A eleição de Barack Obama definiu duas formas de atuação política na rede. De um lado, o Partido Republicano adotando o estilo Steve Bannon, com o apoio central da Fox News. A emissora criava as notícias falsas e as redes sociais se incumbiam de disseminar. A reação do Partido Democrata se deu através da militância digital.
Ambos os lados perceberam ter em mãos um instrumento para tentar influenciar a política em outros países.
A primeira tentativa de instrumentalizar as redes deu-se em torno da participação de hackers russos na campanha que elegeu Donald Trump. Um blog de pouca penetração apareceu com supostos estudos acadêmicos tentando comprovar que o alcance da campanha foi centenas de vezes maior do que o que se percebia.
Seu trabalho foi apresentado a diversos veículos da mídia norte-americana, e apenas um deu guarida: o Washington Post, que acabara de ser adquirido por Jeff Bezos, o dono da Amazon. A decisão do jornal foi duramente criticada pelos demais veículos, por se tratar de um trabalho direcionado e falho.
Mesmo assim, foi a brecha que precisava o Congresso para enquadrar as redes sociais. Zuckerberg foi convocado a uma sessão pesada. Saiu de lá direto para o Atlantic Council, um think tank ligado ao Estado profundo norte-americano – integrado por membros do Departamento de Estado, potentados árabes, empresas com problemas de reputação e procuradores gerais de países atrasados, como foi o caso de Rodrigo Janot, do Brasil. Foi o principal estimulador da Lava Jato e dos primeiros movimentos da sociedade civil, bancados pelos bilionários do Partido Democrata, como o Viva Rio.
O Atlantic Council foi contratado para definir uma estratégia para Zuckerberg. Consistiu na tentativa de montar uma rede mundial de agências de checagem, reunidas em torno de uma associação.
Tempos depois, blogueiros independentes levantaram os dados técnicos do tal blog e constataram que era um domínio de propriedade do próprio Atlantic Council.
A intenção inicial era barrar a disseminação de notícias de esquerda. Os bilionários financiavam diversas ONGs e portais noticiosos, muitos deles com reportagens proveitosas sobre abusos a direitos humanos, mas sem estabelecer vínculos com o modelo econômico e a financeirização.
Por isso, na fase inicial – quando as “primaveras” prosperavam por todos os cantos – os grandes adversários a serem combatidos eram os blogs enquadrados como de esquerda.
Os ecos desse modelo chegaram ao país. Primeiro, através de uma pesquisa de um professor da Universidade de São Paulo, Pablo Ortellado, contratado pela revista Veja – através da Agência Pública -, para um trabalho de identificação de blogs radicais. Ele colocou no mesmo nível blogs de ultradireita, conhecidos por espalhar fake news, com os principais blogs críticos da mídia. O trabalho de Ortellado foi apresentado pela Veja em um seminário para o mercado publicitário, resultando no bloqueio de publicidade para esses portais.
O próprio Ortellado teve papel dúbio nas manifestações de 2013, tornando-se uma espécie de mentor dos black blocs – o grupo violento, cujas ações visavam claramente desmoralizar os movimentos iniciais, de cunho progressista, jogando o movimento nas mãos da direita.
O passo seguinte foi montar, no Brasil, uma associação de agências de checagem, para se integrar à rede proposta pelo Atlantic Council. A rede foi constituída apenas por agências de checagem da mídia corporativa e de portais alinhados politicamente.
A primeira jogada pesada foi quando o Papa Francisco mandou um terço bento para Lula, já preso em Curitiba. Uma das agências denunciou dois portais de esquerda por fake news. Se não fosse verdade, no mínimo seria uma barriga, jamais uma fake news – a notícia falsa com intenção de promover ódio. Imediatamente foram bloqueados pelo Facebook. Dias depois, o próprio Papa confirmou o envio do terço e a trama se desfez.
Tempos atrás, o Congresso pressionou novamente as big techs, em uma sessão dura.
Agora, com a vitória de Trump, há a revanche de Zuckerberg, inaugurando oficialmente a nova etapa da globalização: a ditadura das big techs, como extensão do poder norte-americano.
