segunda-feira, 16 de março de 2020

Até quando a má consciência conivente das elites nacionais permitirá que Bolsonaro abuse de nossa paciência?, por Antonio Rodrigues do Nascimento




Qualquer estudante de direito sabe que  a conduta que represente perigo para a vida ou saúde de outrem é crime capitulado no Código Penal

Até quando a má consciência das elites nacionais permitirá que Bolsonaro abuse de nossa paciência? 

por Antonio Rodrigues do Nascimento

“Até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência? (…) Não vês que tua conspiração foi dominada pelos que a conhecem? (Cícero, 63 AC)
Não é novidade que o Brasil passa por um rebaixamento político, ético e moral desde que parte substancial da sociedade brasileira, especialmente as parcelas representativas das classes médias e populares, foi instrumentalizada como infantaria na guerra híbrida deflagrada pelos Estados Unidos da América e por seus sócios locais contra o projeto nacional-desenvolvimentista iniciado no Governo Lula (2003-2006). 
Ao menos desde 2013, quando a insatisfação difusa da sociedade foi capturada pela extrema-direita com auxílio luxuoso e comprovado dos recursos financeiros e tecnológicos disponibilizados pelos EUA, já nos acostumamos às práticas de desestabilização das instituições democráticas por meio da fabricação de consensos nas mídias sociais; às manifestações de massa em nome de reivindicações e valores abstratos e, sobretudo, ao acirramento diuturno dos conflitos internos. 
No dia 15 de março de 2020, contudo, a liderança local da guerra híbrida, o títere do Império estadunidense, o infausto presidente Jair Bolsonaro, talvez por condicionamentos cognitivos ou pelas características de seu caráter ou, ainda, por ambos os fatores, parece ter ultrapassado com sua conduta celerada até mesmo os limites estabelecidos pelos padrões neo-obscurantistas que guiam os sectários agregados em torno de si.   
Como pode a autoridade mais importante da República, porque representativa da maioria dos cidadãos brasileiros, notoriamente suspeita de contaminação por um vírus que assola a saúde planetária, expor voluntariamente seus seguidores ao contágio e estimular condutas que contradizem as orientações das autoridades sanitárias do seu próprio governo? 
Qualquer estudante de direito sabe que  a conduta que represente perigo para a vida ou saúde de outrem é crime capitulado no Código Penal (“Art. 132 – Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena – detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.”)
Como pode um presidente eleito promover o ataque às instituições republicanas que têm a mesma legitimidade democrática que a Presidência? Como pode uma autoridade pública exortar impunimente a população contra o Poder Judiciário? 
Qualquer operador do direito medianamente formado sabe que atentar contra o livre exercício dos poderes constitucionais é crime de responsabilidade previsto na Lei do Impeachment (Lei nº 1079/1950: “Art. 6º São crimes de responsabilidade contra o livre exercício dos poderes legislativo e judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados: 1 – tentar dissolver o Congresso Nacional, impedir a reunião ou tentar impedir por qualquer modo o funcionamento de qualquer de suas Câmaras; […]”)
Até quando a má consciência daqueles que patrocinaram o impeachment sem crime de responsabilidade e a prisão sem culpa formada dos líderes do projeto nacional-desenvolvimentista permitirá que um ser desqualificado moral e politicamente como Jair Bolsonaro continue abusando de nossa paciência?
Por onde andarão os guardiões do interesse público, da probidade, da moral e dos bons costumes? Será que sucumbiram à culpa ou à covardia?
Antonio Rodrigues do Nascimento – Advogado e Professor de Direito, Mestre em Ciências Jurídico-Políticas (Universidade de Lisboa) e Especialista em Direito Administrativo (PUC-SP). Autor de “Crimes de responsabilidade e impeachment presidencial em Portugal e no Brasil” (in Estudos sobre o constitucionalismo no mundo de língua portuguesa – Vol. II – Brasil e Portugal, Lisboa: AAFDL, 2018, pp. 201-248)

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