quarta-feira, 25 de setembro de 2019

Como os Estados Unidos viram o "discurso" de Jair Bolsonaro, por Patrícia Faermann




Os mesmos jornais do país venerado por Bolsonaro ironizaram e criticaram o tom "nacionalista", de "ultra direita", "bombástico", "polêmico", "repleto de menções a Deus" e que "retribuiu o desprezo à comunidade internacional"



Trump elogia Bolsonaro nos bastidores da Assembleia Geral da ONU - Foto: Alan Santos/PR
Jornal GGN A única liderança internacional elogiada por Jair Bolsonaro no discurso da Assembleia Geral das Nações Unidas, nesta terça-feira (25), foi os Estados Unidos de Donald Trump, como era de se esperar. Entretanto, os mesmos jornais do país venerado por Bolsonaro ironizaram e criticaram o tom “nacionalista”, de “ultra direita”, “bombástico”, “polêmico”, “repleto de menções a Deus” e que “retribuiu o desprezo à comunidade internacional”.
GGN traz como as falas de Bolsonaro aprofundaram a crise diplomática do Brasil e tornaram o presidente do país uma caricatura da extrema direita na visão global:

The New York Times

The New York Times colocou Jair Bolsonaro na lista dos discursos “mais bombásticos” da Assembleia Geral da ONU, nesta terça-feira (25), juntamente com Donald Trump, dos Estados Unidos, o ditador egípcio Abdel Fattah el-Sisi, o autoritário presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, e o ultradireitista Boris Johnson que comanda o Reino Unido e debutará a separação definitiva do país no bloco europeu, o Brexit.
Ao tratar especificamente de Bolsonaro, o NYT introduziu com a seguinte apresentação: “Por vezes chamado de mini-Trump, uma figura polêmica em sua própria casa [Brasil] e que, como Trump, descarta os receios sobre as mudanças climáticas e desmerece quem o critica no Twitter”.
Apontando trechos de seu discurso, quando Bolsonaro responsabilizou de “sensacionalistas” a repercussão da mídia internacional pelas queimadas na Amazônia, e quando defendeu que o Brasil tem uma política de “zero tolerância” ao crime, destacou a fala de Bolsonaro de que “a Amazônia não está sendo devastada, nem está sendo consumida pelo fogo como a mídia enganosamente diz”.
Juntamente com estas falas, o The New York Times ressaltou: “a agência do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais do Brasil identificou 40.341 incêndios na região amazônica nos primeiros oito meses deste ano, cerca de 35% acima da média dos primeiros oito meses de cada ano, desde 2010”.
Em tom de ironia, o jornal norte-americano apontou que Bolsonaro “denunciou” o politicamente correto, finalizando expondo a fala do mandatário brasileiro: “a ideologia invadiu a própria alma humana para expulsar Deus e a dignidade que ele nos concedeu”.

The Washington Post

Em um especial dedicado ao polêmico discurso de Bolsonaro, o The Washington Post entrou com a ironia logo na manchete: “A Amazônia não está em chamas, diz Bolsonaro do Brasil à Assembleia Geral da ONU; está cheia de riquezas”. Na reportagem, o jornal afirma que Bolsonaro “rejeitou pedidos de intervenção estrangeira nas queimadas da Amazônia”, porque a região não estaria em chamas, na visão do líder brasileiro.
Destacou, ainda, a intenção de Bolsonaro de “explorar nosso potencial [da floresta] de uma maneira sustentável”, nas propostas do mandatário de “desenvolver” a região e as reservas indígenas. “As taxas de desmatamento na Amazônia quase dobraram desde que Bolsonaro, um nacionalista de direita, assumiu o cargo em janeiro”, adicional o periódico.
“Em um discurso repleto de menções a Deus, patriotismo e crítica ao socialismo, Bolsonaro disse que as potências estrangeiras estão de olho nas riquezas naturais do Brasil e ‘têm interesse em manter os indígenas vivendo como homens das cavernas’. (…) O presidente disse que vastas terras tribais estão cheias de ouro, diamantes e urânio esperando para serem explorados.”
A reportagem do Washington Post refere-se à fala de Bolsonaro sobre as riquezas da reserva Yanomami, mas relembra que, no local, “a mineração ilegal é tão intensa que mais da metade da população tem envenenamento por mercúrio, de acordo com um estudo realizado no início deste ano pela Fundação Oswaldo Cruz”. Também refere-se à indígena Ysani Kalapalo, que esteve na comitiva do mandatário, não tem o apoio da “vasta maioria dos indígenas e ativistas ambientais do Brasil”.
Ao jornal norte-americano, a chefe da Associação dos Povos Indígenas do Brasil, Sônia Guajajara, criticou o discurso de Bolsonaro e contrariou o posicionamento de Kalapalo: “Ele quer entregar nossa terra para exploração, e nunca vamos concordar com essa posição. (…) O movimento indígena nas cinco regiões deste país não aceita a política de Bolsonaro. Continuaremos lutando, nos opondo e nos tornando inimigos deste governo”, disse a líder indígena à reportagem dos EUA.