Nunca é demais lembrar que, até se tornar uma ameaça mundial, Hitler e Mussolini foram apoiados por forças econômicas norte-americanas, que viam no nacionalismo exacerbado uma maneira de enfraquecer o movimento sindical e a ameaça das esquerdas
O governo federal gasta todos os meses um total de R$ 59.448,61 mil com pagamentos de salários para dois oficiais do Exército acusados pelo assassinato e ocultação do cadáver do ex-deputado federal Rubens Paiva, em janeiro de 1971. Além disso, a União também paga um total de R$ 80.793,40 em pensões para oito familiares de outros três réus apontados pelo homicídio de Paiva que morreram nos últimos anos. Os dois valores somados chegam a um gasto mensal de R$ 140.242,01.
Os militares foram denunciados pelo MPF (Ministério Público Federal), em 2014, mas até o momento não houve julgamento e três deles já morreram. Os acusados são José Antonio Nogueira Belham, Rubens Paim Sampaio, Jurandyr Ochsendorf e Souza, Jacy Ochsendorf e Souza e Raymundo Ronaldo Campos. Os oficiais foram denunciados por homicídio doloso qualificado, ocultação de cadáver, fraude processual e quadrilha armada, conforme documento de maio de 2014.
Os dois militares acusados pelo crime e que estão vivos são major reformado Jacy Ochsendorf e Souza e o general reformado José Antônio Nogueira Belham. O major recebe R$ 23,4 mil e o general R$ 35,9. Só de gratificação natalina o general recebeu, no ano passado, um total de R$ 17,9 mil.
Os tenentes-coronel Rubens Paim Sampaio e Jurandyr Ochsendorf e Souza, e, ainda, o general reformado Raymundo Ronaldo Campos faleceram depois do início do processo e deixaram oito familiares como pensionistas. O pagamento, no caso desse grupo, é previsto em lei desde 1960, apesar de ser bastante polêmico e alvo de críticas.
A Justiça Federal do Rio de Janeiro aceitou a denúncia na época e abriu processo contra eles. O Tribunal Regional Federal da 2ª Região confirmou a instauração da ação penal em setembro de 2014. Foi a primeira vez que foi instaurada no Judiciário brasileiro uma ação penal contra militares por um homicídio ocorrido na ditadura militar. No entanto, um recurso dos militares feito ao STF pausou o caso logo depois e ainda aguarda julgamento, dez anos depois.
A atriz fernanda torres venceu o internacional Globo deOouro de melhor atriz de drama. O Globo de Ouro é considerado pela crítica o mais importante prêmio cinematográfico existente pois considera obras muito mais valiosas para o cinema do que o Oscar
CESAR CALEJON é jornalista e EDUARDO MOREIRA é apresentador do ICL Notícias. Eles vão bater um papo sobre uma possível “guerra civil” na direita brasileira. O Vilela já disse que, se houver guerra civil, ficará do lado do Capitão América.
O importante é quebrar paradigmas, pensar fora da caixa, ser um creative developer, um profissional do design thinking, visionário e disruptivo, um criador de soluções que subvertam o senso comum. Em outras palavras: o dinheiro e o valor atribuído a ele, juntamente com a bolsa de valores, juros e os grandes bancos não passam de invenções humanas relacionadas ao capitalismo que servem para nos distrair do nosso imenso vazio existencial.
Cidades brasileiras viverão neste fim de semana manifestações contra as queimadas. Por que construir um movimento climático é vital para o futuro do país e do planeta. Como ele pode enfrentar o agronegócio e sua aliança com o governo
Publicado 20/09/2024 às 19:32 - Atualizado 23/12/2024 às 17:33
Foto: Zdf.de
As queimadas, cuja fumaça só poupou uma capital brasileira, Teresina, e as enchentes, que destruíram boa parte da região de Porto Alegre, estão mostrando, nesse ano de 2024, que as mudanças climáticas já se tornaram um grande problema para o povo brasileiro e caminham para se tornar o maior desafio já enfrentado pelo Brasil. Elas conectam diretamente as grandes cidades do país, onde vive a imensa maioria da população, 85% dela urbana, à necessidade de preservação do Cerrado, do Pantanal e da Amazônia.
