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segunda-feira, 21 de abril de 2025

segunda-feira, 16 de setembro de 2024

Teto-Terra-Trabalho: mantra dos movimentos sociais populares, por Leonardo Boff, teólogo, ecologista e filósofo

 

”Estamos no mesmo barco, ou nos salvamos todos ou ninguém se salva”


Artigo Leonardo Boff, publicado no iclnotícias

O Papa Francisco está sujeito à crítica furiosa de alguns grupos católicos conservadores, incapazes de sair de sua bolha tradicional. A razão reside na forma como cuida da Igreja. Não o faz no estilo tradicional, diria, principesco e faraônico no seu estilo, herdado dos primeiros imperadores cristãos que passaram aos padres, aos bispos e ao Papa todos os privilégios, estilos de vida, modos de se vestir dos imperadores, dos senadores e das elites ricas imperiais. Isso vem desde o século terceiro e, fundamentalmente, perdura até os dias de hoje. Ao ver o desfile dos cardeais quando se encontram todos em Roma parece que estamos no Sambódromo do Rio ou de São Paulo, tal é a pompa e o colorido dos vestuários. Tudo isso não tem nada a ver com o pobre Jesus de Nazaré.

Mas não é disso que quero tratar. Quero me referir a uma inovação surpreendente que o Papa Francisco introduziu. Só poderia vir dele, fora da galáxia católica centro-europeia, mas de alguém que “vem do fim do mudo” como tem se expressado com frequência. Vir do fim do mundo, significa que vem da experiência de uma Igreja que não é mais espelho da europeia, mas fonte própria, que lança suas raízes nos meios populares, que faz uma opção preferencial pelos empobrecidos e injustamente colocados à margem do processo social vigente, controlado pelas classes dominantes e organizado em favor de seus privilégios. Um tipo de Igreja que não tem nada de imperial ou faraônico, mas que assume as dores e o destino trágico dos descartados pelo sistema atual.

Exemplo disso são os muitos encontros que fez com os Movimentos Sociais Populares, vindos do mundo inteiro. Isso nunca se viu na história. A eclesiologia dominante, quer dizer, a doutrina sobre a Igreja concentra ainda hoje todo o poder de decisão nas mãos da hierarquia. O Concílio Vaticano II (1962-1965) introduziu o conceito de Igreja como Povo de Deus que pressupõe a igualdade entre todos. Mas prevaleceu o conceito de Igreja como comunhão. Mas logo esvaziou o conceito ao dizer que é uma comunhão hierárquica, que equivale dizer, que é como uma escada, dentro dela tem gente que está graus acima e gente que está graus abaixo. Se é comunhão vigora uma igualdade entre todos, não se toleram hierarquias, de gente em cima e de gente em baixo. Se estas existirem são apenas funcionais porque ninguém faz tudo e assume todas as tarefas mas as distribui aos vários participantes. São Paulo o formulou muito bem em suas epístolas, usando a metáfora do corpo humano:” o olho não pode dizer à mão, não preciso de ti, nem a cabeça aos pés, não preciso de vós” 1Cor 12,21). Todos os membros são igualmente importantes. Nem pensemos nas mulheres totalmente destituídas de qualquer poder decisório, embora sejam aquelas que fazem a maioria dos serviços eclesiais.

Em setembro realizar-se-á em Roma os dez anos depois do primeiro encontro feito em 2014 dos Movimentos Sociais Mundiais. Lá estará o nosso João Pedro Stédile entre aqueles que falarão para a multidão. Nesse encontro se retomará o mantra inaugurado em 2014: os famosos 3 T’s: Teto-Terra-Trabalho assim detalhados: “Nenhuma família sem teto, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhuma pessoa sem a dignidade que o trabalho confere”.

No encontro em setembro já se definiu o lema: “Plantar a bandeira contra a desumanização”. Se há um fenômeno atualmente dos mais perversos é um processo acelerado de desumanização. Há algo de mais desumano o fato de que quase metade da riqueza no mundo está na mão de 1% da população (Global Wealth Report 2023) ao lado de cerca, segundo a FAO, 800 milhões de famélicos e um bilhão com insuficiência alimentar? Se os 3 mil bilionários pagassem somente 2% de suas fortunas em imposto geraria US 250 bilhões (RS 1.32 trilhão), como no G20 Brasil e França sugeriram. Isso garantiria a vida de todos os ameaçados pela fome e doenças da fome.

O genocídio perpetrado pelo Estado de Israel na Faixa de Gaza vitimando cerca de 12.300 crianças com o apoio de um Presidente norte-americano católico e pela Comunidade Europeia, esquecida de sua tradição que fundou os direitos dos cidadãos e as várias formas de democracia. Isso é feito ao céu aberto, tornando cumplices seus apoiadores além de negar comida, água e energia a uma inteira população, um manifesto crime contra a humanidade.

Além da guerra Rússia-Ucrânia na qual uma venerável civilização irmã está sendo destruída, a Ucrânia, existem 18 lugares de conflitos severos com alta letalidade de vidas.

Enquanto isso, o papa na Indonésia, na maior nação muçulmana do mundo, num evento inter-religioso proclamava: “que todos nós, juntos, cada um cultivando a sua espiritualidade e praticando a sua religião, possamos caminhar à procura de Deus e contribuir para a construção de sociedades abertas, fundadas no respeito mútuo e no amor recíproco”. Desafiava os cristãos com estas palavras: “não se cansem de zarpar para o mar alto, lancem as redes, não se cansem de sonhar e de construir uma civilização de paz”.

São palavras de esperança quase desesperada face à desumanização reinante, com a consciência daquilo que disse na encíclica Fratelli tutti: ”estamos no mesmo barco, ou nos salvamos todos ou ninguém se salva” (n. 32). Mas todos juntos e conscientizados podemos dar um rumo novo à nossa história comum, apontando para uma biocivilização e para uma Terra da Boa Esperança.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

Papa Francisco pede ‘vacina para todos’ e critica ‘vírus do individualismo radical’ narcisista e exclusivista

 

“Não me posso pôr a mim mesmo antes dos outros, colocando as leis do mercado e as patentes de invenções acima das leis do amor e da saúde da humanidade”, disse Francisco


Vatican News
O papa lembrou o compromisso solidário com "as pessoas mais frágeis, os doentes e quantos neste tempo se encontram desempregados ou estão em graves dificuldades pelas consequências económicas da pandemia"

“No Natal, celebramos a luz de Cristo que vem hoje ao mundo e Ele vem para todos: não só para alguns. Hoje, neste tempo de escuridão e incertezas pela pandemia, aparecem várias luzes de esperança, como a descoberta das vacinas”, apontou o papa.

“Peço a todos os responsáveis dos Estados, empresas, organismos internacionais, que promovam a cooperação e não a concorrência, procurando uma solução para todos, vacinas para todos, especialmente os mais vulneráveis e necessitados de todas as regiões do planeta. Em primeiro lugar, os mais vulneráveis e necessitados”, disse.

‘Vírus do individualismo radical’

O Papa Francisco criticou ainda “o vírus do individualismo radical” que torna as pessoas “indiferentes ao sofrimento de outros irmãos e irmãs”, segundo ele. “Não me posso pôr a mim mesmo antes dos outros, colocando as leis do mercado e as patentes de invenções acima das leis do amor e da saúde da humanidade”, pontuou.

