 2018, quando julgou o Habeas Corpus de liberdade a Lula.

“Em um ambiente eivado de patriotismo, ontem à noite, no auditório da FHE-POUPEx, foi lançado o ‘Projeto de Nação’. O trabalho atendeu a uma demanda abrangente de anos”, escreveu o general, que segue como conselheiro próximo de Jair Bolsonaro.

Escancaradamente retornando a bandeiras da ditadura misturadas com teor neoliberalista, o coordenador do evento, Rocha Paiva, afirmou que o documento é “apartidário, aberto e flexível” e que servirá “mesmo que haja mudança de governo”, exceto a esquerda, que segundo ele “vai jogar fora”.

APARATO “POLÍTICO-ESTRATÉGICO”

Em previsões futurísticas, o documento dos militares fala que supostos avanços serão obtidos pelo Brasil graças a um autodenominado “Centro de Governo”, formado pelas organizações militares e civis que apoiam este plano, que criarão uma “Estratégia Nacional (EN)” em “meados da década de 2020”.

Este Centro de Governo, segundo os militares, “foi um dos fatores que possibilitou ao Brasil ingressar na OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), em meados da década de 2020”. O Brasil não é membro da OCDE.

Também haverá, segundo este plano, um “Sistema Integrado de Gestão Estratégica (SIGE-BR)” para implementar a “Estratégia Nacional (EN)”. O nome remete aos sistemas de informação e segurança do aparato da ditadura do regime militar.

E a sua função seria:

“Oferecer orientações e claras linhas mestras de atuação, com apoio de técnicas e ferramentas (…). Com ela, o CdG tem trabalhado para monitorar os cenários prospectivos e a evolução diária e imediata da conjuntura, assessorando o mais alto nível de governo em face das ameaças e oportunidades.”

Sem apresentar nenhum tipo de pesquisa ou consulta pública realmente efetivada, o documento afirma que “essa nova estrutura político-estratégica — EN, CdG e SIGE-BR — foi desenhada com o perfil desejado pela maioria da população brasileira, que se fez ouvir não somente em manifestações de grande magnitude, mas principalmente nas urnas, em sucessivos períodos eleitorais.”

CONSERVADORES EVOLUCIONISTAS LIBERAIS

Ainda na introdução do “Projeto de Nação”, determina que “os cidadãos brasileiros, em sua maior parte, identificam-se como Conservadores evolucionistas, no campo psicossocial, e Liberais, porém, conscientes da responsabilidade social de apoiar, com políticas públicas sustentáveis, as camadas carentes da sociedade.”

Defesa Nacional, geopolítica, economia, Amazônia e diversos pontos são tratados no documento. Chama o globalismo de “movimento internacionalista” de “imposições de caráter autoritário, porém disfarçados como socialmente corretos e necessários”.

O globalismo, segundo eles, é controlado pela “elite financeira mundial, ator não estatal constituído por megainvestidores, bancos, conglomerados transnacionais e outros representantes do ultracapitalismo”.

O artigo publica que supostamente em 2035 será “visível a união de esforços entre determinadas entidades nacionais e o movimento globalista, inclusive com o apoio de relevantes atores internacionais, visando a interferir nas decisões de governantes e legisladores, especialmente em pautas destinadas a conceder benesses a determinadas minorias, em detrimento da maioria da população, a exercer ingerência em nosso desenvolvimento econômico, usando pautas ambientalistas a reboque de seus interesses e não pela necessária preservação da natureza, e a provocar crises que enfraquecem a Nação em sua busca pelo desenvolvimento.”

FIM DA GRATUIDADE DO SUS E EDUCAÇÃO

Contraditoriamente, após criticar o “ultracapitalismo”, o documento defende que a classe média pague pelo atendimento no SUS a partir de 2025. O projeto sistematiza pontualmente como isso deve ser feito:

“Além disso, a partir de 2025, o Poder Público passa a cobrar indenizações pelos serviços prestados, exclusivamente das pessoas cuja renda familiar fosse maior do que três salários mínimos.”

No campo da educação, além de também querer cobrar as mensalidades de acesso às universidades públicas – em mais uma medida de atuação neoliberal -, prega por “currículos desideologizados”, “reforçando valores morais, éticos e cívicos”.

“Não se trata de uma vã tentativa de adivinhar o futuro — até porque isso é impossível – mas sim de um exercício baseado em métodos consagrados para: alargar os mapas mentais; visualizar as principais tendências e suas possíveis rupturas; identificar ameaças e oportunidades; e propor medidas para a construção do melhor futuro possível. (…) Bem-vindo ao futuro e boa leitura!”, traz o documento.

