quinta-feira, 14 de março de 2019

A conjuntura política no Brasil apresenta um obscurantismo perigoso para a democracia, por Vinícios Viana Gonçalves


"O Brasil acabou adotando uma perspectiva anti-intelectualista, onde percebe- se grande parte da sociedade ignorar bases factuais, e absorver tudo aquilo que ela entende como verdade, mesmo que isso não faça sentido. Este mecanismo também é adotado pelo atual governo, reforçando tal princípio, e colocando a sociedade brasileira em um obscurantismo perigoso para as liberdades democráticas."


Do Justificando:


A conjuntura política no Brasil apresenta um obscurantismo perigoso para a democracia
Terça-feira, 12 de março de 2019

A conjuntura política no Brasil apresenta um obscurantismo perigoso para a democracia

A confusão político-social no Brasil e seus reflexos
O Brasil historicamente sempre foi um país em constante ebulição no campo político-social. Podemos citar inúmeros eventos desta recente nação, que resultaram em importantes mudanças no status quo. Estas transformações vêm nos acompanhando desde os tempos de descobrimento, passando por outros períodos como República Velha, Segunda  República, Estado Novo, República Populista, Ditadura Militar e atualmente, um regime democrático, este, embora despontar de forma espaçada na linha temporal brasileira, foi desde a promulgação de nossa carta magna em 1988, sendo o maior período vivenciado pela sociedade brasileira e assim seguimos, criando períodos significativos de mudanças de nosso corpo social.
Nos tempos atuais, o fator internet se tornou importante para mudança do paradigma social, seja pelas reivindicações populares, como monitoramento do 
campo político, ou mesmo como núcleo de organização em massa. Ao longo dos anos, esta ferramenta ainda era terreno desconhecido dos brasilianos, embora um pouco mais explorada em outros lugares do mundo, as redes sociais em especial, tornaram-se o maior fator de vicissitude entre nações, como 
exemplo no Brasil Desde 2013, o país vem enfrentando um período de demandas e mobilizações, que basicamente tiveram seus embriões criados ou fortalecidos em grupos pelas redes sociais.
Como no caso do Movimento Passe Livre [1], que embora fundado em 2005, teve um fortalecimento oriundo da organização nas redes sociais quando em 2013, após o aumento da tarifa de ônibus em São Paulo de vinte centavos, protestos foram surgindo e consequentemente violentamente reprimidos pela polícia. Contudo, estas movimentações cresciam com o passar do tempo iria agregando outros setores da sociedade como sindicatos e partidos políticos, além de se espalhar de forma orquestrada pelo resto do território brasileiro.
Estas protestações ficariam marcadas a exemplo das que ocorreram pelo mundo também em 2013 como Primavera Árabe, Movimentos Ocuppy entre outros [2]. No ano de 2014, devido aos inúmeros casos de corrupção com o então grupo político que comandava o executivo nacional desde 2003, outros levantes populares que ocasionaram mudanças sociais significativas aconteceram no Brasil. Podemos citar as reivindicações contrárias a Copa do Mundo de 2014 [3], trivialmente chamado de “Não vai ter copa” e também das requisições que aconteceram durante o período pré-eleitoral, situação que desenhou um dos momentos mais conturbados ocasionando em uma eleição considerada a mais acirrada da história brasileira [4].
Em 2015, estes protestos aumentavam devido à baixa popularidade da então presidente reeleita Dilma Rousseff, somado aos inúmeros casos de corrupção que se desenrolavam durante a Operação Lava-Jato [5]. Com o aumento significativo nas concentrações, o surgimento de grupos sociais e políticos, e o aumento da repressão que causavam, aumentava-se o questionamento principalmente de governos dito populares ou com o viés social democrata, o que perante a comunidade internacional, por inúmeras violações de direitos essenciais [6].
