domingo, 14 de junho de 2020

Xadrez da revanche ultra extrema-direita de Silvio Frota e o Dispositivo Militar de Bolsonaro, por Luis Nassif




A cada dia que passa mais fica minguada a base de apoio a ele. A continuar nesse ritmo, o mais provável é que, quando chegar o momento do confronto, Bolsonaro caia de maduro.
Jornal GGN:

Peça 1 – a derrota de Silvio Frota

Ministro do Exército em 1977, Silvio Frota era o representante mais ostensivo da linha-dura de Costa e Silva, o general do AI-5. No final do governo Geisel, Silvio Frota tentou se lançar candidato à Presidência. Seu discurso era a de que Geisel estava dando espaço para comunistas, tipo que ele via em todas as frestas do país.
Aliado do jogo por Geisel, Silvio Frota planejou um golpe de Estado. Geisel agiu antes.
No dia 10 de outubro de 1977, Geisel informou os generais Golberi do Couto e Silva, Chefe do Gabinete Civil, e Hugo Abreu, do Gabinete Militar, de sua decisão de demitir Frota. Seria em 12 de outubro, feriado em Brasília e, por isso mesmo, reduzindo a repercussão.
Foi feito um trabalho rápido de preparar as Forças Armadas para resistir à tentativa de golpe. Duas divisões foram essenciais. Do Rio de Janeiro, a Brigada de Paraquedistas comandada pelo general Fernando Valente Pamplona; em Brasília, o general Arnizaut de Matos, comandante militar do Planalto. A guarnição chave era a Infantaria Motorizada, sediada em Cristalina (GO).
Ponto central dessa história foi o general Roberto França Domingos, casado com uma sobrinha de Geisel e comandante daquela guarnição. Foi o fator de desequilíbrio, em um jogo em que Frota tinha o apoio  dos comandantes de dois dos quatro exércitos nacionais.
Frota foi varrido do jogo político. Quem acompanhou todos os passos foi o jovem capitão, membro do gabinete de Silvio Frota, Augusto Heleno, hoje general da reserva e Ministro-Chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). E, com ele, os resíduos da linha dura dentro do Exército, e dos homens do porão que, a exemplo de Jair Bolsonaro, se reorganizaram fora dos quartéis, muitas vezes em milícias.

Peça 2 – as visitas de sábado à tarde de Bolsonaro

No dia 24 de abril o então Ministro da Justiça Sérgio Moro pediu demissão. Era considerado uma das âncoras do governo e, sua saída, sinal de crise brava pela frente.
No dia 2 de maio, Bolsonaro foi de helicóptero a Cristalina e pousou no quartel do Exército.
Cristalina fica em Goiás, no alto da Serra dos Cristais, a 132 km de distância, na bifurcação de uma rodovia. Um lado liga Distrito Federal ao Rio de Janeiro e ao Triângulo Mineiro; outro lado liga o DF a São Paulo e ao Sudeste,
E tem a 3a Brigada de Infantaria e uma Companhia da Polícia do Exército.
No dia 30 de maio, Bolsonaro foi a Abadiânia, a 119 km de Brasília, em companhia do deputado major Vitor Hugo (PSL-GO). O deputado, eleito pela Polícia Militar de Goiás, divulgou um vídeo de Bolsonaro recebendo homenagem de militares.

Ontem, Bolsonaro visitou Formosa (GO) a apenas 80 km de BSB a porta de acesso ao Norte Nordeste e Oeste da Bahia. Visitou o quartel e também o Clube de Tiro da cidade.
Formosa fica a apenas 80 km de Brasília. Recentemente, houve a transferência, para lá, do Centro de Instrução e Artilharia de Mísseis e Foguetes, que anteriormente ficava no Rio Grande do Sul. Foi uma mudança técnica do Alto Comando das Forças Armadas. 
Sem máscara Bolsonaro visitou o Comando de Artilharia do Exército e foi convidado a disparar um foguete SS40.
Do ponto de vista tático, as guarnições visitadas por Bolsonaro controlam todas as portas de entrada para Brasília. Se alguém pretendesse um golpe de estado clássico, os três locais seriam estratégicos.