Polícia Rodoviária Federal atuou em pelo menos três chacinas no governo Bolsonaro

 


Equipe do Núcleo de Operações Especiais (NOE) da Polícia Rodoviária Federal do Rio de Janeiro – Reprodução/Instagram – @noe.rj.prf

do Brasil de Fato

Polícia Rodoviária Federal atuou em pelo menos três chacinas no governo Bolsonaro


Paulo Motoryn – Brasil de Fato | Brasília (DF)

chacina na Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro, e a morte de um homem dentro de uma viatura transformada em câmara de gás, no litoral de Sergipe, marcaram a semana. Os dois casos chamaram a atenção pelo protagonismo de agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

Não é a primeira vez que a corporação está envolvida em operações que terminam com um elevado número de mortes. Desde o início do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), a PRF atuou em parceria com polícias militares em pelo menos três chacinas.

Além da parceria desta semana na ação com o Batalhão de Operações Especiais (Bope), deflagrada na VIla Cruzeiro – que já chegou a 25 mortes confirmadas –, agentes da PRF estiveram ao lado da Polícia Militar do Rio de Janeiro, em fevereiro deste ano, na mesma região.

A operação deixou pelo menos oito mortos, no complexo da Penha. Na ocasião, a PM afirmou que os agentes estavam cumprindo mandados de prisão contra uma quadrilha de roubo de cargas. A operação visava prender Adriano Souza Freitas, conhecido como Chico Bento, suposto chefe do Comando Vermelho.

Em outubro do ano passado, pelo menos 25 pessoas foram mortas em uma ação conjunta da PRF com a PM de Minas Gerais, em Varginha, no sul do estado. De acordo com a PRF, a ação combatia o chamado “novo cangaço”. Em nota, a corporação disse que os bandidos teriam atacado os policiais.

A ação ocorreu em duas chácaras. Segundo a PRF, no primeiro confronto, 18 criminosos foram mortos. Nesta ação, 10 fuzis foram recuperados, além de outras armas, munições, granadas e coletes a prova de balas.

Outra parte da quadrilha estava numa segunda chácara. Em novo confronto, mais sete criminosos foram mortos e mais armas recuperadas e grande quantidade de explosivos. Também foram encontrados 10 veículos roubados. Nenhum policial ficou ferido.

Em entrevista ao Brasil de Fato, a cientista política, antropóloga e especialista em Segurança Pública Jacqueline Muniz, professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), afirma que, no país, não há limites claros sobre onde começa e termina a competência de cada força de segurança.

“Quando há uma pergunta sobre a competência, não é só a Polícia Rodoviária Federal. Nenhuma organização de força, e são mais de 10 mil no Brasil, passa nesse teste”.

Muniz alerta que, apesar do nome, a atuação da PRF não se restringe às estradas. O próprio site da instituição destaca que “a PRF tem sob sua responsabilidade a segurança viária e a prevenção e repressão qualificada ao crime em mais de 75 mil quilômetros de rodovias e estradas federais em todos os estados brasileiros e nas áreas de interesse da União”.

“Quando você não tem definição de competências partilhadas, exclusivas e redundantes [entre as polícias], você não tem como definir missão, não tem como definir padrão tático de atuação, não tem como validar logística ou armamento usado por qualquer polícia, e muito menos procedimentos. Vira  uma ‘bateção de cabeça'”, aponta a pesquisadora.

Em todos os casos, houve participação do Núcleo de Operações Especiais (NOE), grupos de elite da corporação, sediado em cada unidade regional ou superintendência da PRF.

O NOE tem o objetivo de “planejar, coordenar e executar operações de enfrentamento aos crimes de roubo e furto de veículos e cargas, tráfico de substâncias entorpecentes e de armas, munições e produtos controlados, contrabando, descaminho, falsificação de produtos, adulteração de combustíveis”.


Núcleo de Operações Especiais da PRF no Rio de Janeiro em operação com o Bope / Divulgação/Instagram

Laços com o Bope e “agrados” do presidente

O diretor-geral da PRF, Silvinei Vasques, tem apostado no aprofundamento dos laços com esquadrões de elite de polícias militares. Pouco mais de três meses antes da operação desta semana, ele esteve reunido com o comandante do Bope, no Rio de Janeiro.

Em publicação em sua conta no Instagram, Vasques anunciou uma parceria com o batalhão, conhecido pela letalidade das operações: “Criamos um grupo de trabalho para ações operacionais, de inteligência, de ensino e projetos estratégicos entre a @prfoficial e o @bope.oficial”.

“Estive reunido com o Comandante e seus oficiais do Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Diretores e gestores da PRF da área de Operações e Ensino estiveram presentes”, escreveu.


Diretor-geral da PRF, Silvinei Vasques (o terceiro, da esquerda para a direita), em encontro realizado no Bope da PM-RJ / Reprodução/Instagram

Nesta semana, o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto autorizando o início do Curso de Formação Profissional para 625 excedentes do último concurso PRF. O anúncio foi feito em vídeo divulgado nas redes sociais, em que Jair Bolsonaro aparece ao lado do ministro da Justiça, Anderson Torres.

