quinta-feira, 13 de janeiro de 2022

Presença de militares (com privilégios no desgoverno Bolsonaro, ânsia de poder e tradição golpísta) na política coloca em risco a higidez do processo eleitoral

 

Eleição para retomada da democracia ocorrerá sob perigosa tutela militar explícita, apontam especialistas

www.brasil247.com - Lula e Bolsonaro
Lula e Bolsonaro (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil | Ricardo Stuckert | Reuters)

Por Eduardo Maretti, na Rede Brasil Atual – O “Cenário político e eleitoral” e as perspectivas para as eleições de 2022 foram tema de debate realizado nesta quarta-feira (12) pela Rede Estação Democracia. As cientistas políticas Maria do Socorro Braga (Universidade Federal de São Carlos) e Ana Simão (Escola Superior de Propaganda e Marketing – Porto Alegre), além do economista Plínio de Arruda Sampaio Júnior discutiram sobre aquela que é considerada por alguns analistas como a mais importante eleição desde a redemocratização do país após a ditadura.

Para Maria do Socorro, a importância do pleito deste ano só é comparável à disputa de 1989, que abriu o período de eleições diretas após a sucessão de regimes militares (1964-1985) logo depois da promulgação da Constituição de 1988. O país realiza as eleições deste ano “em regime de tutela militar explicita”, afirmou Plínio.

A importância de 2022 se deve ao contexto de desconstrução promovido pelo governo de Jair Bolsonaro, opina Maria do Socorro. “Será uma eleição de reconstrução e talvez da reconstitucionalização do Brasil, a depender da união das forças democráticas do país”, avalia. Em sua opinião, no próximo período o país deve “recomeçar a democracia”, tanto na reconfiguração do sistema partidário como do ponto de vista constitucional.

Na avaliação de Plínio, com a conjuntura de grave crise civilizatória, “gravíssima” crise sanitária que não arrefece e crises social e politica profundas, a eleição por si só não vai resolver os problemas do país. O colapso do Estado nacional é fruto de um projeto pensado. Bolsonaro é consciente disso, o que ficou claro quando ele mesmo disse, em março de 2019, que sua tarefa era “desconstruir muita coisa”, destacaram os debatedores.

Competência para destruir

Nesse sentido, o projeto bolsonarista é realizado com competência, ao promover a destruição da Amazônia, do cerrado, do SUS, do Ibama, entre outras coisas, mencionou o economista. “Não adianta só tirar Bolsonaro”, afirmou. “A esquerda precisa de um programa de mudanças estruturais.”

Na opinião de Ana Simão, embora muitos analistas critiquem a chamada polarização, este não é um problema, até porque as eleições têm sido de fato polarizadas no país. O que a atual polarização trouxe de novo, porém, é a “carência de racionalidade”, introduzida já em 2018 por Bolsonaro e seus seguidores disseminando o ódio e a desinformação.

Plínio lembra que, apesar dos índices de popularidade de Bolsonaro estarem em queda, sua base de apoio “tem revelado resiliência”. “Há um resíduo reacionário de 15% no país que deixa Bolsonaro, mesmo sem nada a apresentar a não ser a truculência, em boas condições de disputar o segundo lugar.” Para ele, “se Lula materializar a aliança com Alckmin, praticamente internaliza a terceira via: Lula vira a primeira e a terceira via”. No entanto, se um eventual governo Lula tiver, por exemplo, um presidente do Banco Central “muito palatável ao capital, ficaremos aprisionados no mesmo modelo”, pondera.  

A direita neoliberal está muito dividida e o centro, fragmentado, lembra Maria do Socorro. O ex-juiz Sergio Moro “não chega nem a 10%” das intenções de votos. Já o atual chefe do Executivo pode ver a crise econômica, o desemprego, a inflação e a falta de politicas públicas reduzirem ainda mais seus eleitores. Esses desiludidos podem ir para Lula ou para uma terceira via. Na opinião da professora da Ufscar, se haverá ou não uma terceira via organizada para as eleições de 2022, isso ficará claro talvez em maio.

Ameaça à eleição?

Os debatedores foram questionados se poderia haver uma desestabilização da democracia no período eleitoral ou algo que ameace as eleições.

Maria do Socorro respondeu que tende a acreditar que tudo se encaminhe dentro da normalidade e no funcionamento das instituições, embora sob as regras da democracia liberal, “com as limitações que temos”. Porém, a analista faz uma ressalva. “Um segmento chama a atenção, e fico com um pé atrás: os militares”, diz. Ela questiona até que ponto setores militares e parte da elite estarão de acordo com uma vitória de Lula.

Nessa leitura, considerando que o atual governo está assentado no chamado “partido militar”, aparece a dúvida. A professora lembra que, em 2018, “puseram Lula na cadeia”. Para Ana Simão, não parece que algo vá impedir a eleição. “Acho que não tem espaço.”

“O momento é de grande instabilidade, e no Brasil em particular”, afirmou Plínio. Em grande parte devido à crise do capitalismo, mais impactantes nas periferias. Na avaliação do economista, poderá haver este ano um recrudescimento da pandemia, agravamento da crise econômica e turbulência social e política interna. “Já não estamos numa normalidade. O Brasil entrou em regime de tutela militar explicita”, disse.

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