sábado, 28 de fevereiro de 2015

"Ás agressões humanas, a Terra responde com flores", texto de Leonardo Boff



Ás agressões humanas, a Terra responde com flores


Texto de Leonardo Boff
   Mais que no âmago de uma crise de proporções planetárias, nos confrontamos hoje com um processo de irreversibilidade. A Terra nunca mais será a mesma. Ela foi transformada em sua base fisico-quimica-ecológica de forma tão profunda que acabou perdendo seu equilíbrio interno. Entrou num processo de caos, vale dizer, perdeu sua sustentabilidade e afetou a continuação do que, por milênios, vinha fazendo: produzindo e reproduzindo vida.

 Todo caos possui dois lados: um destrutivo e outro criativo. O destrutivo representa a desmontagem de um tipo de equilíbro que implica a erosão de parte da biodiversidade e, no limite, a diminuição da espécie humana. Esta resulta ou por incapacidade de se adaptar à nova situação ou por não conseguir mitigar os efeitos letais. Concluído esse processo de purificação, o caos começa mostrar sua face generativa. Cria novas ordens, equilibra os climas e permite os seres humanos sobreviventes construírem outro tipo de civilização.
   Da história da Terra aprendemos que ela passou por cerca de quinze grandes dizimações, como a do cambriano há 480 milhões de anos, que dizimou 80-90% das espécies. Mas por ser mãe generosa, lentamente, refez a diversidade da vida. 

  Hoje, a comunidade científica, em sua grande maioria, nos alerta face a um eventual colapso do sistema-vida, ameaçando o próprio futuro da espécie humana. Todos podem perceber as mudanças que estão ocorrendo diante de nossos olhos. Grandes efeitos extremos: por um lado estiagens prolongadas associadas à grande escassez de água, afetando os ecossistemas e a sociedade como um todo, como está ocorrendo no sudeste de nosso país. Em outros lugares do planeta, como nos USA, invernos rigorosos como não se viam há decênios ou até centenas de anos.

   O fato é que tocamos nos limites físicos do planeta Terra. Ao forçá-los como o faz a nossa voracidade produtivista e consumista, a Terra responde com tufões, tsunamis, enchentes devastadoras, terremotos e uma incontida subida do aquecimento global. Se chegarmos a um aumento de dois graus Celsius de calor, a situação é ainda administrável. Caso não não fizermos a lição de casa ao diminuirmos drasticamente a emissão de gases de efeito estufa e não reorientarmos nossa relação para com a natureza na direção da auto-contenção coletiva e de respeito aos limites de suportabilidade de cada ecossistema então preve-se que o clima pode se elevar a quatro e até seis graus Celsius. Aí conheceremos a “tribulação da desolação” para usarmos uma expressão bíblica e grande parte das formas de vida que conhecemos não irão subsistir, inclusive porções da humanidade.
  A renomada revista Science de 15 de janeiro de 2015 publicou um trabalho de 18 cientistas sobre os limites planetários (Planetary Bounderies: Guiding human development on a changing Planet). Identificaram nove dimensões fundamentais para a continuidade da vida e de nosso ensaio civilizatório. Vale a pena citá-las: (1) mudanças climáticas; (2) mudança na integridade da biosfera com a erosão da biodiversidadae e a extinção acelerada de espécies;(3) diminuição da camada de ozônio estratosférico que nos protege de raios solares letais;(4) crescente acidificação dos oceanos;(5) desarranjos nos fluxos biogeoquímicos (ciclos de fósforo e de nitrogênio, fundamentais para a vida);(6) mudanças no uso dos solos como o desmatamento e a desertificação crescente;(7) escassez ameaçadora de água doce;(8)concentração de aerossóis na atmosfera(partículas microscópicas que afetam o clima e os seres vivos); (9) introdução agentes químicos sintéticos, de materiais radioativos e nanomateriais que ameaçam a vida.
 Destas nove dimensões, as quatro primeiras já ultrapsssaram seus limites e as demais se encontram em elevado grau de degeneração. Esta sistemática guerra contra Gaia pode levá-la a um colapso como ocorre com as pessoas.  E apesar deste cenário dramático, olho em minha volta e vejo, extasiado, a floresta cheia de quaresmeiras roxas, fedegosos amarelos e no canto de minha casa as “belle donne” floridas, tucanos que pousam em árvores em frente de minha janela e as araras que fazem ninhos debaixo do telhado.

  Então me dou conta de que a Terra é de fato mãe generosa: às nossas agressões ainda nos sorri com flora e fauna. E nos infunde a esperança de que não o apocalipse mas um novo gênesis está a caminho. A Terra vai ainda sobreviver. Como asseguram as Escrituras judeo-cristãs: “Deus é o soberano amante da vida”( Sab 11,26). E acredito que não permitirá que a vida que penosamente superou caos, venha a desaparecer.
Leonardo Boff é colunista do JBonline, filósofo, teólogo e escritor
Fonte do texto: Leonardo Boff Wordpress

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Em um mundo mecanicista, ainda há teimosos corações que pulsam

     


    Adaptando um pensamento de Carl Gustav Jung (como se tanto fosse possível) que afirma que "todos nascemos originais, mas morremos cópias", eu diria que todos nascemos gente, com um coração que pulsa e sensibiliza-se com a vida, e quase todos morremos cópias, por termos sido condicionados a um egoísmo individualista, uma mente condicionada ao banal e um coração que foi substituído por uma mera bomba industrializada, de lata....


Carlos Antonio Fragoso Guimarães


segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Carta aberta de uma funcionária da Petrobrás às manipuladoras Organizações Globo

Extraído do Pragmatismo Político:

Carta aberta de uma funcionária da Petrobras para as Organizações Globo


  Funcionária da Petrobras que foi citada e teve foto publicada em reportagem de O Globo desnuda as diversas mentiras da "jornalista" autora da matéria e revela quais são as verdadeiras intenções das Organizações Globo por trás da cobertura da Lava Jato. "Não é de hoje que a Globo tem objetivo definido em relação à Petrobras: entregar um patrimônio que pertence à população brasileira a interesses privados internacionais"


  A petroleira Michelle Vieira, funcionária da Petrobras, publicou uma carta aberta após ser citada em matéria da repórter Leticia Fernandes intitulada “Petrobras: nova rotina de medo e tensão na estatal” e publicada no jornal O Globo. Uma foto de Michelle foi utilizada para ilustrar a reportagem.

  Michelle destacou que o conteúdo exposto pela repórter é mentiroso e criticou as verdadeiras intenções das Organizações Globo por trás da cobertura da Operação Lava Jato.

Leia a seguir a íntegra da carta de Michelle Daher Vieira

Antes de tudo, gostaria de deixar bem claro que não estou falando em nome da Petrobras, nem em nome dos organizadores do movimento “Sou Petrobras”, nem em nome de ninguém que aparece nas fotos da matéria. Falo, exclusivamente, em meu nome e escrevo esta carta porque apareço em uma das fotos que ilustram a reportagem publicada no jornal O Globo do dia 15 de fevereiro, intitulada “Nova Rotina de Medo e Tensão”.

Fico imaginando como a dita jornalista sabe tão detalhadamente a respeito do nosso cotidiano de trabalho para escrever com tanta propriedade, como se tudo fosse a mais pura verdade, e afirmar com tamanha certeza de que vivemos uma rotina de medo, assombrados por boatos de demissões, que passamos o dia em silêncio na ponta das cadeiras atualizando os e-mails apreensivos a cada clique, que trabalhamos tensos com medo de receber e-mails com represálias, assim criando uma ideia, para quem lê, a respeito de como é o clima no dia a dia de trabalho dentro da Petrobras como se a mesma o estivesse vivendo.

Acho que tanta criatividade só pode ser baseada na própria realidade de trabalho da Letícia, que em sua rotina passa por todas estas experiências de terror e a utiliza para descrever a nossa como se vivêssemos a mesma experiência. Ameaças de demissão assombram o jornal em que ela trabalha, já tendo vários colegas sendo demitidos[1], a rotina de e-mails com represálias e determinando que tipo de informação deve ser publicada ou escondida devem ser rotina em seu trabalho[2], sempre na intenção de desinformar a população e transmitir só o que interessa, mantendo a população refém de informações mentirosas e distorcidas.

