quinta-feira, 28 de abril de 2022

Eduardo Bolsonaro aparece em esquema sujo de “astroturfing” e fake news usado no WhatsApp na eleição de 2018

 

Número de WhatsApp usado pelo mandato de Eduardo Bolsonaro administrava 6 grupos que participavam do ecossistema das fake news em 2018

Jornal GGN:

Eduardo Bolsonaro em plano médio, numa montagem com o símbolo do WhatsApp
Foto original: Marcelo Camargo/Agência Brasil


Um estudo publicado na prestigiada revista científica International Journal of Communication em 2022 aponta fortes indícios de participação do hoje deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL) em um esquema de mobilização social e distribuição de fake news pelo WhatsApp na eleição de 2018.

O esquema batizado de “astroturfing” foi observado pelo pesquisador Viktor Chagas, da Universidade Federal Fluminense. Chagas conseguiu associar um número de celular utilizado oficialmente pelo mandato de Eduardo Bolsonaro à participação em 22 grupos e administração de 6 grupos bolsonaristas no WhatsApp. Em grande parte, esses grupos disseminaram conteúdo classificado como “desinformação” e “proselitismo”.

Astroturfing é a estratégia de mascarar os financiadores ou a organização por trás de uma mensagem com o intuito de fazê-la parecer espontânea. Nos últimos anos, acadêmicos têm estudado o fenômeno que vem favorecendo a extrema-direita no mundo, mas quase sempre a análise é do ponto de vista conceitual. Chagas, por outro lado, propõe uma abordagem empírica, apontando um caminho ou uma ferramenta para detecção e eventual desarticulação de grupos com comportamento atípico.

Desde maio de 2018 até chegar à eleição, o pesquisador monitorou e empregou a técnica de “social network analysis” (SNA) – “análise de redes sociais”, em tradução livre – em 124 grupos bolsonaristas no WhatsApp.

Ele identificou que um usuário atrelado ao número de telefone (61) 99150-1881 participava de 22 grupos bolsonaristas – o que equivale a 17,5% da amostra – e administrava 6 destes grupos no WhatsApp. O mesmo telefone foi divulgado publicamente pelo mandato de Eduardo Bolsonaro para coletar perguntas de seguidores que seriam respondidas em vídeo.

“Durante muito tempo, o clã Bolsonaro negou envolvimento direto com esta rede. Mas Eduardo Bolsonaro estava lá o tempo inteiro, mesmo quando silenciosamente, ou quando o celular fosse utilizado apenas por agentes da campanha, ciente de todo o tipo de conteúdo que circulava nos grupos”, escreveu o pesquisador em uma postagem no Twitter, onde comenta os resultados da pesquisa.

No artigo disponível em inglês [ver anexo no final], Chagas lembra que Eduardo Bolsonaro teve encontros com Steve Bannon, um estrategista digital da ultradireita no mundo.

AS EVIDÊNCIAS CONTRA EDUARDO BOLSONARO

Além da imagem abaixo, que aparece como evidência do envolvimento de Eduardo Bolsonaro no esquema, destacado na obra acadêmica, o GGN identificou uma postagem de 2017 no Facebook, na conta oficial de Eduardo Bolsonaro, utilizando o mesmo número. Além disso, o canal de Eduardo Bolsonaro no Youtube também divulgou o número em maio de 2018, no âmbito da campanha “Dê um alô para o seu deputado Eduardo Bolsonaro”. Confira aqui e aqui.

Imagem divulgada em 2018, extraída do artigo “WhatsApp e Astroturfing Digital: Uma análise de rede social de grupos de discussão política brasileira de apoiantes de Bolsonaro”, escrito por Viktor Chagas, da Universidade Federal Fluminense

GGN verificou que o número associado a Eduardo Bolsonaro no esquema de astroturfing não parece mais estar ativo no WhatsApp. Nesta quarta-feira (27), a redação procurou a assessoria de imprensa do parlamentar por meio do gabinete em Brasília, mas ainda aguarda posicionamento.

Segundo o estudo, “os dados sugerem que Eduardo Bolsonaro foi um dos principais organizadores da astroturfing no WhatsApp durante as eleições brasileiras de 2018.”

“A presença do seu celular nesta amostra cumpre a expectativa de que a rede bolsonarista no WhatsApp também tenha sido infiltrada por agentes do campo da política profissional, apesar das repetidas negações por parte do próprio grupo”, advertiu Chagas.

“A tentativa de esconder a participação e a estrutura altamente hierárquica da rede são elementos típicos do conceptual definição de astroturfing”.

Print do canal Eduardo Bolsonaro, no Youtube, que prova a divulgação de um número de WhatsApp que, no estudo de Viktor Chagas, é responsável por administrar 6 grupos bolsonaristas

O ECOSSISTEMA BOLSONARISTA NO WHATSAPP

Analisando a dinâmica dos grupos bolsonaristas no WhatsApp, o pesquisador conseguiu identificar alguns nichos que se articulavam com objetivos ou interesses diferentes. “São grupos monárquicos, militaristas e olavistas, que constituem, num sentido amplo, a base intelectual do bolsonarismo”. Cerca de 70% do material compartilhado por este ecossistema é classificado como “desinformação e proselitismo”.

“No caso do WhatsApp, participando simultaneamente em 22 grupos de discussão política, por exemplo, se pode potencialmente chegar a mais de 5.600 usuários em poucos segundos”, aponta o artigo.

Imagens extraídas do artigo sobre astroturfind e bolsonarismo. Elas indicam as principais bandeiras que moviam os usuários, além do tipo de ação que eles realizavam, que inclui desde espalhar fake news até organizar mobilizações sociais

Os grupos “eram muitas vezes criados em série, geridos por usuários especializados, que moderaram vários grupos e ofereceram uma identidade visual personalizada. Estas características apontam para algum grau de coordenação na estrutura da rede e encaixam-se numa estratégia de astroturfing“, diz o estudo.

Grupos bolsonaristas tinham um padrão para nomes e identidade visual, evidenciando a conexão entre seus administradores

As eleições de 2018 foram marcadas pela produção e disseminação de fake news e ataques aos candidatos de esquerda, sobretudo do PT. A jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de S. Paulo, revelou um suposto esquema de financiamento empresarial irregular para sustentar essa “máquina do ódio”. O Tribunal Superior Eleitoral, porém, decidiu não cassar o mandato de Jair Bolsonaro. A família Bolsonaro rechaça reiteradamente envolvimento em esquemas no WhatsaApp e afirma que sua militância digital é puramente “orgânica”.

De acordo com o estudo sobre astroturfing e bolsonarismo, as plataformas digitais “têm focado seus esforços na moderação de conteúdo, sem olhar com a mesma eficiência como alguns grupos de usuários convergem para realizar certas ações. É aqui que o SNA [análise de redes sociais], ao contrário de outros métodos, pode ser particularmente eficaz.”











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