terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

Adorno, a ultradireita radical e a democracia totalitária em prol das mesmas velhas elites. Artigo de Thomas Meyer, da revista alemã Exit

 


Em palestra de 1967, filósofo descreveu o “novo radicalismo de direita” e sua relação com o empobrecimento da classe média. Mas enquanto a “democracia” contemporânea só enxergar os cidadãos que geram valor, a História deve se repetir

Por Thomas Meyer, no Exit

A ascensão do populismo de direita nos últimos anos exige uma explicação. Tem sido salientado em vários pontos que os movimentos de direita dos últimos anos não caíram simplesmente do céu, mas devem ser vistos no contexto do neoliberalismo e das suas convulsões sociais das últimas décadas. Segundo Wilhelm Heitmeyer,1 o autoritarismo, tal como é expresso e exigido pelos populistas ou radicais de direita, já está contido no neoliberalismo, que se apresenta sempre como sem alternativa. A erosão dos processos democráticos, a liquidação da rede social, a expansão do Estado policial, a insegurança social fundamental e a entrega direta do indivíduo aos imperativos de valorização do capital tornam claro o autoritarismo do regime neoliberal.2 Por último, mas não menos importante, a proporção da população que pode ser comprovada como tendo uma visão do mundo racista, etc., tem aumentado constantemente ao longo dos anos. Assim, sempre houve um alto potencial de “misantropia centrada no grupo” e não é de modo nenhum uma novidade dos últimos anos.3

As estratégias da direita visam “deslocar os limites do dizível”. Sem dúvida, a “burguesia bruta” (Heitmeyer) também contribuiu para isso, como ficou claro, por exemplo, nas obras de Sloterdijk4 e Sarrazin5. Como escreve Heitmeyer, é “um fato que sob uma fina camada de maneiras civilizadas, gentis (‘burguesas’) se escondem atitudes autoritárias, que se tornam cada vez mais visíveis, geralmente na forma de uma retórica cada vez mais raivosa”.6 Este encobrimento tem sido continuamente quebrado nos últimos anos. Uma razão (não a causa!) foi a “crise do fechamento de fronteiras” (David Goeßmann) do Outono de 2015, que revelou a “burguesia bruta” no debate sobre os refugiados, no qual até os chamados opositores da Alternativa para a Alemanha (AfD) incluíam argumentos ou “narrativas” de direita, que diferiam apenas ligeiramente ou nada das da AfD.7 Finalmente, os “argumentos” de agitação racista foram retomados pelo mainstream: é a própria classe média burguesa que está à direita; ela dá origem ao “extremismo de centro”.8 Como Heitmeyer enfatiza, a própria normalidade é o problema: “é óbvio que o extremismo, com suas formas de comunicação e ação abertamente brutais, está inseparavelmente ligado à normalidade da vida social e política e só surge a partir dela. […] O normal [portanto] não deve ser entendido como uma garantia de segurança, mas como potencialmente perigoso. […] Por isso deve ser levantada a questão de como o destrutivo se desenvolve na normalidade (e não penas contra ela)”.9

Pode-se assim falar, com Heitmeyer, que é a normalidade burguesa que contém em si o autoritarismo e renova constantemente as atitudes autoritárias. Neste contexto, a Teoria Crítica e a sua investigação da personalidade autoritária ganham renovado interesse.10 Perante o sucesso eleitoral contínuo dos partidos populistas de direita e a força crescente dos movimentos de direita radical, também foi publicada pela primeira vez uma palestra pública de Adorno em 1967 sobre o radicalismo de direita. Nesta palestra, Adorno descreveu o que constitui os radicais de direita modernos e o que impulsiona e faz com que a agitação fascista tenha sucesso. Este pequeno livro, Aspectos do novo radicalismo de direita, fez um grande alvoroço, tendo sido discutido nos suplementos culturais burgueses e na rádio estatal. Foi enfatizado que os comentários de Adorno eram muito atuais e soavam como se Adorno já tivesse discutido a AfD. O pano de fundo da palestra foi o sucesso eleitoral do Partido Nacional Democrático da Alemanha (NPD) naquela época.11 Adorno destacou no texto da palestra, entre outras coisas, que o fascismo deve o seu sucesso principalmente ao fato de as suas causas ainda existirem. Adorno viu uma causa central da agitação fascista sobretudo na concentração do capital e na conexa ameaça de desclassificação da pequena burguesia, entre outras coisas. A queda iminente da classe média também foi “usada” para reivindicar a soberania nacional. Esta soberania nacional é tanto mais exigida quanto as suas condições objetivas já não existem. Adorno chegou a esta avaliação no contexto do confronto de blocos e da CEE (Comunidade Econômica Europeia).12 As semelhanças com o presente são óbvias: os radicais de direita e os populistas de direita de hoje também lutam pela recuperação da soberania nacional,13 especialmente nas suas críticas à União Europeia. No entanto, as condições objetivas para a “soberania nacional” estão ainda menos presentes hoje do que nos anos 60, devido à transnacionalização do capital, sendo completamente ilusórias.14