Fico impressionada com o conteúdo da matéria e não posso deixar de pensar como a Letícia não tem vergonha de a ter escrito e assinado. Com tantas coisas sérias acontecendo em nosso país ela está preocupada com o andar onde fica localizada a máquina que faz o café que nós tomamos e com a marca do papel higiênico que usamos. Mas dá para entender o porque disto, fica claro para quem lê o seu texto com um mínimo de senso crítico: o conteúdo é o que menos importa, o negócio do jornal é falar mal, é dar uma conotação negativa, denegrir a empresa na sua jornada diária de linchamento público da Petrobras. Não é de hoje que as Organizações Globo tem objetivo muito bem definido[3] em relação à Petrobras: entregar um patrimônio que pertence à população brasileira à interesses privados internacionais. É a este propósito que a Leticia Fernandes serve quando escreve sua matéria.

Leticia, não te vejo, nem você nem O Globo, se escandalizado com outros casos tão ou mais graves quanto o da Petrobras. O único escândalo que me lembro ter ganho as mesma proporção histérica nas páginas deste jornal foi o da AP 470, por que? Por que não revelam as provas escondidas no Inquérito 2474[4] e não foi falado nisto? Por que não leio nas páginas do jornal, onde você trabalha, sobre o escândalo do HSBC[5]? Quem são os protegidos? Por que o silêncio sobre a dívida da sonegação[6] da Globo que é tanto dinheiro, ou mais, do que os partidos “receberam” da corrupção na Petrobras? Por que não é divulgado que as investigações em torno do helicoca[7] foram paralisadas, abafadas e arquivadas, afinal o transporte de quase 500 quilos de cocaína deveria ser um escândalo, não? E o dinheiro usado para construção de certos aeroportos em fazendas privadas em Minas Gerais [8]? Afinal este dinheiro também veio dos cofres públicos e desviados do povo. Já está tudo esclarecido sobre isto? Por que não se fala mais nada? E o caso Alstom[9], por que as delações não valem? Por que não há um estardalhaço em torno deste assunto uma vez que foi surrupiado dos cofres públicos vultosas quantias em dinheiro? Por que você e seu jornal não se escandalizam com a prescrição e impunidade dos envolvidos no caso do Banestado[10] e a participação do famoso doleiro neste caso? Onde estão as manchetes sobre o desgoverno no Estado do Paraná[11]?

Deixo estas perguntas como sugestão e matérias para você escrever já que anda tão sem assunto que precisou dar destaque sobre o cafezinho e o papel higiênico dos funcionários da Petrobras.
A você, Leticia, te escrevo para dizer que tenho muito orgulho de trabalhar na Petrobras, que farei o que estiver ao meu alcance para que uma empresa suja e golpista como a que você trabalha não atinja seu objetivo. Já você não deve ter tanto orgulho de trabalhar onde trabalha, que além de cercear o trabalho de seus jornalistas determinando “as verdades” que devem publicar, apoiou a Ditadura no Brasil[12], cresceu e chegou onde está graças a este apoio. Ao contrário da Petrobras, a empresa que você se esforça para denegrir a imagem, que chegou ao seu gigantismo graças a muito trabalho, pesquisa, desenvolvimento de tecnologia própria e trazendo desenvolvimento para todo o Brasil.

Quanto às demissões que estão ocorrendo, é muito triste que tantas pessoas percam seu trabalho, mas são funcionários de empresas prestadoras de serviço e não da Petrobras. Você não pode culpar a Petrobras por todas as mazelas do país, e nem esperar que ela sustente o Brasil, ou você não sabe que não existe estabilidade no trabalho no mundo dos negócios? Não sabe que todo negócio tem seu risco? Você culpa a Petrobras por tanta gente ter aberto negócios próximos onde haveria empreendimentos da empresa, mas a culpa disto é do mal planejamento de quem investiu. Todo planejamento para se abrir um negócio deveria conter os riscos envolvidos bem detalhados, sendo que o maior deles era não ficar pronta a unidade da Petrobras, que só pode ser culpada de ter planejado mal o seu próprio negócio, não o de terceiros. Imputar à Petrobras o fracasso de terceiros é de uma enorme desonestidade intelectual.

Quando fui posar para a foto, que aparece na reportagem, minha intenção não era apenas defender os empregados da injustiça e hostilidades que vem sofrendo sendo questionados sobre sua honestidade, porque quem faz isto só me dá pena pela demonstração de ignorância. Minha intenção era mostrar que a Petrobras é um patrimônio brasileiro, maior que tudo isto que está acontecendo, que não pode ser destruída por bandidos confessos que posam neste jornal como heróis, por juízes que agem por vaidade e estrelismos apoiados pelo estardalhaço e holofotes que vocês dão a eles, pelo mercado que só quer lucrar com especulação e nunca constrói nada de concreto e por um jornal repulsivo como O Globo que não tem compromisso com a verdade nem com o Brasil.

Por fim, digo que cada vez fica ainda mais evidente a necessidade de uma democratização da mídia, que proporcionará acesso a uma diversidade de informação maior à população que atualmente é refém de uma mídia que não tem respeito com o seu leitor e manipula a notícia em prol de seus interesses, no qual tudo que publica praticamente não é contestado por não haver outros veículos que o possa contradizer devido à concentração que hoje existe. Para não perder um poder deste tamanho vocês urram contra a reforma, que se faz cada vez mais urgente, dizendo ser censura ou contra a liberdade de imprensa, mas não é nada além de aplicar o que já está escrito na Constituição Federal[12], sendo a concentração de poder que algumas famílias, como a Marinho detém, totalmente inconstitucional.

Sendo assim, deixo registrado a minha repugnância em relação à matéria por você escrita, utilizando para ilustrá-la uma foto na qual eu estou presente com uma intenção radicalmente oposta a que ela foi utilizada por você.

Fontes:
[1] Demissões nas Organizações Globo:

http://www.conexaojornalismo.com.br/…/demissoes-do-globo-es…
http://radiodeverdade.com/tag/demissoes-na-radio-globo/
http://www.parana-online.com.br/editor…/almanaque/…/836519/…
http://www.portalimprensa.com.br/…/o+globo+faz+cortes+na+re…
http://blogs.odia.ig.com.br/…/globo-inicia-demissoes-no-jo…/

[2] Exemplos de o que deve e não deve ser publicado
http://www.brasildefato.com.br/node/31315
http://www.pragmatismopolitico.com.br/…/globo-ordena-que-no…
http://www.conversaafiada.com.br/…/globo-censura-reporter-…/

[3] Objetivos
http://www.municipiosbaianos.com.br/noticia01.asp…
http://www.aepet.org.br/…/Prezado-a-companheiro-a-da-Petrob…
http://www.viomundo.com.br/…/sordida-campanha-dos-marinho-c…
https://petroleiroanistiado.wordpress.com/…/petrobras-sob-…/
https://fichacorrida.wordpress.com/…/rede-globo-de-corrupc…/

[4] Inquérito 2474
http://www.cartacapital.com.br/…/em-sigilo-ha-7-anos-inquer…
http://www.ocafezinho.com/…/inquerito-2474-ja-esta-na-inte…/
http://www.istoe.com.br/…/…/345927_ERRO+HISTORICO+NA+AP+470+
http://www.brasil247.com/…/Nassif-STF-vai-abrir-segredo-de-…

[5] Escândalo do HSBC
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-assombroso-silen…/
http://economia.ig.com.br/…/reino-unido-investiga-hsbc-por-…
http://economia.estadao.com.br/…/hsbc-entenda-o-escandalo-…/
http://economia.ig.com.br/…/receita-esta-de-olho-em-corrent…
http://www.brasil247.com/…/Sonega%C3%A7%C3%A3o-no-HSBC-%C3%…