97% dos brasileiros aceitam que as mudanças climáticas existem e 78% avaliam que elas têm causas humanas, um dos maiores índices do mundo. Talvez isso seja resultado de um aprendizado prático nas condições de existência: 5.233 municípios brasileiros (94% do total de 5.565) tiveram emergência ou calamidade decretadas entre 2013 e 2023, principalmente por chuvas e cheias torrenciais, deslizamentos ou secas prolongadas. Mas quando perguntadas sobre quem são responsáveis, a maioria das pessoas responde com termos genéricos como “os homens” ou “os seres humanos”. Porém, diferente de muitos outros países, onde as consequências do aquecimento global parecem resultado de processos sistêmicos mais distantes (principalmente pelo uso dos combustíveis fósseis), no Brasil temos uma interação entre os biomas e o clima (e um monitoramento por satélite dos incêndios) que nos permite obter o CPF e o RG dos grandes interessados e responsáveis pelos incêndios.
Temos o CPF e o RG dos responsáveis
São os ruralistas, o segmento da classe capitalista vinculado ao controle de terras, um grupo numericamente insignificante da população, mas que vertebra o poder no país. Eles lidam com os territórios que conquistam como enxames de gafanhotos em guerra contra a terra, explorando-a até esgotar sua capacidade produtiva e depois se deslocando para outras regiões onde reproduzem o mesmo processo. Eles vertebram o bloco social de raízes agrárias que dominou com mão de ferro o Brasil até 1930, quando foram então parcialmente deslocado do centro do Estado, mas voltaram a controlar o poder depois de 1990, desindustrializando o país e voltando a colocá-lo no mundo, em grande medida, como uma grande fazenda.
Os ruralistas estão articulados com o setor financeiro e são coadjuvados, na predação dos territórios e do clima, pelos envolvidos em setores como a produção e uso de combustíveis fósseis, a mineração e por seus representantes políticos, agentes ideológicos e gestores estatais. Como proprietários ausentes, alimentam, nas grandes cidades, booms imobiliários especulativos, que desfiguram o tecido urbano. Aliados com pastores neopentecostais, vertebram a vaga neofascista que vive o país.
A classe dominante agrária se estabeleceu no Brasil com base no escravismo e no controle do acesso à terra (formalizado pela Lei de Terras de 1850), depois em formas diversas de trabalho compulsório, para finalmente adotar o assalariamento, mantendo sempre a violência para o controle social. Ainda hoje são comuns as denúncias de uso de trabalho similar ao escravo. Seu outro alicerce foi e é a predação ambiental. Observamos isso quando olhamos para a Mata Atlântica, que ocupava 1,3 milhões de quilômetros quadrados (15% do território) e da qual restam hoje fragmentos, boa parte destruída pelo já no século XX. A agropecuária hoje repete o processo no Cerrado, na Amazônia e no Pantanal.
O ruralismo produtor de commodities (soja, cana, carne, café) repõe, a cada momento histórico, o que Caio Prado chamou de “o sentido da colonização”, produzindo riquezas para o mercado mundial às custas do saque interno da natureza e do trabalho humano. Isso se distingue da agricultura produtora de comida, voltada para o mercado interno, quase toda produzida pelo campesinato e pela agricultura familiar, ambientalmente muito mais responsável. As commodities são parte da alimentação apenas indiretamente, fornecendo insumos para a “junkie food” ultraprocessada. A pecuária tem, nessa cadeia, a particularidade de ser também o principal mecanismo de grilagem de terras e vetor de desmatamento no Bioma Amazônico, para onde se desloca a fronteira agrícola.
A agropecuária produtora de commodities destroi imensas parcelas do território tão somente em benefício próprio, tendo sempre se oposto à construção nacional. É por responsabilidade dela que, ao contrário do discurso vigente, o Brasil não é uma vítima detentora de uma dívida climática para com o Norte. Esse discurso só leva em conta as emissões industriais; somos, ao contrário, o quarto maior emissor acumulado de carbono depois de 1850 devido ao desmatamento – atrás apenas dos EUA, da China e da Rússia, segundo o levantamento da Carbon Brief. Ou alguém acha que a destruição da enorme Mata Atlântica, do Cerrado e de parte da Amazônia pelo ruralismo brasileiro não jogou e continua jogando bilhões de toneladas de carbono na atmosfera; ou que o rebanho bovino brasileiro, maior que a população do país, não constitui um passivo ambiental gigantesco? Se tomarmos a sério a dinâmica do colapso ambiental em curso, o ruralismo brasileiro é, junto com os produtores de petróleo e carvão, um dos vilões maiores do clima do planeta, um dos grandes inimigos da humanidade.
