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segunda-feira, 23 de junho de 2025

Hegemonia de transição, multipolaridade, BRICs, MAGA: o que esperar do caos na ordem mundial? Por Camila Bezerra, citando José Luís Fiori, professor de Economia Política INternaciona da UFRJ

 

José Luís Fiori aponta que EUA e G7 estão enfraquecidos, mas não devem aceitar perder o poder que exercem há mais de 500 anos


Do Jornal GGN:



Se existe uma certeza em relação ao futuro do cenário global é o de que ele é incerto, tendo em vista o caos, a desordem e o descontrole que o regem. Esta conclusão é do professor José Luís Fiori, Professor emérito dos Programas de Pós-graduação em Economia Política Internacional (IE/UFRJ), e em Bioética e Ética Aplicada (PPGBIOS/UFRJ), da UFRJ.

Tamanho caos é causado, por exemplo, pelo desaparecimento de atores do sistema mundial, que exerciam algum tipo de arbitragem capaz de negociar os crescentes conflitos no mundo, a exemplo de instituições e acordos firmados após o término da 2ª Guerra Mundial e Guerra Fria. 

“Espatifaram, estão esvaziadas, não são legítimas, por definição. E a principal potência responsável, em grande medida, ou pela criação ou pela tutela dessas instituições, é hoje a principal contestadora dessas instituições. Não pode haver desordem maior”, aponta Fiori. 

Um dos grandes exemplos apontados pelo professor é o G7, composto pelo Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e Estados Unidos, e cuja participação se justifica porque seriam as sete maiores economias do mundo. “O G7 é uma caricatura grotesca do que eles foram.”Na análise de Fiori, ainda que tais países tivessem grande influência por muito tempo, hoje se mostraram uma organização pouco influente. 

Tal percepção ficou clara quando, na semana passada, tais países se reuniram, porém sem grandes debates. Pelo contrário, o que mais havia era embates. 

“Em primeiro lugar, eles não são mais as sete principais potências econômicas do mundo. Pelo menos, três outras não estão aí incluídas, entre as dez maiores. Segundo, eles não são, tampouco, as sete maiores economias mais industrializadas do mundo. Terceiro, eles não têm mais acordos sobre a condução da guerra na Ucrânia. Eles não têm acordos sobre a Rússia”, continuou o professor.

“Além disso, o que é quase cômico, o líder, o chefe dos sete que chegou de Boné na reunião com a anunciada ideia de anexar um dos sócios. É a primeira reunião do G7 depois da posse do Trump depois de ele ter anunciado que quer o Canadá e quer a Groenlândia”, emendou Fiori.

O presidente dos EUA foi responsável ainda pela recente guerra tarifária imposta justamente a parceiros que, diante de respostas à altura, obrigaram-no a recuar. “Donald Trump e os Estados Unidos não têm hoje mais o poder que Trump imaginou que teria.”

Segundo Fiori, Trump e sua equipe erraram no cálculo da eficácia da guerra comercial, não conseguiram intermediar o fim da Guerra na Ucrânia, como prometido em campanha pelo presidente ou conseguiram manipular o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. “Aos cinco meses de governo, você ter cinco milhões de pessoas na rua protestando contra você é um sucesso que poucos presidentes conseguem.”

Multipolaridade?

Em contrapartida à desordem interna dos EUA e desarticulação do G7, a China e os países asiáticos se reuniram este mês, durante o segundo Fórum China-Ásia Central, realizado no Cazaquistão. “Não há nenhum conflito. Estão discutindo cooperação, desenvolvimento, não tem ideia de guerra nenhuma.”

Enquanto o G7 não representa mais o poder econômico e político que apresentava décadas atrás, os BRICs formaram um bloco econômico promissor, uma vez que reúnem cinco dos 10 países mais ricos do mundo, somam 45% da população mundial, tem 43% do PIB mundial, 60% das reservas de gás e 50% das reservas mundiais de petróleo, além de deter o controle de terras raras e da produção de alimentos. 

