Como Daniel Vorcaro, o Banco Master, o BRB e a engrenagem política de Arthur Lira, Ciro Nogueira, Rueda e Ibaneis montaram o maior escândalo financeiro
Do Jornal GGN:
O esquema bilionário do banqueiro do Centrão
por Gustavo Tapioca
A prisão cinematográfica de Daniel Vorcaro, em um jatinho privado, abriu a caixa-preta de um esquema bilionário que misturava fraude financeira, influência política e tentativas de empurrar um banco podre para dentro de um banco público com o respaldo do governador Ibaneis.
A engenharia da fraude: títulos falsos, CDBs milagrosos
A operação da PF começa em 2024, quando o Banco Central identifica irregularidades graves: emissão de títulos de crédito falsos — ou “insubsistentes” — vendidos como se fossem ativos legítimos. Esses papéis eram usados para lastrear operações de crédito e “embelezar” balanços, gerando a aparência de um banco robusto que, na verdade, estava podre por dentro.
O Master também se especializou em CDBs com remuneração “fora da curva”: 135%, 140% e até 150% do CDI para investidores pessoa física — uma taxa incompatível com qualquer operação saudável. Para entregar esse rendimento artificial, o banco montou uma carteira tóxica baseada em consignados sem lastro real; duplicatas infladas; títulos falsificados; operações cruzadas entre empresas do próprio grupo; e manobras contábeis para mascarar a insolvência iminente.
Banqueiro do Centrão
Esses papéis, vendidos como ativos seguros, foram despejados em fundos de previdência estaduais e municipais, como o RioPrevidência, fundos do Amazonas, prefeituras do União Brasil e do PP, além de investidores de varejo atraídos pelo rendimento surreal.
O vídeo “O Banqueiro do Centrão”, divulgado pelo YouTube, expõe um ponto decisivo: o verdadeiro risco não era apenas o banco quebrar, mas arrastar consigo o Fundo Garantidor de Créditos (FGC).
Há estimativas de que até 60% da capacidade do FGC poderia ser consumida se o Master implodisse de forma descontrolada. Se isso ocorresse, milhões de pequenos investidores ficariam expostos.
O “outsider” da Faria Lima que virou banqueiro do poder
Daniel Bueno Vorcaro não era um banqueiro tradicional.
Em 2016, comprou o antigo Banco Máxima, rebatizou para Banco Master e passou a operar de forma agressiva no mercado — expandindo carteiras, fazendo aquisições arriscadas e tentando ocupar espaços deixados por bancos médios tradicionais.
Seu estilo incomodava a elite financeira: mansões em Miami e Trancoso, jatinhos particulares, estas de altíssimo luxo, presença constante em camarotes VIP, proximidade com celebridades, e uma rede de influenciadores digitais pagos para ampliar sua imagem.
Além disso, Vorcaro articulou a compra ou influência sobre veículos de mídia como: IstoÉ, Brazil Journal, PlatôBR, Portal Leo Dias, e tentativas de aquisição do Correio Braziliense e do Estado de Minas.
Um banqueiro sob suspeita não compra mídia por vaidade — compra para influenciar narrativas, blindar investigações e acumular poder político.
A engrenagem política: Ciro, Lira e Rueda — o tripé do Centrão
O vídeo “O Banqueiro do Centrão” revela que Daniel Vorcaro tinha suporte direto da tríade mais poderosa do centrão contemporâneo:
1. Ciro Nogueira (PP)
Apontado como o principal articulador político do Master,
Ciro teria aberto portas para o banco dentro de governos estaduais e, principalmente, dentro do governo do Distrito Federal.
2. Arthur Lira (PP)
O presidente da Câmara é descrito como figura crucial para proteger o banco no Congresso, influenciar pautas e impedir que investigações prosperassem no ritmo natural.
3. Antônio Rueda (União Brasil)
Presidente do partido, articulador de prefeituras e fundos municipais — muitos deles expostos aos ativos fraudulentos do Master.
Esse tripé oferecia a Vorcaro poder político, acesso a fundos públicos, influência institucional e blindagem parlamentar.
Sem essa engrenagem, o Master jamais teria alcançado o tamanho que teve — nem teria avançado tanto sobre órgãos públicos.