Embora a apresentação de Adorno seja elogiada pela sua validade analítica, também é de notar que as diferenças com os anos 60 devem ser notadas. Volker Weiß, que escreveu um posfácio, comenta: “que valor têm estas análises para o presente? Antes de mais nada, as diferenças têm de ser observadas. O aviso de Adorno contra a simples ligação do radicalismo de direita aos movimentos cíclicos da economia deve ser levado a sério. Os efeitos da recessão de 1966/67, como pano de fundo imediato da evolução descrita, não podem ser comparados nem com as consequências da crise econômica mundial de 1929, nem com as da atual crise financeira e monetária. […] As linhas políticas de frente também não são facilmente comparáveis. Ao contrário do antissemitismo, na confrontação com o jihadismo global, elemento chave de agitação do populismo de direita, não se trata apenas de projeção patológica. O Islã político é um ator real e ele próprio tem de ser visto como produto de um delírio narcisista coletiva”.15

Na verdade, uma teoria ou uma crítica deve ser sempre examinada no seu ‘núcleo temporal’, o que Adorno também enfatizou. Mas o que deveria constituir este núcleo permanece muito pouco claro no atual “debate sobre Adorno”. Assim, a crise atual é percebida apenas de modo muito superficial. Não há entre os publicistas liberais como Volker Weiß quaisquer observações sobre teoria da acumulação ou teoria da crise. Portanto, em Weiß, as diferenças entre as crises dos anos 60 e as de 1929 e 2008 em diante têm de ser adivinhadas mais do que são determinadas.

Adorno, de fato, aponta para o já então anacronismo objetivo do nacionalismo, mas apenas com Adorno não ficaria claro por que a soberania do Estado-nação como tal está hoje em erosão, por que a capacidade reguladora política do capital transnacionalizado está atingindo os seus limites, por que a democracia está continuamente a se des-democratizar (Estado policial, acordo de livre comércio), por que os aparelhos estatais estão se asselvajando,16 por que cada vez mais Estados estão desintegrando.17 Neste aspecto, a celebrada atualidade da palestra é exagerada, até porque comentadores como Weiß estão longe de serem capazes de formular uma crítica de acordo com o tempo atual.

No caso de Weiß, também é claro que ele critica a nova direita sobretudo pelo seu antiliberalismo. Ora esta crítica é justificada, mas um antiliberalismo de direita também é alimentado por um certo “mal-estar na modernidade”. Em vez de fazer do mal-estar na modernidade, dos desaforos da modernização, da liberdade e igualdade burguesas o tema da discussão, Weiß comete o erro “de pensar que o mundo do mercado global estaria em ordem se os ‘bárbaros’ castanhos-fascistas (ou atualmente: verdes-islamistas) simplesmente não existissem”.18 Assim, não teria de ser rejeitado apenas um “antimodernismo” de direita (que em si mesmo é muito moderno), mas também uma apologética burguesa da “liberdade e igualdade”, sobretudo no contexto do Estado policial e do estado de exceção, que as democracias burguesas estão a forçar por si próprias (basta pensar nas novas leis policiais). O aviso de Adorno de que a sobrevivência do fascismo é mais perigosa na democracia do que contra ela, portanto, merece mais atenção.19 Por outras palavras: o radicalismo de direita poderia hoje ser visto como uma ideologia de crise, como uma continuação da administração democrática da crise com outros e/ou com os mesmos meios.20