“Mas o que que é e, sobretudo, como funciona ou como funcionará uma ordem multipolar? Em princípio, ela soa melhor,  ela parece mais democrática do que uma ordem unipolar, com certeza. Mas você não tem nenhuma ideia do que seja ou que possa vir a ser, essa ordem multipolar”, ressalta Fiori.

O que se sabe até o momento é o papel do hegemon, que apesar de passar a impressão de centralidade e estabilidade, é o grande desestabilizador do sistema global ao promover conflitos. 

“O Ocidente, o G7, a OTAN, a União Europeia não vão abrir mão do poder que eles conquistaram nesses últimos 500 anos conversando. Não vão”, aposta o professor. “Eles estão vendo isso como uma perda de um poder que eles tiveram e que exerceram de forma implacável em todo o mundo nos últimos 500 anos, usando o seu direito de matar e invadir onde bem entendessem”, conclui o docente emérito. 

A análise de Fiori foi compartilhada com os alunos do  Ciclo de Estudos Estratégicos – Geopolítica do Século XXI, promovido pela Cátedra Celso Furtado, no auditório da FESPSP, na última terça-feira (17).

LEIA TAMBÉM:

sábado, 12 de março de 2022

O analista geoólítico internacional Pepe Escobar, em entrevista com Leonardo Attuch, explica as causas reais da guerra Rússia x Ucrânia, o que está por trás do conflito, o papel da Mídia ocidental e da OTAN e EUA no conflito

 

Do Canal 247:

O jornalista Leonardo Attuch entrevista o analista geopolítico Pepe Escobar sobre a nova ordem internacional e os movimentos da Rússia na Ucrânia

Minutagem (temas debatidos no video e onde encontrá-los na linha do tempo):

0:00 Boas vindas 2:00 Guerra de comunicação foi completamente perdida pela Rússia, antes mesmo da guerra começar 5:00 Pepe diz por que não considera a ação militar russa uma invasão 8:00 Pepe vê a ação como operação de desmilitarização e desnazificação da Ucrânia 12:30 Neonazismo ucraniano está mais do que provado 14:30 A desnazificação terá que ser operada pelos próprios ucranianos 19:30 Pepe explica por que o governo ucraniano não tem autonomia para negociar. "Zelensky é totalmente manipulado por Washington" 21:00 Não havia outra alternativa para a Rússia, diz Pepe Escobar. Donbass vivia genocídio em câmera lenta 25:00 "População ucraniana está sendo usada com carne de canhão na guerra entre Estados Unidos e Rússia", diz Pepe Escobar 27:00 O plano é transformar a Ucrânia em Afeganistão e criar o caos, dando um Vietnã aos russos 31:00 Firmas americanas estão formando jihads nazis 32:00 Pode haver uma confrontação direta entre Rússia e Polônia 35:00 Ninguém sabe quem está mandando na Ucrânia 39:00 Pepe fala sobre as sanções. "A Rússia vai tomar conta de todas as empresas que saíram em debandada do país" 42:00 Visa e Mastercard serão substituídos por Union Pay 47:00 Pedido de petróleo à Venezuela expressa o desespero do Império 55:00 Quando os europeus perceberem o que vai acontecer nas contas de luz, a reação será enorme 58:00 Os chineses estão lucrando com tudo 1:03:00 Pepe fala sobre o apoio da Índia e da Turquia à Rússia 1:22:00 Pepe fala sobre o big picture. Chegamos a um ponto de inflexão 1:30:00 Estão montando uma nazi jihad contra a Rússia 1:35:00 "Os russos têm uma capacidade de resistência inimaginável", diz Pepe. 1:44:00 Anexação de Taiwan é inevitável 1:53:00 Partido Democrata não quer a volta de Lula e vão sabotá-lo ao máximo, caso vença. Já estão perdendo a Argentina no momento. 1:54:00 Pepe fala sobre Dugin: somos amigos e nos respeitamos 1:59:00 "A guerra acabaria com um telefonema de Zelensky, mas ele não pode se render porque fere o plano A dos Estados Unidos de criar guerrilha urbana na Ucrânia", diz Pepe. "Zelensky transformou toda a população em combatente" 2:03:00 A guerra foi forçada pelos Estados Unidos Moon of Alabama: https://www.moonofalabama.org/ The Saker: https://thesaker.is/ The Cradle: https://thecradle.co/Home Apoie o 247 em brasil247.com/apoio (https://www.brasil247.com/apoio). Você também pode fazer doação por Pix com a chave pix@brasil247.com.br ou fazer uma assinatura Pix em https://bit.ly/pix247 e pode pedir sua nota fiscal em contato@brasil247.com.br. Ao contrário da mídia corporativa, a TV 247 se financia por meio da sua própria comunidade. Você pode apoiar a TV 247 e o site Brasil 247 de diversas formas.