Em 2016, com o agravamento da crise, das revoltas populares, da repressão [7], e dos casos de corrupção, começamos a entrar em um dos momentos mais marcantes de nossa história contemporânea, e que agravaria a crise política brasileira, o processo de Impeachment dá presidente Dilma [8]. Durante o procedimento, a instabilidade aumentava, as reivindicações sociais começariam a antagonizar frentes distintas, onde grupos se articulavam, como aqueles em apoio a presidente, quanto aqueles que, embora não concordassem com o governo, entendiam que a normalidade democrática não poderia ser quebrada, e aqueles que achavam, que a destituição da presidente seria a melhor alternativa, e juntamente destes, a ascensão de grupos extremistas que até então, se mantinha no obscuro da sociedade, e que de alguma maneira, começaram a se manifestar neste turbilhão de eventos durante o período.
Logo após a destituição de Dilma, o agravamento político chegava em limites até então jamais vistos, as mobilizações populares pelo lado de trabalhadores, sindicatos e partidos com viés de esquerda seguiriam resistindo, já que o projeto pós governo Dilma então colocado em pratica, de alguma forma, era mais problemático que o anterior, e que certamente colaborou para a recessão e revoltas sociais que culminaram de alguma forma, direcionando a sociedade brasileira até o período eleitoral de 2018.
As reações sociais, notícias falsas, Internet e o resultado eleitoral
Após o impedimento, e a posse do então vice presidente Michel Temer, a situação de colapso político do Brasil continuou se agravando, começando 
sistematicamente pelo governo, onde antes havia um modelo social democrata, mais centro-esquerda, para um modelo centro-direita, com inúmeras reformas questionáveis, o que de alguma maneira atiçava a ira e revolta de outros setores da sociedade, principalmente dos trabalhadores e das classes mais baixas, estas que geralmente são as mais prejudicadas em um contexto geral. Com o agravamento das incertezas, da violência urbana, e da falta de reflexão dos campos progressistas, percebeu-se que o Brasil iria acompanhar a temerária mudança de espectro político que já vinha em andadura pelo mundo, que se materializou na eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, e por pleitos igualmente meandrosos como na França, Romênia entre outros [9].
Uma guinada para a extrema direita, foi o ponto em questão para a atual metamorfose de paradigma social no Brasil. Tal fator foi tão intenso, que acabou ditando as eleições no país, com um discurso conservador e com a bravata calcada no combate a corrupção, combate a violência, mudanças em leis trabalhistas e supressão de garantias fundamentais, entre outros. O grande problema, é que se expandiram casos de repressão contra grupos sociais que historicamente sofrem com a violência, como LGBTS, negros, índios e periféricos [10]. 
O maior expoente desta guinada ao extremismo da direita, personifica-se na figura do então deputado federal pelo Rio de Janeiro Jair Bolsonaro. Um militar reformado, defensor de pautas conservadoras e responsável por inúmeros impropérios contra minorias, que angariou ao longo dos anos, uma legião de adoradores ensandecidos que de alguma forma, encontravam nele, um escoadouro de todos os sentimentos, que durante muito tempo, encontrava-se nos porões colagenosos da sociedade [11]. A campanha eleitoral no ano de 2018 foi marcada por mudanças significativas no campo social. Velhos paradigmas que de alguma forma ditavam as eleições tornaram-se obsoletos, como coligações e tempo de televisão. E a rede mundial de computadores, foi sem dúvida o fiel da balança e maior responsável pela então vitória do então candidato Jair Bolsonaro.
Entretanto, com o advento da internet de forma maciça somado com a desinformação intrínseca do brasileiro, o pleito eleitoral ficou marcado principalmente pelo uso dos meios digitais para espalhar notícias falsas, ou popularmente conhecidas como Fake News [12]. Algo também empregado pelo então candidato americano Donald Trump [13], e que de alguma forma, solidificou uma tática que foi igualmente dispersada na Europa, com o pedido do Reino Unido sair da União Europeia, ou simplesmente Brexit [14]. As notícias falsas, se tornaram endêmicas, momento que estas são os maiores conscienciosos por propagar teorias conspiratórias entre outras questões que acabaram por mudar totalmente os rumos do brasil, e trazendo também, casos absurdos e discussões revisionistas que sequer deveriam ser afamadas em pleno século XXI, como terra plana, nazismo de esquerda ou mesmo, o aumento de grupos anti-vacinas [15].