Na mensagem, o papa lembrou ainda o compromisso solidário com “as pessoas mais frágeis, os doentes e quantos neste tempo se encontram desempregados ou estão em graves dificuldades pelas consequências económicas da pandemia”, destacando “as mulheres que nestes meses de confinamento sofreram violência doméstica”.

Ao realizar um balanço da situação em diversos países, o Papa referiu-se à América Latina desejando “que a eterna Palavra do Pai seja uma fonte de esperança para o continente americano, particularmente afetado pelo coronavírus, que tem agravado os muitos sofrimentos que o oprimem, muitas vezes agravado pelas consequências da corrupção e do tráfico de drogas.”

Com informações de Agência Ecclesia e El Diario



quarta-feira, 1 de abril de 2020

Papa teme ‘genocídio viral’ caso o mundo priorize a economia e a riqueza de uma minoria em vez da saúde da maioria



O Papa Francisco enviou uma carta ao presidente da Comissão Pan-Americana de Juízes para os Direitos Sociais, Roberto Andrés Gallardo, alertando os governos que não adotam medidas para defender a população do coronavírus. O documento foi enviado no último sábado (28). A informação é da agência Vatican News.

Do BHAZ:

papa reza coronavírus

“Estamos todos preocupados com o crescimento, em progressão geométrica, da pandemia. Estou feliz com a reação de tantas pessoas, médicos, enfermeiros, enfermeiras, voluntários, religiosos, sacerdotes que arriscam suas vidas para curar e defender as pessoas saudáveis do contágio”, ressaltou Francisco.
O pontífice destacou que “alguns governos adotaram medidas exemplares com prioridades bem definidas para defender a população”.
“É verdade que essas medidas ‘incomodam’ aqueles que são obrigados a cumpri-las, mas é sempre para o bem comum e, a longo prazo, a maioria das pessoas as aceita e se move com uma atitude positiva. Os governos que enfrentam a crise mostram a prioridade de suas decisões: primeiro as pessoas. E isso é importante, pois sabemos que defender as pessoas supõe um prejuízo econômico”, destacou.
Segundo o Papa, “seria triste se o oposto fosse escolhido, o que levaria à morte de muitas pessoas, algo como um genocídio viral”.

Consequências da pandemia

Segundo Francisco, já se notam algumas consequências da pandemia do Covid-19 que devem ser enfrentadas. A fome das pessoas sem trabalho fixo, o aparecimento de agiotas e a violência são alguns dos efeitos mencionados pelo Papa.
Em relação “ao futuro econômico”, o pontífice recorda a visão da economista Mariana Mazzucato, professora da University College London destacada no livro “O valor de tudo. Quem produz e quem subtrai na economia global”, publicado em 2018, ressaltando que tal pensamento “ajuda a pensar o futuro”.
O livro conta como especuladores e rentistas fingem ser criadores de valores na economia global e lança um apelo a fim de repensar o valor como a chave para criar um mundo diferente e melhor.

quarta-feira, 4 de março de 2020

Considerações sobre o Papa Francisco, por Michael Löwy



"Uma análise do perfil e das ações de Jorge Bergoglio, o Papa que redirecionou as posições da Igreja Católica", escreve o diretor de pesquisas, na França, do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS), Michael Löwy



Por Michael Löwy
Contra as versões falsificadas de Francisco, o Papa dos Pobres

O artigo se posiciona contra as versões falsificadas de Francisco, o Papa dos Pobres (Foto: REUTERS/Filippo Monteforte/Pool)