A ignorância da crise corresponde à reivindicação incondicional da democracia. Isto pode ser ligado a um aspecto problemático e anacrônico da palestra de Adorno. Assim Adorno apresenta a ideia de uma verdadeira democracia ainda a ser realizada: “ouve-se com muita frequência, especialmente em relação a categorias como ‘os eternamente incorrigíveis’ e outras frases reconfortantes do mesmo tipo, a afirmação de que existe um certo sedimento de incorrigíveis ou de loucos, uma chamada franja lunática, como se diz na América, em cada democracia. E há uma certa consolação burguesa tranquilizante nisto, se assim se imaginar. Penso que só podemos responder que existe certamente algo deste tipo, que pode ser visto em diferentes graus em cada uma das chamadas democracias do mundo, mas apenas como expressão do fato de que, em termos do seu conteúdo, a democracia nunca tomou real e completa forma em parte nenhuma, mas permaneceu formal. E os movimentos fascistas, neste sentido, poderiam ser descritos como estigmas, como cicatrizes de uma democracia que ainda não correspondeu plenamente ao seu próprio conceito”.21

Hoje, porém, é completamente errado reivindicar ideais burgueses contra a realidade burguesa, sobretudo se olharmos mais de perto em que consistem esses ideais burgueses e qual é o quadro pressuposto em que eles (deveriam) ser realizados, especialmente em condições de crise. Marx já descreveu o perigo de ser cego por ideais burgueses.22 Assim, nos Grundrisse, diz: “Por outro lado, evidencia-se igualmente a tolice dos socialistas (notadamente dos franceses, que querem provar que o socialismo é a realização das ideias da sociedade burguesa expressas pela Revolução Francesa), que demonstram que a troca, o valor de troca etc. são originalmente (no tempo) ou de acordo com o seu conceito (em sua forma adequada) um sistema da liberdade e igualdade de todos, mas que têm sido deturpados pelo dinheiro, pelo capital etc. […] o valor de troca ou, mais precisamente, o sistema monetário é de fato o sistema da igualdade e liberdade, e as perturbações que enfrenta no desenvolvimento ulterior do sistema são perturbações a ele imanentes, justamente a efetivação da liberdade igualdade, que se patenteiam como desigualdade e ausência de liberdade. […] O que distingue esses senhores dos apologistas burgueses é, de um lado, a sensibilidade das contradições que o sistema encerra; de outro, o utopismo, não compreender a diferença necessária entre a figura real e a figura ideal da sociedade burguesa e, consequentemente, pretender assumir o inútil empreendimento de querer realizar novamente a própria expressão ideal, expressão que de fato nada mais é do que a fotografia dessa realidade.”23

Se, olhando para o passado, podemos perceber condições ainda mais democráticas do que hoje, isto também tem a ver com o fato de que a “capacidade de configuração” política ainda estava presente em tempos anteriores, em tempos de expansão fordista, quando as reformas ainda abriam a possibilidade de progresso social e o âmbito da ação política era muito maior. No entanto, quando estes encolhem, sobretudo no contexto de uma crise do financiamento público, a democracia também perde a sua “capacidade de configuração”.24 Portanto, se a valorização encontra limites, a democracia também sofre erosão. Em contraste, hoje em dia, muitas pessoas reivindicam uma “verdadeira democracia”,25 sem realmente compreenderem a lógica da democracia: “a consciência dominante […] não tem naturalmente a menor compreensão do caráter totalitário da própria sagrada democracia”.26 Pois mesmo a antiga “capacidade de configuração” da democracia estava sempre sujeita a limites restritos: a subjugação dos sujeitos aos imperativos de valorização do capital é pressuposta pelo discurso democrático e como tal não negociável. Toda a ação democrática tem de mover-se dentro deste quadro. “Jamais ocorre ao pensamento democrático, em todas as suas variantes, a ideia de mobilizar e organizar os recursos e a riqueza social de outra maneira que não na forma da mercadoria e do dinheiro, e que com isso a sua suposta liberalidade e humanidade coloca para si mesma, como limite intransponível, as próprias leis sistêmicas da forma-mercadoria moderna.27 Além disso, “a liberdade abstrata do indivíduo-mônada abstrato, que deve incessantemente ‘autovalorizar-se’, implica a luta concorrencial impiedosa de todos contra todos”. E “a capacidade decisória como livres e iguais é limitada na realidade pela capacidade de pagamento”.28