O Brasil acabou adotando uma perspectiva anti-intelectualista, onde percebe- se grande parte da sociedade ignorar bases factuais, e absorver tudo aquilo que ela entende como verdade, mesmo que isso não faça sentido. Este mecanismo também é adotado pelo atual governo, reforçando tal princípio, e colocando a sociedade brasileira em um obscurantismo perigoso para as liberdades democráticas.
O crescimento da corrupção e o fator social 
A corrupção sempre foi um problema em todas as democracias do mundo, visto que existem estudos que detalham o nível da corrupção em diversos países. Obviamente, não existe como discordar que o fator social é fundamental para o nível da corruptela de uma nação. Países onde existem grandes investimentos sociais, onde a desigualdade social é menor, tendem a ter menos problemas. Podemos citar aqui, os países da Escandinávia, como Finlândia, Noruega, Suécia, Islândia, países que ficaram no topo entre nações com menor aliciação pelo mundo, enquanto o país tupiniquim ficou pelo número 96°, abaixo por exemplo do Timor-Leste, e a frente da Colômbia [16]. O Brasil ainda sofre com baixos índices de IDH, mesmo que, em um passado recente tenha conseguido alcançar números um pouco maiores, porém, ainda é um país problemático na educação de base, infraestrutura, distribuição de renda e aumento de direitos sociais.
É necessário ampliar estas questões, a fim de combater o lúgubre que se tornou um fator de mudança sociológica, e que agrava ainda mais assuntos que já deveriam estar findados, como acontecem em nações mais florescentes. O aumento da capacitação cultural, colabora para que sociedades se tornem menos vulneráveis a disseminação de pragas digitais como as fake news, ou mesmo, governos com ar de autoritarismo que se vendem como novidades mas articulam a política de forma decrépita e ineficaz. A peita pode ser combatida, se mudarmos o fator social, e melhorarmos as garantias dos indivíduos, ampliando cada vez mais o alcance Estatal de forma ordenada e propositiva, e não exclusiva e condenatória, como acontece em tempos atuais [17]. Não podemos tolerar a segregação, o crescimento de grupos extremistas e nem aceitar retroceder em direitos duramente conquistados.
A alheação dos brasílios colabora para que interesses de poucos se sobreponham aos da maioria, para assim, colocarem projetos de poder que apenas agregam pequenos nichos economicamente poderosos às custas de uma população inteira. Aliás, tal ato não são recentes, e embora as diferenças entre governos, ambos em algum momento, pecaram por não investir nas bases sociais de formas realmente substanciais. Aponta-se novamente os países nórdicos, como a Finlândia, que durante os anos setenta era um país extremamente pobre na Europa, e após um grande investimento social, conhecido como Welfare State que revolucionou tornando os países que constituem a Escandinávia, do status de empobrecidos, em um grupo de países com índice de desenvolvimento humano absurdamente alto, distribuição de renda e riqueza, algo que até hoje é exemplo pelo mundo [18].
Infelizmente, no Brasil, os índices educacionais ainda são incoerentemente decepcionantes, visto que em matéria na revista Superinteressante, de 10 de maio de 2018, apontou que o país ficou na terceira posição dos mais ignorantes do mundo [19]. E anteriormente, em 2017, uma pesquisa feita pelo Instituto IPSOS e 
vinculado pela Revista Exame, o Brasil ficou em segundo lugar no ranking sobre a realidade [20]. Situação inquietante e que provoca uma deformação social muito grave, mas possível de mudança, para isso, precisamos de um trabalho de sustentáculo de transfiguração social, pois só assim poderemos nos tornar relevantes culturalmente, economicamente e principalmente com grande aporte social para o mundo.
O Brasil precisa incongruentemente um choque de realidade. A coletividade está adoentada, está perdida e certamente perecerá por conta de ações conflitantes com o interesse da maioria. Vide as primeiras ações do atual governo, que em seus primeiros vinte e cinco dias de regência, está sufocado por escândalos contornando ministros do primeiro escalão em supostos casos de corrupção [21]. A luta por um inimigo invisível, cega a maioria do coletivo que sofre com anos de alienação, ao ponto do nupérrimo presidente do Instituto nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), o órgão responsável pelo Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) em seu discurso, cheio de paralogismos, atacou ideologias contrarias ao seu aceito, palrou sobre pseudointelectuais findando sua fala com: Formar Cidadãos.
