quinta-feira, 1 de abril de 2021

Teremos o necessário impeachment ou, ao contrário, o sonho nazifascista de Estado de Sítio?, por Erick Kayser

  Os efeitos da crise sanitária e econômica do país – que ingressou em uma irrefreável curva de estagnação econômica e aumento inflacionário – são permeados e potencializados pela crise política, que possui seu epicentro no governo Bolsonaro. Mais do isso, temos a sensação que ingressamos em uma crise dentro da própria crise, onde as incertezas e a instabilidade são a regra.

 Bolsonaro tentando convencer a Ema de que a Cloroquina cura a Covid 19, sem sucesso


Crise do governo Bolsonaro: teremos impeachment ou o sonho fascista de Estado de Sítio?

por Erick Kayser

O Brasil vive uma grave e generalizada crise, com difícil e custosa solução. Os efeitos da pandemia ainda estão muito longe de serem superados, mais do que isso, tudo indica que ao longo de 2021 as coisas tendem a piorar significativamente antes de vislumbrarmos alguma melhora. Os efeitos da crise sanitária e econômica do país – que ingressou em uma irrefreável curva de estagnação econômica e aumento inflacionário – são permeados e potencializados pela crise política, que possui seu epicentro no governo Bolsonaro. Mais do isso, temos a sensação que ingressamos em uma crise dentro da própria crise, onde as incertezas e a instabilidade são a regra.

Decifrar as reais intenções deste governo é sempre uma tarefa difícil. Seus movimentos erráticos são em parte calculados, como ensinam as cartilhas de comunicação militar e suas táticas para confundir aos adversários, mas também revelam o despreparo político em seu estado puro. O mês de março se encerra com uma espécie de “reforma ministerial” que mescla medidas de contenção de curto prazo, com boa dose de esculhambação, tipicamente miliciana, onde interesses gerais e pessoais se confundem.

Nas áreas mais sensíveis e objeto de crítica, as substituições representam a troca de seis por meia dúzia e a certeza da continuidade dos problemas. Ocorrida um pouco antes, a troca do ministério da saúde, tirando o desastroso general Pazzuelo e colocando Queiroga, representa apenas um leve ajuste retórico, sem nenhuma mudança profunda que busque frear o morticínio pandêmico. A queda de Ernesto Araújo no Itamaraty não causou surpresas e era tida como inevitável, após uma gestão amplamente fracassada, que corroborou para converter o país em uma condição de pária internacional. Assim como a substituição por uma figura com o mesmo perfil obscurantista, também não teve surpresas. Bolsonaro, em meio a seus delírios messiânicos, sempre aprovou a condução da política externa.

As demais trocas, buscam resolver questões imediatas e “estancar a sangria”. Em franca crise com o centrão, com seu fisiologismo insaciável, entregar um ministério para uma deputada do PL é um paliativo fraco, com curto efeito para aplacar a pressão do Congresso, que será redobrada com a crise social e o agravamento da pandemia. A “cereja do bolo” do arremedo de reforma ministerial é o novo ministro da justiça. Figura inexpressiva, em termos nacionais, sua principal qualificação para o cargo parece ser a amizade com os filhos do presidente, em um momento que o cerco sobre seus crimes aumentaram.

Com maior efeito político, a demissão do ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, indicam muito mais que uma turbulência, mas o desdobramento de uma crise em um governo que, desde sua posse, vive em permanente estado de crise. Para a manutenção da “estabilidade” bolsonarista, o apoio incondicional do “Partido Militar” é um de seus pilares. A imprensa noticia, de forma extraoficial, que a queda do ministro da Defesa ocorreu após sua recusa em um maior alinhamento das Forças Armadas ao governo Bolsonaro. O presidente teria apresentado uma proposta para implementar um Estado de Sítio. Oficialmente esta informação é negada, mas não faltam elementos para dar credibilidade para esta versão.

As condições objetivas para Bolsonaro deflagrar um golpe de Estado lhe são desfavoráveis. O agravamento da pandemia no país forçou um deslocamento de setores do capital, que até então, vinham lhe prestando apoio. Ainda que boa parte da burguesia brasileira, especialmente os setores ligados ao mercado financeiro, sigam apoiando Bolsonaro, sua base de sustentação encolheu, dificultando o avanço de um projeto autocrático de poder. Seus conflitos com a grande imprensa, especialmente a Globo, reduzem as chances de obter apoio midiático majoritário para um golpe. Ao contrário de 1964, hoje não haveria o apoio unânime dos Barões da mídia, tornando a aventura golpista mais tortuosa.

Contudo, o sonho fascista de instalar um Estado de Sítio e conferir poderes ditatoriais para Bolsonaro segue vivo. Para tocar adiante seus planos de um golpe de Estado, o apoio majoritário das forças armadas é um elemento importante, mas não indispensável. O bolsonarismo tem construído uma politização instrumental das polícias estaduais, parecendo buscar um caminho semelhante ao da Bolívia, onde o golpe de Estado teve sua vanguarda nas policias locais, sendo posteriormente endossado pelo Exército. Converter o país em um “narcoestado miliciano”, infelizmente, está longe de ser uma fantasia distópica e parece encontrar atualmente espaço para germinar no país.

A crise política está longe do fim. Tudo indica, em termos gerais, que nas próximas semanas viveremos a paradoxal situação de um país onde seu presidente tanto pode cair e ser defenestrado do poder, como poderá tentar um Golpe de Estado. Ambas são possibilidades reais colocadas na mesa. Serão semanas decisivas para o futuro do Brasil.

Erick Kayser é doutorando em História (UFRGS)

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