[6] Sonegação Globo
http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/?p=4664
http://www.ocafezinho.com/…/os-documentos-da-fraude-da-glo…/
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/injusto-e-pagar-im…/
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/como-o-processo-de…/

[7] Helicoca
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-dcm-apresenta-no…/
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-papel-cada-vez-m…/
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/categorias/helicoca/

[8] Aeroportos Mineiros
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/por-que-a-midia-na…/
http://www1.folha.uol.com.br/…/1493571-aecio-neves-a-verdad…
http://www1.folha.uol.com.br/…/1488587-governo-de-minas-fez…
http://www.pragmatismopolitico.com.br/…/trafico-de-cocaina-…
http://www.plantaobrasil.com.br/news.asp?nID=82339
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/aecio-nomeou-desem…/

[9] Alstom
http://www1.folha.uol.com.br/…/1281123-brasil-e-unico-que-n…
http://tijolaco.com.br/blog/?p=24684

[10] Banestado
http://www.redebrasilatual.com.br/…/o-caso-banestado-a-petr…
http://www1.folha.uol.com.br/…/1267100-justica-anula-punica…
http://ultimosegundo.ig.com.br/…/lentidao-da-justica-livrou…

[11] Beto Richa e o Paraná
http://www.pragmatismopolitico.com.br/…/beto-richa-quebrou-…
http://www.redebrasilatual.com.br/…/curitiba-a-pauta-da-reb…

[12] Globo e a Ditadura
http://www.pragmatismopolitico.com.br/…/editorial-globo-cel…
http://www.brasildefato.com.br/node/25869
http://altamiroborges.blogspot.com.br/…/as-diretas-ja-e-o-c…
http://www.viomundo.com.br/…/faz-30-anos-bom-jornalismo-da-…
http://www.viomundo.com.br/…/fabio-venturini-no-golpe-dos-e…
http://www.viomundo.com.br/…/exclusivo-as-entrevistas-feroz…
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/abrir-empresa-em-p…/


domingo, 22 de fevereiro de 2015

Bob Fernandes: A Guerra midiática das narrativas contra o uso da razão crítica da população




Segue vídeo (seguido de sua transcrição textual) de Bob Fernandes, da TV Gazeta, sobre a fomração, manipulação e uso das informações pela grande mídia empresarial:



 A Guerra da Narrativa: Corrupção ou Cartel? Falta d'água ou crise hídrica?

 A Política é teatro. O cidadão, o povo, contracena. De vez em quando, raramente, se torna ator principal.

Por isso é tão feroz a disputa pela hegemonia da narrativa. A palavra, que liberta ou aprisiona as ideias, é condutora primordial da narrativa.

No Brasil, cada vez mais na Política, as narrativas buscam emparedar, castrar novas ideias, soluções e caminhos.

.Muitos dizem "petista", ou derivados, como quem vomita. E na busca de intimidar quem seja intimidável. Como muitos dizem "tucano" como se estivessem expelindo algo, e com intenção de enquadrar.

Nessa disputa pela narrativa terminam por aprisionar e encolher as palavras, a imaginação, as ideias.

"Austeridade" é expressão em voga aqui e mundo afora. Pelo mundo, "austeridade" significa não apenas, mas também, 100 milhões de desempregados desde a crise de 2008. E uma conta de US$ 15 trilhões. Por isso, mesmo sem se saber no que vai dar, a ascensão do "Syriza", na Grécia e, talvez, do "Podemos" na Espanha.

"Syriza" e "Podemos" são rebentos do contubérnio da Crise com a Austeridade.

No Brasil, na disputa feroz pela hegemonia da narrativa, a corrupção de décadas, de séculos, é protegida por eufemismos. Como, por exemplo, "Cartel".

Já para os que são novos no ataque ao butim, o que vale é "quadrilha", ou "bando". Essa guerrilha pela hegemonia da narrativa se a cada palavra, a cada caso.

"Falta d´água", "seca", "racionamento", por exemplo, é coisa para o Nordeste.

Em São Paulo, no sudeste, o que se diz, mesmo com ameaça de uma tragédia social, é "crise hídrica" e "rodizio".

Quando é no nordeste se diz que a seca é arma de "coronéis que exploram o atraso". Em São Paulo, no sudeste, foi "São Pedro que não ajudou".

Amiga, amigo. Ainda mais em tempos de crise, atenção à narrativa.

Verifique se instituições, ou porta-vozes que vociferam e apontam o dedo, resistem a dois ou três cliques num site de busca.


A guerra da narrativa: corrupção ou cartel? Falta d’água ou crise hídrica? - See more at: http://www.tvgazeta.com.br/?videos=guerra-da-narrativa-corrupcao-ou-cartel-falta-dagua-ou-crise-hidrica-2#sthash.6ViujeCQ.dpuf

Quando a mídia impõe "verdades prontas" segue o velho padrão do mercado no uso da propaganda: oficializa-se a mentira mais lucrativa a quem paga por ela


Armandinho criticando a acomodação mental dos que "não pensam, não existem, só assistem"

sábado, 21 de fevereiro de 2015

A marcha fascista pelo golpe desde as passeatas de julho de 2013: com a palavra Paulo Moreira Leite, da Isto É




 "É bom recordar que a maioria escolhe seu governo pelo voto, o critério mais democrático que existe.

 "Nenhum brasileiro chegou perto do paraíso e todos nós temos reivindicações legítimas que precisam de uma resposta.

 "Também sabemos das mazelas de um sistema político criado para defender a ordem vigente – e que, com muita dificuldade, através de brechas sempre estreitas, criou benefícios para a maioria."
Paulo Moreira Leite 


Transcrevemos, pela atualidade e importância,  o texto de Paulo Moreira Leite, publicado em julho de 2013, no site da Isto É:

Entre democracia e fascismo


O movimento de caráter semi-insurrecional que vemos no país de hoje exige uma reflexão cuidadosa.


  Começou como uma luta justíssima pela redução de tarifas de ônibus.

  Auxiliada pela postura irredutível das autoridades e pela brutalidade policial, esta mobilização transformou-se numa luta nacional pela democracia.

  Se a redução da tarifa foi vitoriosa, a defesa dos direitos democráticos também deu resultado na medida em que o Estado deixou de empregar a violência como método preferencial para impor suas políticas.

  Mas hoje a mobilização assumiu outra fisionomia.

 Seu traços anti-democráticos acentuados. Até o MPL, entidade que havia organizado o movimento em sua primeira fase, decidiu retirar-se das mobilizações.

  Os manifestantes combatem os partidos políticos, que são a forma mais democrática de participação no Estado.

 Seu argumento é típico do fascismo: “povo unido não precisa de partido.”

 Claro que precisa. Não há saída na sociedade moderna. Às vezes, uma pessoa escolhe entrar num partido. Outras vezes, é massa de manobra e nem sabe.  

A criação de partidos políticos é a forma democrática de uma sociedade debater e negociar interesses diferentes, que não nascem na política, como se tenta acreditar, mas da própria vida social, das classes sociais.

 Em São Paulo, em Brasília, os protestos exibiram faixas com caráter golpista: 
“Chega de políticos incompetentes!!! Intervenção Militar Já!!!”
 No mesmo movimento, militantes de esquerda, com bandeiras de esquerda, foram forçados a deixar uma passeata na porrada. Uma bandeira do movimento negro foi rasgada.

  A baderna orquestrada cumpre um papel essencial na conjuntura atual. Reforça a sensação de desordem, cria o ambiente favorável a medidas de força – tão convenientes  para quem tem precisa desgastar de qualquer maneira um bloco político que ocupa o Planalto após três eleições consecutivas.
  
 A baderna é uma provocação que procura emparedar o governo Dilma criando uma situação sem saída.
 Se reprime, é autoritária. Se cruza os braços, é omissa.

 Outro efeito é embaralhar a situação política do país, confundir quem fala pela maioria e quem apenas pretende representá-la.

  É bom recordar que a maioria escolhe seu governo pelo voto, o critério mais democrático que existe.

  Nenhum brasileiro chegou perto do paraíso e todos nós temos reivindicações legítimas que precisam de uma resposta.