Um serpentário de governo, responsável pelo órgão que realiza os exames do ensino médio, lendo um texto previamente escrito, enunciou: Cidadãos [22]. 
Carecemos de um Brasil digno, que respeite seus tratados, que acate seus princípios básicos, que proponha mudanças significativas de interesse isonômicos. 
Não podemos permitir que direitos sejam removidos, que tenhamos que abrir mão destes por desejo de uma casta privilegiada. Precisamos de um Estado forte, pujante, convergindo com a sociedade, necessitamos de um judiciário que não se comporte como uma Monarquia, onde Juízes e Ministros [23], são indiferentes aos interesses sociais, prezando apenas pelos seus privilégios, que tenhamos um Ministério Público de verdade, que faça jus ao significado de custos legis, e não uma promotoria de acusação medieval e inquisidora [24].
Pensar sobre formas de combater o anti-intelectualismo, a corrupção e a negação, são questões sine qua non, além da reflexão de todos os equívocos que 
criaram este engodo comunitário. Fazer esta digressão será a retomada da sensatez e construir um importante avanço, que feito de maneira sistematizada, responsável, organizada e progressista, promoverá a cautela de ações futuras e irá resguardar as liberdades individuais, respeitabilidade benevolente dos cidadãos. O Brasil passa por um grave retrocesso, por inúmeros equívocos de governos que tinham um grande apelo popular, isso não podemos negar, masque ao longo de sua trajetória, esqueceram de tocar em questões substanciais, inquirições importantes como o desenvolvimento cultural e social, melhorar a educação de base, e inclusive compreender o intricado povo brasileiro.
Infelizmente, chegamos ao ponto, onde criou-se uma guerra ideológica, cheia de espantalhos e opositores impalpáveis, tal qual durante a guerra fria, além de 
exacerbação do radicalismo, da misoginia, do machismo, da violência contra mulheres, negros, índios, homossexuais e desprotegidos. É inconcebível que aconteçam crimes de viés político-ideológicos como o da vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco. Transgressão que continua sem uma resposta definitiva das valências, apenas considerando uma possível rede soturna de ligações com políticos, entre eles o então deputado também pelo Rio de Janeiro Flavio 
Bolsonaro, filho do presidente, Jair Bolsonaro [25].
Mais recentemente, o deputado federal pelo Rio de Janeiro, Jean Willys, que havia sido reeleito, desistiu do seu mandato e se exilou do país, por conta de ameaças a sua integridade e de seus familiares, fora todo o preconceito que passou simplesmente por assumir sua homossexualidade. O deputado em nota, informou que sempre recebeu dezenas de ameaças, mas chegou ao ponto que começaram a ameaçar familiares, e isso, fez com que se abdicasse de seu direito de viver em seu próprio país, por conta da incapacidade do Estado Brasileiro garantir a segurança de um congressista [26].
Não podemos ficar inertes e indiferente a casos como estes, pois são fatores perigosos ao regime democrático, também demonstra a aceitação da anormalidade, desumaniza o personagem e transforma o pais numa selvageria sem controle. Desprezar estes sinais, são vitualhas que atiram a sociedade em regimes perigosos, em democracias solúveis e frágeis, terminando por fim em um regime totalitário. O esforço para a mudança a médio e longo prazo será custosa e sacrificante, porém é a única alternativa de resgate da sociedade e de sua democracia, com uma promoção da didática e da expansão da sociologia, juntamente com políticas públicas de inclusão, informação e assistência utilitária do Estado, cada vez mais oportunidades para uma parte da população, principalmente aqueles que possuem pouco alento e perspectiva. Poderemos sim nos tornar uma nação mais igualitária, mais democrática e menos acompanhando os novos tempos que o mundo moderno demanda.

Vinicius Viana Gonçalves é bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais Pela Faculdade Anhanguera do Rio Grande (FARG) e pós-graduado em Ciências Políticas pela Universidade Cândido Mendes (UCAM).


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