A dinâmica global-local da emergência climática
O aquecimento global evidenciou, desde junho de 2023, um salto de qualidade, produzindo consequências por todas as partes do planeta. Uma boa síntese das conclusões dos cientistas tem sido apresentada por Johan Rockstrom em suas conferências recentes, como em “Os pontos de virada da mudança climática – e onde estamos” (disponível com legendas em português). O aquecimento global está se acelerando: de 0,18° por década passou, depois de 2010, para 0,26° por década. Vamos, certamente, ultrapassar o aquecimento de 2° acima da temperatura pré-industrial antes de 2050, talvez atingindo 2.5°. Entre nós, Carlos Nobre tem reproduzido o mesmo diagnóstico. A grande aceleração capitalista extrapolou as fronteiras naturais do planeta e aponta para a ruptura, nos próximos anos, de vários “tipping points” decisivos do Sistema Terra. A crise da civilização capitalista ganha contornos dramáticos: guerras, crise social, deslocamentos de população e fascismo acompanham o colapso climático, inclusive a possibilidade de colapso da Amazônia O destino da Floresta Amazônica, que as pesquisas de Luciana Gatti mostra que está se tornando uma emissora de carbono, é uma questão candente para toda a humanidade.
O clima perdeu a estabilidade relativa que teve nos últimos dez mil anos (o período Holoceno). Tornou-se, no Antropoceno, o resultado da disputa entre a destrutividade do capitalismo extrativista e fossilista, que ameaça a biosfera do planeta, e as forças sociais que buscam uma alternativa que hoje não pode deixar de ser qualificada como ecossocialista. É, cada vez mais, o vetor resultante da luta civilizatória da vida contra a morte, travada pelos povos sempre no terreno local, mas que se projeta no espaço nacional e global. Não há hierarquias rígidas e, embora alguns territórios sejam decisivos para toda a humanidade (como, no nosso caso, a Floresta Amazônica) ou para um país (como o Cerrado, a caixa d’água do Brasil, e o Pantanal, fonte de biodiversidade única), as escalas são muito variáveis, dependendo das condições ecológico-territoriais, sócio-econômicas e políticas. Um programa ecossocial tem que envolver múltiplos atores e situações, alianças e encadeamentos de transição.
O problema não está apenas no campo, mas também nas cidades, que estão se transformando em ilhas de calor infernais. O expansionismo do setor imobiliário nas cidades intensifica o calor, destroi as áreas verdes e recusa toda ideia de esponjas urbanas. Uma cidade como São Paulo é de 5 a 10 graus mais quente que as regiões de vegetação da Mata Atlântica remanescente ao redor. Os grandes empreendimentos imobiliários são a contrapartida urbana da irresponsabilidade do agronegócio no campo.
O engajamento na disputa política se dá, assim, em múltiplas dimensões, inclusive a global. As cláusulas ambientais no comércio internacional são um instrumento de pressão imprescindível contra o comportamento criminoso de inúmeros setores econômicos. A pecuária brasileiro é exemplar de um setor que precisa ser enquadrado por estruturas políticas muito mais fortes que as do governo brasileiro. Ela não aceita rastrear a origem do gado cuja carne é exportada porque grande parte dele é criado ilegalmente na Amazônia desmatada e depois levado para estados de outras regiões para abate. A União Europeia está implementando, a partir de 2025, uma lei contra o desmatamento que afetará as importações de commodities como carne e soja – as mais destrutivas para o meio ambiente brasileiro. Segundo o Itamaraty e o Ministério da Agricultura, que protestam contra a legislação junto às autoridades europeias, ela deve afetar 30% das exportações do setor para a Europa. Por outro lado, o Observatório do Clima defendeu, corretamente, que a Europa inicie a fiscalização já no início do próximo ano. É só o início de uma pressão que todos nós devemos procurar fazer crescer de forma exponencial.
