terça-feira, 23 de janeiro de 2024

Cúpula do Exército burla Lei para proteger Mauro Cid. Artigo de Jeferson Miola

 

'Complacência da cúpula do Exército com Mauro Cid tem um toque de astúcia', escreve Jeferson Miola


Mauro Cid
Mauro Cid (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

O Alto Comando do Exército burla Leis e normas militares com objetivo de proteger o multi-delinquente Mauro Cid.

A cúpula fardada apenas simula compromisso com a legalidade, mas na realidade atua para proteger o tenente-coronel, garantir sua impunidade e a promoção dele ao posto de coronel.

Reportagem do jornalista Cézar Feitosa com “generais ouvidos [em off] pela Folha” relata que “a cúpula do Exército espera que o Ministério Público Federal apresente denúncia contra o tenente-coronel Mauro Cid antes de abril”.

Segundo esta versão militar, caso Mauro Cid não seja declarado réu pela justiça civil até o dia 30 de abril, não haverá nenhum impedimento para o ascenso dele na carreira. “Pelas regras atuais, Cid poderia ser impedido de concorrer à promoção caso se tornasse réu na Justiça”, alegam.

No fundo, o Alto Comando trabalha pela impunidade de Mauro Cid, do mesmo modo como procede em relação a todos oficiais e militares implicados em diversos crimes, ilícitos, desvios, esquemas de corrupção e, claro, nos atendados contra o Estado de Direito.

É preciso lembrar que os militares continuam impunes e praticamente impuseram uma anistia tácita a si próprios. Desde os atentados de 8 de janeiro, há mais de um ano, apenas três militares foram julgados.

Um deles, o coronel da reserva Adriano Camargo Testoni, participante ativo da depredação do Palácio do Planalto, foi punido apenas com um mês e 18 dias de prisão. E em regime aberto. A punição, no entanto, não foi pela participação dele na invasão do Planalto, mas por ter xingado seus superiores que não providenciaram a intervenção militar.

O caso dos outros dois militares que o Comando do Exército alega terem sido condenados por participação no 8 de janeiro também é outro deboche.

Um deles pegou três dias de prisão, e o outro foi “punido” com advertência. É um absoluto disparate em relação à condenação a mais de 17 anos imposta pelo STF a extremistas pelos crimes de ameaça de deposição violenta do governo e de abolição do Estado de Direito.

A complacência da cúpula do Exército com Mauro Cid é tão ou mais vergonhosa que nos casos acima citados. E tem um toque de astúcia.

Os comandantes cruzaram os braços no caso, prevaricam e apostam na lentidão do judiciário para responsabilizarem a justiça civil pela impunidade que, no fundo, eles programaram para safar Mauro Cid de condenações.

Mauro Cid é um réu confesso. Ele fez delação premiada e assumiu os crimes cometidos. Isso seria suficiente para o Comandante do Exército, o Ministério Público Militar e a Justiça Militar instaurarem inquéritos criminais e levarem-no a julgamento.

Apesar disso, contudo, a cúpula do Exército aguarda providências do MPF “antes de abril”, o que é no mínimo acintoso.

De acordo com o Decreto-Lei nº 3038/1941, Mauro Cid está sujeito à declaração de indignidade para o oficialato devido à prática, pelo menos, de crimes que ele próprio confessou: de peculato, no caso do roubo de jóias e bens da União para contrabando e venda nos EUA [inciso IV do artigo 1º]; e de falsidade documental, na falsificação das carteiras de vacinação para si, família e para Bolsonaro [inciso VII].

É da competência do Ministério Público Militar promover a declaração de indignidade ou de incompatibilidade para o oficialato [inciso II do artigo 116 da Lei Complementar nº 75/1993].

No artigo 7º, o Decreto-Lei 3038 dispõe que “uma vez declarado indigno do oficialato, ou com ele incompativel, perderá o militar seu posto e respectiva patente, ressalvada à sua família o direito à percepção das suas pensões, como se houvesse falecido” – o morto ficto, invento sui generis dos militares para preservar esta imoralidade a que nenhum servidor público civil ou trabalhador comum faz jus.

Essa situação absurda evidencia que o Superior Tribunal Militar, o Ministério Público Militar e os demais órgãos da justiça militar são excrescências remanescentes da ditadura que devem ser extintas, pois servem para proteger os maus militares que cometem crimes.

O ministro da Defesa José Múcio Monteiro tem a obrigação legal de agir. Caso permita que a cúpula do Exército continue prevaricando para proteger Mauro Cid, estará validando como critério valorizado para o ascenso na carreira militar aqueles militares com trajetória delinquencial, que passam em revista o Código Penal brasileiro.


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