(artigo publicado originalmente no site A Terra é Redonda)
A hipótese de Max Weber
Max Weber argumentava, em seu célebre ensaio de sociologia das religiões, que a ética protestante era favorável ao desenvolvimento do capitalismo, especialmente na Inglaterra e nos Estados Unidos; encontramos uma hipótese análoga, meio século antes, em certos escritos de Marx (em especial, nos Grundrisse). Todavia, neste mesmo texto, Weber sugere que a ética católica era, ao contrário, fundamentalmente hostil ao espírito do capitalismo.
Em uma nota de rodapé, no contexto de uma polêmica contra os trabalhos de Franz Keller, ele afirma que as tomadas de posição da Igreja Católica em relação ao capitalismo enquanto tal são determinadas por uma “aversão tradicionalista, sentida o mais das vezes de forma confusa, contra o crescente poder impessoal do capital – dificilmente suscetível, por isso mesmo, de eticização”[i]
No decorrer do debate que provocou a publicação de seu livro, Weber propôs um novo conceito: o de uma incompatibilidade (Unvereinbarkeit) entre os ideais aos quais se subscreve o crente católico seriamente convencido” e a “busca ‘comercial’ do ganho”. De fato, esta incompatibilidade não exclui as adaptações, mas, acrescenta o sociólogo, “eu não posso interpretar os numerosos ‘compromissos’ práticos e teóricos senão justamente como ‘compromissos’”[ii]. Em outros termos: se existem compromissos, é porque duas potências hostis se confrontam, e a Unvereinbarkeitcontinua sendo o tom dominante da relação católica com o espírito do capitalismo.
Ele retorna a esta problemática em diversos outros textos, notadamente em sua História Econômica: “A aversão profunda da ética católica, seguida pela ética luterana, a toda tendência capitalista repousa essencialmente sobre a repugnância que lhes inspira a impessoalidade das relações no interior da economia capitalista. Esta impessoalidade subtrai da igreja e de sua influência moralizadora certas relações humanas, excluindo assim toda infiltração e toda regulamentação ética de sua parte.”[iii]
A hipótese weberiana me parece essencial para compreender diversos fenômenos sociorreligiosos, desde o século XIX até hoje. De fato, esta hostilidade, esta aversão, esta “antipatia” (um outro termo utilizado por Weber) contra o capitalismo assumiu, particularmente no século XIX, um caráter conservador, retrógrado, em uma palavra, reacionário. Estas manifestações não tinham escapado à atenção de Marx e Engels, que as designou ironicamente de “socialismo feudal”.
Eis o que dizem sobre o assunto no Manifesto do Partido Comunista, que as denuncia, mesmo reconhecendo a sua dimensão crítica (antiburguesa): “O socialismo feudal, um misto de lamento, pasquim, eco do passado e vaticínio das ameaças do futuro – por vezes, atingindo a burguesia no coração com veredictos amargos e espirituosamente dilacerantes, mas sempre causando impressão engraçada, graças a sua total incapacidade de compreender o curso da história moderna”[iv].
Tratava-se, provavelmente, de autores tais como o filósofo social romântico e católico Johannes von Baader, firme partidário da Igreja e do Rei que denunciava, no entanto, a condição miserável dos proletairs (seu termo) na Inglaterra e na França, mais cruel e desumana do que a servidão. Criticando a exploração brutal e nada cristã desta classe desprovida pelos interesses do dinheiro (Argyrokratie), ele propõe que o clero católico se torne o defensor e o representante dos proletairs.[v]
Dito isso, vê-se aparecer, no seio do capitalismo, uma corrente anticapitalista de esquerda. Paradoxalmente, o crescimento de uma esquerda católica aparece em relação ao fato de que a Igreja se mostrava cada vez mais disposta a procurar um compromisso com a sociedade burguesa. Depois da mordaz condenação dos princípios liberais no Syllabus (1864), Roma parecia admitir, desde o fim do século XIX, o advento do capitalismo e o estabelecimento de um Estado moderno (“liberal”) burguês como fatos irreversíveis.
A manifestação mais aparente dessa nova estratégia foi a aproximação da Igreja francesa (até então defensora incondicional da monarquia) com a República. O catolicismo intransigente toma a forma de um “catolicismo social” que, ainda que criticando sempre os excessos do “capitalismo liberal”, não mais coloca verdadeiramente em questão a ordem social e a economia existentes. Seguem na mesma direção todos os documentos provenientes da magistratura romana (os encíclicos pontificiais) assim como a doutrina social da Igreja, do Rerum Novarum (1891) até Ratzinger (Bento XVI).
Foi precisamente no momento da “reconciliação” – real ou aparente – da Igreja com o mundo moderno que apareceu uma nova forma de socialismo católico, notadamente na França, que se tornaria uma minoria consequente na cultura católica francesa. Na virada do século, vê-se florescer simultaneamente as formas mais reacionárias do anticapitalismo católico – Charles Maurras, o movimento da Ação Francesa e a ala regressiva da Igreja, que assumiriam uma parte ativa na sinistra campanha antissemita contra Dreyfus – e uma forma de anticapitalismo não menos “intransigente”, mas agora de esquerda, cujo primeiro representante foi o escritor dreyfusiano filosemita e socialista libertário, Charles Péguy, que tornou-se católico em 1907 apesar de jamais ter sido recebido pela Igreja. Esta corrente não era isenta de ambiguidades, mas seu engajamento fundamental era à esquerda.
A partir do fim do século XIX, e mais ainda depois da Revolução Russa, era evidente que o inimigo principal do Vaticano não era mais o “liberalismo” burguês, mas definitivamente o movimento operário socialista e, em particular, o “comunismo ateu”. Pio XII vai se distinguir neste combate, excomungando os comunistas na Itália (1948) e interditando, na França, a atividade de padres operários, excessivamente próximos da CGT (anos 1950). Woytila, João Paulo II, o papa polonês, reassumirá esta iniciativa em um novo contexto histórico.
Apesar da hostilidade romana, a esquerda católica continua a se desenvolver na Europa e ainda mais na América Latina, com o crescimento, a partir de 1960, da Teologia da Libertação. Uma das características principais desta corrente, representada por movimentos estudantis, operários e rurais, por comunidades de base, teólogos, mas também de bispos, é a condenação intransigente, moral e política, do capitalismo, em termos nos quais a influência do marxismo é visível.
Veja-se, por exemplo, a conclusão do documento Marginalização de um povo: o grito das igrejas, assinado pelos bispos e superiores de ordens religiosas da região Centro Oeste do Brasil: “É preciso vencer o capitalismo: ele é o maior mal, o pecado acumulado, a raiz podre, a árvore que produz todos os frutos que conhecemos tão bem: a pobreza, a fome, a doença, a morte. Por isso, é preciso que a propriedade privada dos meios de produção (fábricas, terra, comércio, bancos) seja superada.”[vi]
Se Paulo VI manifestou certa tolerância face à teologia da libertação, o mesmo não foi o caso dos dois pontífices seguintes: João Paulo II e Bento XVI perseguiram ativamente seus representantes, chegando a impor ao teólogo Leonardo Boff um ano de “silêncio obsequioso”.
Jorge Bergoglio, o Papa Francisco
O que esperar do Cardeal Jorge Bergoglio, eleito Pontifex Maximum em março de 2013? De fato, ele era um latino americano, o que já significava uma mudança. Mas ele fora escolhido pelo mesmo conclave que havia empossado o conservador Ratzinger, e vinha da Argentina, um país onde a Igreja não prima pelo progressismo – tendo vários de seus dignatários cooperado ativamente com a sanguinária ditadura militar. Este não foi o caso de Bergoglio – segundo certas testemunhas, ele teria até mesmo ajudado perseguidos pela Junta a se esconder ou a sair do país – mas ele também não era opositor ao regime: um “pecado por omissão”, poder-se-ia dizer. Se alguns cristãos de esquerda como Adolfo Perez Esquivel (Prêmio Nobel da Paz) sempre o apoiaram, outros o consideravam como um opositor de direita ao governo dos “peronistas de esquerda” Nestor e Christina Kirchner.
Seja o que for, uma vez eleito, Francisco – o nome que ele escolheu, em referência a São Francisco, o amigo dos pobres e dos pássaros – se distinguiu imediatamente pelas tomadas de posição engajadas e corajosas. Em certo sentido ele faz lembrar do papa Roncalli, João XXIII: eleito como “papa de transição” para assegurar a continuidade da tradição, que deu início à transformação mais profunda na Igreja em séculos: o Concílio Vaticano II (1962-65). Aliás, Bergoglio tinha pensado, num primeiro momento, em assumir o nome de “João XXIV”, em honra a seu predecessor dos anos 1960.
A primeira viagem do novo pontífice para fora de Roma ocorreu em julho de 2013, no porto italiano de Lampedusa, onde chegavam centenas de imigrantes clandestinos, ao passo que muitos deles tinham se afogado no Mediterrâneo. Em sua homília, ele não temeu assumir a contracorrente do governo italiano – e de boa parte da opinião pública – ao denunciar a “globalização da indiferença” que nos deixa “insensíveis aos gritos dos outros”, isto é, ao destino “dos imigrantes mortos no mar, nestes barcos que, no lugar de serem um caminho da esperança, foram uma rota para a morte”. Ele retornaria em várias ocasiões a esta crítica da desumanidade da política europeia quanto aos imigrantes.