Segundo eles, a intenção é convocar todos os candidatos aprovados no último concurso da Polícia Rodoviária Federal. De acordo com o presidente, pode ser que a Polícia Rodoviária Federal tenha, com as novas convocações que virão, “o maior efetivo da sua história”.

Na semana passada, uma reportagem do jornal O Estado de S. Paulo apontou que o presidente recuou da ideia de conceder um reajuste maior para todas as carreiras de segurança pública. A ideia seria garantir a reestruturação da carreira apenas para a PRF.

O aumento aos agentes rodoviários é estimado em cerca de 20%. As outras polícias, como a PF, teriam o aumento de 5%, como já decidido em abril, da mesma forma que será para as demais categorias de servidores públicos.

Outra sinalização à PRF foi a escolha do ex-diretor geral da corporaçnao Eduardo Aggio para cargo no Palácio do Planalto, como sub-chefe de Análise Governamental (SAG) da Casa Civil da Presidência da República.

Nas redes sociais, Aggio e Vasques exibem proximidade com a família presidencial. Atual chefe da corporação, Vasques publicou recentemente uma foto ao lado do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), vestido com o boné da PRF.


Silvinei Vasques e Eduardo Bolsonaro: corporação se aproximou do bolsonarismo / Divulgação

Câmara de gás em Sergipe

Os moradores da cidade de Umbaúba, no litoral sul de Sergipe, flagraram uma abordagem policial que resultou em morte, nesta quarta-feira (25). Um homem foi morto depois de ser preso por dois policiais rodoviários federais dentro de uma “câmara de gás” montada no porta-malas da viatura da PRF.

O homem morto pelos policiais rodoviários federais foi identificado como Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos, pelo portal G1. O sobrinho da vítima, Wallyson de Jesus, presenciou a situação e afirmou que o tio tinha um transtorno mental.

“Eles pediram para que ele levantasse as mãos e encontraram no bolso dele cartelas de medicamentos. Meu tio ficou nervoso e perguntou o que tinha feito. Eu pedi que ele se acalmasse e que me ouvisse”, relatou Wallyson.

Nas imagens gravadas pela população, é possível ver Genivaldo ser rendido por dois policiais. Ele está no chão e depois é colocado no porta-malas da viatura.

Enquanto um dos policiais segura a tampa do porta-malas para assegurar que ela continue fechada, o outro joga, dentro do espaço fechado, grande quantidade de gás. Quando o compartimento é aberto de novo, o homem já não se mexe mais.

Holocausto

Durante o Holocausto, câmaras de gás foram projetadas como parte da política nazista de genocídio contra judeus. Os nazistas também tinham como alvo ciganos, homossexuais, deficientes físicos e mentais, intelectuais e do clero. A estratégia foi usada para matar milhões de pessoas entre 1941 e 1945.

Outro lado

Em nota, a PRF afirmou que o homem teria “resistido ativamente” à abordagem. Os agentes, então, teriam utilizado “técnicas de imobilização e instrumentos de menor potencial ofensivo” para conter a agressividade da vítima, que passou mal no caminho para a delegacia, segundo a corporação.

Leia a íntegra da nota da PRF:

“Na data de hoje, 25 de maio de 2022, durante ação policial na BR-101, em Umbaúba-SE, um homem de 38 anos resistiu ativamente a uma abordagem de uma equipe PRF. Em razão da sua agressividade, foram empregados técnicas de imobilização e instrumentos de menor potencial ofensivo para sua contenção e o indivíduo foi conduzido à Delegacia de Polícia Civil em Umbaúba.

Durante o deslocamento, o abordado veio a passar mal e socorrido de imediato ao Hospital José Nailson Moura, onde posteriormente foi atendido e constatado o óbito.

A equipe registrou a ocorrência na Polícia Judiciária, que irá apurar o caso. A Polícia Rodoviária Federal em Sergipe lamenta o ocorrido e informa que foi aberto procedimento disciplinar para averiguar a conduta dos policiais envolvidos”.

*Com a colaboração de Felipe Mendes

Edição: Rodrigo Durão Coelho e Felipe Mendes

quinta-feira, 26 de maio de 2022

O autoritarismo e arrogância dos militares de extrema direita e o Xadrez do Projeto de Nação do Partido Militar, por Luis Nassif em artigo de Luis Nassif

 

Plano deflagra movimento cujo próximo passo será a aproximação de lideranças civis reacionárias, se apresentando como representantes políticos
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Ministro da Justiça do Michel Temer, Raul Jungmann abriu as portas e convidou os militares a entrarem na sala do poder civil. O general Villas Boas Corrêa, chefe do Estado Maior do Exército, gostou e convocou todos os presidenciáveis para prestar contas sobre seus planos. E eles foram. Finalmente, fechou o acordo Braga Netto-Bolsonaro e assumiu fatia do poder. E só aí se deu conta de que tinha o poder, mas não tinha o plano. E aí chamou o Instituto Sagres e encomendou o Projeto de Nação.

