Entidades judaicas também repudiam ato de apoiadores fanáticos de Bolsonaro.
Embaixador alemão no Brasil condena uso de símbolos nazistas
Gesto que lembra saudação nazista feito por “manifestantes claramente de extrema direita” em Santa Catarina é um ataque à democracia, diz Heiko Thoms.
O embaixador da Alemanha no Brasil, Heiko Thoms, condenou nesta quinta-feira (03/11) o uso de símbolos que remetam ao nazismo e ao fascismo. Ele se referia à cena vista em Santa Catarina em que manifestantes bolsonaristas fizeram um gesto que lembra a saudação nazista.
“O uso de símbolos nazistas e fascistas por ‘manifestantes’ claramente de extrema direita é profundamente chocante. Apologia ao nazismo é crime!”, escreveu Thoms no Twitter.
“Não se trata de liberdade de expressão, mas de um ataque à democracia e ao Estado de direito no Brasil. Esse gesto desrespeita a memória das vítimas do nazismo e os horrores causados por ele”, completou o embaixador alemão.
A saudação nazista, usada por apoiadores de Adolf Hitler nos anos 1930 e 1940, consiste num cumprimento com o braço direito estendido com a palma da mão voltada para baixo, acompanhado das palavras “Heil Hitler” (“salve Hitler”) ou “Sieg Heil” (“salve a vitória”). O gesto é proibido na Alemanha e passível de multa ou até cinco anos de prisão.
Na quarta-feira, apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) que participavam de um bloqueio ilegal na rodovia SC-163, em São Miguel do Oeste (SC), foram filmados cantando o hino nacional e fazendo o gesto que lembra a emblemática saudação hitlerista.
O caso, que ocorreu em frente ao 14º Regimento de Cavalaria Mecanizado, base do Exército na cidade, é investigado pelo Ministério Público de Santa Catarina.
Entidades condenam
Entidades foram rápidas em condenar o ato em Santa Catarina, que faz parte de uma série de manifestações de cunho golpista realizadas por apoiadores de Bolsonaro em estradas do país. O objetivo dos bloqueios é contestar o resultado das eleições, que deram vitória a Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A Embaixada de Israel disse rejeitar “qualquer forma de referências nazistas no Brasil e em geral”. “Estamos preocupados com esse fenômeno aqui e contamos com as autoridades competentes para que tomem as providências necessárias para acabar com esse tipo de atos ultrajantes”, afirma em comunicado.
O Museu do Holocausto no Brasil também condenou o acontecido. “Estética e contexto (social e histórico) deveriam ser suficientes para que não precisássemos nos deparar com cenas ofensivas como estas. A tentativa de associar esse gesto ao juramento à bandeira é mais um ultraje [sobre] que a Justiça e a educação antifascista precisarão se debruçar”, disse a instituição.
Já a Confederação Israelita do Brasil (Conib), principal representante da comunidade judaica brasileira, disse no Twitter repudiar os gestos, que descreveu como “repugnantes”: “As imagens […] precisam ser investigadas e condenadas com veemência pelas autoridades e pela sociedade como um todo. O nazismo prega e pratica a morte e a destruição.”
“A sociedade brasileira não pode tolerar posturas como essa. Fazer esse gesto vestindo camisa da seleção brasileira é também uma ofensa às nossas Forças Armadas, que lutaram bravamente contra as forças nazistas na Europa durante a Segunda Guerra Mundial.”
Por sua vez, o Instituto Brasil-Israel declarou: “O uso da saudação nazista é uma das consequências da normalização de símbolos fascistas e nazistas ao longo dos últimos anos. Nada é por acaso. Assusta, mas não surpreende.”
Investigações em andamento
O ato está sendo investigado pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC). O Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco) de São Miguel do Oeste, que faz parte do MPSC, informou que uma apuração para identificar quem fez a saudação nazista está em andamento.
No entanto, a corporação antecipou que, segundo uma investigação preliminar, os manifestantes na cidade catarinense não tiveram intenção de apologia ao nazismo. Segundo o Gaeco, não há evidências de prática de crime, “embora a atitude seja absolutamente incompatível com o respeito exigido durante a execução do hino nacional”. Mas as investigações continuam.
O caso também está sendo acompanhado pelo Núcleo de Enfrentamento a Crimes Raciais e de Intolerância (Necrin).
Presença do nazismo em Santa Catarina
Alusões ao nazismo não são novidade em Santa Catarina – nem em São Miguel do Oeste. Em 20 de outubro, a Polícia Civil do estado prendeu seis suspeitos de integrarem um grupo neonazista na cidade e em outros municípios catarinenses, incluindo Florianópolis.
As prisões ocorreram no âmbito da operação Gun Project, que também apreendeu livros, símbolos e bandeiras que faziam apologia ao nazismo. Segundo a Polícia, o grupo, que se intitulava como “Nova SS de SC”, treinava como usar armas de fogo e chegou a conversar sobre perpetrar ataques contra moradores de rua.
Dias depois, suásticas e frases de cunho antissemita e misógino foram encontradas nos banheiros da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Outra personalidade controversa do estado é o professor de história Altair Reinehr, pai da deputada federal e atual vice-governadora catarinense Daniela Reinehr (PL). Ele é conhecido por defender ideias neonazistas e por negar o genocídio de judeus durante a Segunda Guerra Mundial. Suas ideias foram expostas em textos em que ele relativiza o nazismo e teriam sido propagandeadas até mesmo em sala de aula.
Junto a um desses artigos, Altair publicou uma foto dele em frente à casa onde nasceu Adolf Hitler, em Braunau am Inn, na Áustria. No texto, ele se queixa de que, na Alemanha, “é proibido falar bem de Hitler” e “lembrar obras reconhecidamente positivas”.
“Nas escolas dos países europeus, não se ensina a conhecer o governo de Hitler, nem o que era o nacional-socialismo, mas ensina-se a odiar ambos. E tudo isso em nome da democracia, da verdade e da ‘liberdade de expressão'”, reclama o professor.
No mesmo texto, Reinehr exalta supostas realizações positivas do ditador nazista e reclama por a “história oficial” considerá-lo o causador da Segunda Guerra, “o que cada vez mais está sendo questionado por historiadores de renome de diferentes países”.
Altair também testemunhou a favor de Siegfried Ellwanger Castan (1928-2010), proprietário da editora Revisão, notória por publicar livros negacionistas do Holocausto e literatura antissemita. Castan foi condenado por racismo pelo Supremo Tribunal Federal em 2000.
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