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Trump não é Caesar, mas os EUA são uma Fake Rome, por Fábio de Oliveira Ribeiro

 

Júlio Caesar deixou um admirável legado literário. Trump se limitou a construir edifícios horríveis com dinheiro de origem duvidosa.

Jornal GGN:
New York Times

Trump não é Caesar, os EUA é uma Fake Rome

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Um articulista norte-americano comparou Donald Trump ao romano Júlio Caesar. Essa comparação não me parece muito adequada.

As tensões políticas que existiam em Roma no século I a.C. e as que sacodem os EUA nos dias de home têm a mesma origem: o abismo entre ricos e pobres e o controle absoluto do Estado pelos ricos. Nenhuma outra semelhança existe entre essas duas culturas.

Júlio Caesar correu riscos durante a invasão e conquista da Gália e na subsequente Guerra Civil. Donald Trump nunca participou de um conflito militar.

O primeiro imperador de Roma morreu porque desafiou os privilégios da aristocracia patrícia romana. Apesar de sua retórica populista, o presidente norte-americano trabalhou apenas em benefício dos ricos e do enriquecimento de sua própria família.

Júlio Caesar deixou um admirável legado literário. Trump se limitou a construir edifícios horríveis com dinheiro de origem duvidosa.

A República romana caiu porque Roma se tornou muito maior do que uma cidade e sua elite mesquinha e gananciosa. A democracia dos EUA morreu porque o neoliberalismo causou o apodrecimento do bipartidarismo à medida que Estado passou a ser mais e mais controlado exclusivamente pelos banqueiros, pelo Pentágono e pela CIA.

Apesar de adotar alguns símbolos do poder romano (a águia, os edifícios monumentais com colunas em Washington DC, etc), os norte-americanos nunca deixaram de ser bárbaros. A verdadeira natureza dos EUA fica evidente quando prestamos atenção na maneira como eles transformaram Jesus num clone do deus da guerra romano.

Segundo Tito Lívio, os romanos tinham uma virtude: agir e sofrer. Os norte-americanos se limitam a produzir, encenar e apreciar filmes de ação. Os soldados romanos combateram seus inimigos a curta distância, os EUA já empregam drones de combate pilotados a milhares de quilômetros do conflito por soldados confortavelmente sentados na frente de monitores de LCD.

As obras deixadas pela civilização romana serão sempre admiradas. Enquanto houver homens, isso será verdade. As obras que os norte-americanos deixarão serão lembradas? Isso é improvável. Não sobrará nada digno de nota nos EUA depois que aquele país for totalmente devastado por uma guerra civil nuclear.

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sexta-feira, 11 de setembro de 2020

Vídeo mostra como os EUA montaram a estrutura" anticorrupção" invasora que espalhou tentáculos por diversos países, incluindo o Brasil, atingindo em cheio a Petrobras e destruindo grandes empresas brasileiras, usando da Lava Jato que levou o fascismo ao poder

 

Desde o ataque (ao World Trade Center em 11 de setembro de 2001), o governo norte-americano passou a exercer uma marcação ainda maior sobre transações financeiras internacionais e intensificou as ações políticas e cooperação jurídica com outros países. “Nunca houve na história da humanidade nenhum País que concentrasse tanto poder”, disse ao GGN Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington.