O Sagres é um Instituto que tem, no seu site, uma relação de projeto com inúmeros entes públicos, mas todos até 2012, o que permite acreditar que estava desativado, De qualquer modo, reativou-se, montou a parceria com o Instituto Villas Boas e o Instituto Federalista e publicou o Projeto de Nação – o Brasil em 2035.

O Projeto de Nação permite inúmeras leituras.

Peça 1 – continuidade de 2022 a 2035 

O Projeto de Nação recorre a uma esperteza. Desenha um país imaginário construído a partir de 2022 e outro em 2035, consequência do que foi plantado antes. O que permite concluir que, ao menos na imaginação dos autores do planos – e dos três Institutos – há uma continuidade entre 2022 e 2035.

Como seria? Em vários pontos, os autores criticam os radicais de esquerda e de direita, colocando-se como se fosse uma terceira via armada. Bolsonaro é radical de direita; Lula é visto pelos militares como radical de esquerda. Quem seria a alternativa? Certamente não seria pela via eleitoral. Mas, se fosse, há uma incômoda coincidência com os pontos de vista do candidato Ciro Gomes, como se verá mais adiante.

Peça 2 – o modelo chinês, de liberalismo com centralismo

O Projeto de Nação segue o modelo chinês. Defende liberdade para a livre iniciativa, redução do peso do Estado, um liberalismo social (falso como uma nota de três). E, por sobre tudo isso, uma superestrutura, chamada de Centro de Governo (CdG), incumbida de garantir que todos os Ministérios e setores do país sigam os princípios preconizados no projeto nacional. É o mesmo papel desempenhado pelo Partido Comunista e pelo Exército na China.

“Essa flexibilidade proporciona ao Centro de Governo ferramentas para vencer uma série de obstáculos, no sentido de orientar, coordenar e garantir a convergência de estratégias e ações estratégicas, ao tempo em que permite a aplicação de técnicas, ferramentas e práticas flexíveis e adequadas às diferentes realidades existentes entre instituições e nas unidades da federação. O CdG foi um dos fatores que possibilitou ao Brasil ingressar na OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), em meados da década de 2020”. 

Peça 3 – o antiglobalismo

Um dos pontos centrais é a defesa da autonomia diplomática, sem se ligar a nenhuma das duas superpotências. E a resistência ao “globalismo”, dominado pelo grande capital, e controlando a mídia e o poder judiciário.. 

“Falta de autonomia política, econômica, militar, científico-tecnológica, diplomática e cultural, diante do poder econômico e financeiro da Elite Globalista, que amplia sua capacidade de influência mundial. Domínio da mídia internacional e cooptação de grande parte da mídia nacional, inclusive ONGs e centros de estudos estratégicos (Comissão Trilateral, Diálogo Interamericano, CFR – Council on Foreign Relations e outros) ligados ao Movimento e às bandeiras globalistas, seja por idealismo ingênuo, seja por outros interesses. Deficiente espírito cívico e patriótico da Nação, tendente a enfraquecer a coesão social, o que fragiliza o Brasil no enfrentamento desse desafio e de outros da agenda global”.

Nem se imagine que a crítica se concentre na financeirização da economia, na concentração de renda e em outros vícios do modelo. A crítica é contra as regras ambientais e a preservação da Amazônia.

Um dos braços do globalismo seria a Justiça e o Ministério Público:

“O globalismo tem outra face, mais sofisticada, que pode ser caracterizada como “o ativismo judicial político-partidário”, onde parcela do Judiciário, do Ministério Público eda Defensoria Pública atuam sob um prisma exclusivamente ideológico, reinterpretando e agredindo o arcabouço legal vigente, a começar pela Constituição brasileira.”

Peça 4 – a guerra ideológica.

Como não poderia deixar de ser, a guerra ideológica ocupa lugar de destaque no Projeto de Nação, tendo como alvos principais a educação – a básica e a superior. Serão os alvos preferenciais do Centro de Governo.

 “Ideologização nociva dos sistemas de ensino e de cultura, com os escalões superiores dominados por lideranças ideológicas, radicais e sectárias, não democráticas, o que colabora para a polarização da Nação, enfraquecendo sua capacidade de enfrentar o jogo do poder mundial.”

“Essa flexibilidade proporciona ao Centro de Governo ferramentas para vencer uma série de obstáculos, no sentido de orientar, coordenar e garantir a convergência de estratégias e ações estratégicas, ao tempo em que permite a aplicação de técnicas, ferramentas e práticas flexíveis e adequadas às diferentes realidades existentes entre instituições e nas unidades da federação. O CdG foi um dos fatores que possibilitou ao Brasil ingressar na OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), em meados da década de 2020. ” 

Peça 5 – o ultraliberalismo

Como retórica, o Projeto de Nação fala em liberalismo social. Na prática, propõe o fim do acesso gratuito ao SUS (Sistema Único de Saúde) e à Universidade pública.