Peça 3 – o significado das visitas às guarnições militares

Vamos conferir, primeiro, as questões mais objetivas:
  1. O governo Bolsonaro agoniza. Fica cada vez mais claro que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) está disposto a interromper a destruição do país.
  2. O dispositivo militar de Bolsonaro – os generais Hamilton Mourão, Braga Neto, Luiz Eduardo Ramos, Augusto Heleno e Eduardo Pazuello – procura montar o contra-ataque. Tem levantado argumentos sobre a suposta infiltração internacional nas manifestações, trata as manifestações como criminosas e ora ameaça, ora recua, em relação ao Supremo Tribunal Federal.
  3. Há um movimento claro de armar as milícias, com mudança em regulamentos para facilitar a posse de armas, e conclamações de Bolsonaro, para a população se armar.
  4. As manifestações do Dispositivo Militar de Bolsonaro mostram claros preparativos para a guerra política. Suspensão de informações contrárias ao governo, criminalização dos protestos, reação contra tribunais, aparelhamento do Ministério da Saúde, subordinando-o às estratégias políticas de Bolsonaro, tudo indica reforço da trincheira para comandar um contra-ataque aos inimigos.
É evidente que as visitas de Bolsonaro a guarnições militares estratégicas fazem parte dessa estratégia de guerra.
Há dúvidas apenas sobre a motivação.
Hipótese 1 – tenta cooptar guarnições para o golpe.
Hipótese 2 – trabalha para reduzir as resistências das guarnições, para casos de reações armadas de grupos pró-Bolsonaro.

Peça 4 – o mapa do golpe 

Tudo indica  a Hipótese 2 como a mais provável. 
Todos os sinais indicam que a atual geração das Forças Armadas é imune a aventuras golpistas. Os generais palacianos são isso aí: generais de Bolsonaro, defendendo o governo Bolsonaro e os seus próprios cargos, e não avalistas das Forças Armadas junto a um governo abilolado.
Então com quem Bolsonaro ousaria o golpe? Sua base de apoio armado é óbvia, mas ainda sem uma organização central:
* Policiais de bases da Polícia Militar. Em alguns estados, como Goiás, provavelmente toda a corporação.
* Clubes de tiros.
* MIlícias do Rio de Janeiro e outros estados, para onde elas se expandiram.
* Fanáticos em geral, distribuídos pelo país, mas sem dimensão política ou bélica maior.
Por tudo isso, o mapa do golpe parece claro.
  1. Aguardar a ampliação dos protestos e procurar criminalizá-los.
  2. Desenvolver a narrativa da perseguição das instituições contra ele.
  3. Acelerar a arregimentação dos seus aliados armados.
Ocorre que o governo Bolsonaro já entrou na reta final. Esgotou-se politicamente e isolou-se em relação aos aliados iniciais. Agora, entra-se na contagem regressiva para o julgamento no TSE, sujeita a acelerar dependendo de novos abusos de Bolsonaro.
Os últimos episódios – como a sonegação de informações do Covid-19 – comprovam que os absurdos continuarão se repetindo diariamente. Os militares de Bolsonaro já ligaram o botão de pânico e terão que acelerar – e se expor diariamente – para montar suas trincheiras e tentar sair da defensiva atual.
Se houver alguma iniciativa maior de reação, será através de eventuais Policiais Militares estaduais.
Há um histórico de intervenção das Polícias Militares na história do Brasil.
No contragolpe do Marechal Lott, a PM mineira foi decisiva para assegurar a posse de JK.
Em 1964, o governador mineiro Magalhães Pinto já tinha montado até um Ministério para a hipótese de assumir o poder. Escudava-se também na PM mineira, anunciando que poderia virar um Exército com a decretação do estado de beligerância.
Quando o general Newton Cruz (da turma do Augusto Heleno) tentou impedir a eleição de Tancredo Neves, o governador mineiro Hélio Garcia reagiu, avisando que a PM de Minas viraria exército.
Por tudo isso, os governadores terão papel central no contragolpe. E, nos principais estados, Bolsonaro não conta mais com aliados.
A cada dia que passa mais fica minguada a base de apoio a ele. A continuar nesse ritmo, o mais provável é que, quando chegar o momento do confronto, Bolsonaro caia de maduro. E seu dispositivo militar seja uma repetição do famoso Dispositivo Assis Brasil. E pessoas como os generais de Bolsonaro, os Ministros fundamentalistas, os oportunistas que entraram no barco, comecem a pular fora, se preparando para entrar no lixo da história.

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