Do Jornal GGN:

Como o 11 de Setembro impactou na cruzada anticorrupção dos EUA

Vídeo mostra como os EUA montaram a estrutura anticorrupção que espalhou tentáculos por diversos países, incluindo o Brasil, atingindo em cheio a Petrobras

Jornal GGN O atendado às Torres Gêmeas e ao Pentágono, em 11 de Setembro de 2001, fez os Estados Unidos prepararem uma nova doutrina de segurança, uma estrutura de combate à corrupção de influência internacional, que forjou um realinhamento do País em relação à ordem global.

Desde o ataque, o governo norte-americano passou a exercer uma marcação ainda maior sobre transações financeiras internacionais e intensificou as ações políticas e cooperação jurídica com outros países. “Nunca houve na história da humanidade nenhum País que concentrasse tanto poder”, disse ao GGN Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington.

Lançados em janeiro de 2020, dois vídeos produzidos pelo GGN mostram como o 11 de Setembro se relacionada com a cruzada anticorrupção dos Estados Unidos, que culminou na parceria com a Lava Jato para processar a Petrobras e outras grandes empresas brasileiras.

Os vídeos fazem parte da série “Lava Jato Lado B”, um projeto exclusivo do GGN, que mostra como os EUA influenciaram a Lava Jato e como nasceu, no Brasil, a indústria do compliance.

Os cinco vídeos foram lançados antes da divulgação de mensagens de Telegram da Lava Jato que comprovam as relações promíscuas entre procuradores da República e agentes norte-americanos.

Confira abaixo os episódios com mais detalhes sobre o 11 de Setembro e a estrutura governamental de combate à corrupção criada pelos EUA.

Episodio 3: A geopolítica do capital: pré-sal na mira dos EUA

Episódio 1: Como a anticorrupção virou bandeira política dos EUA

Confira outros episódios da série aqui.

 

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quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