“Um marco importante para a melhoria de desempenho das universidades públicas, mas que sofreu forte resistência para vingar, foi a decisão de cobrar mensalidades/anuidades, segundo critérios que levaram em conta a renda pessoal do aluno e ou de seu responsável, o número de alunos sob o mesmo responsável, a concessão de bolsas a alunos de camadas carentes e para os de elevado nível de desempenho. Os avanços foram lentos, mas com ótimo resultado, gerando reflexos positivos nos cômputos das avaliações do SINAES (Instituições, Curso, Desempenho dos Alunos) e, em consequência, uma pequena melhora no posicionamento das IES brasileiras nos rankings mundiais de qualidade.”

O ultraliberalismo, aliás, segue os princípios da ultra direita mundial, contra toda forma de regulação, especialmente em relação ao meio ambiente e aos direitos indígenas.

“Implantar o Zoneamento Econômico e Ecológico (ZEE) Regional e remover as restrições da legislação indígena e ambiental, que se conclua serem radicais, nas áreas atrativas do agronegócio e da mineração.”

Peça 6 – o Partido Militar

O Partido Militar está atrás do Projeto de Nação. Na quinta-feira passada, três institutos com fortes vínculos militares – Instituto General Villas Bôas, Instituto Sagres e Instituto Federalista –  lançaram o “Projeto Nação”. Foi um evento de exaltação, ao som da “Aquarela do Brasil” e de “Eu te amo meu Brasil”, executados pelo coral do Colégio Militar de Brasília. Principalmente, com a presença do vice-presidente, general Hamilton Mourão, e do ex-comandante do Exército, general Villas Boas. 

A apresentação foi do general Rocha Paiva e houve até o gesto simbólico de uma família negra subindo ao palco, para receber o livreto em nome do povo brasileiro.


Instituto Sagres foi fundado por oficiais da reserva das Forças Armadas, “dedicado ao estudo e pesquisa na área de estratégia e consultoria”. Na página de projetos, há uma infinidade, mas todos eles até 2012, mostrando uma paralisação do Instituto, pelo menos até a eleição de Bolsonaro..

Entre seus membros está o  general Luiz Eduardo Rocha Paiva, que recentemente defendeu a ruptura institucional, depois da “nefasta decisão do Ministro Fachin, livrando Lula de suas condenações (…) uma bofetada na cara (desculpem a expressão) da Nação Brasileira”.

presidente do Instituto é Raul José de Abreu Sturari, que previu uma guerra comandada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra a liberdade de expressão.

”Por tudo isso, tenho absoluta convicção que os militares de hoje não se prestarão ao papel de virtuais “capitães do mato” do ciberespaço e saberão, com maestria, separar criminosos de pessoas que querem somente exercer o direito constitucional e basilar da democracia: a liberdade de expressão”.

Peça 7 – as alianças civis

O papel que os militares se outorgam é de serem os supervisores dos grandes valores morais da nacionalidade. Abrem espaço, portanto, para alianças civis. Um dos principais aliados é o ex-Ministro da Defesa Aldo Rebelo, que se tornou um aliado incondicional não apenas dos militares como do agronegócio. Nos últimos anos, Rebello organizou grupos de discussão com militares da reserva e pensadores conservadores. Enquanto Ministro da Defesa de Dilma, ocultou o PT o início das investidas militares sobre o poder civil.

Outro nome a se prestar atenção é Ciro Gomes. Há indícios de que seu próximo movimento será em direção a valores contidos no Projeto de Nação. Há uma série de passos nessa direção:

  • a defesa de Aldo Rebelo, durante debate com Gregório Duvivier.
  • a defesa que fez recentemente dos valores tradicionais, ao criticar a postura de Lula em defesa do aborto. Como se recorda, o Projeto de Nação defende o “conservadorismo evolucionista”, seja lá isso o que for.
  • a defesa enfática da exploração mineral da Amazônia.
  • o modelo de gestão autocrático, com diagnósticos técnicos, mas sem povo, sem movimentos sociais e sem partidos políticos.

O Projeto de Nação deflagra um movimento cujo passo seguinte será a aproximação de lideranças civis, as vivandeiras dos quartéis se apresentando como seus representantes na política.

Aqui, uma das webinar do Instituto General Villas Boas.


Moro ter sido considerado "herói" mostra claramente a decadência da classe média e das elites brasileiras

 

Do Cortes 247:

Paulo Nogueira Batista Jr. é economista. Foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento do BRICS e diretor executivo no FMI pelo Brasil.



terça-feira, 24 de maio de 2022

Do Portal do José: Dória fora da corrida. Quem ganha? Bolsonaro: corrupção e traição a pátria! Eletrobrás não terminou!

