sexta-feira, 15 de julho de 2022

Xadrez dos militares (ou parcela deles) bolsonaristas golpistas, por Luis Nassif

 

É importante que os militares conspiradores comecem a pensar nos custos da conspiração. Enfrentarão não apenas a reação das instituições, mas as críticas dos colegas, pela desmoralização imposta às Forças Armadas.

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Peça 1 – o golpe em preparação.


Não há a menor dúvida de que o Ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira, participa da conspiração bolsonarista de colocar em dúvida as eleições. Assim como os generais Braga Neto, Augusto Heleno, Hamilton Mourão, Heber Portella, entre outros.

É aposta alta, com desdobramentos iniciais previsíveis – e consequências posteriores imprevisíveis.

Há inúmeras maneiras de boicotar as eleições, um factoide em torno das urnas de uma região, a não entrega de urnas por parte do Exército – incumbido de transportar as urnas até os Tribunais Regionais Eleitorais -, a introdução de um script malicioso por parte de alguma empresa cooptada.

O jogo dado, em caso de derrota de Bolsonaro, a partir da suspeita lançada, será contar com a agitação estimulada, os atentados dos Clubes de Caça e Tiro, a explosão da violência individual, para implantar um estado de exceção de prazo indeterminado.

Peça 2 – as consequências imediatas

A resistência ao golpe também é previsível.

Com exceção do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o indizível Luiz Fux, praticamente todas as instituições se manifestaram esta semana em defesa das eleições: vários Ministros do STF, o presidente do Senado, o Tribunal de Contas da União, a mídia, quase todos os partidos políticos.

O golpe suscitaria reação internacional imediata, a começar dos donos do dinheiro. Uma coisa é o que a mídia trata genericamente como “mercado” – operadores do dia-a-dia, com compreensão apenas sobre os movimentos da semana. Outra, são os donos do dinheiro, os gestores dos grandes fundos internacionais, as instituições multilaterais, a maioria das democracias ocidentais.

Haverá reação, também, em setores das Forças Armadas, que não endossarão os golpistas, o que estimulará a resistência contra o golpe.

De início, poderá haver adesão de parte do empresariado. Mas não será permanente, especialmente quando se explicitarem as represálias econômicas internacionais, além da indizível dificuldade de Paulo Guedes em gerir a economia. E não se trata apenas da política econômica, mas da notável incapacidade de Guedes em gerir o dia-a-dia da economia, agravada pela desorganização do mercado e do fluxo de recursos internacionais.

Portanto, o mais provável é que cada dia de golpe seja uma contagem regressiva para seu fim, um aumento do caos econômico, e um desgaste rápido do golpismo.

Peça 3 – o pós-golpe

Aí se chega no busílis da questão: como será o dia seguinte ao pós-golpe?

Ao contrário do fim da ditadura de 1964, desta vez não haverá um pacto de impunidade, que livrou da Justiça até crimes contra a humanidade.

A falta de experiência política dos militares de Bolsonaro impede-os de enxergar que nenhum poder é eterno. Hoje em dia, conspiram com naturalidade porque tem Bolsonaro na presidência. E quando cessar a blindagem?

Nem se espere represálias da parte do governo Lula – caso seja ele o eleito. Não será necessário. Bastará acabar com essa loucura do sigilo de cem anos para operações que escondem crimes. Caindo o sigilo, será derramada na praça uma sucessão imensa de suspeitas de crimes, das rachadinhas dos Bolsonaro aos crimes da Saúde, que ficarão à disposição de procuradores de primeira instância, de uma Procuradoria Geral da República independente, de um STF sem o comando de Luiz Fux, de um Tribunal de Contas da União ativo, de uma mídia francamente anti-Bolsonaro.

Não apenas os crimes. Todos os abusos atuais dos generais conspiradores virão à tona. Serão divulgados não apenas as operações suspeitas, mas os empregos distribuídos a granel, os abusos dos salários dobrados, as compras efetuadas, os custos das obras de engenharia militar.

Os julgamentos sobre a invasão do Capitólio, e a tentativa de Donald Trump de explodir uma guerra civil, servirão de modelo para o caso brasileiro.

É possível que o golpe seja bem-sucedido. E, para tal, será sangrento.

É mais provável que falhe. E, aí, é importante que os militares conspiradores comecem a pensar nos custos da conspiração. Enfrentarão não apenas a reação das instituições, mas as críticas dos colegas, pela desmoralização imposta às Forças Armadas.

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