  Também sabemos das mazelas de um sistema político criado para defender a ordem vigente – e que, com muita dificuldade, através de brechas sempre estreitas, criou benefícios para a maioria.

  Olhando para a maioria dos brasileiros, aqueles que foram excluídos da história ao longo de séculos, cabe perguntar, porém: os políticos atuais são incompetentes para quem, mascarados?

 Para a empregada doméstica, que emancipou-se das últimas heranças da escravidão?

 Para 40 milhões que recebem o bolsa-família?

  Para os milhões de jovens pobres que nunca puderam entrar numa faculdade? Para os negros? Quem vive do mínimo?

  Ou para quem vai ao mercado de trabalho e encontra um índice de desemprego invejado no resto do mundo?

 Mascarados que arrebentam vidraças, incendeiam ônibus e invadem edifícios trabalham contra a ordem democrática, onde os partidos são legítimos, as pessoas têm direitos iguais  – e  o poder, que emana do povo, não se resolve na arruaça, pelo sangue, mas pelo voto.

   É óbvio que a baderna, em sua fase atual, não quer objetivos claros nem reivindicações específicas. Não quer negociações, não quer o funcionamento da democracia. Quer travá-la.

 Enquanto não avançar pela violência direta, fará o possível para criar pedidos difusos, que não sejam possíveis de avaliar nem responder.

  O objetivo é manter a raiva, a febre, a multidão eletrizada.

 É delírio enxergar o que está acontecendo no país como um conflito entre direita e esquerda. É uma luta muito maior, como aprenderam todas as pessoas que vivenciaram e estudaram as trevas de uma ditadura.

  A questão colocada é a defesa da democracia, este regime insubstituível para a criação do bem-estar social e do progresso econômico.

  O conflito é este: democracia ou fascismo. Não há alternativa no horizonte.

   Quem não perceber isso está condenado a travar a luta errada, com métodos errados e chegar a um desfecho errado. 

 Paulo Moreira Leite

Diretor da Sucursal da ISTOÉ em Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".

Ali Kamel, o todo poderoso chefe de Jornalismo da Rede Globo, segue o exemplo de Aécio Neves ao perseguir blogueiros que deles discordam: o Caso de Miguel do Rosário, de O Cafezinho e a "liberdade de expressão" de fachada


"A Repórteres Sem Fronteiras acusou o Brasil de ser o país dos 30 Bersluconis, referindo-se às famílias que dominam a mídia de massa no país.
 O relator da ONU para Liberdade de Expressão, Frank de La Rue, veio ao Brasil recentemente e afirmou que a concentração da mídia é a maior ameaça à liberdade de expressão. La Rue se referia, naturalmente, à situação da midia no Brasil.
 Essas denúncias foram abafadas por nossa mídia corporativa, cuja estrutura segue muito parecida, e até mais concentrada ainda, em relação aos chamados anos de chumbo."
Miguel do Rosário

Seguem textos de Miguel do Rosário, de O Cafezinho, e Fernando Brito, do Tijolaço.com:

Carta aberta ao povo brasileiro: liberdade de expressão em risco




  Dirijo-me ao nobre e valoroso povo brasileiro, na qualidade de um cidadão atingido por uma absurda violência política, e que não afeta somente a mim, mas o coletivo e a própria liberdade de expressão de uma nação continental.

  Trata-se de um processo movido contra mim por Ali Kamel, empregado da família mais rica do país.

Mais rica e que controla um dos maiores impérios de mídia do mundo.

Não creio que, em nenhum país democrático (com exceção talvez da Itália, que tem o seu Berlusconi), exista um grupo que reúna tanto poder financeiro e midiático como a Globo.

  Pois o empregado deste grupo, e não qualquer empregado, mas o seu diretor-geral de jornalismo, pediu-me, e venceu na justiça, uma indenização de mais de R$ 20 mil, a qual, acrescida pelos custos judiciais, me custarão mais de R$ 30 mil.
  
  O processo já terminou. Ele venceu na segunda instância e não conseguimos chegar ao Supremo Tribunal de Justiça. Não há mais como recorrer.

  O juiz mandou executar e terei de pagar o montante em alguns dias.

  E qual a razão do processo? Simplesmente porque fiz uma crítica política à empresa para a qual ele trabalha.

  Não ataquei sua honra. Não o chamei de ladrão ou corrupto. Não pedi sua demissão.

  Apenas disse que ele trabalhava para uma concessão pública que, na minha opinião, merece ser criticada.

 Para não faltar com a verdade, os únicos adjetivos que dirigi ao autor da ação, e que poderiam ser considerados pessoalmente ofensivos, foram: sacripanta e reacionário. E me referia a ele enquanto diretor de jornalismo da Globo, a concessão pública líder de audiência no país.

 O dia em que todos forem condenados porque chamaram, num artigo político, o diretor de jornalismo da maior concessão pública de um país, de “reacionário” e “sacripanta”, será o último dia de liberdade no Brasil.


Creio se tratar de um desses casos emblemáticos que podem influenciar o país durante muitos anos.

 Até porque, neste momento, já são vários blogueiros agredidos judicialmente pelo mesmo personagem, ou pelo mesmo campo político.

 É um fato notório o mal que a concentração da mídia faz à democracia, um mal denunciado por inúmeras organizações nacionais e internacionais.

 A Repórteres Sem Fronteiras acusou o Brasil de ser o país dos 30 Bersluconis, referindo-se às famílias que dominam a mídia de massa no país.

 O relator da ONU para Liberdade de Expressão, Frank de La Rue, veio ao Brasil recentemente e afirmou que a concentração da mídia é a maior ameaça à liberdade de expressão. La Rue se referia, naturalmente, à situação da midia no Brasil.

 Essas denúncias foram abafadas por nossa mídia corporativa, cuja estrutura segue muito parecida, e até mais concentrada ainda, em relação aos chamados anos de chumbo.

 O surgimento de blogs políticos que fazem um contraponto à grande mídia, devem ser entendidos, portanto, como uma reação biologicamente natural, saudável e necessária, do ambiente democrático.

 Se a mídia age como um partido político homogêneo, um verdadeiro cartel ideológico, impondo sempre as mesmas pautas, repetindo as mesmas opiniões e até usando os mesmos colunistas, é natural que emergissem blogs no lado oposto do espectro ideológico.

 Se a mídia torna-se dia a dia mais conservadora, os blogs se notabilizam por defender pautas progressistas e trabalhistas.

 Não é fácil manter um blog, contudo. Raros são os blogs que são atualizados constantemente, e raríssimos aqueles que conseguiram se profissionalizar.

 Entretanto, creio que, neste momento da nossa história, os blogs políticos constituem um respiro democrático no ambiente histérico, reacionário, udenista, muitas vezes flertando com o golpismo, da nossa imprensa corporativa.

 Não digo que os blogs sejam perfeitos, nem que a nossa imprensa seja 100% um lixo (digamos que ela seja 75% lixo). Mas representamos um contraponto importante. E ajudamos a concretizar um dos princípios que norteiam a nossa Constituição: a pluralidade política.

 Claro, os blogs não resolvem o problema da concentração midiática. Apenas ajudam a enriquecer o debate, a criar uma válvula de escape num ambiente que, sem eles, seria talvez desesperador para muita gente.

 A sustentação financeira dos blogs é complicada. Apesar dos adversários nos acusarem de recebermos “apoio do governo”, sabemos que isso não é verdade.

 Recentemente, os dados referentes a todos os órgãos de governos, incluindo estatais, foram abertos e comprovamos que apenas dois ou três blogs ou sites recebiam apoio oficial (não estou incluído), e mesmo assim, irrisórios se comparados ao custo de manutenção dos mesmos, e ridiculamente ínfimos, se comparados ao que receberam os grandes ou mesmo medianos grupos de mídia tradicionais.

 Os blogs políticos, em geral, são sustentados pelo próprio bolso dos autores.

 Em alguns casos, como o meu, o blog é sustentado por assinaturas e contribuições dos leitores, uma ou outra publicidade, além do adsense do Google, um esquema randômico de propaganda.