 

Do Portal do José:




Conspirata militar de extrema direita de generais bolsonaristas para se manter no poder até 2035 no autoritário e fascistóide "Projeto Nação" contra o SUS, as Universidades, os Professores, os movimentos sociais e o pensamento crítico em vídeo debate de Luis Nassif com o Professor João ROberto Martins Filho

 

No programa, Luis Nassif recebe João Roberto Martins Filho. Ele é criador e coordenador do Arquivo de Política Militar Ana Lagôa e foi o primeiro presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa. Além disso, é Doutor em Ciências Sociais. Atualmente, é professor de Ciência Política na Universidade Federal de São Carlos.

Da TV GGN:



Os últimos dias foram muito agitados na política, mesmo durante final de semana. No domingo, o jornal Estadão trouxe fortes suspeitas de corrupção do Governo Bolsonaro na compra de caminhões de lixo, com distribuição de modelos inadequados e até preços possivelmente superfaturados. Tudo isso em coluio com o Congresso Nacional, através do Orçamento Secreto. Já nesta segunda-feira, a imprensa noticiou o planejamento estabelecido pelos militares para os próximos 13 anos do Brasil. Os Institutos Villas Bôas, Sagres e Federalistas promoveram evento, no último dia 19, que contou com a presença do vice-presidente Hamilton Mourão. O objetivo do encontro foi apresentar o "Projeto de Nação, O Brasil em 2035". No documento de 93 páginas, as Forças Armadas mostram uma proposta muito parecida às medidas adotadas pela China, nos últimos anos. Ainda hoje, outro fato mexeu com os bastidores de Brasília: João Doria desistiu de sua candidatura à presidência. Apesar dos interesses particulares do empresário, os partidos da Terceira Via (MDB, PSDB e Cidadania) decidiram lançar uma chapa única, o que fez com que líderes tucanos barrassem o nome de Doria. Simone Tebet é nome certo, com o vice ainda indefinido. Tudo isso será discutido no TVGGN 20H de hoje. No programa, Luis Nassif e o colega Marcelo Auler recebem João Roberto Martins Filho. Ele é criador e coordenador do Arquivo de Política Militar Ana Lagôa e foi o primeiro presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa. Além disso, é Doutor em Ciências Sociais. Atualmente, é professor de Ciência Política na Universidade Federal de São Carlos.

Conpirata de generais bolsonaristas, tolerentes com as milícias e admiradores de Ustra, planejam se manter no poder até 2035 atacando professores, universidades, ambientalistas, o SUS e movimentos sociais

 

Do Canal Plantão Brasil, de Thiago dos Reis:




Reinaldo Azevedo: Com Bolsonaro e seus comparsas conspiradores, a todos dias temos uma baixaria

 

Da BandNews FM:




terça-feira, 17 de maio de 2022

A atualidade brutal de Hannah Arendt, por Ladislau Dowbor

 

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A atualidade brutal de Hannah Arendt