Quanto a América Latina, uma transformação notável também aconteceu. Em setembro de 2013, Francisco encontrou-se com Gustavo Gutierrez, o fundador da teologia da libertação, e o jornal do Vaticano, Osservatore romano, publicou pela primeira vez um artigo favorável a este pensador. Outro gesto também simbólico foi a beatificação de Dom Romero, arquiduque de El Salvador, assassinado em 1980 pelos militares por ter denunciado a repressão contra a população[1]  – um herói celebrado pela esquerda católica latino-americana, mas ignorado pelos Pontífices precedentes. Na ocasião de sua visita à Bolívia, em julho de 2015, Bergoglio prestou uma imensa e vibrante homenagem à memória de seu companheiro[2]  jesuíta, Luis Espinal de Camps, um padre missionário espanhol, poeta e cineasta, morto sob a ditadura de Luis Garcia Meza, a 21 de março de 1980, em razão de seu engajamento nas lutas sociais. Em seu encontro com Evo Morales, o presidente socialista boliviano ofereceu-lhe uma escultura feita pelo mártir jesuíta: uma cruz posta sobre uma foice e um martelo em madeira.
Em sua visita à Bolívia, Francisco visitou um Encontro Mundial de Movimentos Sociais na cidade de Santa Cruz. Seu discurso, na ocasião, ilustra a “profunda aversão” ao capitalismo da qual falava Max Weber, mas em um nível jamais alcançado por qualquer um de seus predecessores. Segue uma passagem, que se tornou célebre, desta intervenção: “Está-se a castigar a terra, os povos e as pessoas de forma quase selvagem. E por trás de tanto sofrimento, tanta morte e destruição, sente-se o cheiro daquilo que Basílio de Cesareia – um dos primeiros teólogos da Igreja – chamava de “o esterco do diabo”: reina a ambição desenfreada de dinheiro. É este o esterco do diabo. O serviço ao bem comum fica em segundo plano. Quando o capital se torna um ídolo e dirige as opções dos seres humanos, quando a avidez do dinheiro domina todo o sistema socioeconômico, arruína a sociedade, condena o homem, transforma-o em escravo, destrói a fraternidade inter-humana, faz lutar povo contra povo e até, como vemos, põe em risco a nossa casa comum, a irmã e mãe terra.”[vii]
A iniciativa de Francisco encontra, como era previsível, uma importante resistência por parte dos setores mais conservadores da Igreja. Um de seus opositores mais ativos é o Cardeal norte-americano Raymond Burke, um defensor entusiasta de Donald Trump, que também entrou em contato, na ocasião de uma viagem à Itália, com Matteo Salvini, o chefe da Legga del Norte… Alguns de seus adversários acusam o novo pontífice de ser um herético, ou mesmo um… marxista disfarçado.
A Rush Linebaugh, um jornalista católico (norte-americano) reacionário, tendo o qualificado de “Papa marxista”, Francisco respondeu recusando polidamente o adjetivo, complementando que ele não estava ofendido pois “conhecia vários marxistas que eram pessoas de bem”. De fato, em 2014 o Papa recebeu em audiência dois eminentes representantes da esquerda europeia: Alexis Tsipras, então dirigente da oposição ao governo de direita de Atenas, e Walter Baier, o coordenador da rede Transform, composta por fundações culturais ligadas ao Partido da Esquerda Europeia (como a Fundação Rosa Luxemburgo da Alemanha). Nesta ocasião, decidiu-se iniciar um processo de diálogo entre marxistas e cristãos, que tomou a forma de vários encontros. Que culminaram, em 2018, em uma Universidade de Verão comum na ilha de Syros, na Grécia.
É verdade que, a respeito do direito das mulheres a disporem de seu corpo e da moral sexual em geral – contracepção, aborto, divórcio, homossexualidade – Francisco mantém suas posições conservadoras da doutrina da Igreja. Mas se vê alguns sinais de abertura, da qual o violento conflito, em 2017, com a direção da Ordem de Malta, uma instituição riquíssima e aristocrática da Igreja católica, é um sintoma gritante. O arquiconservador Grande Mestre da Ordem, o Príncipe (!?) Matthew Festing havia exigido a demissão do Chanceler da Ordem, o Barão de Boeslager, pelo terrível pecado de ter distribuído contraceptivos a populações pobres ameaçadas pela epidemia de AIDS na África. O chanceler apelou ao Vaticano, que lhe deu razão contra Festing; este – apoiado pelo cardeal Burke – recusando-se a obedecer, foi deposto de sua posição pelo Vaticano. Isso não é, ainda, a adoção dos contraceptivos pela doutrina moral da Igreja, mas é uma mudança.
Evidentemente, o Papa Francisco não tem nada de marxista, e sua teologia está bem distante da teologia da libertação sob sua forma marxizante. Sua formação intelectual, espiritual e política deve muito à teologia do povo, uma variante argentina não marxista da teoria da libertação, cujos principais inspiradores são Lucio Gera e o teólogo jesuíta Juan Carlos Scannone. A teologia do povo não reivindica a luta de classes, mas reconhece o conflito entre o povo e o “antipovo”, e faz sua a opção prioritária pelos pobres. Ela manifesta menos interesse às questões socioeconômicas que as outras formas da teologia da libertação, e uma maior atenção à cultura, e especialmente à religião popular.
Em um artigo de 2014, “O Papa Francisco e a teologia do povo”, Juan Carlos Scannone insiste, com razão, em tudo o que as primeiras encíclicas do papa, como Evangelium Gaudi (2014), devem a esta teologia popular, difamada por seus críticos de esquerda como “populista” (no sentido argentino, peronista, e não europeu, desse termo). Parece-me, porém, que Bergoglio, em sua crítica ao “ídolo capital” e de todo o “sistema socioeconômico” atual vai além de seus inspiradores argentinos. É o caso, particularmente, de seu último Encíclico, Laudato si’ (2015), que merece uma reflexão marxista.
Laudato si’
A “Encíclica ecológica” do Papa Francisco é um evento de uma importância planetária, do ponto de vista religioso, ético, social e político. Considerando a enorme influência da igreja católica, ela é uma contribuição crucial para o desenvolvimento de uma consciência ecológica crítica. Recebido com entusiasmo pelos verdadeiros defensores do meio ambiente, ela suscitou inquietude e rejeição por parte dos religiosos conservadores, dos representantes do capital e dos ideólogos da “ecologia de mercado”.
Trata-se de um documento de uma grande riqueza e complexidade, que propõe uma nova interpretação da tradição judaico-cristã – em ruptura com o “sonho prometeico de dominação do mundo” – e uma reflexão profundamente radical sobre as causas da crise ecológica. Sob certos aspectos, como por exemplo na associação inseparável do “clamor da terra” e do “clamor dos pobres”, percebe-se que a teologia da libertação – em particular a do ecoteólogo Leonardo Boff – foi uma de suas fontes de inspiração.
Nas breves notas que se seguem, procuro sublinhar uma dimensão da Encíclica que explica as resistências que ela encontrou no establishment econômico e midiático: seu caráter antissistêmico.
Para o Papa Francisco, os desastres ecológicos e a mudança climática não são unicamente o resultado dos comportamentos individuais – ainda que estes também tenham sua parte – mas sim dos “modelos atuais de produção e consumo”[viii] (26). Bergoglio não é marxista, e a palavra “capitalismo” não aparece na Encíclica… Mas continua bem claro que para ele os dramáticos problemas ecológicos de nossa época são o resultado das engrenagens da atual economia globalizada – engrenagens constituídas por um sistema global, um “sistema de relações comerciais e de propriedade estruturalmente perverso” (Seção 52 do documento).
Quais são, para Francisco, estas características “estruturalmente perversas”? Acima de tudo, um sistema no qual predominam os “limitados interesses das empresas” (127) e uma “discutível racionalidade econômica” (127), uma racionalidade instrumental cuja única finalidade é maximizar os lucros. Por consequência, “o princípio da maximização do lucro, que tende a isolar-se de todas as outras considerações, é uma distorção conceitual da economia: desde que aumente a produção pouco interessa que isso se consiga à custa dos recursos futuros ou da saúde do meio ambiente” (195).
Essa distorção, esta perversidade ética e social, não é mais própria a um país do que a outro, mas antes a um “sistema mundial atual, onde predomina uma especulação e uma busca de receitas financeiras que tendem a ignorar todo o contexto e os efeitos sobre a dignidade humana e sobre o meio ambiente. Assim se manifesta como estão intimamente ligadas a degradação ambiental e a degradação humana e ética” (56).
A obsessão de um crescimento sem limite, o consumismo, a tecnocracia, a dominação absoluta das finanças e a deificação do mercado são tantas das características perversas do sistema. Em uma lógica destrutiva, tudo se reduz ao mercado e ao “cálculo financeiro dos custos e benefícios” (190). Ora, é preciso compreender que “o ambiente é um dos bens que os mecanismos de mercado não estão aptos a defender ou a promover adequadamente” (190). O mercado é incapaz de tomar em consideração os valores qualitativos, éticos, sociais, humanos ou naturais, isto é, “valores que excedem todo e qualquer cálculo” (36).
O poder “absoluto” do capital financeiro especulativo é um aspecto essencial do sistema, como mostrou a recente crise bancária. O comentário da carta encíclica é radical e desmistificador. “A salvação dos bancos a todo custo, fazendo pagar o preço à população, sem a firme decisão de rever e reformar o sistema inteiro, reafirma um domínio absoluto da finança que não tem futuro e só poderá gerar novas crises depois duma longa, custosa e aparente cura. A crise financeira dos anos 2007 e 2008 era a ocasião para o desenvolvimento duma nova economia mais atenta aos princípios éticos e para uma nova regulamentação da atividade financeira especulativa e da riqueza virtual. Mas não houve uma reação que fizesse repensar os critérios obsoletos que continuam a governar o mundo” (189).