Noam Chomsky: De Trump espera-se qualquer catástrofe


Pensador estadunidense revela: assassinato de general iraniano deixou até o Pentágono pasmo. Irresponsabilidade de presidente pode gerar conflito global. Ao Irã, duas saídas: ceder às provocações de violência ou assumir liderança regional e enfraquecer EUA
Noam Chomsky entrevistado por Roberto Manríquez, em El Mostrador (Chile) | Tradução: Rôney Rodrigues
O intelectual norte-americano considera que o assassinato – ordenado pelo presidente dos Estado Unidos – ao chefe militar e uma das autoridades mais poderosas do Irã, uma potência nuclear do Oriente Médio, “foi uma decisão que Trump tomou por capricho, o que surpreendeu inclusive os altos oficiais e analistas de informação no Pentágono. Provavelmente, é de se supor que ele fez isso para mostrar seu poder, brincar de destruir cai bem entre seus adoradores, ou com aquilo que seus seguidores supõem que esteja certo”.
Quando tinha nove anos, Noam Chomsky se colocou diante do “valentão da sala” para defender um companheiro que era importunado por ter sobrepeso. O menino abusador avançou sobre o pequeno Noam para espancá-lo, mas Chomsky decidiu fugir, abandonando seu companheiro. “A vergonha por esse acontecimento na infância sempre me acompanhou, desde então sei de que lado devo estar”, disse há alguns anos, recordando essa anedota. Noam Chomsky, que acaba de cumprir 91 anos, é uma referência intelectual mundial e um ativo defensor dos Direitos Humanos.
O gênio da linguística compartilhou suas reflexões sobre o assassinato – ordenado por Donald Trump – do poderoso general iraniano Qasem Soleimani, na capital do Iraque, Bagdá, o que gerou ainda mais incertezas no Oriente e no Ocidente. Além disso, o pensador explica o fracasso da Conferência do Clima (COP25), realizada pela ONU em dezembro do ano passado em Madri, em um momento em que o aquecimento global gera grandes estragos na Austrália com os incêndios florestais.
Trump comemorou abertamente o assassinato do general iraniano Soleimani. Em sua opinião, o que explica esse ataque?
Segundo as últimas informações, foi uma decisão que Trump tomou por capricho, o que surpreendeu inclusive os altos oficiais e analistas de informação no Pentágono. Provavelmente, é de se supor que ele fez isso para mostrar seu poder, brincar de destruir cai bem entre seus adoradores, ou com aquilo que seus seguidores supõem que esteja certo
É inevitável relacionar esse ataque com o julgamento político enfrentado por Trump, lembrando o bombardeio que Bill Clinton ordenou no Iraque em 1998, uma espécie de cortina de fumaça…
Talvez, mas duvido que isso tenha sido decisivo. E tampouco me convenceu a histórica de Clinton em seu tempo.
As autoridades iranianas sustentaram, nos últimos dias, que não respeitarão o acordo sobre material nuclear que Irã assinou com as principais potencias mundiais em 2015.
Nunca houve uma chance de renegociação diante dos termos de Trump, que é uma arma na mão. Se os líderes iranianos são sábios, se absterão desse tipo de ação provocativa que Trump e Pompeo esperam, desesperadamente, para poder usar sua carta mais forte: a violência. Uma direção sábia por parte do Irã seria deixar que a liderança dos Estados Unidos continue se enfraquecendo.
A comunidade internacional está passiva?
Passividade não é a palavra correta. Poucos estão dispostos a enfrentar um touro furioso. Mas é também certo que não se deve permitir que a capital mundial do terror [Washington] atue impunemente.
Diante dessa situação, como acredita que se comportará o eleitorado estadunidense nas eleições de novembro – e que mais podemos esperar de Trump?
De Trump podemos esperar a mesma dedicação alegre diante de uma catástrofe indescritível e, sempre e quando possa, tentará conservar seu poder e perseguirá seu projeto de colocar mais dólares em bolsos já cheios, inclusive os seus. Da forma como é orientado, não lhe resta se não concluir que não existiu tal criminalidade na história humana. Nem mesmo com Hitler, literalmente. Do Partido Republicano, é exatamente o mesmo. Em relação ao eleitorado, isso é uma questão de ação, não de especulação.

Fracasso da Conferência Mundial do Clima

Diante desse cenário bélico, o retumbante fracasso da COP 25 foi pouco difundido, apenas se falou quando as nuvem do fogo australiano cobriu o planeta.
O tratamento dos meios de comunicação e da opinião intelectual em geral sobre a urgência da ameaça do aquecimento global é um crime de dimensões históricas. Ignorar o fracasso da COP 25 é só outro exemplo. Durante anos, estive advertendo, da forma mais forte que posso, sobre as duas grandes ameaças colocadas pela guerra nuclear e pela catástrofe ambiental, que devem ser destacadas nas manchetes dos jornais, principalmente nos Estados Unidos, onde a administração Trump e o Partido Republicano, geralmente, não apenas se recusam a enfrentar a crise, mas também a conduzem de forma triunfal, liderando o caminho para o desastre.
Por que o silêncio? Por que os principais bancos investem em combustíveis fósseis, sabendo que estão contribuindo para a destruição da vida humana organizada no planeta e não em um futuro a longo prazo? Podemos entender a lógica que há por trás dessas ações, mas não há palavras para descrever os inacreditáveis crimes que eles significam.
No geral, Europa mostra certo alarme pelo fracasso destas conferências sobre a emergência climática, mas dessa vez optou pelo silêncio. Por quê?
Talvez porque tem um sentimento de culpa.

sábado, 11 de janeiro de 2020

A esquerda, os militares, o imperialismo e o desenvolvimento, por José Luís Fiori




Foi depois da Primeira Grande Guerra que o movimento socialista internacional repudiou o colonialismo europeu e transformou o “imperialismo” no inimigo número um da esquerda mundial.