Construir as alianças, focalizar o inimigo, aproveitar as oportunidades
As queimadas atuais têm um forte componente de incêndios criminosos por parte do agronegócio. Como afirma Luciana Gatti, a Floresta Amazônica está sendo assassinada e sabemos por quem. Os focos de incêndio no Pantanal e nos canaviais paulistas também têm CPF e RG. Desde a promulgação do Novo Código Florestal sob o governo Dilma, em 2012, assistimos uma ofensiva crescente do setor contra todos os mecanismos de limitação de suas atividades e proteção da natureza. Do uso de todo tipo de agrotóxico banido na Europa à atual ofensiva de flexibilização da legislação que conseguimos manter, passando pela porteira para a boiada de Salles e Bolsonaro, a maioria venal do Congresso é uma máquina para referendar a destruição dos biomas brasileiros.
Como afirma Luiz Marques em uma recente entrevista ao site O joio e o trigo, “O agronegócio é o grande problema do Brasil. Se ele não for extirpado, o Brasil não tem a mais remota chance de viabilidade como sociedade e como natureza. É uma atividade social basicamente criminosa e predadora. E eles controlam o Congresso Nacional por meio da frente parlamentar da agropecuária e têm como aliados, inclusive, as bancadas da Bíblia e da bala. Então, o Brasil está numa situação muito clara: ou nós reagimos a isso, com uma ruptura muito vigorosa em relação a esse processo ou nós não temos nenhuma chance de sobrevivência como sociedade”.
Isso pode parecer uma missão impossível. Mas quem, vendo o Brasil no ano de 1928, imaginaria que, cinco anos depois, a oligarquia cafeeira teria sido derrubada do poder no estado central? Como lembra Chico de Oliveira no seu Ornitorrinco, a possibilidade de mudanças estruturais nas sociedades da periferia está diretamente ligada a cenários de crise geral do sistema internacional, que possam ser aproveitadas por atores políticos internos bem posicionados. Deixamos para trás a globalização vigorosa e entramos em uma fase de disputas interimperialistas que estão fragmentando o mercado mundial e produzindo uma certa desglobalização, que só tende a se aprofundar. O mundo vai ficar um ambiente cada vez mais hostil em todos os sentidos possíveis nos próximos anos.
O projeto do agronegócio brasileiro é vulnerável, de uma parte, por ser ambientalmente suicida em um mundo onde as condições de sustentabilidade se tornarão condições de sobrevivência de uma sociedade. Mas também é vulnerável porque reitera a velha dependência livrecambista dos ciclos de commodities da economia mundial, que retiram todas as condições do Brasil resistir às flutuações da economia mundial em um mundo cada vez mais instável. O que faz Lula senão aprofundar estas vulnerabilidades? Como afirma Liszt Vieira, “de pouco adianta um Ministério do Meio Ambiente que não pode impedir a degradação ambiental provocada, por exemplo, pelo Ministério da Agricultura bancando o agronegócio que desmata florestas, pelo Ministério do Transporte bancando a pavimentação da BR-319 que vai devastar a Amazônia e pelo Ministério da Energia, bancando a exploração de petróleo na bacia da Foz do Amazonas”.
Na medida em que se torna cada vez mais parasitário e destroi suas próprias condições de existência, o agro também se revela cada vez mais destrutivo para a vida da maioria da população brasileira. Podemos resumir a dinâmica dizendo que ou o Brasil acaba com o ruralismo ou o ruralismo acaba com o Brasil. Quem poderá fazer frente a essa tarefa? Uma esquerda distinta da que existe hoje, paralisada frente ao agro. Como lembra E.P.Thompson, as classes se formam na luta de classes.
Um forte movimento pelo clima no Brasil será um movimento por uma transição ecossocial no país, organizada desde os atores populares, capaz de enfrentar os responsáveis nacionais pela predação da natureza e lutar pela restauração dos biomas florestais. A alternativa para o Brasil será criada na luta política por outra economia, por outra sociedade, por outro metabolismo com a natureza.
O Brasil passou pelo terremoto da década de 2010 – que começa com o jornalismo de esgoto, a partir de 2005, e encerra-se com a derrota de Jair Bolsonaro em 2022.