 Não posso reclamar de nada, todavia.

 A blogosfera, aqui entendida como o conjunto de leitores, sempre foi generosa comigo. Tenho centenas de assinantes pagantes e as contribuições sempre foram generosas por parte de um público idealista.

 Não espero matérias elogiosas a meu trabalho em reportagens de TV, em jornais ou revistas de grande circulação.

  Ao contrário, sempre que me citam, e são obrigados a fazê-lo de vez em quando, fazem-no tentando me prejudicar.

  Entretanto, às vezes recebo doações e assinaturas até mesmo de pessoas de baixa renda, e isso realmente me comove e me faz entender a importância de continuar o meu trabalho.

  DDigo isso para mostrar a fragilidade financeira dos blogs, por representarem uma coisa nova, ainda não assimilada pelos agentes econômicos, sobretudo num país onde o ambiente publicitário permanece sob o controle dos monopólios corporativos consolidados no regime militar.

 Frágeis, mas essenciais!

  De qualquer forma, contra tudo e contra todos, estamos crescendo.

 Os blogs têm cada vez mais visitas. O Cafezinho tem cada vez mais assinantes.

 Adentramos até mesmo o terreno mais custoso do jornalismo: a investigação.

 Os blogs hoje também realizam investigações importantes, como eu fiz no caso da sonegação da Globo, do apartamento em Miami de Joaquim Barbosa, e agora, sobre a participação de graúdos das finanças e da política na lista do OffShore Leaks e do HSBC suíço.

 Pois bem, diante de tal situação, o que posso fazer diante da ofensiva covarde da Globo contra o meu trabalho?

  O dinheiro que ganho serve para pagar meu custo de vida, ao qual tive que acrescentar agora os honorários do meu advogado.

  Como posso entrar numa batalha judicial com o diretor de jornalismo da Globo, cujos proprietários têm uma fortuna maior que a de Rupert Murdoch, o magnata australiano dono de um império midiático nos EUA, maior que a de Berlusconi, proprietário de vários canais de TV na Itália e um dos principais expoentes da direita europeia?

  O valor imposto, R$ 20 mil mais custos judiciais, equivale ao valor que o Judiciário costuma impor à revista Veja, que pertence também a uma das famílias mais ricas do país. E isso quando a Veja perde na justiça, o que é raro.

 Não falta aqui um senso de proporção?

 Depois de judicializarem a política, agora partirão para a judicialização da censura?

 Qual o objetivo da Globo? Reduzir o já diminuto pluralismo político do país?  E ela ainda quer se vender como defensora da liberdade de expressão?

 Ainda quer acusar a esquerda de pretender promover a censura por querer estabelecer uma regulamentação que evite esse tipo de aberração, na qual a grande mídia pode destruir reputações, e a pequena mídia não pode falar nada?

 É muito cinismo! Dão golpe e falam que a democracia voltou! Censuram e acusam os outros de censura! Roubam e gritam pega ladrão!

 Só blogueiros cubanos serão defendidos por nossa mídia?

 O caso do blogueiro saudita, condenado a levar algumas centenas de chibatadas, foi denunciado por nossa “imprensa livre” e aqui o diretor de jornalismo da nossa maior empresa de mídia persegue judicialmente os blogs?
É uma contradição atrás da outra!

 Entendo, contudo, perfeitamente, que as pessoas se sintam ofendidas e procurem reparação na justiça.

 Se houvesse a lei de imprensa, o ofendido ganharia direito de resposta no blog, que eu publicaria com o maior prazer.

 Ali Kamel poderia explicar, a meus leitores, que não pode ser culpabilizado pelos crimes que a Globo cometeu contra a democracia, no passado remoto e recente.
Tudo bem.

 Não há mais lei de imprensa, porém. Não há qualquer tipo de regulamentação da mídia, que proteja o cidadão contra ofensas e o jornalista contra abusos do poder econômico e arbítrios da justiça.

 Voltamos à lei da selva, à lei do mais forte.

 Não tenho pretensão de acertar sempre. Entendo que um blogueiro pode passar dos limites às vezes. O limite entre o sarcasmo, o humor, o chiste, e a ofensa, é frequentemente tênue.

 Pode-se publicar por vezes uma denúncia equivocada (o que não é o caso aqui, não “denunciei” nada acerca de Ali Kamel).

 O blogueiro costuma caminhar sobre a corda bamba.

 Ora, mas então que se aplique uma multa proporcional ao padrão financeiro de um blog!

 Um blog político independente não tem R$ 20 ou R$ 30 mil para sair distribuindo para o primeiro que se sentir ofendido!

 Se não conseguir pagar este valor, minhas contas serão bloqueadas e, evidentemente, meu trabalho ficará comprometido.

 E aí é que não conseguirei pagar nada mesmo!

 É uma coisa tão absurdamente injusta, tão ridiculamente sem sentido, que dá vontade de rir.

 Os caras mais ricos do país, donos do maior império de mídia da América Latina, tentando matar um blogueiro de fome!

 Tudo com apoio de uma justiça sem grande apreço, aparentemente, pela liberdade de expressão (ou que entende que esta liberdade seja propriedade da grande mídia); e a complacência de uma sociedade amedrontada e chantageada por uma mídia doentiamente inchada pelo totalitarismo político.

 Vivemos uma ditadura sanguinária, onde a liberdade de expressão é monopólio de meia dúzia de poderosos?

 O querelante se aproveita do fato do poder judiciário não estar devidamente atualizado sobre a importância dos blogs para o pluralismo político no Brasil, nem habituado à linguagem às vezes agressiva, própria da blogosfera, sobretudo quando se trata de enfrentar a grande mídia, herdeira da ditadura, símbolo do mainstream e de séculos de opressão e desigualdade social.

 Eu fui condenado, aliás, porque escrevi um texto em apoio a um outro blogueiro, também condenado injustamente.

 Até isso querem criminalizar, a solidariedade.

 Até onde vai essa perseguição política, promovida por um gigante corporativo, através de seu diretor de jornalismo, contra simples blogueiros?

 Gostaria de acreditar que vivemos um regime democrático, que vencemos a luta contra a ditadura, e que, portanto, os herdeiros dos anos de chumbo não vencerão esta batalha fundamental.

*
Aos leitores que quiserem ajudar, podem fazê-lo através deste link. Qualquer dúvida, use o email assinatura@ocafezinho (falar com Mônica Teixeira). Meu email é migueldorosario@gmail.com (que é também meu ID no Paypal).


A solidariedade a Miguel do Rosário

20 de fevereiro de 2015 | 15:41 Autor: Fernando Brito


Miguel do Rosário, por um post em O Cafezinho, foi condenado, já em segunda instância, a indenizar por Ali Kamel, que, como se sabe, tem conseguido diversas condenações a blogueiros.

Não entro no mérito – porque, ao que parece, não se pode mais discutir o que dizem juízes – e tento não abrir  o flanco a processos judiciais deste senhor, é evidente. Razão pela qual este posts não será aberto a comentários, pois não disponho de uma equipe para triá-los todos e no que sair nas intervenções dos leitores, pode-se explorar uma eventual co-responsabilidade do autor, ainda que seja nenhuma, nestes tempos de redes sociais.

Peço que visitem o post em que ele comenta o assunto e vejam como podem, se desejarem, ajudá-lo.

Nos poucos créditos que este blog possui e do qual Miguel é sócio, será possível buscar algo para complementar o que for necessário para que ele quite o débito que lhe foi imposto.

Algo, apenas, não porque se tenha aqui qualquer sentimento de mesquinharia, mas porque as receitas são poucas, embora sejamos apontados como “sujos” por receber publicidade oficial que, afinal,  não recebemos.

As razões do lobo são assim mesmo.