Por Ladislau Dowbor, no Justificando (publicado em 05 de outubro de 2015).
O filme causa impacto. Trata-se, tema central do pensamento de Hannah Arendt, de refletir sobre a natureza do mal. O pano de fundo é o nazismo, e o julgamento de um dos grandes mal-feitores da época, Adolf Eichmann. Hannah acompanhou o julgamento para o jornal New Yorker, esperando ver o monstro, a besta assassina. O que viu, e só ela viu, foi a banalidade do mal. Viu um burocrata preocupado em cumprir as ordens, para quem as ordens substituíam a reflexão, qualquer pensamento que não fosse o de bem cumprir as ordens. Pensamento técnico, descasado da ética, banalidade que tanto facilita a vida, a facilidade de cumprir ordens. A análise do julgamento, publicada pelo New Yorker, causou escândalo, em particular entre a comunidade judaica, como se ela estivesse absolvendo o réu, desculpando a monstruosidade.
A banalidade do mal, no entanto, é central. O meu pai foi torturado durante a II Guerra Mundial, no sul da França. Não era judeu. Aliás, de tanto falar em judeus no Holocausto, tragédia cuja dimensão trágica ninguém vai negar, esquece-se que esta guerra vitimou 60 milhões de pessoas, entre os quais 6 milhões de judeus. A perseguição atingiu as esquerdas em geral, sindicalistas ou ativistas de qualquer nacionalidade, além de ciganos, homossexuais e tudo que cheirasse a algo diferente. O fato é que a questão da tortura, da violência extrema contra outro ser humano, me marcou desde a infância, sem saber que eu mesmo a viria a sofrer. Eram monstros os que torturaram o meu pai? Poderia até haver um torturador particularmente pervertido, tirando prazer do sofrimento, mas no geral, eram homens como os outros, colocados em condições de violência generalizada, de banalização do sofrimento, dentro de um processo que abriu espaço para o pior que há em muitos de nós.
Por que é tão importante isto, e por que a mensagem do filme é autêntica e importante? Porque a monstruosidade não está na pessoa, está no sistema. Há sistemas que banalizam o mal. O que implica que as soluções realmente significativas, as que nos protegem do totalitarismo, do direito de um grupo no poder dispor da vida e do sofrimento dos outros, estão na construção de processos legais, de instituições e de uma cultura democrática que nos permita viver em paz. O perigo e o mal maior não estão na existência de doentes mentais que gozam com o sofrimento de outros – por exemplo uns skinheads que queimam um pobre que dorme na rua, gratuitamente, pela diversão – mas na violência sistemática que é exercida por pessoas banais.
Entre os que me interrogaram no DOPS de São Paulo encontrei um delegado que tinha estudado no Colégio Loyola de Belo Horizonte, onde eu tinha estudado nos anos 1950. Colégio de orientação jesuíta, onde se ensinava a nos amar uns aos outros. Encontrei um homem normal, que me explicava que arrancando mais informações seria promovido, me explicou os graus de promoções possíveis na época. Aparentemente queria progredir na vida. Outro que conheci, violento ex-jagunço do Nordeste, claramente considerava a tortura como coisa banal, coisa com a qual seguramente conviveu nas fazendas desde a sua infância. Monstros? Praticaram coisas monstruosas, mas o monstruoso mesmo era a naturalidade com a qual a violência se pratica.
Um torturador na OBAN me passou uma grande pasta A-Z onde estavam cópias dos depoimentos dos meus companheiros que tinham sido torturados antes. O pedido foi simples: por não querer se dar a demasiado trabalho, pediu que eu visse os depoimentos dos outros, e fizesse o meu confirmando a verdades, bobagens ou mentiras que estavam lá escritas. Explicou que eu escrevendo um depoimento que repetia o que já sabiam, deixaria satisfeitos os coronéis que ficavam lendo depoimentos no andar de cima (os coronéis evitavam sujar as mãos), pois veriam que tudo se confirmava, ainda que fossem histórias absurdas. Segundo ele, se houvesse discrepâncias, teriam de chamar os presos que já estavam no Tiradentes, voltar a interrogá-los, até que tudo batesse. Queria economizar trabalho. Não era alemão. Burocracia do sistema. Nos campos de concentração, era a IBM que fazia a gestão da triagem e classificação dos presos, na época com máquinas de cartões perfurados. No documentário A Corporação, a IBM esclarece que apenas prestava assistência técnica.
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Banalidade do mal: Panfleto atirado em frente ao velório do ex-senador José Eduardo Dutra, em Belo Horizonte, pede a morte de petistas 
O mal não está nos torturadores, e sim nos homens de mãos limpas que geram um sistema que permite que homens banais façam coisas como a tortura, numa pirâmide que vai desde o homem que suja as mãos com sangue até um Rumsfeld que dirige uma nota aos exército americano no Iraque, exigindo que os interrogatórios sejam harsher,ou seja, mais violentos. Hannah Arendt não estava desculpando torturadores, estava apontando a dimensão real do problema, muito mais grave.
A compreensão da dimensão sistêmica das deformações não tem nada a ver com passar a mão na cabeça dos criminosos que aceitaram fazer ou ordenar monstruosidades. Hannah Arendt aprovou plenamente e declaradamente o posterior enforcamento de Eichmann. Eu estou convencido de que os que ordenaram, organizaram, administraram e praticaram a tortura devem ser julgados e condenados.
O segundo argumento poderoso que surge no filme, vem das reações histéricas de judeus pelo fato de ela não considerar Eichmann um monstro. Aqui, a coisa é tão grave quanto a primeira. Ela estava privando as massas do imenso prazer compensador do ódio acumulado, da imensa catarse de ver o culpado enforcado. As pessoas tinham, e têm hoje, direito a este ódio. Não se trata aqui de deslegitimar a reação ao sofrimento imposto. Mas o fato é que ao tirar do algoz a característica de monstro, Hannah estava-se tirando o gosto do ódio, perturbando a dimensão de equilíbrio e de contrapeso que o ódio representa para quem sofreu. O sentimento é compreensível, mas perigoso. Inclusive, amplamente utilizado na política, com os piores resultados. O ódio, conforme os objetivos, pode representar um campo fértil para quem quer manipulá-lo.