Se isto é questionado na prática, mesmo que apenas rudimentar e seletivamente, os cães de caça alinham-se e a democracia revela o seu núcleo repressivo. Esta é a democracia realizada e, portanto, não é apenas uma democracia formal, ou formalmente limitada, que simplesmente ainda não se realizou. A sua realização consiste precisamente em conceder formalmente direitos, mas também em suspendê-los ou restringi-los novamente, se se revelarem disfuncionais para a administração da crise e para a valorização (ou desvalorização) do capital. Portanto, o terror do Estado policial não é uma contradição com a democracia. Dado que uma pessoa só se pode realizar como livre e igual se provar ser um sujeito produtivo de capital, a democracia realizada também é compatível com enormes desigualdades sociais. O oposto da liberdade e as suas contradições pertencem assim a essa liberdade em si, como Marx já enfatizava. Surpreendentemente, isto também nem sequer é negado. Friedrich August von Hayek, por exemplo, formulou que a liberdade inclui “passar fome”, e até mesmo que “a conformidade voluntária é uma condição para os efeitos benéficos da liberdade”. Consequentemente, segundo Hayek, uma “democracia […] pode exercer violência totalitária, e é concebível que um governo autoritário possa agir de acordo com princípios liberais”.29 Saudações liberais a Pinochet!

Quando há uma crise, os protestos sociais e qualquer contradição podem revelar-se “perturbadores”. Não é por acaso que durante a crise grega se falou que a austeridade da Alemanha não deveria ser negociada democraticamente.30 Não é coincidência que Merkel tenha dito que a democracia tem de estar “em sintonia com o mercado”. Se o “mercado” já não permite opções de decisão imanentes, então todas as decisões equivalerão a “poupar e morrer” e a liberdade democrática consistirá em nada mais do que ajudar a configurar a própria execução por decreto e parlamento.

Numa democracia, a capacidade jurídica está ligada à capacidade de valorização. Se os contratos de trabalho já não podem ser celebrados, o próprio direito se desfaz.31 As pessoas que perdem a capacidade de valorização, com a desvalorização da sua força de trabalho ou similares, tornam-se de fato cidadãos de direito inferior, como prova o regime Hartz IV.32 Pessoas cuja desvalorização progrediu ainda mais, como os refugiados, acabam por ter negado o seu mero direito à vida ou a sua morte é aceita. Isto é demonstrado não só pela política isolacionista do “Ocidente livre e democrático”, e pelas mortes persistentes no Mediterrâneo, mas também pelo ‘depósito’ mais ou menos ‘final’ de pessoas em instalações semelhantes a campos de concentração, nos chamados “campos de refugiados”. O mais sujo trabalho de porcos é deixado de bom grado a outros.33

Uma vez que a democracia como forma de Estado está vinculada à forma valor-cisão e, portanto, entra em erosão com a crise de valorização, não faz sentido lamentar a perda da democracia, nem reclamar a realização de uma democracia “real”. Portanto, de modo nenhum seria suficiente acusar a democracia de ser meramente formal para exigir que ela seja finalmente realizada — talvez através de mais “democracia direta”, como os populistas de direita também exigem. Por isso não basta criticar a participação ou representação insuficiente ou a distribuição desigual da riqueza. O objeto da crítica tem de ser a forma do interesse e da vontade do sujeito burguês e, portanto, a forma capitalista de riqueza e de (re)produção em si. Terá de ficar claro que a democracia não é um discurso livre, não é uma “associação de pessoas livres” (Marx), na qual todos têm de se pôr de acordo sobre o uso sensato dos recursos. Pelo contrário: este não é o tema do discurso democrático, não é o tema do discurso de uma economia de comando autoritária nem de um regime étnico nacional. A submissão à constituição fetichista da sociedade do valor-cisão, à forma da mercadoria e ao movimento de valorização do capital é precisamente a base de toda a democracia. Esta falsa contraposição, repetidamente surgida, de democratas liberais a uma burguesia autoritária, bruta e até fascista, deve, portanto, ser rejeitada.34 Se, como pensava Marx, a verdade da sociedade burguesa deve ser vista nas suas colônias,35 também a verdade da democracia real deve ser vista na crise e no estado de exceção. Uma teoria crítica à altura do seu tempo tem de tomar nota disto ou não é teoria crítica nenhuma.


1 Heitmeyer, Wilhelm: Autoritäre Versuchungen – Signaturen der Bedrohung I [Tentações autoritárias – Assinaturas de Ameaça I], 3. Aufl., Berlin 2018.