Então é assim, com 10, 20, 50 reais da generosidade pública que sobrevivemos e será com isso que Miguel pagará esta sentença.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Luciano Martins Costa, do Observatório da Imprensa, reflete sobre o triunfo da banalidade no jornalismo político nacional


   "Essa mistura de pautas, na qual os jornais balançam entre um cauteloso apoio ao ministro da Fazenda e a condenação explícita da presidente da República, e ao mesmo tempo precisam dar um ar de seriedade ao que é pura folia, traz à tona uma característica pouco observada do ambiente midiatizado: o triunfo da banalidade."
Luciano Martins Costa 

Segue artigo extraído do Observatório da Imprensa:


JORNALISMO POLÍTICO

O triunfo da banalidade

Por Luciano Martins Costa em 20/02/2015 na edição 838
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 20/2/2015

 A imprensa brasileira retoma na sexta-feira (20/2) seus temas prediletos, na prática consagrada de atuar como força política acima dos partidos e das instituições. Mas não pode abandonar completamente a agenda da folia, porque o carnaval só acaba na madrugada de domingo, após o desfile das campeãs. Paralelamente, em algumas cidades os foliões empurraram o calendário católico e invadiram parte da Quaresma com seus blocos anárquicos.
Essa mistura de pautas, na qual os jornais balançam entre um cauteloso apoio ao ministro da Fazenda e a condenação explícita da presidente da República, e ao mesmo tempo precisam dar um ar de seriedade ao que é pura folia, traz à tona uma característica pouco observada do ambiente midiatizado: o triunfo da banalidade.
O peso igualitário entre os temas que fazem o material cotidiano da mídia é definido, na televisão e no rádio, pelo tom de voz e pelas expressões dos apresentadores, não pelo conteúdo.
Se tudo que merece a cobertura da imprensa é relevante, nada é essencial e tudo é banalidade. Por exemplo, a questão, levantada na quarta-feira de cinzas, sobre se as mulheres que desfilam como destaques nas escolas de samba usam artifícios para esconder o que se considera imperfeições em suas medidas corporais, não pode ser considerada banal, se os jornais investem nesse assunto o tempo de seus repórteres e o suporte de papel ou bytes necessário para torná-lo público. Por outro lado, o noticiário considerado sério, como a crônica da política e as informações sobre economia e negócios, é contaminado por uma metalinguagem que esconde a intencionalidade das edições.
Existe sempre um pressuposto que define a priori os protagonistas de cada notícia, e que funciona como uma tela de fundo para tudo que sai na imprensa. Mas há momentos em que o discurso hegemônico da mídia precisa sondar determinados atores antes de fixar em sua testa a etiqueta: adversário ou aliado. É o caso, por exemplo, do novo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que num dia aparece como condutor de um processo de resgate da autonomia do Legislativo, e no dia seguinte é apresentado como líder de uma corrente fundamentalista da bancada religiosa, empenhado em fazer retroagir a agenda dos direitos humanos.
A “agenda positiva”
Já a presidente da República, identificada como inimiga a ser eliminada do campo político, pode-se dizer que chegou a gozar de algum beneplácito da imprensa, no começo de seu primeiro mandato, quando promoveu o que os jornalistas chamaram de “faxina moral”, por conta das denúncias de corrupção que atingiram alguns de seus ministros e auxiliares. Mas, no presente momento, os jornais tratam de vincular sua figura ao escândalo que atinge a Petrobras, embora seu nome não tenha aparecido, até aqui, nas notas que vazam das investigações.
De vez em quando, um ou outro jornal coloca suas lentes em iniciativas do Palácio do Planalto e considera que tal ou qual medida tem o objetivo de criar uma “agenda positiva” que se contraponha à enxurrada de notícias deletérias que sitia a presidente da República. O mais recente desses episódios foi o programa que pretende reduzir a burocracia para as pequenas empresas, e que será oficialmente lançado na semana que vem.
O projeto foi coordenado pelo ministro Guilherme Afif Domingos, que nem de longe representa o núcleo ideológico da aliança que apoia a presidente, e que, colocado à frente da Secretaria da Micro e Pequena Empresa, faz uma ponte entre o governo e o ambiente de negócios.
Ao carimbar a iniciativa como “uma ação de marketing”, a imprensa procura desqualificar o programa, ainda antes que seus detalhes sejam anunciados. Assim, o que pode ser um conjunto de medidas há muito reivindicado pelos empreendedores, acaba na vala comum da politicagem, porque o editor assim o deseja.
Avessa a aparições na mídia, a presidente da República paga o preço por falar ou por calar. Se cala, é porque seu governo não tem transparência. Se fala, é porque precisa criar uma “agenda positiva” para se contrapor ao escândalo da Petrobras e aos indicadores que revelam dificuldades nas contas públicas.
A exposição constante ao noticiário pode induzir o leitor crítico a concluir que nada disso é importante e que a banalidade, afinal, triunfou.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Luis Fernando Veríssimo e Diogo Santos refletem sobre os ataques à Petrobrás sob a ótica do contexto maior: a velha guerra pelo seu controle e seu petróleo

"Do ponto de vista da eternidade nada do que está sendo revelado, em capítulos diários, sobre o propinato na Petrobras e os partidos políticos que beneficiou deixa de ser grave, mas é impossível não ver o cerco à estatal do petróleo no contexto maior da velha guerra pelo seu controle, que já dura quase 70 anos, desde que a Petrobras venceu a primeira batalha, a que lhe permitiu simplesmente existir, quando diziam que nunca se encontraria petróleo no Brasil."

Luis Fernando Veríssimo


  "A campanha contra a Petrobras levada à frente pelo bloco conservador brasileiro é, neste contexto, absolutamente funcional aos interesses das petroleiras ocidentais estrangeiras. Mais do que enfraquecer a Petrobras, esta campanha objetiva retirar do Brasil o controle sobre seu próprio futuro, como várias vezes vimos acontecer na história da estatal e na história do país".
Diogo Santos

Seguem dois textos sobre os interesses por trás do massacre midiático contra a Petrobrás:

O Contexto Maior


Luis Fernando Veríssimo

  Recomenda-se a desiludidos com a atualidade em geral e com o PT em particular a procurar refugio no contexto maior. O contexto maior não absolve, exatamente, o contexto imediato, a triste realidade de revelações e escândalos de todos os dias, mas consola. Nossa inspiração deve ser o historiador francês Fernand Braudel, que — principalmente no seu monumental estudo sobre as civilizações do Mediterrâneo — ensinou que, para se entender a Historia, é preciso concentrar-se no que ele chamava de la longue durée, que é outro nome para o contexto maior. Braudel partia do particular e do individual para o social e daí para o nacional e o generacional, se é que existe a palavra, e na sua história da região, o indivíduo e seu cotidiano eram reduzidos a “poeira” (palavra dele também, que incluía até papas e reis) em contraste com a longue durée, o longo prazo da história verdadeira. Assim na sua obra se encontram as minúcias da vida diária nos países do Mediterrâneo mas compreendidas sub specie aeternitatis, do ponto de vista da eternidade, que é o contexto maior pedante.

  Do ponto de vista da eternidade nada do que está sendo revelado, em capítulos diários, sobre o propinato na Petrobras e os partidos políticos que beneficiou deixa de ser grave, mas é impossível não ver o cerco à estatal do petróleo no contexto maior da velha guerra pelo seu controle, que já dura quase 70 anos, desde que a Petrobras venceu a primeira batalha, a que lhe permitiu simplesmente existir, quando diziam que nunca se encontraria petróleo no Brasil. Mais do que em qualquer outra frente de confronto entre conservadores e progressistas e direita e esquerda no Brasil, na luta pela Petrobras, e por tudo que ela simboliza além da exploração de uma riqueza nacional, se definem os lados com nitidez. A punição dos responsáveis pelos desvios que enfraqueceram a estatal deve ser exemplar e todos os partidos beneficiados que se expliquem como puderem, mas que se pense sempre no contexto maior, no qual a sobrevivência da estatal como estatal, purgada pelo escândalo, é vital.

  Fernand Braudel viveu e lecionou no Brasil. Não conheço nenhum texto dele sobre sua experiência brasileira. Seria interessante saber como ele descreveria, ou preveria, hoje, a longue durée da nossa História. O que significaria, na sua avaliação, o longo dia no poder do PT? O contexto maior tudo perdoaria ou tudo justificaria? Enfim, o contexto maior de todos é o Universo, que, no fim, engole todos os significados. O que também não é um consolo...



