quinta-feira, 11 de setembro de 2025

Os dois pessos e duas medidas de Luiz Fux no julgmaneto da ORCRIM de Jair Bolsonaro

 

 O voto do ministro Luiz Fux no julgamento do núcleo político da tentativa de golpe de 8 de janeiro trouxe à tona uma contradição que ressoa fortemente entre juristas e políticos. De um lado, Fux acompanhou a maioria do Supremo Tribunal Federal e ratificou mais de 400 condenações de invasores da sede dos Três Poderes, aplicando penas severas e reafirmando a gravidade das condutas de quem participou diretamente da destruição do patrimônio público e das agressões às instituições. De outro, ao se debruçar sobre o núcleo político da trama, que teria articulado o movimento, Fux surpreendeu ao adotar um discurso garantista e absolver a maior parte dos chefes, incluindo Jair Bolsonaro e ex-ministros de seu governo.

Do ICL Notícias:


POLÍTICA

DOIS PESOS E DUAS MEDIDAS

Fux absolve tubarões e condena bagrinhos



Por Cleber Lourenço

O voto do ministro Luiz Fux no julgamento do núcleo político da tentativa de golpe de 8 de janeiro trouxe à tona uma contradição que ressoa fortemente entre juristas e políticos. De um lado, Fux acompanhou a maioria do Supremo Tribunal Federal e ratificou mais de 400 condenações de invasores da sede dos Três Poderes, aplicando penas severas e reafirmando a gravidade das condutas de quem participou diretamente da destruição do patrimônio público e das agressões às instituições. De outro, ao se debruçar sobre o núcleo político da trama, que teria articulado o movimento, Fux surpreendeu ao adotar um discurso garantista e absolver a maior parte dos chefes, incluindo Jair Bolsonaro e ex-ministros de seu governo.

A diferença de postura chama a atenção não apenas pelo contraste entre as duas situações, mas também pela seletividade dos argumentos. Quando julgou os invasores, o ministro não levantou dúvidas sobre a competência do STF, não reclamou da quantidade de provas nos autos e não alegou qualquer nulidade processual.

Pelo contrário: defendeu a dureza das penas e a responsabilização exemplar dos envolvidos. Já no julgamento dos líderes, apresentou uma leitura distinta, alegando cerceamento de defesa, excesso de provas que prejudicaria a análise adequada do processo e a necessidade de rever a competência da Corte para julgar tais casos.

Na prática, Fux pediu a condenação de apenas dois dos acusados: Mauro Cid e Walter Braga Netto, ambos pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, e ainda assim com penas menores do que as aplicadas aos invasores de base. Todos os demais integrantes da cúpula política foram absolvidos.

Pesos

Ministro Alexandre de Moraes observa Luiz Fux durante o voto. Foto: STF

Fux chegou a pedir a anulação do processo, rejeitou o enquadramento em organização criminosa e optou por reclassificar os fatos como mero concurso de agentes. A justificativa, no entanto, não se sustenta diante de dois fatores fundamentais: primeiro, porque o Supremo já reafirmou reiteradas vezes a sua competência para julgar os casos relacionados ao 8 de janeiro; segundo, porque o próprio Fux havia votado favoravelmente às condenações de centenas de réus, sem contestar a competência nem apontar nulidades de defesa.

Ao citar o chamado “caso Débora” como exemplo de sua evolução de entendimento, o ministro buscou sustentar que já teria manifestado preocupação com a competência do STF em outros momentos. Mas a comparação não se sustenta.

Naquele episódio específico, seu voto reconheceu a incompetência apenas em um contexto restrito, e depois o próprio Fux voltou a aceitar a competência da Corte em processos subsequentes relacionados ao mesmo tema. A evocação desse caso, portanto, soou mais como um recurso retórico do que como um fundamento jurídico sólido.

O que torna essa guinada ainda mais estranha é o histórico do ministro. Luiz Fux sempre foi identificado como um magistrado punitivista. Em diversas ocasiões, defendeu o endurecimento das penas, negou habeas corpus mesmo em situações de furtos insignificantes e foi contrário à aplicação de teses mais protetivas ao réu. Sua trajetória construiu a imagem de um julgador rigoroso, alinhado à linha dura do Direito Penal. Agora, ao analisar os chefes da trama golpista, surge um Fux garantista, preocupado com a defesa e com os limites da competência da Corte — uma postura que destoa de sua biografia judicial.

O jurista Dimitri Sales, em entrevista ao ICL Notícias, destacou esse comportamento seletivo e o classificou como casuísmo:

“Não se surpreenda se no próximo julgamento de matérias penais o ministro Fux volte a ser punitivista, severo. Não se surpreenda. O fato é que a gente está diante de um processo histórico que terá consequências muito enraizadas para a própria história do Brasil. (…) Esse casuísmo, de alguma forma, faz com que a gente se surpreenda com o punitivista sendo o maior de todos garantistas. O ministro alega cerceamento de defesa, mas os atos processuais estiveram de acordo com os prazos da legislação. Portanto, ele cria um argumento que é político e não jurídico, que reforça a atuação das milícias digitais e da extrema direita para transformar o processo em debate político, não jurídico.”

A fala de Dimitri reforça o ponto central: não se trata de uma evolução jurisprudencial consistente, mas de um uso seletivo dos princípios jurídicos, que mudam conforme o réu que está no banco dos acusados. Essa seletividade enfraquece a legitimidade da decisão e abre espaço para leituras políticas, em vez de jurídicas, em um processo que deveria marcar a defesa das instituições democráticas. Justamente o que Fux diz combater.

Esse duplo padrão alimenta críticas sobre a atuação do Supremo e compromete a percepção pública sobre a imparcialidade das decisões.

Ao condenar os que invadiram, mas absolver a maioria dos que planejaram, o ministro Luiz Fux acabou por criar um contraste que se tornará referência obrigatória nos debates sobre o julgamento histórico do 8 de janeiro.

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