2 Ver também: Wacquant, Loic: Bestrafen der Armen – Zur neoliberalen Regierung der sozialen Unsicherheit [Punir os pobres – Sobre o governo neoliberal de insegurança social], Berlin/Toronto 2013, zuerst Paris 2004.

3 Heitmeyer 2018.

4 Cf. Kurz, Robert: Das Weltkapital – Globalisierung und innere Schranken des modernen warenproduzierenden Systems [O capital mundial – Globalização e limites internos do moderno sistema produtor de mercadorias], Berlin 2005, p. 387ss e 458ss. Ver também: Winkel, Udo: Der Geist geistloser Zustände – Sloterdijk u. Co.: Zum intellektuellen Abstieg der postkritischen deutschen Elitedenker [O espírito dos estados sem espírito – Sloterdijk & Cia: Sobre a Decadência Intelectual dos Pensadores de Elite Alemães Pós-Críticos], in: exit! – Krise und Kritik der Warengesellschaft, Nr.7, Bad Honnef 2010, p. 251–259.

5 Cf. Lux, Vanessa: Verschiebungen in der biologistischen Diskussion: das Beispiel Sarrazin [Mudanças na discussão biologística: o exemplo de Sarrazin], in: Schulze, Annett; Schäfer, Thorsten: Zur Re-Biologisierung der Gesellschaft – Menschenfeindlichen Konstruktion im Ökologischen und im Sozialen [Sobre a Re-Biologização do Social – Construção Misantrópica nas Esferas Ecológica e Social], Aschaffenburg 2012, p. 129–152. Ver também: Konicz, Tomasz: Generation Sarrazin – Eine kurze Skizze der Genese der neuen deutschen Rechten [Geração Sarrazin – Um Breve Esboço da Gênese da Nova Direita Alemã], 2015a, online: https://www.streifzuege.org/2015/generation-sarrazin/.

6 Heitmeyer 2018, p. 310.

7 Cf. Goeßmann, David: Die Erfindung der bedrohten Republik – Wie Flüchtlinge und Demokratie entsorgt werden [A invenção da república ameaçada – Como são descartados os refugiados e a democracia], Berlin 2019. Isto é demonstrado, por exemplo, pelas mudanças no discurso no decorrer do fim da “cultura de acolhimento”, cf. Jäger, Margarete; Wamper, Regina (Hg.): Von der Willkommenskultur zur Notstandsstimmung – Der Fluchtdiskurs in deutschen Medien 2015 und 2016 [De uma cultura de acolhimento a um clima de estado de necessidade: o discurso sobre os refugiados nos media alemães 2015 e 2016], Duisburg 2017, online: http://www.diss-duisburg.de/wp-content/uploads/2017/02/DISS-2017-Von-der-Willkommenskultur-zur-Notstandsstimmung.pds.

8 Konicz, Tomasz: Kapitalkollaps – Die finale Krise der Weltwirtschaft [O colapso do capital – A crise final da economia mundial], Hamburg 2016, p. 158ss.

9 Heitmeyer 2018, p. 279, destaque no original.

10 Ziege, Eva-Maria: Nachwort der Herausgeberin [Posfácio da editora], in: Adorno, Theodor W.: Bemerkungen zu ›The Authoritarian Personality‹ [Notas a ‘A personalidade autoritária’], Berlin 2019b, p. 135ss.

11 O NPD então falhou por pouco sua entrada no Bundestag em 1969. A consequência foi uma ‘mudança de estratégia’ de partes da direita, o que a ‘modernizou’, ver Weiß, Volker: Die autoritäre Revolte – Die Neue Rechte und der Untergang des Abendlandes [A Revolta Autoritária – A Nova Direita e o Declínio do Ocidente], Stuttgart 2018, p. 27ss., assim como Feit, Margret: Die »Neue Rechte« in der Bundesrepublik – Organisation, Ideologie, Strategie [A “Nova Direita” na República Federal – Organização, Ideologia, Estratégia], Frankfurt/New York 1987, p. 23ss.

12 Adorno, Theodor W.: Aspekte des neuen Rechtsradikalismus [Aspectos do novo radicalismo de direita], 4. Aufl., Berlin 2019a, p. 9-13. [Edição brasileira: Aspectos do novo radicalismo de direita. São Paulo: Ed. Unesp, 2020. Tradução de Felipe Catalani].

13 Não é por acaso que a revista de extrema direita de Jürgen Elsässer tem o subtítulo “Magazin für Souveränität” [Revista para a Soberania].