Importância do Pré-Sal (e da Petrobrás) na Geopolítica do Petróleo

Diogo Santos



  O Brasil vive um período de repactuação entre o capital público e as frações capital privado em relação aos seus diferentes papéis no próximo ciclo de crescimento da economia brasileira. Garantir a indispensável participação do capital público é tarefa que deve unificar todos os setores avançados da nação. A unidade se torna imprescindível quando do outro lado estão interesses sensíveis do Imperialismo, como é o caso do petróleo na camada pré-sal.

  Ignácio Rangel, ilustre pensador brasileiro e certamente o mais original entre nossos grandes economistas, escreveu que o setor público e o setor privado devem repactuar suas respectivas participações na economia sempre que as oportunidades de investimentos de um ciclo econômico estão se esgotando. Nas superiores palavras de Rangel:

“Quer isso dizer que a lua-de-mel entre o setor privado e o setor público da economia dura enquanto, por um lado, o empresariado capitalista considera suficientes as oportunidades de investimentos que lhe são abertas e enquanto as responsabilidades deixadas ao Estado não exigem dele que tente aumentar demasiado sua participação no dividendo nacional. Periodicamente, esse equilíbrio se rompe, tornando necessária uma redistribuição de funções, e essa ruptura de equilíbrio se manifesta por uma série de perturbações – notadamente, ao longo do processo de industrialização, o recrudescimento do processo inflacionário, o qual supõe […] precisamente o esgotamento das oportunidades de investimento para o empresariado capitalista.”


  No Brasil, vivemos este período nos anos recentes. A campanha eleitoral catalisou a disputa em torno da decisão de quem dará as cartas na próxima rodada de crescimento econômico. Após o segundo turno, a definição da equipe econômica do próximo governo Dilma foi o capítulo mais aguardado, pois sua composição sinalizaria qual pacto o governo pretende fazer com as frações financeira e produtiva do capital.

  A realização dos contratos de investimentos no setor de logística foi um momento importante desta repactuação entre o capital público e o privado. A adoção do modelo de concessão reforça a presença de um Estado menos subserviente às imposições do capital privado. Do outro lado da corda, as empresas pressionaram para aumentar o retorno mínimo dos contratos. O tempo gasto além do esperado para destravá-los releva certamente as inescapáveis rodadas de pressão de ambos os lados.

  O capítulo mais importante, entretanto, da definição de papéis entre o público e o privado se deu em torno do modelo de exploração do pré-sal. O regime de partilha é uma grande conquista para uma nação cuja soberania ainda está em construção. Não por acaso, ainda hoje encontramos os porta-vozes locais de interesses estrangeiros defendendo o retorno ao modelo anterior, no fundo, por discordarem do pacto proposto pelo Estado brasileiro.

  Poucos temas estão tão imbricados com os interesses das potências hegemônicas do capitalismo como o controle sobre a produção mundial do petróleo. A relevância do pré-sal para as petroleiras tradicionais deriva de sua magnitude, mas é reforçado pelos movimentos realizados no setor de energia, desde o início dos anos 2000, por dois grandes países em desenvolvimento: Rússia e China.

  A Rússia viveu durante a década de 1990 a formação de uma plutocracia durante governo antinacional de Yeltin, patrocinada pelo Estado, que levou a graves prejuízos para a indústria do petróleo russa. O conluio entre governo e banqueiros fatiou e distribuiu as recém-criadas empresas para privatização. Um dos mecanismos utilizados foram os empréstimos tomados pelo governo que tinham como garantias as ações das empresas ainda não privatizadas. Caso o governo não pagasse o empréstimo o banco colocava as ações em leilão. O governo não pagava, os leilões eram de fachada e os bancos se tornavam proprietários das ações. A empresa Yukos, por exemplo, foi adquirida por US$390 milhões, avaliada em seguida com o valor de US$15 bilhões. Uma das consequências deste verdadeiro saque ao patrimônio do povo russo foi que em 1996, a produção de petróleo foi de apenas 60% do valor recorde do ano de 1987.

  A partir do primeiro governo Putin, a Rússia percorreu um caminho de retomada do controle público sobre o estratégico setor de petróleo e gás como parte da retomada de um projeto de desenvolvimento nacional. O governo alterou o regime de tributação e conseguiu aumentar as receitas oriundas do setor; o BC russo adotou mecanismos para que grande parte das receitas das empresas permanecesse na Rússia; e a estatal do petróleo, a Rosneft, e a estatal do gás, a Gazprom, passaram adquirir participação acionária e ativos das empresas vistas como estratégicas ou desconectadas dos interesses nacionais. Em poucos anos, a produção de petróleo voltou a crescer vigorosamente.

  O controle soberano da Rússia sobre a economia do petróleo e gás retira a capacidade das tradicionais petroleiras ocidentais, ancoradas nos respectivos Estados, de dominarem uma das maiores reservas do mundo. As reservas de outros países, consequentemente, se tornam ainda mais relevantes. Ao mesmo tempo, a determinada política russa de ampliação da produção e exportação de petróleo amplia a concorrência pelos mercados consumidores.

  A Rússia, todavia, ainda não se libertou da enorme dependência que sua economia possui do setor do petróleo, o que a torna vulnerável às pressões externas. E aqui é preciso fazer alguns comentários sobre a atual crise no preço do petróleo e seus impactos sobre a Rússia, mesmo que temporariamente nos afastemos do intento principal deste texto.

  De junho até dezembro deste ano o preço do barril do petróleo caiu 45%, chegando a estar abaixo dos US$60,00, menor valor desde 2009. A persistente crise economia mundial ainda vivida em todas as partes do mundo e a extração do petróleo de xisto dos EUA contribuíram para a oferta de petróleo exceder a demanda e assim derrubar o preço. Entretanto, a decisão da Opep, que comercializa cerca de 40% do petróleo vendido no mundo, de manter o volume de produção em um nível sabidamente muito acima da capacidade de consumo mundial foi o fator mais desestabilizador do preço da commodity.

  Ao que parece, esta postura da Opep – da Arábia Saudita em especial, pois outros membros como a Venezuela propuseram a redução da oferta para evitar o derretimento do preço – é uma tática de concorrência por meio de preço predatório. A Arábia Saudita é responsável por mais de 30% do total produzido pela Opep e possui o menor custo de produção de petróleo do mundo, o que lhe dá um grande poder de suportar preços baixos. Com o preço do barril acima de US$70,00, muitos projetos de exploração de alto custo passariam a ser viáveis, o que ampliaria a concorrência. O banco Goldman Sachs avalia que muitos campos que estão na iminência de serem explorados se tornam inviáveis com os níveis atuais do preço do petróleo. As consequências serão atrasos de investimentos, necessidade de redução de custos, vendas de ativos e desvalorização das empresas que operam em campos que possuem custos elevados. A disposição da Opep de não intervir na queda do preço e deixar entender que permitirá uma queda ainda maior, manifesta esta tática de concorrência predatória.

  A Rússia que até então vinha enfrentando razoavelmente o impacto das sanções econômicas impostas pelos EUA e UE, tomou um grande golpe com a queda do preço do petróleo nos últimos meses. A fuga de capitais decorrente das sanções se intensificaram com a queda do preço. Em novembro o BC, que já vinha aumentando a taxa básica de juros, passou adotar o regime de câmbio flutuante. Somente no dia 15 de dezembro, a moeda russa perdeu 10% de valor frente ao dólar. No dia 16, o BC decidiu elevar a taxa de juros de 10,5% para 17%, em uma forte medida de tentar estancar o processo de desvalorização do rublo.