A esquerda, os militares, o imperialismo e o desenvolvimento

por José Luís Fiori

As grandes potências são aqueles Estados de toda parte da Terra que possuem elevada capacidade militar perante os outros, perseguem interesses continentais ou globais e defendem estes interesses por meio de uma ampla gama de instrumentos, entre eles a força e ameaças de força, sendo reconhecidos pelos Estados menos poderosos como atores principais que exercem direitos formais excepcionais nas relações internacionais.
Charles Tilly, Coerção, Capital e Estados Europeus. São Paulo: EDUSP, 1996, p. 247
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Foi depois da Primeira Grande Guerra que o movimento socialista internacional repudiou o colonialismo europeu e transformou o “imperialismo” no inimigo número um da esquerda mundial. Assim mesmo, quando os socialistas chegaram pela primeira vez ao poder, na Europa, e foram obrigados a governar economias capitalistas, não conseguiram extrair consequências da sua própria teoria do imperialismo para o plano concreto das políticas públicas. E quando foram chamados a comandar diretamente a política econômica, como no caso de Rudolf Hilferding, entre outros, seguiram o receituário vitoriano clássico, do “sound money and free markets” – até muito depois da Segunda Guerra, quando aderiram, já nos anos 60 e 70, às ideias, propostas e políticas keynesianas. Mas na década de 80, estes mesmos partidos se converteram ao programa ortodoxo da austeridade fiscal e das reformas liberais que levaram à desmontagem parcial do Estado de Bem-estar Social.
Esse mesmo problema reapareceu de forma mais dramática quando lhes tocou aos socialistas e às forças de esquerda governarem países “periféricos” ou “subdesenvolvidos”. Também nestes casos, os teóricos do imperialismo e da dependência tiveram muita dificuldade para decidir qual seria o modelo de política econômica “ideal” para as condições específicas de um país situado no “andar de baixo” da hierarquia mundial do poder e da riqueza.
No caso da América Latina, a CEPAL formulou nos anos 50 uma teoria “estruturalista” do comércio internacional e da inflação, e propôs um programa de industrialização por “substituição de importações” que lembrava as teorias e propostas de Friederich List, economista alemão do século XIX, com a diferença de que as ideias cepalinas não tinham nenhum tipo de conotação nacionalista, ou de coloração anti-imperialista. Na prática, entretanto, dentro e fora da América Latina, os governos de esquerda dos países periféricos acabaram, quase invariavelmente, derrubados ou estrangulados financeiramente pelas grandes potências do sistema mundial, sem terem conseguido descobrir o caminho do crescimento e da igualdade, dentro de uma economia capitalista subdesenvolvida, e no contexto de um sistema internacional assimétrico, competitivo e extremamente bélico. Apesar de tudo, essas experiências deixaram um ensinamento fundamental: que os modelos e as políticas econômicas que funcionam em um país do “andar de cima” não funcionam necessariamente em países situados nos escalões inferiores do sistema, e menos ainda, quando estes países do “andar de baixo” tiveram a ousadia de querer mudar sua posição relativa dentro da hierarquia mundial do poder.
Desta perspectiva, para poder avançar neste debate, é útil distinguir pelo menos quatro tipos ou grupos de países,[1] do ponto de vista de sua estratégia de desenvolvimento e de sua posição com relação à potência dominante em cada um dos grandes tabuleiros geopolíticos e econômicos do sistema mundial. No primeiro grupo, encontram-se os países que lideram ou lideraram a expansão do sistema mundial, em distintos níveis e momentos históricos, as chamadas “grandes potências”, do presente e do passado, desde a origem do sistema interestatal capitalista; no segundo grupo, estão os países que foram derrotados e submetidos pelas grandes potências, ou que adotaram voluntariamente estratégias de integração econômica com as potências vitoriosas, transformando-se em seus dominiums econômicos e protetorados militares; no terceiro grupo devem ser situados os países que lograram se desenvolver questionando a hierarquia internacional estabelecida e adotando estratégias econômicas nacionais que priorizaram a mudança de posição do país dentro do poder e da riqueza mundiais; e por fim, no quarto grupo, podemos situar todos os demais países e economias nacionais situadas na periferia do sistema e que não puderam ou não se propuseram sair dessa condição, ou mesmo sofreram um processo de deterioração ou decadência depois de terem alcançado níveis mais altos de desenvolvimento, como no caso de alguns países africanos e latino-americanos.