Quando exilado na Argélia, durante a ditadura militar, conheci Ali Zamoum, um dos importantes combatentes pela independência do país. Torturado, condenado à morte pelos franceses, foi salvo pela independência. Amigos da segurança do novo regime localizaram um torturador seu, numa fazendo do interior. Levaram Ali até a fazenda, onde encontrou um idiota banal, apavorado num canto. Que iria ele fazer? Torturar um torturador? Largou ele ali para ser trancado e julgado. Decepção geral. Perguntei um dia ao Ali como enfrentavam os distúrbios mentais das vítimas de tortura. Na opinião dele, os que se equilibravam melhor, eram os que, depois da independência, continuaram a luta, já não contra os franceses mas pela reconstrução do país, pois a continuidade da luta não apagava, mas dava sentido e razão ao que tinham sofrido.
No 1984 do Orwell, os funcionários eram regularmente reunidos para uma sessão de ódio coletivo. Aparecia na tela a figura do homem a odiar, e todos se sentiam fisicamente transportados e transtornados pela figura do Goldstein. Catarse geral. E odiar coletivamente pega. Seremos cegos se não vermos o uso hoje dos mesmos procedimentos, em espetáculos midiáticos.
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Manifestantes protestam durante velório de ex-presidente do PT, em total desrespeito aos amigos e parentes
O texto de Hannah, apontando um mal pior, que são os sistemas que geram atividades monstruosas a partir de homens banais, simplesmente não foi entendido. Que homens cultos e inteligentes não consigam entender o argumento é em si muito significativo, e socialmente poderoso. Como diz Jonathan Haidt, para justificar atitudes irracionais, inventam-se argumentos racionais, ou racionalizadores. No caso, Hannah seria contra os judeus, teria traído o seu povo, tinha namorado um professor que se tornou nazista. Os argumentos não faltaram, conquanto o ódio fosse preservado, e com o ódio o sentimento agradável da sua legitimidade.
Este ponto precisa ser reforçado. Em vez de detestar e combater o sistema, o que exige uma compreensão racional, é emocionalmente muito mais satisfatório equilibrar a fragilização emocional que resulta do sofrimento, concentrando toda a carga emocional no ódio personalizado. E nas reações histéricas e na deformação flagrante, por parte de gente inteligente, do que Hannah escreveu, encontramos a busca do equilíbrio emocional. Não mexam no nosso ódio. Os grandes grupos econômicos que abriram caminho para Hitler, como a Krupp, ou empresas que fizeram a automação da gestão dos campos de concentração, como a IBM, agradecem.
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“Qualquer momento é momento de mandar um bandido embora. Até no enterro da minha mãe eu faria isso”, disse o aposentado de 60 anos com o cartaz na mão
O filme é um espelho que nos obriga a ver o presente pelo prisma do passado. Os americanos se sentem plenamente justificados em manter um amplo sistema de tortura – sempre fora do território americano pois geraria certos incômodos jurídicos -, Israel criou através do Mossad o centro mais sofisticado de tortura da atualidade, estão sendo pesquisados instrumentos eletrônicos de tortura que superam em dor infligida tudo o que se inventou até agora, o NSA criou um sistema de penetração em todos os computadores, mensagens pessoais e conteúdo de comunicações telefônicas do planeta. Jovens americanos no Iraque filmaram a tortura que praticavam nos seus celulares em Abu Ghraib, são jovens, moças e rapazes, saudáveis, bem formados nas escolas, que até acham divertido o que fazem. Nas entrevistas posteriores, a bem da verdade, numerosos foram os jovens que denunciaram a barbárie, ou até que se recusaram a praticá-la. Mas foram minoria.
O terceiro argumento do filme, e central na visão de Hannah, é a desumanização do objeto de violência. Torturar um semelhante choca os valores herdados, ou aprendidos. Portanto, é essencial que não se trate mais de um semelhante, pessoa que pensa, chora, ama, sofre. É um judeu, um comunista, ou ainda, no jargão moderno da polícia, um “elemento”. Na visão da KuKluxKlan, um negro. No plano internacional de hoje, o terrorista. Nos programas de televisão, um marginal. Até nos divertimos, vendo as perseguições. São seres humanos? O essencial, é que deixe de ser um ser humano, um indivíduo, uma pessoa, e se torne uma categoria. Sufocaram 111 presos nas celas? Ora, era preciso restabelecer a ordem.
Um belíssimo documentário, aliás, Repare Bem, que ganhou o prêmio internacional no festival de Gramado, e relata o que viveu Denise Crispim na ditadura, traz com toda força o paralelo entre o passado relatado no Hannah Arendt e o nosso cenário brasileiro. Outras escalas, outras realidades, mas a mesma persistente tragédia da violência e da covardia legalizadas e banalizadas.
Sebastian Haffner, estudante de direito na Alemanha em 1930, escreveu na época um livro – Defying Hitler: a memoir – manuscrito abandonado, resgatado recentemente por seu filho que o publicou com este título.3 O livro mostra como um estudante de família simples vai aderindo ao partido nazista, simplesmente por influência dos amigos, da mídia, do contexto, repetindo com as massas as mensagens. Na resenha do livro que fiz em 2002, escrevi que o que deve assustar no totalitarismo, no fanatismo ideológico, não é o torturador doentio, é como pessoas normais são puxadas para dentro de uma dinâmica social patológica, vendo-a como um caminho normal. Na Alemanha da época, 50% dos médicos aderiram ao partido nazista.
O próximo fanatismo político não usará bigode nem bota, nem gritará Heil como os idiotas dos “skinheads”. Usará terno, gravata e multimídia. E seguramente procurará impor o totalitarismo, mas em nome da democracia, ou até dos direitos humanos.
Ladislau Dowbor é professor de economia nas pós-graduações em economia e em administração da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), e consultor de várias agências das Nações Unidas. Seus artigos estão disponíveis online em http://dowbor.org.