Xadrez de 2025 e as cinco bestas do apocalipse, por Luís Nassif
2025 será decisivo para o renascimento institucional do país, depois do terremoto entre 2010 e 2022, período de desmonte das instituições
2025 será um ano decisivo para o primeiro passo do renascimento institucional do país.
O Brasil passou pelo terremoto da década de 2010 – que começa com o jornalismo de esgoto, a partir de 2005, e encerra-se com a derrota de Jair Bolsonaro em 2022.
Nesse período ocorreu um desmonte geral das instituições, abrindo espaço para o aventureirismo mais deletério já enfrentado pelo país em período democrático – sob os auspícios do Supremo Tribunal Federal, indo à reboque do efeito manada provocado pela mídia.
Narro em detalhes esse processo em meu livro “A Conspiração Lava Jato”.
Criou-se um vácuo político que passou a ser ocupado a cotoveladas pelas principais corporações brasileiras.
Nesse período de trevas, pelo menos as seguintes instituições saíram dos trilhos:
O Supremo Tribunal Federal, cooptado pela mídia com o uso recorrente do chicote e da cenoura e, como consequência, a Justiça. Especial destaque para a justiça federal, dentro do fenômeno Lava Jato, com juízes federais insurgindo-se contra a Constituição, como foi o caso Sérgio Moro, sendo avalizados pela participação escabrosa do Tribunal Regional Federal da 4a Região, criando o estado de exceção para a Lava Jato. No seu rastro, houve a politização dos ministérios públicos estaduais, com muitos promotores montando acordos políticos com forças municipais, deixando o campo aberto para o avanço do crime organizado através das Organizações Sociais.
Militares das Forças Armadas e das Polícias Militares com atuação política, e empenhados claramente no movimento conspiratório de Bolsonaro-Braga Neto.
A Câmara dos Deputados, dominada por uma organização chantagista, chefiada pelo deputado federal Arthur Lira.
O mercado financeiro, dominado por um cartel de grandes fundos, impondo seus interesses e controlando totalmente dois preços fundamentais: o câmbio e os juros.
O Supremo Tribunal Federal
A reinstitucionalização passa por várias etapas.
Apesar de todas as concessões, o STF acordou a tempo e foi a primeira instituição a reagir ao desmonte institucional, da qual ela foi agente ativo, pelo menos até a eleição de Bolsonaro.
Um dia, Antônio Dias Toffoli e Alexandre de Moraes revelarão as razões que levaram à abertura do chamado Inquérito do Fim do Mundo. Na época, Toffoli me convidou para uma conversa em São Paulo, falou da urgência de se começar a investigar o que estava ocorrendo. Não deu maiores detalhes.
Mas ficou claro que já tinham identificado os preparativos de um futuro golpe de Estado a ser aplicado por Bolsonaro. O inquérito foi entregue a Alexandre de Moraes, que se cercou de um conjunto de assessores de sua estreita confiança. Ali começou a ser preparada a resistência que, mais tarde, impediu a concretização do golpe e permitiu a apuração da conspiração bolsonarista-militar.
A astúcia e coragem pessoal de Moraes o absolvem de todos os erros anteriores – um dos quais foi ter aberto o governo Temer a militares com histórico de golpismo, como Sérgio Etchegoyen. Entrará para a história como peça central de defesa da democracia.
A partir de sua atuação, gradativamente o STF assumiu o papel de âncora central da reinstitucionalização, ajudando a enfrentar as cinco bestas do apocalipse da democracia.
Besta 1 – a desorganização da Justiça
O profundo processo de deterioração dos organismos judiciários – tribunais, Ministérios Públicos, Polícia Federal – depende fundamentalmente de quatro instituições, em geral bastante corporativistas:
Supremo Tribunal Federal
Conselho Nacional de Justiça
Conselho Nacional do Ministério Público
Procuradoria Geral da República.
O STF já se recolocou.
O Conselho Nacional de Justiça se redimiu, através do relatório do ex-corregedor Luiz Felipe Salomão, sobre os abusos da Lava Jato e do Tribunal Regional Federal da 4a Região.
A cumplicidade entre a Lava Jato, juízes federais e o Tribunal Regional Federal da 4a Região é um dos capítulos mais vergonhosos da história jurídica do país. O ápice foi a 8a Turma aumentando, de forma unânime (contrariando qualquer análise probabilística), as penas de Lula, para evitar a prescrição por idade.