No caso da América Latina, a potência dominante sempre foram os Estados Unidos. E desde a Segunda Guerra Mundial, até o final da década de 70 pelo menos, os Estados Unidos defenderam e patrocinaram na sua “zona de influência” um projeto de tipo “desenvolvimentista” que prometia rápido crescimento econômico e modernização social, como caminho de superação do subdesenvolvimento latino-americano. Mas depois da sua crise dos anos 70, e em particular na década de 80, os norte-americanos mudaram sua estratégia econômica internacional e abandonaram definitivamente seu projeto e patrocínio desenvolvimentista. Desde então, passaram a defender, urbe et orbi, um novo programa econômico de reformas e políticas neoliberais que ficou conhecido pelo nome de “Consenso de Washington”, que se transformou no núcleo central de sua retórica vitoriosa depois do fim da Guerra Fria. Combinavam a defesa dos mercados livres e desregulados com a defesa da democracia e da desestatização das economias que haviam seguido seu ideário anterior, que propunha um crescimento econômico rápido e induzido pelo Estado. Foi o momento em que o neoliberalismo se transformou no pensamento hegemônico de quase todos os partidos e governos da América Latina, incluindo os partidos socialistas e social-democratas. Na segunda década do século XXI, entretanto, os Estados Unidos voltaram a redefinir e mudar radicalmente seu projeto econômico para a periferia latina e mundial, defendendo um ultraliberalismo radical e com forte viés autoritário, sem nenhum tipo de preocupação social ou promessa para o futuro, seja de maior justiça ou de maior igualdade.
É nesse contexto hemisférico que se deve ler, interpretar e discutir a trajetória econômica brasileira da Segunda Guerra Mundial até hoje, começando pelo sucesso econômico do seu “desenvolvimentismo conservador”, que foi sempre tutelado pelos militares e apoiado pelos Estados Unidos. Em troca, durante todo esse período, os militares brasileiros submeteram-se à estratégia militar dos Estados Unidos durante a Guerra Fria, transformando-se no único caso de sucesso no continente latino-americano daquilo que alguns historiadores econômicos costumam chamar de “desenvolvimento a convite”, que se encaixa diretamente no segundo tipo de estratégia e de desenvolvimento da nossa classificação anterior. Ressalva deve ser feita ao governo Geisel, que se manteve fiel ao anticomunismo americano, mas ensaiou uma estratégia de centralização e estatização econômica e de conquista de maior autonomia internacional, que foi vetada e derrotada pelos Estados Unidos e pelo próprio empresariado brasileiro.[2]
É exatamente o período “geiselista” do regime militar brasileiro que deixa muitos analistas confundidos quando o comparam com o ultraliberalismo do atual governo “paramilitar” instalado no Brasil em 2018. Na verdade – excluída a “excrecência bolsonarista” – os militares brasileiros seguem no mesmo lugar, ocupando a mesma posição que ocuparam nos golpes de 1954 e de 1964: aliados com as mesmas forças conservadoras e com a extrema-direita religiosa, e alinhados de forma incondicional e subalterna com os Estados Unidos. E é por isto exatamente que não representa nenhum constrangimento para eles o fato de terem sido “nacional-desenvolvimentistas” na segunda metade do século XX, e serem agora “nacional-liberistas” neste início do século XXI. Acreditam que, uma vez mais, seu alinhamento automático com os Estados Unidos lhes garantirá o mesmo sucesso econômico que tiveram durante a Guerra Fria, só que agora através de mercados desregulados, desestatizados e desnacionalizados.
