TVGGN debate alternativas para a unificação das polícias, porém a estrutura arcaica da sistema diante da modernidade dos crimes desponta como um dos desafios
Do Jornal GGN:
Camila Bezerrajornalggn@gmail.com
As estatísticas relacionadas aos policiais militares chamam a atenção. Em 2019, mais policiais tiraram a própria vida (91) do que foram mortos em serviço (62) durante o serviço em São Paulo, o que demonstra a fragilidade da saúde mental desses profissionais diante da militarização da corporação.
Outro dado relevante é o aumento de 74% das mortes provocadas pela PM apenas no primeiro semestre de 2024, segundo ano da gestão de Tarcísio Freitas (Republicanos).
Diante deste panorama, o programa TVGGN Justiça da última sexta-feira (13) recebeu o policial federal e mestre em criminologia, Flávio Werneck, e o historiador e comunicador popular, Jones Manoel, para debater a desmilitarização e a unificação das polícias.
“Toda campanha a gente escuta o mesmo discurso “eu preciso de mais policial, eu preciso de mais viatura, eu preciso de mais arma”, sendo que o problema da segurança pública brasileira está na construção, na base do artigo 144 da Constituição Brasileira, que divide a segurança pública entre prevenção e investigação”, explica o policial federal.
Werneck explica. Quando o Banco Central faz uma investigação, ela é enviada para a PF, que vai refazer a investigação e ouvir novamente todos os envolvidos. Por fim, o Judiciário vai refazer todos os processos.
“Então, nós temos um problema de eficiência cristalizado na estrutura, e essa estrutura acabou gerando poder. Existem pessoas que se beneficiam da falta de efetividade, da falta de uma segurança pública para a sociedade brasileira”, emenda.
Um dos exemplos em que a estrutura da polícia beneficia poderosos é o chamado combate ao tráfico de drogas, em a grande maioria dos presos é preto e pobre, estereótipo de pessoas que são facilmente cooptadas para o crime. Os financiadores do tráfico, porém, nunca são detidos. E todo este cenário facilita o crescimento do crime organizado brasileiro.
“O crime organizado cresceu com a tecnologia. Ele sempre existiu no Brasil, mas hoje ele foi catapultado a uma estatura maior, porque hoje nós temos criptomoeda, hoje nós temos os meios digitais, hoje nós temos toda uma estrutura de mídias digitais sem controle algum. Você consegue tirar dinheiro do país e por dinheiro para fora, você consegue mexer com vários bancos que não são bancos, nem autorização do Banco Central têm”, continua Werneck.
“Você já tinha uma estrutura, que é uma estrutura arcaica de segurança pública, uma estrutura de segurança pública que foi feita para privilegiar certa parcela da sociedade em detrimento das demais”, emenda o policial federal.
Ineficiência
A manutenção do status quo das polícias em detrimento da necessidade da sociedade é ruim, segundo Werneck, desde 1988, tendo em vista a divisão de ações preventivas e investigativas, além de usar o inquérito policial, alto que só existe no país.
“Para homicídio, [as polícias] têm uma ineficiência de 8%, de cada 100 homicídios no Brasil, só 8 são realmente resolvidos e a pessoa cumpre pena. Então, nós temos esse claro problema no país e ninguém quer resolver, porque tem gente que ganha muito dinheiro com isso, desde pessoas que desviam dinheiro público e que desviam grandes e vultosas quantias de dinheiro, quanto as pessoas que deixam de pagar imposto, tudo isso nesse país não é punido”, pontua o especialista.
Flávio Werneck comenta ainda que, de acordo com uma tese de mestrado de um colega da Controladoria Geral da União (CGU), apenas 0,5% dos crimes de desvio de dinheiro público são efetivamente punidos no Brasil.
Modelos
Em relação à discussão sobre novos modelos de polícia, Jones Manoel lembrou que as políticas de governos estaduais progressistas não se destacaram no país, pois além de multiplicarem o encarceramento, também promoveram ações de racismo contra jovens periféricos.
“O ex-governador [de Pernambuco] Eduardo Campos (PSB), falecido, na época dele estabeleceu uma política, que eu era adolescente, eu fui vítima dessa política, que era o seguinte: botava a polícia militar para fazer blitz em ônibus que saiam das regiões periféricas em direção ao centro da cidade, para proibir jovens, principalmente negros, que saiam das periferias para chegar no centro. Então a PM parava o ônibus, mandava os jovens descer e voltarem para casa. Isso foi uma política oficial de governo. Eu fui parado quatro vezes, ali no Pernambuco, para quem conhece Recife, foi impedido de chegar no Marco Zero, no Recife Antigo. Essa era a política oficial de governo do Eduardo Campos, parte do Pacto pela Vida, e isso nunca abalou a imagem do sujeito de progressista, de democrático, por aí vai. No Brasil, infelizmente, tanto a direita como a esquerda, ninguém perde voto, ninguém perde apoio, ninguém perde prestígio por defender os racistas”, comenta o historiador.
Existem modelos de que poderiam ser adotados para melhorar a polícia, mas em vez de desmilitarização, a desmilicianização se mostra uma demanda cada vez mais urgente.
Confira o debate na íntegra:
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