O capítulo Ibaneis Rocha: como um banco podre foi empurrado dentro do BRB
O episódio mais grave envolve o governador do Distrito Federal. Em março de 2025, Ibaneis Rocha (MDB) anuncia, em tom de triunfo, que o BRB iria comprar o Banco Master. O discurso oficial prometia expansão, fortalecimento e crescimento.
A realidade era outra: um banco estatal seria usado para salvar um banco privado quebrado. O Banco Central percebeu a manobra e barrou a operação. Mas Ibaneis insistiu.
A segunda tentativa foi ainda mais perigosa: se o BRB não podia comprar o Master inteiro, então compraria apenas as carteiras de consignado — justamente o núcleo da fraude.
Quando a PF deflagrou a Operação Compliance Zero, tudo ruiu: o Master é liquidado, o BRB recua, o presidente do BRB é afastado, Ibaneis vira alvo de CPI, e a relação entre o Master, o BRB e o governo do DF passa a ser investigada.
O vídeo resume com precisão:
“Foi a mais descarada tentativa de usar dinheiro público para salvar o banqueiro do Centrão.”
A arquitetura do colapso e o risco sistêmico
Com a liquidação extrajudicial decretada em 18 de novembro de 2025, o Banco Central precisou agir com rapidez para: proteger o FGC, garantir pagamento aos investidores, segurar corridas bancárias em bancos médios, impedir contaminação financeira entre fundos de previdência e evitar que o caso se transformasse em uma crise sistêmica.
A fraude do Master não era apenas contábil — era estrutural. E poderia ter desencadeado um efeito dominó sem precedentes desde o caso Banco Santos.
Mídia comprada e narrativa controlada
Poucos brasileiros sabiam, até então, que Vorcaro vinha montando, com investidores e intermediários, um mini conglomerado de mídia.
Isso incluía: influenciar matérias, evitar reportagens críticas, construir imagem positiva, pressionar órgãos reguladores de forma indireta.
Vários veículos comprados ou influenciados suavizaram as notícias sobre o rombo — enquanto a PF, o BC e a mídia independente traziam os fatos.
A PF de Bolsonaro volta a ser polícia de Estado
Há um contraste essencial para entender por que o caso Master veio à tona agora. Com Bolsonaro (2019–2022), a PF era uma polícia de família. Sofria interferências diretas do presidente, blindagem a filhos e amigos investigados, perseguição a governadores e opositores, trocas constantes de superintendentes, declarações explícitas de que a PF deveria “proteger” aliados.
A corporação estava amordaçada politicamente. Não tinha autonomia para investigar bancões e banqueiros nem liberdade para atingir figuras poderosas. Agora, as investigações são técnicas e o foco é na estrutura da fraude, não na conveniência política.
A prisão de Daniel Vorcaro — um banqueiro bilionário ligado ao Centrão — seria impossível em 2021. Desde 2023, ocorreu com normalidade institucional.
Foi a PF livre que abriu a caixa-preta do Master, prendeu o banqueiro em fuga para o exterior, mirou políticos influentes, salvou um BRB, banco estatal do DF, conduziu o inquérito livre e sem interferência do Planalto.
Esse contraste não é detalhe — é o coração do caso.
A era dos mega inquéritos financeiros começou
O caso Banco Master é, sim, o maior escândalo financeiro recente do Brasil.
E é um marco por três razões:
- Escala da fraude: bilhões de reais em ativos falsos.
- Penetração política: Centrão, governadores, prefeituras e fundos públicos.
- Autonomia institucional: PF e BC atuando sem interferência.
E abre uma porta inédita: a responsabilização de banqueiros grandes — algo historicamente raro no Brasil. Os próximos meses trarão novas revelações. E, para os “Vorcaros” ainda em operação, o recado está dado:
No Brasil de Lula, a PF não persegue opositores — persegue criminosos. E, dessa vez, chegou antes de jatinho decolar para Dubai.
Gustavo Tapioca é jornalista formado pela UFBa e MA pela Universidade de Wisconsin. Ex-diretor de Redação do Jornal da Bahia. Assessor de Comunicação da Telebrás, Oficial de Comunicação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e do IICA/OEA. Autor de Meninos do Rio Vermelho, publicado pela Fundação Jorge Amado.
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