Huffpost

Também o Huffpost traçou críticas ao discurso do líder brasileiro na ONU, na reportagem “Jair Bolsonaro brasileiro defende o desmatamento: ‘A Amazônia não está sendo devastada'”, destacando o teor “de nacionalismo inflamado” de suas falas.
“O presidente de extrema-direita do Brasil, Jair Bolsonaro, culpou as organizações de imprensa internacionais e ambientais por espalharem ‘mentiras’ sobre os incêndios que assolam a floresta amazônica durante um discurso nacionalista que abriu a Assembléia Geral das Nações Unidas em 2019 na manhã de terça-feira. ‘A Amazônia não está sendo devastada’, disse Bolsonaro, contradizendo recentes reportagens da mídia e até dados científicos de seu próprio governo”, introduziu o jornal.
“Bolsonaro, um ex-oficial militar que elogiou a ditadura militar anterior do Brasil, está enfrentando escrutínio internacional por lidar com o surto recorde de incêndios na Amazônia, por esvaziar as agências ambientais, por reverter as proteções florestais e por negar a mudança climática – o foco central da cúpula anual da ONU deste ano”, continuou o jornal.
O Huffpost disse que “como era de se esperar”, o líder brasileiro retribuiu “o desprezo à comunidade internacional”, ao invés de ter tentado reatar o conflito diplomático. O ataque à ONU, recomendando que ela não seja “uma organização globalista”, ao “ambientalismo radical” e após transcrever trecho da carta da indígena lida por Bolsonaro no encontro, o jornal colocou uma observação entre parênteses: “(Bolsonaro já havia dito anteriormente que os indígenas brasileiros não têm “nenhum cultura “e que era” uma pena “não terem sido exterminados)”.
E concluiu a reportagem dizendo que “apesar de seus insistentes apelos para colocar o mercado por sobre a ideologia, Bolsonaro embebeu seu discurso em conceitos da era da Guerra Fria”. “Ele defendeu a expulsão de mais de 8.000 médicos cubanos, muitos dos quais atendiam a aldeias indígenas remotas do país logo após a posse, e culpou legiões de ‘agentes’ cubanos por instituir a ‘crueldade do socialismo’ na Venezuela atingida pela crise”, exemplificou o diário.

O inglês Financial Times

Em outro continente, mas com presença de leitores nos Estados Undios, o britânico Financial Times, em duas reportagens, mencionou como o presidente brasileiro está tratando a Amazônia. Em uma delas [aqui], que recomenda cinco livros para entender a batalha contra o desmatamento da Amazônia, assim descreve a atuação do atual presidente: “Mas para o líder nacionalista brasileiro Jair Bolsonaro, que abriu a Assembléia Geral da ONU hoje, a Amazônia se tornou outra coisa: um campo de batalha essencial para sua guerra cultural contra a esquerda”.
Em outra matéria [aqui], que trata sobre a atuação de Donald Trump contra os avanços dos países para evitar as mudanças climáticas, exemplifica que assim como o presidente do Brasil, que se viu alvo de uma crise diplomática internacional pelo “desrespeito do presidente brasileiro Jair Bolsonaro em proteger a floresta amazônica”, Trump pode ser alvo do mesmo destino.

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