segunda-feira, 22 de março de 2021

Moisés Mendes: Bolsonaro ameaça porque só aqui há festa para torturadores

 

Só aqui um presidente (cada vez mais acossado e surtado com a volta de Lula) pode dizer, a 10 dias do aniversário do golpe de 64, que as Forças Armadas estão a postos para o que der e vier, aponta o colunista Moisés Mendes


Jair Bolsonaro fala a apoiadores no dia do aniversário

Jair Bolsonaro fala a apoiadores no dia do aniversário (Foto: Reprodução)

Os argentinos começaram a homenagear no domingo a memória de perseguidos, encarcerados, assassinados e desaparecidos da ditadura. A frase inspiradora foi repetida pelo presidente Alberto Fernández: “Não se esqueçam nunca”.

A Argentina completa dia 24 os 45 anos do golpe de março de 1976. É impensável que alguém corra o risco de organizar um evento de exaltação da ditadura hoje na Argentina.

É impensável que alguém em Montevidéu articule uma festa em homenagem à ditadura uruguaia. Não há como imaginar eventos com exaltações públicas e descaradas das ditaduras chilena, boliviana, peruana, paraguaia.

Os militares argentinos, desmoralizados pela Guerra das Malvinas, são figuras sem relevância, sem poder e sem ter muito o que fazer.

Na Argentina, uma Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas criou nos anos 80, a partir de testemunhos, condições para o julgamento dos torturadores. Generais argentinos foram presos.

No Brasil, a Comissão Nacional da Verdade não teve apoio suficiente para que se produzisse aqui pressão política sobre a Justiça, em especial o Supremo, e se fizesse o mesmo.

Até o Paraguai puniu torturadores, muito poucos, mas puniu. No Brasil, os criminosos da ditadura ficaram totalmente impunes e ainda são exaltados publicamente por quem está no governo.

No domingo, Bolsonaro voltou a ameaçar com intervenção das Forças Armadas, porque aqui os militares fazem o que bem entendem. Os militares brasileiros protegem até uma aberração do porte de Bolsonaro.

Nós somos a democracia mais achinelada da América Latina. Somos um dos países mais acovardados do mundo. Porque nunca enfrentamos os crimes de lesa humanidade cometidos na ditadura.

Por isso é preciso acompanhar o que se passa hoje na Bolívia, onde são cumpridas ordens de prisão contra sete generais golpistas que traíram Evo Morales em 2019. Militares subjugados pelas ordens de policiais. Não lideraram nada. Fora subalternos covardes da polícia amotinada.

Já prenderam quatro deles. Vão encarcerar preventivamente os golpistas, sem medo da anunciada reação da extrema direita. A população quer o julgamento dos que avalizaram o golpe e depois perseguiram, reprimiram e mataram manifestantes nas ruas.

A Bolívia é o caso mais recente e próximo de nós de resgate da democracia, pelo voto, que acaba por fortalecer as instituições e a Justiça. O Ministério Público e o Judiciário agem com respaldo do povo.

Na Argentina, os generais que levaram 650 soldados à morte, numa guerra perdida desde o começo, não valem nada. Um general argentino e um guarda da esquina têm o mesmo peso o político.

No Uruguai, mesmo com uma anistia semelhante à brasileira, o Ministério Público já denunciou e conseguiu condenar militares torturadores acusados de crimes contra a humanidade.

O Brasil é o que é porque foi cordial com ditadores e seus subalternos e elegeu um adorador de torturadores. O Supremo, que revalidou a anistia e não reconhece o direito de alguém processar criminosos criados pelo golpe de 64, foi cordial com a ditadura.

Aqui, a possibilidade de punição de torturadores fica restrita à área cível, pelo esforço de alguns bravos do Ministério Público. A grande maioria dos membros do sistema de Justiça sempre esteve calada e resignada.

A classe média e os ricos brasileiros, que hoje tentam se livrar de Bolsonaro, são cúmplices das homenagens que o sujeito deve fazer de novo a assassinos.

As anunciadas comemorações do 31 de março são a parte festiva do aval que as elites e a classe média deram a Bolsonaro.

Só aqui um presidente (cada vez mais acossado e surtado com a volta de Lula) pode dizer, a 10 dias do aniversário do golpe de 64, que as Forças Armadas estão a postos para o que der e vier.

O Brasil não só foi cordial com a ditadura como permite a exaltação dos crimes cometidos. A festa acontecerá com o patrocínio do governo e dentro do governo.

O 31 de março deveria ser também o dia do acovardamento dos que poderiam e nunca reagiram, todos esses anos, à impunidade de criminosos que ainda estão vivos.

Bolsonaro só existe porque seus ídolos nunca enfrentaram a Justiça e continuam a inspirar os generais que protegem seu governo. Toda a família Bolsonaro tem certeza de que pode contar com essa proteção.

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