domingo, 30 de agosto de 2020

Portaria dos militares no Ministério da Saúde que dificulta aborto legal é inconstitucional, dizem advogados


"Ministro da Saúde não pode regulamentar procedimentos policiais, e isso virou procedimento policial", diz a advogada feminista Luciana Boiteux sobre portaria que obriga médico a reportar estupro à polícia
Jornal GGN A portaria 2282/2020, em que o governo Bolsonaro obriga os profissionais da saúde a violarem o sigilo médico reportando à polícia casos de estupro que requerem aborto legal, é inconstitucional e deve ser judicializada e anulada. É o que afirmam o criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, e a advogada feminista Luciana Boiteux, durante a live do grupo Prerrogativas deste sábado (29). O debate contou com a participação do médico Olímpio Barbosa e da ex-senadora Marta Suplicy.
Contrariando a legislação sobre aborto legal, a portaria publicada na sexta (28) no Diário Oficial da União obriga o médico a fazer uma série que questionamentos sobre o estupro à vítima durante o atendimento e a chamar a polícia. Segundo Luciana, o “ministro da Saúde não pode regulamentar procedimentos policiais, e isso virou um procedimento policial.”
“Essa portaria tem que ser anulada porque é uma ameaça aos serviços de saúde”, disse Luciana. “Tem uma questão de direito processual, administrativo e penal. Na verdade, é o contrário. Acho que os profissionais que não estão seguindo normas humanizadoras e técnicas, da ciência, é que na verdade podem estar incindindo em crime.”
Segundo o médico Olímpio Barbosa, diretor do Hospital em Recife que fez o abortamento da menina de 10 anos estuprada pelo tio no Espírito Santo, não existe no mundo “uma portaria como essa”.
Ele narrou que é inviável fazer o atendimento médico submetendo a vítima a uma nova violência, agora psicológica. Entre as perguntas, a portaria quer saber qual foi o horário do estupro, a roupa usada pelo estuprador, a altura do indivíduo, se a vítima tinha ingerido bebida alcoólica, entre outros detalhes “sórdidos”.
Na visão dos debatedores, a portaria vai aumentar o volume de abortos clandestinos no Brasil.
“Médicos podem tranquilamente descumprir essa portaria”, disse Kakay. “Esse ministro da Saúde não tem autoridade legal para fazer isso. Os advogados criminais têm de estar à disposição dos médicos. A portaria é absolutamente inconstitucional e revoga uma série de leis que já existem.”
Para Marta Suplicy, a portaria “é fruto de um mar de desconstrução de políticas públicas” que vivemos sob Bolsonaro. O “panorama geral é de retrocesso de conquistas em todas as áreas”.

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