terça-feira, 12 de novembro de 2019

A responsabilidade penal de governadores por crimes praticados pela polícia, por Antônio Martins, professor adjunto de Direito Penal e Criminologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutor em Direito pela Goethe-Universität Frankfurt am Main, na Alemanha





A responsabilidade penal de governadores por crimes praticados pela polícia sob suas ordens diretas: um caso de autoria mediata?

do Grupo Prerrogativas

A responsabilidade penal de governadores por crimes praticados pela polícia

por Antônio Martins

I. O cenárioUm hipotético cenário: o chefe de governo de um Estado da Federação declara, reiteradas vezes, a veículos de imprensa e, ao que parece, diretamente aos policiais que lhe estão subordinados, (2) em forma de ordem ou autorização abrangente, que estes devem disparar para matar contra quem esteja portando arma de fogo de grosso calibre, em local público, supondo que esse local integre uma zona arbitrariamente estipulada como conflitiva. O mesmo governador extingue a secretaria de segurança pública, tornando-se mais diretamente vinculado às ações policiais praticadas no âmbito de seu Estado. O mesmo governador se deixa filmar participando de uma operação que efetua disparos contra alvos não identificados em zona residencial. O mesmo governador, braços ao alto, celebra, em público, a morte de um homem que havia sequestrado um veículo de transporte público, e sobre cuja imputabilidade pairam dúvidas razoáveis.
Um número crescente de vítimas é registrado, por sucessivas ações policiais desastradas – desastradas, mas compatíveis com o ideal de “efetividade policial” do governo: trata-se de uma “política de confronto”. A letalidade policial aumenta, seguindo tendência histórica – sem desconsiderar, portanto, que o número de mortes por policiais já atingia, antes do incremento proporcionado por nosso chefe de governo, níveis insustentáveis. As vítimas, anônimas, encontram, na figura simbólica de uma criança, morta, ao que tudo indica, em razão de uma intervenção policial, sua expressão mais exasperante.
Esse cenário hipotético encontra inquietante correspondência com a realidade do Estado do Rio de Janeiro. (3) A proposta eleitoral de disparar, de forma letal, contra pessoas armadas, segundo expressa declaração do governador de Estado, torna-se política de governo. (4) Isto implica, inclusive, a promoção de atiradores de elite que tenham sucesso na empreitada e o cancelamento de incentivos financeiros para reduzir o número mortes em intervenções policiais. (5) O aumento drástico da letalidade policial pode ser observado sem esforço; a média, entre janeiro e agosto de 2019, era de cinco mortes por dia.6 A política de governo conta com essas mortes, naturaliza-as. (7) Vítimas marginais, que deveriam estar inteiramente alheias ao campo de intervenção policial, são a consequência necessária do contexto de violência gerado por essa “carta branca” à morte policial; (8) suplícios simbólicos em face de um cenário trágico. (9)
II. As indagações
Considerando que as mortes praticadas pela polícia nesse cenário são, reiteradas vezes, ilícitos penais, não cobertos pelos deveres da atividade policial nem pelo direito de legítima defesa que a todos assiste (1)0 – é possível responsabilizar criminalmente por elas o chefe de governo?
Quais seriam as formas possíveis que essa responsabilização poderia assumir?
Pode-se considerar que o governador é não apenas partícipe, mas também autor dos crimes praticados pela polícia?
III. O panorama dogmático
O Código Penal brasileiro determina, em seu artigo 29, que todo aquele que concorre para o crime incide nas penas a ele cominadas. Esse artigo, evidentemente, deve ser lido em conjunto com o artigo 13 do Código Penal, restringindo, no âmbito da tipicidade, a participação criminal àqueles que deram uma contribuição jurídico-materialmente relevante ao fato punível, para além do executor direto – sujeita, portanto, também aos critérios limitadores da imputação objetiva. (1)1
