quarta-feira, 10 de abril de 2019

Do Justificando: Militares, um falso engano, 80 tiros certeiros, por Maciana Souza


Durante a intervenção, 6.041 pessoas morreram de forma violenta no Rio. Não há justificativa para isto. Apenas excesso de uso da força. Mortes que poderiam ter sido evitadas



Por Maciana de Freitas e Souza
Dentre as garantias fundamentais presentes no ordenamento jurídico, podemos citar o chamado “direito de livre locomoção”. Na Constituição de 1988, essa garantia está descrita no artigo 5º, XV: “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”. Na prática, é de se notar que o tal “direito de ir e vir” ainda não é uma realidade para todos.
Ontem, tornou-se de conhecimento público, que o músico Evaldo dos Santos teve sua vida interrompida pela violência do Estado, em Guadalupe, Zona Norte do Rio de janeiro. O mesmo tinha saído de casa com sua família para um chá de bebê e teve seu carro alvejado por 80 tiros durante uma ação do Exército. Sim,80 tiros.
Durante a intervenção, 6.041 pessoas morreram de forma violenta no Estado, uma redução de -1,7% em relação aos registros de 2017, números do Observatório da Intervenção. Não há justificativa para isto. Apenas excesso de uso da força. Mortes que poderiam ter sido evitadas.
As altas taxas de homicídio da juventude negra nos alertam sobre a importância de ações de enfrentamento e de proteção e garantia de direitos para esse grupo. A segurança é um direito social que deve ser garantido pelo Estado brasileiro a todos cidadãos.
Essa situação coloca em xeque o mito de democracia racial defendida ainda por alguns, sobre o qual não haveria racismo no país. Entendermos assim, que o racismo é um elemento determinante também no processo de perpetração da violência sobretudo por aqueles que são moradores das periferias das grandes cidades, o que faz aumentar a probabilidade de vitimização da juventude negra.
Esse contexto de letalidade, mostra a falta de uma política de segurança pública eficaz conduzidas pelas autoridades brasileiras e fluminenses no que diz respeito ao seu dever de prevenção das mortes violentas. No plano real, as ações empreendidas pelo Estado em nome da “segurança” revelam outras violações de direitos.
Diante desse quadro, é necessário que sejam dados passos cada vez mais coletivos para a redução das situações de violência. A política de segurança pública deve ser entendida com ações preventivas em sua origem, faz-se necessário a construção de estratégias governamentais para conceder prioridade à proteção da vida e diminuição de confrontos em favelas e periferias, estimulando o policiamento baseado em ações de inteligência para desarticular grupos armados. Fortalecer o controle de armas, bem como a criação de um plano de redução de danos para evitar violações de direitos humanos durante as operações. Todos esses passos são fundamentais para desenhar políticas de segurança que sejam efetivas.
Os milhares de homens das forças de segurança nas ruas e favelas não têm produzido os resultados esperados. Em resumo, as práticas violentas continuam predominando. Segundo o monitoramento do Observatório, no período dos cinco meses de intervenção, tiroteios e disparos aumentaram 37%. As chacinas aumentaram 80% e as mortes em chacinas (três pessoas mortas ou mais), 128%. Enquanto isso, a apreensão de fuzis, metralhadoras e submetralhadoras caiu 39% de fevereiro a maio de 2018 em relação ao mesmo período em 2017.
Desde a intervenção federal em 2017 vários problemas e questões permanecem abertos um deles são os ataques aos direitos humanos e uma abordagem dos problemas de violência e criminalidade a partir de uma lógica de guerra, baseada no uso de tropas de combate, ocupações de favelas e grandes operações. O número de mortes provocadas por agentes públicos durante a intervenção federal disparou e com os novos governos tende a aumentar ainda mais. Temos muitos desafios pela frente.
Nossa solidariedade à família de Evaldo dos Santos e à todas as famílias vítimas da violência do Estado.
Maciana de Freitas e Souza é bacharela em Serviço Social pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN).


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