O que os atuais militares brasileiros ainda não perceberam, entretanto, é que a estratégia de desenvolvimento ultraliberal esgotou-se em todo mundo, e em particular no caso dos Estados e economias nacionais de maior extensão e complexidade, como o Brasil. E que os Estados Unidos já não estão em condições nem querem assumir a responsabilidade pela criação de um novo tipo de “dominium canadense” ao sul do continente americano. Além disso, nesta nova fase os Estados Unidos estão inteiramente dedicados à competição entre as três grandes potências que restaram no mundo;[3] não têm mais nenhum tipo de aliado permanente ou incondicional, com exceção de Israel e Arábia Saudita; e consideram que seus interesses econômicos e estratégicos nacionais estão por cima de qualquer acordo ou aliança com qualquer tipo de país, que por definição será sempre passageira. Por sua própria conta, a agenda ultraliberal pode garantir um aumento da margem de lucro dos capitais privados, sobretudo depois da destruição da legislação trabalhista, e durante o período das grandes privatizações. Mas, definitivamente, a agenda ultraliberal não conseguirá dar conta do desafio simultâneo do crescimento econômico e da diminuição da desigualdade social brasileira.
No entanto, esse “fracasso anunciado” traz de volta o grande desafio e a grande incógnita da esquerda e das forças progressistas, até porque o antigo desenvolvimentismo brasileiro não foi uma obra de esquerda, como já dissemos, mas sobretudo uma obra conservadora e militar que não teria tido grande sucesso se não tivesse contado com o “convite” norte-americano. E exatamente por isso fica muito difícil querer reinventá-lo utilizando apenas novas fórmulas e equações macroeconômicas. Talvez por isto mesmo às vezes se tem a impressão, hoje, de que a esquerda econômica vive prisioneira de um debate circular e inconclusivo, sempre em busca da fórmula mágica ou ideal que supõe ser capaz de responder por si só triplo desafio do crescimento, da igualdade e da soberania.
Nesses momentos de grandes “bifurcações históricas”, é preciso ter coragem de mudar a forma de pensar, é preciso “rebobinar” as ideias, mudar o ângulo e trocar o paradigma. Isto é muito difícil de esperar dos militares porque eles foram educados para pensar sempre da mesma maneira, e foram treinados para fazer a mesma coisa todo dia, em ordem unida. O problema maior, entretanto, vem da resistência dos economistas progressistas que, quando ouvem falar em “imperialismo”, “dependência” ou em “assimetria do poder internacional”, preferem se esconder atrás do argumento velho e preguiçoso de que se trata de uma “visão conspiratória” da História, sem querer enfrentar a dura realidade revelada por Max Weber, quando nos ensinou que “os processos de desenvolvimento econômico são lutas de poder e dominação [e por isto] a ciência da política econômica é uma ciência política, e como tal não se conserva virgem com relação à política quotidiana, a política dos governos e das classes no poder, e pelo contrário, depende dos interesses permanentes da política de potência das nações”.[4]

30 de dezembro de 2019
[1] Fiori, J.L., “História, estratégia e desenvolvimento”, Editora Vozes, Petrópolis, 2015, p: 43 e 44
[2] “O governo Geisel tentou impor um novo movimento de centralização econômica, mas já não encontrou o apoio social e político – nacional e internacional – de início do regime militar. Por isso fracassou, e apesar da aparência em contrário, seu intento acelerou a divisão interna dos militares, que cresceu ainda mais nos anos seguintes e acabou levando-os à impotência final”. FIORI, J.L. Conjuntura e ciclo na dinâmica de um Estado periférico. Tese de Doutoramento, mimeo, USP, 1985, p. 214.
[3] COLBY, E.A. e MITCHELL, A.W. The Age of Great-Power Competition. How the Trump Administration Refashioned American Strategy. Forerign Affairs This Week. December 27, 2019.
[4] Weber, M. “Escritos Políticos”, Folio Ediciones S.A., México, 1982, p: 18