Rompendo a melodia ufanista em torno do juiz Sérgio Moro e da Força-Tarefa do Ministério Público, diz que "alguns procuradores" fazem uma "oposição totalitária fascista", sublinhando, numa observação que ajuda a entender a gravidade do que ocorre hoje, que o "clima emocional" do país "está muito propício a esse modo de lidar". Paulo Moreira Leite
Segue texto de Paulo Moreira Leite extraído do Brasil 247:
PSDB finge que não ouviu Lara Resende
Depois de ler as opiniões do economista André Lara Resende sobre a Operação Lava Jato, proferidas numa conferência em Nova York e registradas pela correspondente Taís Bilenky, da Folha, convém perguntar o uso que o PSDB e o DEM pretendem fazer delas. A pior atitude seria fechar os olhos, tapar os ouvidos e a boca, como têm feito até aqui.
Um dos mais influentes cérebros do mercado financeiro, interlocutor frequente de Fernando Henrique Cardoso, Lara Resende aponta para um cenário de tragédia política e econômica no horizonte. Diz que impeachments sempre são "traumáticos" e que o afastamento de Dilma Rousseff deve ser evitado. Não é só.
Enquanto o Ministério Público faz campanha para transformar a corrupção em crime hediondo, Lara Rezende deixa claro que os indícios de corrupção "sistêmica" no país colocam a necessidade de se discutir uma pacificação entre as partes -- e não a lógica da vingança e do conflito.
Lembrando o valor insubstituível de uma vida humana, vai um pouco mais fundo na crítica a campanha do MP. Faz questão de dizer que não acha corrupção "mais grave que assassinato."
Rejeitado a noção de que o remédio infalível para mais crimes é mais punição, ele disse: "Minha impressão é que, quando você tem uma crise como a que temos no Brasil, a forma que podemos usá-la para provocar uma mudança é dizer: Vamos começar do zero, vamos superar o passado", diz Lara Resende.
Rompendo a melodia ufanista em torno do juiz Sérgio Moro e da Força-Tarefa do Ministério Público, diz que "alguns procuradores" fazem uma "oposição totalitária fascista", sublinhando, numa observação que ajuda a entender a gravidade do que ocorre hoje, que o "clima emocional" do país "está muito propício a esse modo de lidar".
Em resposta ao questionamento de uma estudante, Lara Rezende cita a "Mani pulite", que investigou esquemas de corrupção na Itália, nos anos 1990. Seu balanço: "Deixou o país completamente desmantelado, causou o colapso dos dois principais partidos e o que veio depois? [O ex-premiê Silvio] Berlusconi."
Cabe registrar que nenhuma observação de Lara Resende ganharia o prêmio de originalidade nos debates sobre a Lava Jato. Nem é isso o que importa.
O importante é sublinhar um ponto. Críticas que até há pouco eram descartadas como pura invenção de aliados do governo começam a ser reconhecidas como verdade por vozes que se encontram do lado oposto do espectro político.
Lara Resende é um adversário assumido e rigoroso das principais linhas de política econômica implantadas no país a partir de 2003. Não custa lembrar que, como presidente do BNDES, esteve a frente dos programas de privatização de estatais no governo FHC.
Não é preciso concordar com a visão de mundo de André Lara Resende – a quem fiz críticas duras neste espaço ao longo da campanha de 2014 – para reconhecer o valor de sua conferência. Ela ocorre num momento em que o país se encontra às voltas com permanentes demonstrações de desonestidade intelectual, que ajudam a alimentar uma crise em larga medida artificial.
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