Os responsáveis foram os desembargadores João Pedro Gebran Neto (relator), Leandro Paulsen e Victor Luiz dos Santos Laus.
O segundo episódio foi a constituição de uma fundação, destinada a desviar dinheiro da Lava Jato.
Esse esquema começou a ser desmontado na gestão Augusto Aras, na Procuradoria Geral da República, mas, especialmente, pelo relatório da corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, por Luiz Felipe Salomão.
Foi a recolocação do CNJ na restauração da institucionalidade.
A resistência a esse processo restaurador da justiça emperra em dois poderes.
Um, a Procuradoria Geral da República, especificamente o PGR Paulo Gonet; outra o Secretário Nacional de Segurança Pública, Mário Sarrubbo.
Paulo Gonet e Mário Sarrubbo
O PGR Gonet mantém engavetado o inquérito de Salomão – que acusa de peculato diretamente o ex-juiz Sérgio Moro, a juíza Gabriela Hardt e o ex-procurador Deltan Dallagnol -, e tem criado dificuldades para a apuração dos desvios do juiz Marcelo Bretas, o halterofilista acusado de cumplicidade com um advogado neófito, na operação no Rio de Janeiro.
O Secretário Sarrubbo, por sua vez, está empenhado em desmoralizar uma correição do Conselho Nacional do Ministério Público, que atingiu um promotor aliado.
O CNMP era visto, até então, como o mais corporativista das organizações do sistema judicial. Justo em uma área – as prefeituras – em que se amplia perigosamente a atuação do crime organizado e contra a qual os promotores estaduais deveriam estar na linha de frente.
O órgão começou a se redimir em São João da Boa Vista, investigando a atuação de um promotor aliado da prefeita local, com contratos suspeitos nas áreas de lixo e saúde. São os dois setores preferenciais de atuação das organizações criminosas, segundo o promotor Lincoln Gakiya, que lidera o GAECO (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) de São Paulo.
A investigação sofreu interferência direta de Sarrubbo, responsável pela organização do combate ao crime organizado do Ministério da Justiça, interferindo nas investigações do CNMP, como testemunha de defesa do promotor e com ataques ao corregedor responsável pela correição original -mostrando que se valeu do inquérito para acerto de contas pessoal.
Como os promotores estaduais deveriam ser a linha de frente contra o avanço do PCC nas Organizações Sociais, a presença de Sarrubbo traz indagações concretas sobre qual seu grau de compromisso no combate efetivo às organizações criminosas. E como ficará sua situação política, se as investigações da PF baterem no promotor aliado.
Esse inquérito será fundamental para se avaliar até que ponto o CNMP – e o próprio Ministério da Justiça – estão à altura do grande desafio de colocar os MPs estaduais alinhados no combate ao crime organizado.
Besta 2 – a conspiração militar
Graças ao papel decisivo de Alexandre Moraes, a prisão do general Braga Neto operou como um divisor de águas na história militar do país. Com um comandante legalista no Exército, com a Marinha expurgada do Almirante Almir Garnier, o comandante que apoiou o golpe tentado por Bolsonaro, com informações sobre a resistência do Alto Comando ao golpe – sejam quais foram seus motivos -, há condições objetivas de, pela primeira vez na história, as Forças Armadas cumprirem sua função institucional de defesa da pátria contra inimigos externos, deixando de lado a contaminação recente, estimulada pelo general Villas Boas.
Haverá a renovação do Alto Comando, permitindo a seleção de oficiais comprometidos com a democracia. Mas a profissionalização das Forças Armadas passa por reformas estruturais que estão longe de serem tentadas. E há um bom contingente de oficiais, de coronéis para baixo, de olho nas benesses conquistadas pelos militares que trocaram a dignidade da farda pela recompensa financeira de aderir ao bolsonarismo.
Será uma das principais frentes para a consolidação da re-institucionalização nacional.
Besta 3 – a conspiração das Polícias Militares
O empoderamento das Polícias Militares foi uma das principais armas articuladas pelo bolsonarismo. O motim de 2020, da PM de Fortaleza, a milicialização da PM paulista por Tarcísio-Derrite, o papel da PM do Distrito Federal no 8 de janeiro.