Esta dinâmica perversa do sistema global que “continua a governar o mundo” é a razão que conduziu as Reuniões das Cúpulas Mundiais sobre o meio ambiente: “há demasiados interesses particulares e, com muita facilidade, o interesse econômico chega a prevalecer sobre o bem comum e manipular a informação para não ver afetados os seus projetos” (54). Desde que os imperativos dos grupos econômicos poderosos predominem “poder-se-á esperar apenas algumas proclamações superficiais, ações filantrópicas isoladas e ainda esforços por mostrar a sensibilidade para com o meio ambiente, enquanto, na realidade, qualquer tentativa das organizações sociais para alterar as coisas será vista como um distúrbio provocado por sonhadores românticos ou como um obstáculo a superar” (54).
Neste contexto, a Encíclica desenvolve uma crítica radical face à irresponsabilidade dos “responsáveis”, isto é, as elites dominantes, as oligarquias interessadas pela conservação do sistema, em relação à crise ecológica: “Muitos daqueles que detêm mais recursos e poder econômico ou político parecem concentrar-se sobretudo em mascarar os problemas ou ocultar os seus sintomas, procurando apenas reduzir alguns impactos negativos de mudanças climáticas. Mas muitos sintomas indicam que tais efeitos poderão ser cada vez piores, se continuarmos com os modelos atuais de produção e consumo” (26).
Face ao dramático processo de destruição dos equilíbrios ecológicos do planeta e a ameaça sem precedentes que representa a mudança climática, o que propõem os governos, ou os representantes internacionais do sistema (Banco Mundial, FMI etc.)? Sua resposta é o suposto “desenvolvimento sustentável”, um conceito cujo conteúdo tornou-se cada vez mais vazio, um verdadeiro flatus vocis como diziam os escolásticos da Idade Média. Francisco não se ilude com esta mistificação tecnocrata: “o discurso do crescimento sustentável torna-se um diversivo e um meio de justificação que absorve valores do discurso ecologista dentro da lógica da finança e da tecnocracia, e a responsabilidade social e ambiental das empresas reduz-se, na maior parte dos casos, a uma série de ações de publicidade e imagem” (194).
As medidas concretas que a oligarquia técnico-financeira dominante propõe são perfeitamente ineficazes, como por exemplo o dito “comércio de emissões de carbono”. A crítica mordaz do papa a esta falsa solução é um dos argumentos mais importantes da Encíclica.
Referindo-se a uma resolução da Conferência Episcopal Boliviana, Bergoglio escreve: “A estratégia de compra e venda de ‘créditos de emissão’ pode levar a uma nova forma de especulação, que não ajudaria a reduzir a emissão global de gases poluentes. Este sistema parece ser uma solução rápida e fácil, com a aparência dum certo compromisso com o meio ambiente, mas que não implica de forma alguma uma mudança radical à altura das circunstâncias. Pelo contrário, pode tornar-se um diversivo que permite sustentar o consumo excessivo de alguns países e sectores” (171). Passagens como essa explicam o pouco de entusiasmo dos círculos “oficiais” e dos adeptos da “ecologia de mercado” (ou do “capitalismo verde”) pela Laudato si’.
Se o diagnóstico da Laudato si’ sobre a crise ecológica é de uma clareza e consistência impressionantes, as ações que ele propõe são mais limitadas. Certamente, muitas de suas sugestões são úteis e necessárias, por exemplo: “facilitar as formas de cooperação ou de organização comunitária que defendam os interesses dos pequenos produtores e salvaguardem da predação os ecossistemas locais” (180). É também muito significativo que a Encíclica reconheça a necessidade das sociedades mais desenvolvidas de “abrandar um pouco a marcha, pôr alguns limites razoáveis e até mesmo retroceder antes que seja tarde”. Em outras palavras, “chegou a hora de aceitar um certo decréscimo do consumo nalgumas partes do mundo, fornecendo recursos para que se possa crescer de forma saudável noutras partes” (193).
Mas faltam precisamente as “medidas drásticas”, como as propostas por Naomi Klein em seu livro This Changes Everything: Capitalism vs. the Climate: romper, antes que seja tarde demais, com os combustíveis fósseis (carvão, petróleo), deixando-os no subsolo. Não podemos modificar as estruturas perversas do atual modo de produção e consumo sem um conjunto de iniciativas antissistêmicas, que questionem a propriedade privada, como a das grandes multinacionais dos combustíveis fósseis (BP, Shell, Total, etc.). É certo que o papa menciona a utilidade de “grandes estratégias que detenham eficazmente a degradação ambiental e incentivem uma “cultura do cuidado” que permeie toda a sociedade” (231, p. 174), mas esse aspecto estratégico é pouco desenvolvido na Encíclica.
Ao reconhecer que “o atual sistema mundial é insustentável” (61), Bergoglio busca uma alternativa global, que ele chama de “cultura ecológica”, uma mudança que “não se pode reduzir a uma série de respostas urgentes e parciais para os problemas que vão surgindo à volta da degradação ambiental, do esgotamento das reservas naturais e da poluição. Deveria ser um olhar diferente, um pensamento, uma política, um programa educativo, um estilo de vida e uma espiritualidade que oponham resistência ao avanço do paradigma tecnocrático” (111). Mas há poucas indicações sobre a nova economia e a nova sociedade que correspondem a essa cultura ecológica. Não se trata de pedir ao papa que adote o ecossocialismo, mas a alternativa futura permanece um tanto abstrata.
O Papa Francisco endossa a “opção prioritária pelos pobres” das igrejas latino-americanas. A Encíclica deixa isso claro, como um imperativo planetário: “nas condições atuais da sociedade mundial, onde há tantas desigualdades e são cada vez mais numerosas as pessoas descartadas, privadas dos direitos humanos fundamentais, o princípio do bem comum torna-se imediatamente, como consequência lógica e inevitável, um apelo à solidariedade e uma opção preferencial pelos mais pobres” (158).
Porém, na Encíclica, os pobres não aparecem como os agentes de sua própria emancipação – o projeto mais importante na teologia da libertação. A luta dos pobres, camponeses, indígenas, pela defesa das florestas, da água, da terra, contra as multinacionais e o agrobusiness, bem como o papel dos movimentos sociais, que são precisamente os principais atores da luta climática – Via Campesina, Climate Justice, Fórum Social Mundial – constituem uma realidade social pouco presente na Laudato si’.
No entanto, esse será um tema central nas reuniões do papa com movimentos populares, os primeiros da história da Igreja. Durante a Reunião de Santa Cruz (Bolívia, julho de 2015), Francisco declarou: “Vós, os mais humildes, os explorados, os pobres e excluídos, podeis e fazeis muito. Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em grande medida, nas vossas mãos, na vossa capacidade de vos organizar e promover alternativas criativas na busca diária dos três ‘T’ – entendido? – (trabalho, teto, terra), e também na vossa participação como protagonistas nos grandes processos de mudança, mudanças nacionais, mudanças regionais e mudanças mundiais. Não se acanhem!”[ix]
Obviamente, como Bergoglio enfatiza na Encíclica, a tarefa da Igreja não é substituir os partidos políticos, propondo um programa de mudança social. Por seu diagnóstico antissistêmico da crise, associando inseparavelmente a questão social e a proteção do meio ambiente, “o clamor dos pobres” e “o clamor da terra”, Laudato si’ é uma preciosa e inestimável contribuição para a reflexão e a ação no sentido de salvar a natureza e a humanidade da catástrofe.
Aos marxistas, comunistas e ecossocialistas cabe completar esse diagnóstico com propostas radicais de mudança, não apenas do sistema econômico dominante, mas do modelo perverso de civilização imposto globalmente pelo capitalismo. Propostas que incluam não apenas um programa concreto de transição ecológica, mas também a visão de uma outra forma de sociedade, além do reino do dinheiro e da mercadoria, com base nos valores de liberdade, solidariedade, justiça social e respeito pela natureza.
Tradução: Daniel Souza Pavan
Notas
[i]. WEBER, Max. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo, trad. José Marcos Mariani de Macedo. Companhia das Letras, São Paulo, 2017; n.p. Nota de fim de livro nº 50.
[ii]. WEBER, Max. L’Éthique pritestante et l’esprit du capitalisme. Trad. Jean Pierre-Grossein, Paris, Gallimard. 2003, p.56. Tradução livre para o português.
[iii], Weber,  Histoire economique (1923),  Paris,  Gallimard, 1991,  p.375 (Tradução livre cotejada com: WEBER, Max. General Economic History. Translated by: Frank H. Knight P.h.D. The Free Press, Glencoe, Illinois, 1927
[iv]. ENGELS, Friedrich; MARX, Karl. O Manifesto do Partido Comunista. Trad. Sérgio Tellarori. Companhia das Letras, São Paulo, 2012; n.p.
[v]. VON BAADER, Johannes. “Über des dermalige Missverhältnis der Vemögenslosen oder Proletairs..” (1835), in G.K Kaltenbranner (ed.), Sätze zur Erotische Philosophie, Frankfurt, Ihsel Verlag, 1991, p.181-182, 186.
[vi]. Los Obispos Latinoamericanos entre Medellin y Puebla, San Salvador, UCA, 1978, p.78. Tradução livre para o português da tradução pelo autor para o francês.
[viii]. Carta Encíclica Laudato Si’ do Santo Padre Francisco Sobre o Cuidado da Casa Comum. Disponível em: <http://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html> acesso em 25/01/2020.


quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Sínodo Pan-Amazônico é resistência pela proteção à Amazônia e povos indígenas, diz bispo de São Gabriel da Cachoeira




Para sua fala durante o Sínodo, Dom Edson Damian elencou dois temas: a inculturação e a Igreja Índia Amazônica, propondo que as cerimônias católicas agreguem não só as línguas indígenas, mas também símbolos e rituais tradicionais desses povos.


Para Dom Edson Taschetto Damian a vida humana e o meio ambiente estão sofrendo uma séria e, talvez, irreversível destruição (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)

da Amazônia Real

Sínodo é resistência pela proteção à Amazônia e povos indígenas, diz bispo de São Gabriel da Cachoeira

por Ana Amélia Hamdan, especial para a Amazônia Real
São Gabriel da Cachoeira (AM) – Centro das atenções da imprensa mundial devido às queimadas e às propostas do governo de Jair Bolsonaro (PSL) que envolvem exploração mineral, avanço da fronteira agrícola e suspensão da demarcação de terras indígenas, a Amazônia brasileira ganha ainda mais destaque nas próximas semanas. Dessa vez, por seu papel primordial na questão ambiental, cultural e religiosa: entre os dias 6 e 27 de outubro, a Igreja Católica realiza no Vaticano, em Roma, o Sínodo dos Bispos para a Amazônia com o Papa Francisco.
O bispo da Diocese de São Gabriel da Cachoeira, Dom Edson Taschetto Damian, 71 anos, é um dos 11 bispos da Amazônia convocados pelo Vaticano para o Sínodo. “A Amazônia estará na vitrine do mundo”, diz ele, que iniciou sua vida missionária na região amazônica em 1999 na Diocese de Roraima. O bispo foi também membro da Comissão Pastoral da Terra (CPT).Para sua fala durante o Sínodo, Dom Edson Damian elencou dois temas: a inculturação e a Igreja Índia Amazônica, propondo que as cerimônias católicas agreguem não só as línguas indígenas, mas também símbolos e rituais tradicionais desses povos.
A Diocese de São Gabriel está localizada na região do Alto Rio Negro, no Amazonas, onde há a maior população indígena do Brasil. Dos 45.564 habitantes do município, 95% são indígenas que representam 23 etnias. É também o lugar onde tem quatro línguas oficiais: tukano, baniwa, nheengatu e português.
Papa Francisco com os povos da Amazônia em Puerto Maldonado, no Peru
(Foto: Andres Valle/2018)
No total, mais de 250 bispos, religiosos, pesquisadores e representantes da Organização das Nações Unidas (ONU) participarão do Sínodo dos Bispos para a Amazônia, que discutirá questões sociais e ambientais dos noves países que integram a bacia amazônica: Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Guiana, Guiana Francesa, Venezuela e Suriname.
Dom Edson aponta que São Gabriel da Cachoeira, inclusive devido à sua localização fronteiriça, está sujeita a problemas como exploração de crianças e adolescentes e o tráfico de drogas, questões que serão discutidas durante o Sínodo. Ainda assim, considera que as dificuldades de acesso acabam protegendo a região que, segundo o religioso, é uma das menos atingidas por desmatamento.
Presidente do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) desde maio deste ano, Dom Edson embarca para Roma na próxima semana (em 3 de outubro), levando como presente para o Papa Francisco: um cálice e um cibório, objetos usados na celebração da Eucaristia, feitos em madeira da árvore pau-brasil. E a viagem coincide com os 10 anos de Dom Edson em São Gabriel, que está como bispo da Diocese de São Gabriel desde 2009.
Natural de Jaguari, no Rio Grande do Sul, Dom Edson Damian é membro da Fraternidade Sacerdotal Jesus Cáritas, que segue a espiritualidade de Charles Foucauld. É também o primeiro bispo não salesiano a assumir a Diocese de São Gabriel, fundada em 1941.
Filófoso formado pela Universidade Federal de Santa Maria e teólogo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, ele foi ordenado padre em 1975 por Dom Ivo Lorscheiter (1927-2007). Em entrevista ao Amazônia Real, o bispo disse que o Sínodo pode ser considerado um movimento de resistência pela proteção à Amazônia e aos povos indígenas. E afirma: “A Igreja não terá medo de dizer a verdade”. Leia abaixo a entrevista com o bispo Dom Edson Damian.
Dom Edson Damian na Diocese de São Gabriel da Cachoeira
(Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
Amazônia Real – Como foram elaboradas as questões a serem discutidas durante o Sínodo da Amazônia?
Dom Edson Damian – O Papa Francisco, quando convocou o Sínodo, em 15 de outubro de 2017, disse que é um Sínodo especial para a Pan-Amazônia, com dois objetivos: buscar novos caminhos para a Igreja e novos caminhos para uma ecologia integral. Os principais interlocutores desse Sínodo serão os povos indígenas, os povos originários da Amazônia. Ele disse que, nunca como hoje, os direitos dos povos indígenas estiveram tão ameaçados. Ali, então, o Papa delineou o que ele deseja com esse Sínodo. Além dos indígenas, os ribeirinhos, caboclos, habitantes das periferias das grandes cidades deverão ser os principais interlocutores.


