"Aí está a usina da crise, nesse conluio de oportunismos mesquinhos, entre aproveitadores e ambiciosos levianos do Congresso. O que foi feito da crítica moral à eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara, já como personagem de suspeitas e acusações graves? Onde foi parar a grande reação moral às explicações fraudulentas de Renan Calheiros, quando revelada sua dependência ao cofre da empreiteira Mendes Jr. e mais ilegalidades? Dos dois casos para cá, não sobrou nada de caráter nos deputados indignados e em seus dirigentes partidários para manter um pouco de dignidade na relação com seus ex-criticados?"
Os vencedores e seus aliados
Artigo de Jânio de Freitas publicado na Folha de São Paulo em 09//08/2015
Eduardo Cunha e Renan Calheiros venceram. E venceram andando no fio da navalha. Ambos merecem o reconhecimento de que se impuseram às adversidades e aos adversários. Se amanhã caírem, não será uma negação de sua vitória atual. Nem será surpresa para eles.

Em 24 horas, seus comandados estavam todos, outra vez, de braços com ele. As vestais do PSDB na Câmara perderam os escrúpulos e se entregaram a Cunha. Que se viu de braço dado ainda com PDT e PTB, até então "governistas". Condições ótimas, portanto, para acionar a pauta-bomba, como foi feito.
O que sobrou de voz adversária a Eduardo Cunha, na semana, foram dois editoriais. Mas não é Eduardo Cunha o alvo adequado de críticas à pauta-bomba e ao boicote da Câmara a medidas do "ajuste fiscal". As bombas são criadas na cabeça dele, é certo. Quem as detona, porém, são os peemedebistas de Cunha com o apoio decisivo do PSDB, secundados pelo restante da oposição. E, em certas ocasiões, também de ditos aliados do governo e até do PT.
Em artigo na Folha ("Somos todos Câmara", 7.ago), diz Eduardo Cunha: "Não sou ativador de pautas-bomba". E joga uma pequena bomba no colo dos seus companheiros de bombardeio: "As pautas são elaboradas pelo colégio de líderes". Mas também é verdade que a maioria dos líderes, a começar pelos líderes de bancadas oposicionistas, é dominada por ele. E estende a sujeição às bancadas.
Aí está a usina da crise, nesse conluio de oportunismos mesquinhos, entre aproveitadores e ambiciosos levianos. O que foi feito da crítica moral à eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara, já como personagem de suspeitas e acusações graves? Onde foi parar a grande reação moral às explicações fraudulentas de Renan Calheiros, quando revelada sua dependência ao cofre da empreiteira Mendes Jr. e mais ilegalidades? Dos dois casos para cá, não sobrou nada de caráter nos deputados indignados e em seus dirigentes partidários para manter um pouco de dignidade na relação com seus ex-criticados?
Não. Logo, merecem estar sob o comando de Eduardo Cunha e Renan Calheiros, beneficiários, porém nenhum dos dois culpado da baixeza alheia. Mas muito menos culpado é o país. E está pagando, no presente e em comprometimentos do futuro, pelo estado ensandecido que a Câmara esparge no país, e se tem chamado apenas de crise.
Pode-se perceber essa origem com clareza, se não houver o propósito preliminar de acobertar oposicionistas e a obsessão de atingir o governo. Nos últimos dias, por exemplo, a situação caótica agravou-se e a pregação de impeachment recrudesceu, com a arrogância de Aécio & cia. querendo derrubar, além da presidente, a própria Constituição em suas regras sucessórias.
O governo errou muito, em política e em economia (vale a pena: para afinal entender o que levou à crise econômica, recupere o artigo fácil e inteligente da professora Laura Carvalho na Folha de sexta 7.ago, pág. A24). Mas o que fez o governo na semana passada que agravou a situação crítica? Nada. Humildemente nada.
Houve o agravamento, no entanto. Todo ele produzido na Câmara e no Senado. Com votações antigoverno, que incluíram o exame de contas de governos passados para preparar a reprovação das contas de Dilma, caminho para o impeachment. E com a ameaça de reprovação à permanência de Rodrigo Janot, como punição à decência do seu atual mandato.
Eduardo Cunha e Renan Calheiros subjugaram parte dos adversários e inutilizaram os demais. Dois vencedores. Apesar de si mesmos.
A propósito, ou quase: antes de discutir a delação premiada, Fernando Soares, ou Fernando Baiano, dado como elo de grandes lances de corrupção envolvendo figuras do PMDB, decidiu providenciar a ida da mulher e dos filhos para os Estados Unidos. Sinal de que alguém perigoso está sob risco de revelações.
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