quinta-feira, 4 de agosto de 2022

Caixa 2, lavagem de dinheiro e outros crimes eleitorais: Deltan Dallagnol, o "herói anticorrupção" da Lava Jato, vira suspeito no Paraná

 Partidos ajuízam ação cautelar e pedem investigação sobre possível esquema envolvendo ex-estagiário de Dallagnol

Deltan Dallagnol com uma camisa cinza, olhando para a câmera e sorrindo em foto oficial de campanha eleitoral
O ex-procurador Deltan Dallagnol, atual vice-presidente do Podemos e pré-candidato a deputado federal no Paraná. Foto: Divulgação

Parece que o jogo virou de vez para Deltan Dallagnol. O ex-procurador da Lava Jato pode passar ao banco dos réus por possíveis crimes eleitorais constatados antes mesmo da campanha de 2022 começar.

Vice-presidente do Podemos e pré-candidato a deputado federal pelo Paraná, Dallagnol acaba de virar objeto de uma ação ajuizada por partidos políticos que suspeitam do desvio de recursos do Fundo Partidário para custeio de despesas pessoais e de pré-campanha.

A ação cautelar apresentada nesta quarta-feira (3) ao Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) pela Federação Brasil da Esperança (PT, PCdoB e PV) pede urgência na “produção antecipada de provas” em face do Podemos, de Dallagnol e de seu assessor de confiança, o advogado Matheus Almeida Rios Carmo.

OS SUPOSTOS CRIMES

Segundo a apuração preliminar, Matheus Carmo, ex-estagiário de Dallagnol na Lava Jato, seria o pivô do suposto escândalo. Sem expertise na área, ele teria sido contratado como advogado eleitoral pelo Podemos poucas semanas depois que Dallagnol virou vice-presidente da agremiação e ganhou “poder de mando para articular a ‘contratação'”.

Os autores da ação duvidam da contraprestação de serviços e acreditam que parte dos pagamentos recebidos pela pessoa jurídica de Matheus Carmo (mais de R$ 100.000 em poucos meses) foi usada para bancar o marketing digital da pré-campanha de Dallagnol.

Para incrementar o enredo, o irmão de Matheus Carmo – um empresário do ramo de sons automotivos, algo muito diverso das mídias digitais – é responsável pelo domínio do site oficial da pré-campanha de Dallagnol.

Fotografia anexada à ação cautelar contra Deltan Dallagnol mostra a casa apontada como o escritório do advogado Matheus Carmo. Os autores consideram o imóvel “não compatível com o exercício das atividades típicas de um escritório de advocacia”

Triangulação, caixa 2, lavagem de dinheiro, abuso de poder econômico, apropriação indébita eleitoral. A ação cautelar assinada pelo advogado Luiz Eduardo Peccinin, representante da Federação Brasil da Esperança, leva ao TRE indícios de todos esses supostos crimes e cobra que Dallagnol abra as contas em nome da “transparência que sempre defendeu”.

“Se os devidos esclarecimentos não forem prestados ou não houver justificativa para as irregularidades, promoveremos as medidas cabíveis para cassar o registro de Deltan, prometeu o advogado da Federação.

O ESQUEMA

No processo de 599 páginas protocolado no TRE-PR, a Federação Brasil da Esperança levantou suspeitas sobretudo sobre a contratação de Matheus Carmo como advogado eleitoral do Podemos no Paraná.

O Podemos já com um time de advogados eleitorais renomados, que são titulares no único processo que Matheus Carmo advogou em nome do Podemos até agora. Sua contratação é vista como desnecessária.

De acordo com a ação, Matheus Carmo foi admitido assessor de confiança do então ex-procurador em fevereiro de 2018 e deixou o Ministério Público Federal na esteira do pedido de demissão de Dallagnol.

Chama atenção ainda que enquanto a pessoa jurídica de Matheus Carmo recebeu R$ 100 mil do Podemos em meses, outra empresa de advocacia que presta serviços eleitorais ao partido recebeu uma média de R$ 4 mil mensais – uma evidência de que o contrato do assessor de Dallagnol tem “valor exorbitante”.

Segundo os autores, o jovem advogado “pode estar utilizando os robustos honorários para pagar despesas pessoais e da pré-campanha de Deltan Matarazzo Dallagnol”.

Um ‘powerpoint’ para Deltan Dallagnol: ilustração anexada aos autos da ação cautelar mostra a “triangulação” do suposto esquema envolvendo os recursos do Fundo Partidário do Podemos

A “triangulação”, diz a ação, visa “lavar os recursos oriundos do Fundo Partidário através do respectivo contrato e posteriormente efetivando o pagamento de despesas pessoais de Deltan Dallagnol.”

“Se eventualmente constatado que MATHEUS está sendo utilizado como ‘triangulador’ para pagamento de despesas de DELTAN, inclusive seu domínio junto ao irmão de MATHEUS, BRUNO LEVI, estará concretamente comprovada a prática de ‘Caixa Dois’ em pré-campanha, lavagem de dinheiro dos recursos do fundo partidário e apropriação indébita eleitoral.”

PAGAMENTO DIRETO A DALLAGNOL

Entretanto, “os fatos não se resumem (1) ao valor exorbitante [do contrato de Matheus Carmo], (2) à ausência de prestação dos serviços advocatícios, (3) à vinculação pessoal do advogado com o ex-procurador, (4) ao poder de comando de DELTAN no PODEMOS/PR e (5) à detenção do domínio do site pessoal pertencer à empresa do irmão de MATHEUS; mas também por (6) elementos indicando a utilização dos recursos públicos oriundos do contrato advocatício citado para pagamento de DESPESAS PESSOAIS DO PRÉ-CANDIDATO DELTAN MARTINAZZO DALLAGNOL”.

Em dezembro de 2021, Deltan Dallagnol publicou uma nota informando que passara a receber um salário de R$ 15.000 do Podemos. Segundo a ação cautelar, esses pagamentos “cessaram a partir da ‘contratação’ do escritório do ex-estagiário MATHEUS“, e Dallagnol precisa explicar o motivo.

Comprovante do depósito de R$ 15.000 que o Podemos pagou a Deltan Dallagnol em dezembro de 2021. Segundo a investigação preliminar da Federação Brasil da Esperança, os pagamentos diretos a Deltan “cessaram” depois que o escritório de seu ex-estagiário foi contratado pelo Podemos

A ação cautelar pede que, no prazo de 3 dias, Deltan Dallagnol, o Podemos e Matheus Carmo sejam citados para apresentar comprovantes das despesas de pré-campanha. A Procuradoria Regional Eleitoral também precisa se manifestar.

Como tem feito uma “pré-campanha robusta” nas redes sociais, Deltan precisaria provar que o dinheiro para custeio não saiu do contrato com o assessor pessoal, pois isso “implica em de abuso do poder econômico, ‘caixa dois’, uso de recursos de fontes vedadas, além da incidência de outras tipificações eleitorais e penais.”

Procurada pela reportagem, a assessoria de Deltan Dallagnol afirmou que “em breve” ele irá se manifestar por meio de nota.

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