segunda-feira, 17 de abril de 2023

O Banco Central se diz "autônomo", mas é pró-interesses dos banqueiros, e isso é crime de lesa-pátria, num golpe inacabado, por Armando Coelho Neto

 

A autonomia do Banco Central é parte do pacote do golpe de 2016, que incluía supressão de direitos elementares dos trabalhadores



O Banco Central é crime de lesa-pátria, num golpe inacabado

por Armando Coelho Neto, publicado no Jornal GGN

Tudo se discute neste mundo, menos uma única coisa: a democracia. Ela está aí, como se fosse uma espécie de santa no altar, de quem já não se espera milagres, mas que está aí como referência. A democracia em que vivemos é sequestrada, condicionada, amputada. Na política, o poder do cidadão está limitado a tirar um governo do qual não se gosta para pôr outro de quem talvez venha a gostar.

A fala acima editada e sem aspas é do escritor português José Saramago e reflete parte do momento político brasileiro, pois na sequência, o autor diz que as grandes decisões são tomadas em outras esferas, como organizações financeiras internacionais, o FMI, a Organização Mundial do Comércio, os bancos mundiais, ocupados por dirigentes não eleitos pelo povo. Quem decide não é eleito.

O desgoverno do ex-capitão foi simples fase de um golpe contra o povo brasileiro, cujo ápice foi a derrubada da Dilma Rousseff, por um motivo que a maioria do povo brasileiro desconhece. Pergunte a porteiros de prédios e boates, aos pipoqueiros e catadores de latinha, aos que andam como sardinhas pelas manhãs em ônibus, peruas e metrôs com destino aos pelourinhos do mercado… Não sabem nada.

A autonomia do Banco Central é parte do pacote do golpe de 2016, que incluía supressão de direitos elementares dos trabalhadores, condenados a pagar uma conta que não fizeram, para que os ricos parasitas do mercado se tornassem mais ricos e pobres mais pobres. Nesse pacote a entrega do patrimônio nacional (no todo ou em parte) para a camarilha de sempre e especuladores internacionais.

Como parte do golpe, o Banco Central é hoje presidido por um tirano arrogante, o tal Roberto Campos Neto, que sem voto (olha o José Saramago aí, gente!) quer decidir o que é bom para o povo, definindo taxas de juros combinadas em reuniões secretas com banqueiros. Noutras palavras, o povo sofre as consequências dos juros mais altos do mundo e é refém do autoritarismo de quem o odeia.

Eis pois o lado cruel da denominada elite brasileira, a qual lucra com a crise que finge combater. A “elite” representada pelo mercado tira proveito da ignorância da grande maioria do povo brasileiro sobre tema tão sensível como economia. A grande mídia, que na prática é o próprio mercado, reverbera em economês com discurso doutoral com uma verborragia que só uma minoria entende.

Em meio a essa ignorância, poucas vozes surgem para desmascarar a realidade, mas em campo muito restrito. É o caso da auditora-fiscal Maria Lúcia Fattorelli, auditora-fiscal aposentada da Receita Federal e fundadora da organização Auditoria Cidadã da Dívida. Sem cerimônias, defende que a política adotada pelo Banco Central seja investigada, posto que os juros altos não têm fundamento.

“Não existe amparo técnico para os juros altos: é bandidagem”, afirma Fattorelli. Trata-se de simples discurso autoritário e, na prática, não está controlando nada, mas sim detonando a economia brasileira. O preço dessa irresponsabilidade está retratado notícias sobre os 70 milhões de brasileiros com nome sujo na Serasa, ou o fato de que inflação e juros altos fecharam mais empresas que a pandemia.

De forma didática, Fattorelli explica não está ocorrendo “inflação de demanda”. O que é isso? Seria todo mundo endinheirado querendo gastar, comprando demais a ponto de esgotar estoque. Essa grande procura pode aumentar preços provocar inflação que poderia, em tese, ser freada com juros altos. Por acaso tem algo ao menos parecido acontecendo? Não. E isso provaria a artificialidade da medida.

Na prática, a autonomia do Banco Central – tratada como independência, revela-se um monstro a serviço do mercado. Ao mesmo tempo, o que seria para evitar ingerências políticas revela-se como um pilar político imposto pela nova fase do golpe, que no momento aposta no quanto pior melhor. Portanto, parece ter razão a auditora, ao defender a necessidade de essa postura ser investigada.

A grande mídia faz vistas grossas para quase R$ 300 bilhões do Banco Central no ano passado, mesmo tendo recebido R$ 212 bilhões do Tesouro Nacional, a maior parte para pagar juros para os bancos, destaca a auditora Fattorelli. Sem contar o sumiço descarado de mais de U$ 60 bilhões de dólares das reservas internacionais. Não há justificativa técnica para juros altos. De tão suspeito deve ser investigado.

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo


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