sexta-feira, 10 de novembro de 2017

A defesa do mercado de ódio no caso Waack, por Luis Nassif


   "Nos últimos anos, abriu-se um mercado de trabalho novo, no segmento do chamado jornalismo de esgoto, do ódio vociferante que acabou contribuindo para a desmoralização da grande mídia.  Até então, o nicho era restrito a jornais menores." - Luis Nassif



GGN. - O caso William Waack tem desdobramentos interessantes e que estão sendo pouco percebidos.
Nos últimos anos, abriu-se um mercado de trabalho novo, no segmento do chamado jornalismo de esgoto, do ódio vociferante que acabou contribuindo para a desmoralização da grande mídia.  Até então, o nicho era restrito a jornais menores.
Muitos jornalistas veteranos ou desconhecidos mergulharam nessas ondas turvas, de cronistas musicais diáfanos a pessoas com passado jornalístico respeitável, mas que tinham se colocado fora do mercado.
O esgoto saiu dos guetos e entrou em algumas publicações consideradas de primeira linha, disseminando-se, pelo efeito demonstração, por veículos menores.
A grande onda foi estimulada por dois dos veículos mais influentes, Veja e Globo, aqueles que – com exceção da Folha no pós-redemocratização – sempre comandaram as mudanças de vento, no mercado de opinião. Os demais tendem a segui-los.
Agora, a onda está refluindo no jornalismo de 1ª classe.
Desde a saída de Eurípides Alcântara da Veja, a revista vem tentando lentamente limpar o seu nome, assumindo um conservadorismo de melhor nível e mandando embora colunistas pirados e youtubers.
A próxima reforma das Organizações Globo também deixa claro o desembarque desse modelo de jornalismo, a começar das mudanças anunciadas na revista Época – que pretendeu seguir os caminhos da Veja.
Há vários motivos para esse desembarque.
Há uma questão de qualidade do leitor. O tropel dos ignaros acabou expulsando dos veículos os leitores de melhor formação. Agora que as redes sociais invadem todos os poros da sociedade, a única maneira da imprensa tradicional se diferenciar é tentando recuperar um mínimo de seletividade do público leitor. Afinal, se seu público tem preconceito a pobre, mas também às bestas vociferantes.
O segundo fator é que o jornalismo de guerra exigiu um protagonismo maior dos soldados da linha de frente. Ganharam visibilidade nos veículos, se alavancaram nas redes sociais, amparados pelas hordas guerreiras da direita. Some-se o fator Lava Jato que criou uma espécie de exército autônomo, com jornalistas mais fieis às fontes que ao próprio veículo.
De certo modo, William Waack representava esse estilo de jornalismo enraivecido, que projetava a personalidade para além dos parâmetros definidos pelo próprio veículo.
Embora tivesse reputação jornalística consolidada, era o representante máximo de um estilo que consagrou vários atores medíocres que tinham em comum com ele apenas a ira sagrada.
O terceiro fator é o fenômeno Bolsonaro. Ele já demonstrou, à exaustão, que ganhou vida propria nas redes. Não depende mais da mídia para consolidação de imagem. Ele é a prova viva – e ameaçadora - de que a mídia perdeu o controle absoluto sobre a criação de imagens públicas.
As mudanças na Veja e na Globo indicam a curto prazo um esvaziamento desse estilo na primeira divisão da velha mídia.
A explosão de solidariedade a Waack, por parte de representantes desse estilo, em parte é por solidariedade ideológica. Mais ainda, por pânico com o fim de um modelo que, por mais de uma década, trouxe à tona todos os dejetos acumulados pela mídia.

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