terça-feira, 26 de agosto de 2025

A burrice nacional a serviço da cupidez, por Luís Nassif

 


No Brasil há um quadro típico de países politicamente pouco desenvolvidos: os interesses particulares se sobrepõem aos interesses gerais


Reprodução


Jornal GGN. - A maior falha estratégica do Brasil é não saber distinguir entre estatais que são essenciais à soberania nacional e aquelas que podem ser privatizadas sem prejuízo ao interesse público.

Empresas estratégicas são aquelas que:

  • Garantem a segurança nacional e a capacidade de enfrentar crises.
  • Promovem inovação e planejamento de longo prazo.
  • Asseguram um ambiente competitivo saudável.

Privatizar insumos essenciais — como energia e combustíveis — significa entregar o controle a poucos grupos, eliminando a concorrência e aumentando os preços.

No Brasil há um quadro típico de países politicamente pouco desenvolvidos: os interesses particulares (dos que ambicionam a privatização) se sobrepõem aos interesses gerais dos consumidores, mesmo estes sendo de setores economicamente fortes.

O caso do setor elétrico


Tome-se o caso do setor elétrico nacional. 

Na ponta geradora, tinham-se as hidrelétricas estatais. Na ponta consumidora, todos os grandes setores industriais, da indústria automobilística à de máquinas e equipamentos, a indústria de base, o setor têxtil, a indústria siderúrgica etc.

Na década de 1990, o governo Fernando Henrique Cardoso iniciou a privatização do setor elétrico nacional – até então nas mãos de grandes geradores estaduais coordenados pela Eletrobras. Até então, a energia brasileira era das mais baratas do mundo, e um dos grandes fatores de competitividade da economia brasileira, prestes a se integrar à economia mundial.

O resultado foi o desastre do apagão, obrigando o governo seguinte, através da Ministra das Minas e Energia Dilma Rousseff, a montar um modelo alternativo.

Anos depois, através da Lei 12.783/2013, a então presidente Dilma Rousseff tentou a maior sacada para manter os preços reduzidos. Determinou que as concessões de usinas, com contratos vencendo entre 2015 a 2017, conseguissem a renovação antecipada, mas com tarifas reduzidas. Anualmente, as empresas incorporavam nas tarifas um percentual dos investimentos, a chamada depreciação. Com o fim das concessões, não haveria mais razão para depreciação. Oferecia-se, então, além da indenização da União, a possibilidade de cobrar tarifas resultantes apenas do custo operacional, mais uma margem de lucros.

Houve o bloqueio dos governos dos principais estados produtores, São Paulo, Minas Gerais e Paraná, todos em mãos de partidos da oposição. Depois, uma crise pluvial pressionou a oferta de energia. A partir daí, matava-se a ideia original do sistema hidrelétrico interligado, oferecendo energia barata. 

Já no governo Temer, em 2017, houve o leilão das usinas da Cemig, de Minas Gerais. Foram vendidas as hidrelétricas São Simão, Miranda, Jaguara e Volta Grande, para compradores privados, inclusive grupos chineses. A velha justificativa era a necessidade do ajuste fiscal. Em 2022, já no governo Bolsonaro, houve a privatização escandalosa da Eletrobras, através de um modelo de emissão de ações, diluindo a participação da União. Players estrangeiros, da China, Canadá, mais fundos de investimento, passaram a controlar ativos estratégicos.

O breve interregno do governo Dilma permitiu a redução temporária das tarifas em cerca de 20%. Mas, passado esse período, o setor já experimentava um aumento estrutural no preço da energia.

A privatização da Eletrobras foi a peça final. De R$ 40,00 o MWh, o preço saltou para R$ 150-200. Isso gerou um efeito cascata. Segundo estudos da ABRACE (associação que representa os grandes consumidores), o custo adicional poderá chegar até R$ 400 bilhões até 2040.

As refinarias


O mesmo ocorreu com a privatização das refinarias. Em 2021 foi vendida a RLAM (Refinaria Landulpho Alves), da Bahia. Em 2022, a REMAN (Refinaria Isaac Sabbá), do Amazonas. Em 2022, a SIX (Unidade de Industrialização de Xisto), no Paraná. E também a Lubnor (Lubrificantes e Derivados de Petróleo no Nordeste), no Ceará.

Na Bahia, a compradora, Acelen (fundo soberano de Midabala) passou a cobrar preços independentemente da Petrobras. Gasolina e diesel chegaram a ficar 15% mais cara que a média nacional. O diesel S-10 ficou 36% mais caro.

A REMAN tem monopólio natural em toda a Amazônia, já que a logística fluvial é limitada. O diesel é 25% mais caro que a média nacional; o GLP, mais de 70%

Em nenhum desses estados há competição. Houve a fragilização da integração logística, já que, antes, a Petrobras poderia deslocar derivados entre refinarias para equilibrar a oferta. E maiores dificuldades ainda para implementar uma política nacional de transição energética.

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