O Conselho Pré-Sinodal teve diante de si 1.200 páginas de propostas da escuta que foi feita das comunidades cristãs de toda parte. Nas comunidades indígenas e nas cidades. Essa equipe escreveu o instrumento de trabalho, que ficou pronto em 13 de junho. E do conselho faz parte o padre Justino Tuyuka, único padre indígena do grupo.
É um caminho sinodal, que envolve toda a igreja, a partir das comunidades de base. Dos 390 povos indígenas da Pan-Amazônia, 179 participaram. Aqui em São Gabriel, representantes de todas as 23 etnias participaram.
Amazônia Real – Quais as principais questões levantadas?
Dom Edson – As comunidades que habitam a região amazônica identificaram os seguintes problemas como questões de importância crucial para o Sínodo, por meio de amplo processo de consulta e escuta: a criminalização e assassinato de líderes e ativistas, que defendem territórios e povos indígenas; as práticas predatórias de caça e pesca; as concessões de abate ilegal de árvores; os megaprojetos infraestruturais; concessões de hidrelétricas, monoculturas, projetos mineiros e petrolíferos. A poluição provocada por todas as indústrias, que causa problemas e doenças, em particular a crianças e jovens; o narcotráfico.
Os problemas sociais, como alcoolismo, violência contra a mulher, a exploração sexual; o tráfico de seres humanos; a perda da cultura e identidade. Depois a falta de demarcação de territórios indígenas, a falta de reconhecimento de seu direito a terra. A rápida perda da biodiversidade e as consequências para o planeta, uma vez que a floresta amazônica representa um pulmão vital para a atmosfera. A vida humana e o ambiente estão sofrendo uma séria e, talvez, irreversível destruição.
São Gabriel da Cachoeira tem 23 etnias indígenas
(Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
Amazônia Real –  Dessas questões, quais atingem mais a região de São Gabriel da Cachoeira?

Dom Edson – Em São Gabriel, a violência contra mulheres, contra crianças, abusos sexuais contra menores, o problema do alcoolismo, das drogas. Estamos aqui muito perto da fronteira. E sabemos que muitos indígenas, para sobreviver, colaboram para transportar drogas dos países vizinhos para cá. E, claro, que daqui da nossa região surgiu também esse grito: queremos mais padres e diáconos para atender a nossa comunidade.
Amazônia Real – O senhor está aberto à proposta de que homens casados possam celebrar missas?
Dom Edson – A gente vai propor nesse Sínodo, sem abolir o celibato, a possibilidade de ordenar homens casados. Homens casados que vivam de seu trabalho, com famílias bem constituídas. E, claro, que tenham uma preparação adequada para que possam celebrar a eucaristia nos finais de semana. Estou aberto a essa proposta e vou defendê-la.
As mulheres pedem que tenham espaço maior de participação, que estejam mais presentes não só para executar tarefas, mas nos momentos de decisão. Que elas possam ter ministérios próprios. A gente vai pedir que as mulheres possam receber a ordenação diaconal.
E tudo isso tem um princípio que apareceu nessa consulta para o Sínodo, que é preciso passar de uma Igreja que visita para uma Igreja que permanece. Aqui na nossa região, devido às longas distâncias, os custos de transporte e combustível, os padres visitam quatro vezes por ano as comunidades. Então é uma pastoral de visita. Passar para uma pastoral de presença com as comunidades podendo ter seus ministros ordenados, as mulheres diáconas, os homens presbíteros, celebrando a eucaristia.
Amazônia Real – Essa é uma forma de fazer frente ao avanço da Igreja Evangélica?

Dom Edson – Em algumas regiões, sim. Aqui nem tanto. Temos paróquias aqui, como Taracuá, Pari-Cachoeira e Yauaretê, que são 100% católicas. São acompanhados pela Igreja Católica há mais de 100 anos.
Presentes para o Papa Francisco: cálice e cibório, objetos da Eucaristia, feitos em pau-brasil (Foto: Ana Amélia Hamdan/Amazônia Real)
Amazônia Real – Qual a relação do Papa Francisco com a Amazônia?
Dom Edson – O Papa Francisco (ainda como cardeal arcebispo de Buenos Aires) conheceu sobre a Amazônia em 2007, quando houve a V Conferência dos Bispos da América Latina e do Caribe. Ficaram três semanas em Aparecida (SP) para analisar a situação da Igreja aqui. E ele ficou impressionado diante dos bispos da Amazônia que descreveram uma realidade dramática, pedindo que a Igreja abrisse novos caminhos, que mandasse novos missionários.
E é por isso que o primeiro documento que ele escreveu foi Evangelii Galdium (Alegria do Evangelho) e tem toda a proposta de uma conversão pastoral. A Igreja em saída, que deve ir às periferias geográficas e existenciais. Definiu a igreja como um hospital de campanha, que vai juntar os feridos. É um novo modelo. Isso foi no fim de 2013.
E esse Sínodo vai para a Amazônia, a periferia do Brasil, considerada a despensa, o lugar onde tem reservas intermináveis, onde cada um se julga no direito de vir aqui derrubar quanto quer e com essa economia predatória.
Em 2015 o Papa escreveu o Laudato si‘, o documento ecológico mais completo da Igreja. Esse documento deu um peso muito grande. É o cuidado da Casa Comum. Então esse Sínodo é um novo caminho para a Igreja e para uma ecologia integral.
Amazônia Real – Em seu discurso na ONU, há poucos dias, o presidente Jair Bolsonaro disse que as atuais queimadas na Amazônia são um incidente favorecido pelo clima seco e por práticas da cultura local. Voltou a afirmar que a população indígena pede desenvolvimento. Reforçou que não vai demarcar mais terras. A fala foi duramente criticada por lideranças dos povos indígenas. O que o senhor considera sobre essas posições?
Dom Edson – Isso é lamentável. A figura que o presidente fez na ONU é algo que nos envergonha a todos. Disse coisas, mas aqui é o contrário que está acontecendo. A Igreja não terá medo de dizer a verdade. Nessas três semanas que vai acontecer o Sínodo, em Roma, a Amazônia estará na vitrine do mundo, com jornalistas do mundo inteiro. E são 58 bispos. Iremos para lá, a gente conhece a realidade. Nós moramos aqui. Não somos visitantes e nem viemos aqui para explorar. Viemos para defender. Defender a verdade do evangelho, que deve chegar ao coração de todos, e os direitos humanos, principalmente daqueles mais fragilizados e que são oprimidos e maltratados.
Área degradada pelo fogo em Porto Velho, Rondônia, em 24 de agosto de 2019
(Foto: Victor Moriyama / Greenpeace)

