"PEC de equilíbrio entre os poderes" propõe que Congresso possa revisar decisões do Supremo Tribunal Federal que não forem unânines
A crise política brasileira ganhou mais um capítulo nesta terça-feira, 14, com a notícia de que o deputado federal Domingos Sávio, do PL (partido de Jair Bolsonaro) de Minas Gerais, está elaborando uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que ele apelidou de “PEC do equilíbrio entre os Poderes”.
Em poucas horas, o projeto foi rebatizado pela classe política e jornalística: PEC da castração do Supremo, PEC do golpe no STF, Palhaçada de Emenda Constitucional. O deboche relaciona-se ao fato de que a proposta de Sávio fere cláusula pétrea da Constituição de 1988 e, portanto, jamais poderia ser colocada em prática. Mas sua razão de ser é outra.
Sávio é parte da bancada do boi, que fiscaliza os interesses do agronegócio. Este, por sua vez, teme o desfecho do julgamento do Marco Temporal pelo Supremo. O julgamento começou em 2021 e seria retomado em 23 junho, mas foi retirado de pauta no STF e não tem data para retornar. A tese jurídica sustenta que os indígenas só podem reivindicar demarcação de terras ocupadas antes da Constituição de 1988.
Como gera uma disputa de terras entre indígenas e ruralistas, Jair Bolsonaro já avisou que não cumprirá decisões do STF que sejam desfavoráveis ao agronegócio. O que a PEC do deputado Sávio faz é por no papel a ameaça de Bolsonaro.
Se a PEC for aprovada, o Legislativo teria o direito de “revisar” decisões do Supremo que tenham “transitado em julgado sem aprovação unânime dos seus membros” e desde que “extrapole os limites constitucionais”. A anulação do julgamento teria “vigência imediata”. Na visão de Sávio, “se o Supremo, de forma controversa e sem entendimento unânime de seus membros, decide e julga contrariando a ampla maioria dos representantes do povo, o estado democrático de direito é colocado em risco.”
Bolsonaro já emplacou dois ministros no Supremo – Kassio Nunes e André Mendonça. O voto divergente de ambos já seria motivo para atropelar uma decisão da maioria da Corte, segundo preconiza a PEC. Não apenas o Marco Temporal, mas pauta de costumes e outros julgamentos do STF seriam anulados pelo Centrão. Segundo Sávio, a PEC tem apoio da liderança do governo na Câmara. A esperança para barrá-la estaria no Senado.
Para o advogado Augusto de Arruda Botelho, pré-candidato a deputado federal pelo PSB-RJ, a PEC “não é apenas ilegal, ela é uma afronta ao Estado democrático de Direito”.
Ex-juiz de Direito, o ex-governador Flávio Dino, pré-candidato ao Senado pelo PSB do Maranhão, afirmou que a PEC fere a cláusula pétrea que garante a separação dos Poderes. Por isso, o Congresso não poderá anular decisões do STF.
O deputado federal Orlando Silva (PCdoB) indicou que a cláusula pétrea é, neste caso, uma vacina contra “crises institucionais” e tentativas de castrar os poderes do Supremo.
O deputado federal Ivan Valente, do PSOL-SP, viu na PEC uma tentativa do Centrão de legislar em causa própria e dar proteção aos crimes do governo Bolsonaro.
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