  A desvalorização da moeda na intensidade que ocorreu pressionará para cima a taxa de inflação, diminuirá em grande medida a arrecadação do Estado com as receitas do setor do petróleo provocando um inevitável corte de gastos, desvalorizará as empresas com grande volume de dívidas denominadas em dólar, o que poderá levar a mais fuga de capitais e mais pressão sobre a taxa de câmbio. O aumento da taxa de juros, por sua vez, reforça um horizonte de recessão no próximo ano. No momento em que a Rússia enfrenta seu maior embate geopolítico em anos, o governo russo terá que lidar com repercussões negativas da grande desvalorização do rublo. Impossível não pensar na provável articulação entre Arábia Saudita e as potências ocidentais para derrubar o preço do petróleo e estrangular a Rússia.

 Voltando ao curso principal do texto, falemos do segundo país que também tem desempenhado um importante papel na última década com repercussões sobre a geopolítica do petróleo.

  A China vem adotando uma política decidida de construir sua segurança energética e ter a garantia de que seu processo de desenvolvimento não será bloqueado por escassez de petróleo. O país asiático já é o maior consumidor de energia do mundo, respondendo por 19% da demanda mundial e estudos tem apontado que se tornará o maior importador de petróleo nos próximos anos. Atualmente a China importa 59% de sua demanda de petróleo e derivados.

  Ciente de que não pode se tornar dependente dos países produtores de petróleo do Oriente Médio, devido à instabilidade interna destes países e sintonia com a política norte-americana, a China realiza grandes investimentos em várias partes do mundo. Turcomenistão, Cazaquistão, Uzbequistão, Egito, Equador, Venezuela, Canadá, Quênia e Uganda são países que possuem participação chinesa na exploração de petróleo de alguma maneira, seja via estatais chinesas, join ventures ou participações em empresas locais ou estrangeiras.

  Entre todos estes investimentos, destacam-se os feitos na África. A China tem feito investimentos em diversos setores naquele continente como em infraestrutura logística, construção de hospitais e escolas. Tem firmado parcerias de intercâmbio entre universidades chinesas e africanas, fornecido equipamentos militares e realizado perdão de dívidas de governos. Desde 2009, a China é o principal parceiro comercial da África.

  Esta forte e crescente presença da China na África já despertou o receio das grandes potências ocidentais que acusam a China de pretender colonizar a África. Na realidade, a China tem disponibilizado os recursos aos países africanos que sempre foram negados pelas instituições controladas pelos EUA como o Banco Mundial e o FMI. Ademais, a China não impõe aos países africanos as exigências que acompanham os pacotes de empréstimos destes órgãos. Sem desconsiderar as precauções que os países africanos devem tomar para aproveitar a presença chinesa para seu desenvolvimento, a desfaçatez desta crítica feita pelo ocidente à China através da Imprensa alinhada, Secretários de Relações Exteriores dos diversos países e representantes na África, desnuda a situação de uma civilização que tem ficado com cada vez menos alternativas para enfrentar o potente modelo econômico construído na China desde a Revolução liderada pelo Partido Comunista. Todas estas décadas de benevolência do Ocidente com a África, só lhe rendeu mazelas sociais e fotografias de alguma estrela de Hollywood com suas crianças.

  No setor do petróleo, a presença chinesa na África é solidamente crescente. O Sudão é atualmente o terceiro maior produtor de petróleo da África devido ao volume de investimentos feitos pela China através das estatais CNPC e Sinopec. O país produzia em 2000, 174 mil barris de petróleo por dia e passou a produzir em 2010, 486 mil. A China é a maior fonte de investimento direto externo do país. Na Nigéria e Angola, o primeiro e o segundo maiores produtores de petróleo da África respectivamente, a hegemonia das petroleiras Shell, ExxonMobil, Chevron Texaco, Total e BP foi quebrada pela gigante chinesa, CNOOC. Para se ter dimensão da presença da China na Angola, basta dizer que este país disputa com a Arábia Saudita a posição de principal origem das importações chinesas de petróleo. A CNOOC também atua na Guiné Equatorial que saltou sua produção de 91 mil para 274 mil b/d entre 2000 e 201o.

  O poder das estatais do petróleo chinesas é reforçado por estarem inseridas na estratégia nacional de desenvolvimento de seu país. Por um lado, podem ter um comportamento mais ousado, uma vez que não necessitam ser lucrativas isoladamente, o que lhes dá grande vantagem sobre as concorrentes privadas. Por outro lado, o governo chinês quando necessário reforça as ofertas feitas pelas empresas nas licitações de licenças de exploração petróleo por meio da disponibilização de empréstimos nos bancos de desenvolvimento chineses aos países possuidores das reservas petrolíferas.

  No Brasil a presença chinesa não se restringe na participação da CNPC e da CNOOC no consórcio que venceu o leilão do campo de libra. Em 2005, a Sinopec participou da construção de um gasoduto entre o sudeste e nordeste brasileiros. Em 2009, assinou um importante contrato com a Petrobras, possibilitando que esta obtivesse um empréstimo de US$10 bilhões no Banco de desenvolvimento da China. Em 2010, após a descoberta do pré-sal, a Sinopec e a Sinochem passaram a adquirir ativos de outras empresas estrangeiras que atuam no Brasil.

  O cenário da ação chinesa no setor de petróleo traz a inescapável consequência de ampliar a concorrência e impor novos condicionantes à política adotada pelas petroleiras ocidentais tradicionais, além de restringir a participação destas empresas no maior mercado consumidor de petróleo do próximo período. Para as petroleiras ocidentais é imperativo que disputem com a China o direito de exploração das novas áreas. No pré-sal, os chineses saíram na frente.

  O contexto de maior competição mundial na indústria do petróleo faz do pré-sal uma reserva muito valiosa. O acirramento da concorrência intercapitalista impõe aos capitais individuais a necessidade de intensificarem a acumulação, o que torna as áreas abertas para valorização do capital cada vez mais disputadas.

 A campanha contra a Petrobras levada à frente pelo bloco conservador brasileiro é, neste contexto, absolutamente funcional aos interesses das petroleiras ocidentais estrangeiras. Mais do que enfraquecer a Petrobras, esta campanha objetiva retirar do Brasil o controle sobre seu próprio futuro, como várias vezes vimos acontecer na história da estatal e na história do país.

 Uma página a parte da ofensiva conservadora é a ação contra a Petrobras em curso na justiça dos EUA, que pode custar centenas de milhões de dólares à estatal brasileira, movida por um escritório de advocacia especializado na rapinagem.

 Esses escritórios se aproveitam de momentos de dificuldades das empresas, buscam alguma regra do mercado de capitais norte-americano que elas possam ter infringido, convocam os acionistas para abrirem o processo judicial e lucram milhões de dólares com a causa.

 O editorial do jornal O Globo que defende abertamente a revisão do modelo de partilha e a entrada das petroleiras ocidentais na exploração do pré-sal não fez mais do que explicitar a razão da campanha orquestrada contra a Petrobras: dilapidar a autoridade do PT, de Dilma e de Lula e desvalorizar a Petrobras a fim de inviabilizar a participação diferenciada da estatal na exploração do pré-sal.

 É da soberania brasileira que se trata o tema da exploração do pré-sal, portanto interessa a toda a nação. Diante do panorama de exacerbação da concorrência no mercado mundial de petróleo, a tentativa de enfraquecer a Petrobras e, portanto, a participação do capital público no pré-sal exige um grau de unidade dos setores nacionalistas e democráticos em um patamar elevado. Algumas iniciativas têm contribuído para gestar um programa político que lance as bases para esta unidade necessária. As frentes de defesa da Reforma Política Democrática como a Coalizão Democrática, o Encontro do Fórum Nacional de Democratização da Mídia marcado para os primeiros meses de 2015, a criação do Fórum21 e as plenárias conjuntas de partidos de esquerda, organizações sociais e centrais sindicais são exemplos destas iniciativas.

 O próximo ano vai se desenhando para os setores avançados da sociedade brasileira como o momento de exercitar e transformar em ação política mobilizadora as iniciativas citadas anteriormente. A defesa da exploração soberana do pré-sal será um bom teste.

 Diogo Santos é graduado em Economia pela UFMG, membro da Sessão Mineira da Fundação Maurício Grabois

Fonte: Carta Maior