14 Ver Kurz, 2005.

15 Ver Adorno 2019a, p. 74s. Volker Weiß salienta as semelhanças entre o radicalismo de direita e o islamismo. Por exemplo, a relação entre os dois é evidente na misoginia e na mania da masculinidade. A mania neofascista da masculinidade é exemplificada no livro de Jack Donovan “Der Weg der Männer” (“O Caminho dos Homens”), publicado pela editora da direita radical Antaios-Verlag, cf. Weiß 2018, p. 227ss. Jack Donovan também poderia, em princípio, juntar-se ao ISIS, como observou Weiß: por exemplo, na entrevista “Tacheles: Volker Weiß sobre atores, ideologia e desenvolvimento da Nova Direita”, https://www.youtube.com/watch?v=5xtMdgVayOw, 7:50 min.

16 Cf. Kurz, Robert: Die Demokratie frisst ihre Kinder – Bemerkungen zum neuen Rechtsradikalismus in: Rosemaries Babies – Die Demokratie und ihre Rechtsradikalen, Unkel/Bad Honnef 1993, p. 11–87 [Trad. port. A democracia devora seus filhos. Rio de Janeiro, Ed. Consequência, 2020]. Ver também: Scholz, Roswitha: ›Die Demokratie frisst immer noch ihre Kinder‹ – heute erst recht [‘A democracia devora os seus filhos’ – hoje ainda mais!], in: exit! – Krise und Kritik der Warengesellschaft, Nr. 16, Springe 2019, 30–60. Ver ainda: Konicz, Tomasz: Failed State BRD, 2018, online: https://www.heise.de/tp/features/Failed-State-BRD-4232674.html.

17 Ver Kurz 2003 e Bedszent, Gerd: Zusammenbruch der Peripherie – Gescheiterte Staaten als Tummelplatz von Drogenbaronen, Warlords und Weltordnungskriegen [O colapso da periferia. Estados falhados como viveiro de barões da droga, senhores da guerra e guerreiros do ordenamento mundial], Berlin 2014. Ver ainda Konicz, Tomasz: Kapitalkollaps – Die finale Krise der Weltwirtschaft [O colapso do capital – A crise final da economia mundial], Hamburg 2016.

18 Hanloser, Gerhard: Die libertäre und die liberale Linke und die Neue Rechte – Bemerkungen zu einer drängenden Frage [A Esquerda Libertária e Liberal e a Nova Direita – Comentários sobre uma questão urgente], in: Neznam: Zeitschrift für Anarchismusforschung, Nr.7, Lich 2018, p. 167.

19 Assim, na palestra de Adorno, de 1959: O que significa elaborar o passado, a partir de cerca de 3 min: https://www.youtube.com/watch?v=ioj9UPuP374.

20 A continuidade de ambos é particularmente evidente no imperialismo de exclusão racista e na construção democrática de muros, ver Kurz, Robert: Weltordnungskrieg – Das Ende der Souveränität und die Wandlungen des Imperialismus im Zeitalter der Globalisierung, Bad Honnef 2003. [A Guerra de Ordenamento Mundial – O Fim da Soberania e as Metamorfoses do Imperialismo na Era da Globalização], especialmente p. 190ss. Ver ainda: Trenkle, Norbert: Der Demokratische Mauerbau – Elendsmigration und westlicher Abgrenzungswahn [A construção democrática de muros – Migração de miséria e mania ocidental de delimitação], in: Rosemaries Babies – Die Demokratie und ihre Rechtsradikalen, Unkel/Bad Honnef 1993, p. 227–262.

21 Adorno 2019a, p. 17s.

22 Vale a pena mencionar neste contexto que, em sua polêmica contra Karl Kautsky, Lênin referiu-se à hipocrisia das democracias burguesas e mencionou o que hoje seria chamado de “estado de exceção”. Diz: “considerem as leis fundamentais dos Estados modernos, os métodos pelos quais são governados, a liberdade de reunião ou de imprensa, a ‘igualdade dos cidadãos perante a lei’ – e veremos a cada passo a hipocrisia da democracia burguesa bem conhecida de qualquer trabalhador honesto e com consciência de classe. Não há um único Estado, mesmo o mais democrático, onde não existam lacunas ou cláusulas na Constituição que garantam à burguesia a possibilidade de usar os militares contra os trabalhadores, de impor um estado de sítio, etc., “em caso de violação da lei e da ordem” – na realidade, quando a classe explorada “viola” a sua existência como escrava e tenta deixar de se comportar como tal. Kautsky embeleza sem vergonha a democracia burguesa ocultando, por exemplo, como os burgueses mais democráticos e republicanos da América ou da Suíça tomam medidas contra os trabalhadores em greve” (Lenin, W.I.: Die proletarische Revolution und der Renegat Kautsky [A revolução proletária e o renegado Kautsky], in: Ausgewählte Werke Band III, Berlin 1970, p. 87).

