segunda-feira, 6 de novembro de 2017

O juiz-feitor. Por Fernando Brito


trabalhomartins

Do Tijolaço:

Foi uma pena Michel Temer não ter nomeado o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra da Silva Martins, para o ministério da Justiça quando o então ocupante do cargo Osmar Serraglio, foi pego trocando agrados na Operação Carne Fraca.
Um pena porque, ao menos, teria livrado a Justiça do Trabalho da submissão a alguém que representa o mais puro pensamento escravocrata e censitário, no qual as pessoas valem não como cidadãos e seres humanos, mas pelo que ganham, pela renda que tem.
Hoje, na Folha, Martins expõe com toda a crueza este pensamento.
Como Jair Bolsonaro disse nos EUA, para ter emprego, é preciso que o brasileiro fique sem direitos. Na boca de um presidente de uma corte que existe para proteger estes direitos, é quase como acenar com a escravidão em troca.
Até porque a sua honra e a sua dignidade devem ser medida pelo que você ganha, como ele exemplifica para defender a monstruosidade jurídica que passa a vigir  semana que vem: a indenização por dano moral passa a ser “indexada” ao salário:
Não é possível dar a uma pessoa que recebia um mínimo o mesmo tratamento, no pagamento por dano moral, que dou para quem recebe salário de R$ 50 mil. É como se o fulano tivesse ganhado na loteria.
Nunca antes, na história deste país, um membro do poder judiciário tinha exposto e defendido o “dano moral censitário”, onde a dignidade de alguém é mais ou menos “valiosa” de acordo com seu salário, embora muitos a praticassem.  Até hoje, o que a doutrina do direito consagra é que a reparação do dano moral vinculava-se à gravidade da ofensa, à capacidade econômica de quem ofendeu e a uma salvaguarda de que não poderia ser “enriquecimento sem causa”, porque aqui, exceto quando a honra é de juízes, raramente se vê sentenças de dano moral milionárias.
É só olhar o acervo da Justiça do Trabalho e ver que as humilhações impostas a trabalhadores por maus patrões vai muito além de simples “piadas de mau gosto” que Martins diz serem a causa das ações.
Está consagrado o princípio do “dá dez mil réis e manda embora”.
Vai além, defende a imposição de custas e honorários de sucumbência (pagos ao advogado da outra parte) ao trabalhador. Um cidadão que recebe R$2.500 mensais já pode ter negado o direito de gratuidade judicial e, além de pagar custas judiciais e advogado para correr atrás de seus direitos (não há um que advogue pelos 10% legais que se tem em caso de vitória, exceto em causas de milhões de reais. ou os de sindicatos) terá de pagar ao empregador se não lhe for reconhecida razão.
Por estas e por outras, como o trabalho intermitente, que cria o trabalhador “de prateleira”, que “se paga quando se usa”, prepare-se para ver uma completa insegurança jurídica no campo do direito do trabalho.
Os juízes trabalhistas já sinalizaram que não vão aceitar de forma dócil estas violações evidentes dos princípios constitucionais da igualdade legal e da proteção ao trabalho. Nenhum empregador, salvo os muito grandes, que já dispõem de estrutura jurídica de porte e poder de pressão vai “meter a cara” na aventura que se transformou em lei.
Foi realmente uma pena Gandra não ter ido para o Ministério. Lá, teria a estatura que têm os ministros de Michel Temer. Como presidente do Tribunal Superior do Trabalho é uma ameaça muito maior, uma bofetada togada na dignidade do trabalhador brasileiro.

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