Washington Novaes é conhecido desta coluna, pois temos reproduzido muitos textos dele sobre questões ecológicas. Talvez seja o jornalista mais bem informado de nosso pais. Como estamos acompanhando, não sem preocupações, a Cúpula do Clima (COP 21) em Paris nos começos de dezembro, oferecemos aqui um apanhado geral da situação climática atual e o impasse, já por nós denunciado num artigo nesse blog e confimado por Washington Novaes neste artigo a aparecer nos primeiros dias de dezembro em O Estado de São Paulo. Os chefes de Estado não despertaram ainda acerca da urgência deste problema que poderá nos preparar surpresas altamente desagradáveis em termos de estresse da Terra e da dizimação de boa parte da biodiversidade, não poupando nem a espécie humana. Como nunca antes na história, o destino comum está em nossas mãos e sob o nosso cuidado: se queremos cair no abismo que nós mesmos criamos ou se nos livramos dele através de outra forma de habitar e cuidar da Casa Comum - Leonardo Boff
O Clima bate às portas e pede muita Urgência
Washington NovaesNão está sendo nem será fácil ou tranquila a vida dos chefes de Estado e outros participantes da Cúpula do Clima em andamento em Paris, e que pretende definir novas metas para a redução de poluentes – gerais e em cada país -, além de outras regras para o setor. Já antes que ela começasse, o secretário de Estado John Kerry contrapôs-se ao presidente Obama, ao dizer que seu país não aceitaria regras obrigatórias, vinculantes – a mesma postura do enviado especial norte-americano, Todd Stern. Este último chegou a propor um “modelo híbrido”, em que obrigatórias seriam apenas as regras para verificar as emissões de cada país – não os limites para estas. Um dos argumentos é o de que os EUA já definiram que pretendem reduzir as suas entre 26 e 28% até 2025 (confrontadas com as de 2005).
Não há surpresa até aí. Quando se encerrou a reunião preparatória em Bonn, há algumas semanas, o documento final com as posições dos países tinha 55 páginas, cada um deles defendendo seus interesses específicos – o que poderia levar à paralisia. Um especialista da CEPAL, Luis Miguel Galindo, advertia que já estamos emitindo no mundo 7 toneladas anuais de poluentes por habitante, ou entre 47 e 48 gigatoneladas (bilhões de toneladas) totais – há quem diga 50 gigatoneladas -, quando seria indispensável baixarmos para 20 gigatoneladas até 2050 (2 toneladas per capita).
Estudos da própria ONU dizem que, nos padrões de hoje, não alcançaremos o objetivo de limitar a 2 graus Celsius o aumento da temperatura na Terra – ficaremos com pelo menos 2,7 graus no fim do século. Para intensificar as medidas de adequação será preciso um fundo anual de US$100 bilhões, sobre o qual não há acordo entre possíveis financiadores.
Não é o único complicador. Relatório da Corporate Accountability International (24/11) entra no pantanoso terreno das finanças das corporações patrocinadoras das negociações sobre o clima. São empresas petrolíferas e de outros combustíveis fósseis, bancos, geradoras de energia etc. Segundo o relatório, contar com elas é como “contratar uma raposa para guardar um galinheiro”.
Como fazer, então, se a Agência Internacional de Energia diz (10/11) que as fontes “limpas” não garantem que fiquemos nos limites adequados ? E até 2040, na marcha atual, as renováveis devem representar apenas 15% do total do investimento no mundo – US$7,4 trilhões. Os combustíveis fósseis receberam subsídios de US$ 490 bilhões em 2014. Pouco menos que isso seria necessário investir em tecnologias de renováveis até 2030. Além disso, será preciso eliminar as usinas que queimam carvão, as mais poluidoras – mas que fornecem principalmente aos setores mais pobres (e há 1,2 bilhão de pessoas sem energia no mundo).

De fato, o total das emissões , que em 1990 era de 38 gigatoneladas anuais (com os EUA como maior emissor), em 2010 já está perto de 50 gigatoneladas (agora a China é o maior emissor com 23%, seguida dos EUA, com 15,5%). Se nada mudar, diz o PNUMA, poderemos ter aumento da temperatura entre 3 e 3,5 graus no fim do século.O estudioso Bill McKibben calcula em 556 gigatoneladas o máximo de dióxido de carbono que poderemos colocar na atmosfera sem ultrapassar 2 graus no aumento da temperatura. No Brasil, seria um despautério globalse queimássemos todas as reservas de combustíveis, inclusive no pré-sal
Há avanços importantes. Nos EUA, o presidente Obama rejeitou a proposta de construir o oleoduto Keystone XL, ligando o Canadá ao Golfo do México e depois espalhando-se pelo centro dos Estados Unidos, com passagem inclusive pelo Aquífero Ogalalla – o que seria inadmissível. A Grã-Bretanha fechará todas as suas usinas a carvão em poucos anos (elas geram 30% do total da energia no país) e passará para o gás e a energia nuclear (também discutível).
Mas também seguem as advertências. A ONU tem alertado o Brasil (ESTADO, 7/11) sobre o crescimento preocupante das emissões de poluentes nas cidades e pelo complexo industrial, segundo as palavras de Achim Steiner, do PNUMA. O jornal “Le Monde” (25/11) tem assinalado a dificuldade crescente de a floresta brasileira regular o clima (em 40 anos, diz, 63 mil quilômetros quadrados de florestas foram abatidos;e 2004, foram 27.772 km2; em 2013, pouco mais de 5 mil; o Brasil já perdeu na região mais de 200 mil quilômetros quadrados de florestas, mais que o território do Reino Unido ). No Cerrado, perto de 40% já foram desmatados.
Do lado mais otimista, o respeitado cientista Carlos Nobre, do INPE, lembra que estamos com emissões de 7,5 toneladas por pessoa/ano, mas poderemos chegar a 4 toneladas anuais em 2030 e 2 toneladas em 2050 (Eco 21, setembro). A própria presidente da República tem afirmado que temos condição de recuperar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas e reimplantar florestas em 5 milhões de hectares.
É importante que tudo isso aconteça, que se detenha a progressão de temperaturas em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, que se implante de fato um Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima em 11 setores. Muito tem de ser feito. Não é por acaso que se reúnem em Paris os chefes de governo. Não será para trocar amabilidades.
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