23 Marx, Karl: Grundrisse der Kritik der politischen Ökonomie, Berlin 1953, p. 960 [Grundrisse, São Paulo, Boitempo, 2011, p. 191].

24 Ver Konicz 2016, p. 180ss.

25 Devido à discrepância óbvia entre “a pretensão e a realidade da democracia”, é claro, cada vez menos pessoas acreditam na propaganda democrática ocidental. Em vários pontos fala-se de “pós-democracia”, “democracia de fachada”, “oligarquia (financeira)”, etc.; termos que supostamente capturam a realidade democrática. Estas críticas, porém, permanecem fenomenológicas, não vão além de uma “crítica ao neoliberalismo”, criticam a falta de “representação”, a insuficiente “democracia direta”, o “Estado dentro do Estado” e apelam a um absurdo “sistema financeiro democrático”, etc.

26 Kurz, Robert: Schwarzbuch Kapitalismus – Ein Abgesang auf die Marktwirtschaft [O livro negro do capitalismo – Um canto de despedida à economia de mercado], Frankfurt 1999, p. 574.

27 Kurz 1993, p. 18 .[2020, p. 29].

28 Ibid, [2020, p. 31]. Itálicos no original.

29 Hayek, Friedrich A. von: Die Verfassung der Freiheit [A Constituição da Liberdade] (Gesammelte Schriften Bd. 3), Tübingen 2005, p. 25, 82 e 132.

30 Konicz, Tomasz: Willkommen in der Postdemokratie [Benvindos à pós-democracia], 2015b, online: https://www.heise.de/tp/features/Willkommen-in-der-Postdemokratie-3374458.html.

31 Cf. Kurz 2003, p. 324s.

32 Rentschler, Frank: Der Zwang zur Selbstunterwerfung – Fordern und Fördern im aktivierenden Staat [A coação à autossubmissão – Exigir e promover no Estado ativador], in: exit! – Krise und Kritik der Warengesellschaft, Nr.1, Bad Honnef 2004, p. 201–229.

33 Assim, no início de 2017, o Ministério dos Negócios Estrangeiros falou de condições semelhantes a campos de concentração na Líbia. O relatório afirma, entre outras coisas, que “execuções de migrantes não pagantes, tortura, violação, extorsão e abandonos no deserto estão na ordem do dia lá”, ver https://www.welt.de/politik/deutschland/article161611324/Auswaertiges-Amt-kritisiert-KZ-aehnliche-Verhaeltnisse.html.

34 Para não ser mal interpretado: é claro que democracia e fascismo não são simplesmente a mesma coisa, e não é simplesmente a mesma coisa se um social-democrata corrupto está no controle do poder ou um fascista do calibre de Bolsonaro. Seria, portanto, reacionário aceitar ou declarar irrelevante, por exemplo, a consolidação ou o desmantelamento da justiça burguesa com um encolher de ombros.

35  Como diz o artigo de Marx, The Future Results of British Rule in India, de 8 ago. 1853: “A profunda hipocrisia da civilização burguesa e a barbárie dela inseparáveis são reveladas assim que desviamos o olhar da sua pátria, onde aparecem em formas respeitáveis, para as colônias, onde se mostram em toda sua nudez” (Marx, Karl; Engels, Friedrich: MEW Band 9, Berlin 1960, p 225). Como essa barbárie era flagrante, mostrou, por exemplo, Mike Davis (Die Geburt der Dritten Welt – Hungerkatastrophen und Massenvernichtung im imperialistischen Zeitalter, Berlin/Hamburg/Göttingen 2011, 3. Aufl., original London/New York 2001. [Trad. port.: Holocaustos coloniais: clima, fome, e imperialismo na formação do Terceiro Mundo. Rio de Janeiro/São Paulo: Record Editora, 2002].


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