Seria conveniente uma leitura do livro “O Procurador”, de Luiz Costa Pinto, sobre a articulação dos procuradores gerais para evitar o golpe de Bolsonaro. Houve uma articulação discreta, através da qual os procuradores estaduais decretaram estado de emergência, obrigando as PMs a ficarem nos quartéis.
Hoje em dia, a violência de várias polícias estaduais revela apenas o nível de empoderamento do setor, com a perda da disciplina produzida pela politização de oficiais, pelos influenciadores digitais da própria PM.
Ponto central seria o controle a ser exercido pelos Ministérios Públicos estaduais. Daí a relevância do papel fiscalizador do CNMP e o desserviço prestado pelo Secretário Sarrubo.
Besta 4 – a conspiração do Centrão
No segundo ato político mais relevante do ano, o Ministro Flávio Dino, do STF, aplicou um xeque mate no Centrão, sem interferir nas prerrogativas da Câmara ou do Executivo. Exigiu apenas que fossem identificados os autores e os destinatários das emendas.
Lembra um pouco o que ocorreu em São Paulo, nos massacres de 2006. Eram assassinadas cerca de cem pessoas por dia. O massacre só cessou quando procuradores da República conversaram com o Conselho Regional de Medicina que convocou médicos para comparecem ao Instituto Médico Legal. O laudo do legista é o ponto de partida para qualquer inquérito ou denúncia. Imediatamente cessou o morticínio, embora até hoje o Secretário de Segurança da época, Saulo de Castro Abreu, não tenha sido judicialmente responsabilizado.
O CPF e o CGC nas emendas são o ponto de partida para a investigação policial. A decisão de Dino ocorre em um momento em que a Polícia Federal investiga emendas já liberadas, mostrando relações de deputados com o crime organizado.
Pode terminar a blindagem que até agora beneficiou Arthur Lira, em um período em que a vulnerabilidade institucional permitia a chantagem política. Os desdobramentos da decisão poderão desarticular a mais desmoralizante organização política que já atuou no Congresso Nacional.
Besta 5 – a conspiração do mercado
A última besta é o controle do mercado sobre dois preços básicos da economia: câmbio e juros.
Há duas formas de controle: o institucional, baseado no conjunto de regras definido pelo sistema de metas inflacionárias; e a atuação de um cartel, no câmbio e em juros.
Já começou o combate às duas formas de atuação.
Em relação ao cartel do câmbio, há denúncias formalizadas no CADE (Conselho Administrativo de Direito Econômico) e na CVM (Conselho de Valores Mobiliários). São duas organizações capturadas pelo mercado. Mas, como envolve custos públicos – de carregamento da dívida – a AGU (Advocacia Geral da União) poderá acionar o TCU (Tribunal de Contas da União), a CGU (Conroladoria Geral da União) e até a Polícia Federal.
Um trabalho mais apurado seria possível com uma cooperação com a polícia do Reino Unido, que apurou nas manipulações do câmbio e da libor. A Procuradoria Geral da República poderia montar um grupo para estudar esses ângulos do crime financeiro. Seria uma maneira de se redimir do corporativismo que a contamina e. conferir um papel de destaque ao MPF.
A segunda frente é em relação às formas de fixação da taxa Selic. Há ações em andamento, com todo cuidado que o tema merece, sem histrionismo, sem ameaçar o mercado, apenas trazendo questões de constitucionalidade: a política monetária afeta emprego, nível de atividade, orçamento público. Sua definição não pode ser prerrogativa do mercado e do Banco Central – como é hoje, com o BC submetido aos movimentos especulativos do mercado. E trazer o mercado de volta ao seu papel legitimador: o de financiador do desenvolvimento.
Trata-se de um movimento inicial, mas relevante para começar a discussão de um novo tempo de cidadania, que acabe com os superpoderes de todos esses agentes, que se prevaleceram nas últimas décadas do enfraquecimento do poder Executivo.
HOJE COMENTAREI o absurdo do que publicou Dallagnol para seu público da extrema direita. A criatura deve voltar para a faculdade. Ele desaprendeu tudo em direito penal.