Amazônia Real – O governo Bolsonaro também criticou o Sínodo da Amazônia. Os bispos da Pan-Amazônia divulgaram carta lamentando que, em vez de serem apoiadas, as lideranças estão sendo criminalizadas como inimigos da pátria. O senhor vem sentindo essa tensão no dia a dia?
Dom Edson – Não. Aqui temos um bom diálogo, numa localidade onde 90% da população é formada por povos indígenas. As instituições que estão aqui têm sensibilidade pela situação do povo, tão desassistido e abandonado. Como criticar e falar mal?
Amazônia Real – E sobre os posicionamentos do Governo Bolsonaro, que propõe um modelo desenvolvimentista? Há alguma pressão? 
Dom Edson – Aqui a gente está num lugar privilegiado, pois quase 90% das terras do município de São Gabriel da Cachoeira foram demarcadas e homologadas. Foi uma conquista do povo. A gente pode dizer que nessa região menos de 3% da floresta foi derrubada. É a mais preservada de toda a Amazônia. Porque os povos indígenas estão aqui. Não chegaram madeireiros, nem agronegócio, nem mineradoras. Essas últimas estiveram aqui, mas foram mandadas embora por pressão dos povos indígenas, que perceberam que só traziam malefícios e doenças.
Também há dificuldades. As longas distâncias – são 1.200 km de Manaus até aqui -, o transporte difícil e caro. Depois também a terra da região é arenosa, ácida, não produz muita coisa.
Amazônia Real – E sobre as demarcações especificamente?
Dom Edson – Poucos brancos protestam contra a demarcação. Isso vai se acentuar com o governo que está abrindo campo para esse pessoal. Sentem-se apoiados para fazer isso. A Foirn (Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro), presidida por Marivelton Baré, está bem organizada e está acompanhando.
Amazônia Real – O tema da Sínodo é “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e por uma ecologia integral”. Quais os caminhos os povos indígenas podem indicar quanto à ecologia integral?
Dom Edson – O indígena tem uma relação profunda com a natureza. Com a floresta, com os rios, com os peixes, os animais, as aves. Ecologia integral é um dar-se conta que somos terra, somos água, tudo está interligado. Tudo está interligado nessa casa comum. Os povos têm ligação com a mãe terra. Os rios são as veias. Como vamos poluir o sangue da mãe terra, que é nossa vida.
Dom Edson Damian é Bispo da Diocese de São Gabriel da Cachoeira
(Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real)
Amazônia Real – Sobre qual tema o senhor falará durante o Sínodo?
Dom Edson – Cada bispo tem direito a duas falas de 4 minutos cada uma. Como estou aqui, na diocese mais indígena do Brasil, eu vou defender dois pontos. A inculturação na liturgia, na catequese, nos ministérios da Igreja; e a Igreja Índia Amazônica. São valores dos povos indígenas, suas músicas suas danças, seus ritos que devem entrar nas nossas celebrações.
E no fim do ano, em 14 de dezembro, eu vou ordenar um padre Tukano, em Taracuá. No dia 15, ele vai celebrar a missa totalmente em tucano. E o Sínodo abre esses caminhos. E temos outro padre do povo Baniwa preparando a missa em [na língua] baniwa.
Os valores dos povos indígenas são evidentes. A integração com o meio ambiente, o cuidado de não destruir mais do que precisa para sobreviver, a vida comunitária, a partilha dos alimentos.
Não existe celebração nessas comunidades ribeirinhas onde depois da missa não se faça a partilha dos alimentos, da quinhanpira [prato indígena do Alto Rio Negro]. Já durante a missa eles fazem o dabucuri: eles trazem os seus presentes e fazem questão que o padre leve a farinha, o beiju, a tapioca, banana, abacaxi, frutas da época. A missa que continua na refeição comum. São valores cristãos que os povos indígenas viveram desde sempre.
Amazônia Real – Além da visibilidade dada à Amazônia pelo Sínodo, quais os ganhos os povos indígenas podem ter após o encontro no Vaticano?
Dom Edson – O Sínodo abre novos caminhos para evangelização. O Papa insiste que devemos apresentar propostas criativas e corajosas. Virão propostas para serem aplicadas imediatamente, outras de médio e longo prazo. E o Sínodo tem caráter consultivo. Apresenta-se uma proposta e depois o Papa escreve, colocando coisas novas. Mas o Papa informou que, se houver unanimidade nas propostas, o Sínodo será deliberativo. Ele assina com as propostas dos bispos. Isso é uma novidade.
E também há a conscientização para o cuidado que devemos ter por esse bioma com benefícios para a humanidade e que não podemos destruir com megaprojetos, economia predatória e incêndios, com projetos que vêm de fora, sem consulta aos habitantes daqui, que acabam prejudicados por devastação.
Cientistas dizem que já foram derrubados 20% da Floresta Amazônica. Em algumas regiões, como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia, 90% da floresta já não existem mais. Se destruir mais 5%, será irreversível. E há todos os benefícios que a Amazônia traz para o Brasil inteiro, como os rios voadores. As chuvas vão da Amazônia para o Sudeste. Vai até o Cone Sul.
Logo após os incêndios do mês de agosto, inclusive como 10 de agosto como o Dia do Fogo, com o pessoal das madeireiras, do agronegócio que combinaram botar fogo junto. O que aconteceu? Ao invés da chuva, uma fumaça densa escureceu São Paulo às 15h.
Encontro do Papa Francisco com os povos da Amazônia, no Peru
(Foto: Andres Valle)
Amazônia Real – O Sínodo para a Amazônia pode ser considerado um movimento de resistência pela proteção à região?
Dom Edson Damian – É um movimento de resistência. Basta! O que se destruiu foi demais. Vamos parar por aqui em nome do equilibro ecológico. Tem um movimento de resistência e é crescente. Os povos indígenas são os primeiros a se manifestar, mesmo com a sociedade brasileira bastante apática. São os primeiros que levantam a voz e, quando vão a Brasília, sabem o que dizer.