Uma vez afirmada a relevância normativa da contribuição causal, cabe a pergunta acerca da forma de responsabilização. A essa pergunta respondem as teorias sobre o concurso de pessoas, de sólida tradição dogmática. (12) A despeito da regra do art. 29 e deixando de lado a discussão sobre a adoção de um conceito restritivo ou extensivo de autor, (13) a relevância da diferenciação entre formas de participação faz parte, já ao nível da legalidade estrita, da estrutura do processo de imputação reconhecido por nosso ordenamento: tanto que o art. 31, ao estipular “casos de impunibilidade”, não só reconhece as clássicas figuras da instigação ou induzimento e da cumplicidade, com o que a estas restringe as modalidades de participação, como também adota, direta ou indiretamente, a teoria da acessoriedade limitada, segundo a qual o partícipe só é punível se houver o fato ilícito de um autor. (14)
Não vale a pena, aqui, por razões de espaço e de tempo, descrever detalhadamente todas as formas que pode assumir o concurso de pessoas no direito penal brasileiro. Interessa-nos, antes, considerar as formas que poderiam ser levadas em consideração para a responsabilização de nosso chefe de governo, que são três, segundo entendimento doutrinário predominante e já amplamente debatido em outros contextos: a instigação, a coautoria e a autoria mediata. Em seguida, pretendo dedicar-me a responder as indagações propostas em II., considerando a compatibilidade dessas formas de responsabilização com o contexto fático apresentado.
1. Instigação
A instigação consiste, segundo lição clássica, na determinação de alguém à prática de um crime (ou, como se aventa, ao reforço de uma resolução previamente tomada). (15) Relaciona-se com a antiga figura do mandato, assim como com outras formas de convencimento ou estímulo à prática de um ilícito. Para o caso de nosso chefe de governo, significaria responsabilizá-lo, pelas distintas declarações, diretas e indiretas, dadas à imprensa e – supõe-se – diretamente aos executores, como instigador de ações policiais homicidas, uma vez comprovada a ilicitude destas: seria ele quem determinou os policiais à prática delitiva. (16)
As modalidades de instigação não têm, na história dos conceitos penais, uma posição necessariamente inferior ou menos grave em relação às formas de autoria. (17) Porém, a instigação é tratada, nos sistemas diferenciadores, como forma de participação criminal em sentido estrito, e não de autoria. Segundo o Código penal alemão, por exemplo, que diferencia entre formas de autoria e participação, o instigador será punido tal qual o autor, ou seja, segundo o mesmo marco penal (§ 26 do Código Penal alemão).
A punição do chamado “autor de escritório”, aquele de quem parte um comando normativo que será executado por outrem, vem suscitando controvérsias no contexto da punição da criminalidade de Estado. Mesmo em contextos ditatoriais, parte da doutrina tende a considerar esses agentes como instigadores. (18) Aquele que ordena a prática de crimes a um executor direto, no âmbito da estrutura estatal, seria, portanto, apenas partícipe no fato deste.
Essa conclusão gera certa perplexidade. O soldado nazista que conduzia diretamente judeus a câmaras de gás seria autor, enquanto quem arquitetou e ordenou essa prática seria mero partícipe; o soldado que disparava contra fugitivos, no muro de Berlim, seria autor, enquanto aqueles que forjaram essa política de Estado, instigadores. Os autores diretos, aqui, executavam ordens, numa cadeia de ação, e podiam ser facilmente substituídos por outras pessoas, no caso de se negarem a executá-las. Sua convicção, para a prática do fato, pouco importava. Tomem-se como parâmetro as antigas doutrinas subjetivas de diferenciação entre autoria e participação, já corretamente descartadas pela doutrina; (19) elas parecem traduzir a inquietação de quem se debruça sobre tais constelações de casos: o executor parece ter com o fato um vínculo subjetivo muito mais débil do que o instigador.
A configuração normativa parece não dar conta da realidade; é como se a teoria não correspondesse ao contexto fático sobre o qual pretende ser aplicada.
A questão que aqui se coloca, portanto, é se a imputação por instigação atende à configuração específica dessa realidade. E, não sendo assim, cabe a pergunta sobre o quanto o contexto específico de um fato, ou de uma cadeia de fatos puníveis, pode e deve gerar modificações no modelo de imputação penal – e sob quais condições.
2. Coautoria
Parte da doutrina, para aqueles mesmos casos de criminalidade estatal, cogitou tratar o superior hierárquico como coautor do fato, junto aos executores diretos. (20) Ou seja, haveria divisão funcional de trabalho entre quem dá a ordem e aquele que a executa; tratar-se-ia de uma unidade de ação entre os distintos participantes. (21)
Isto significaria, em nosso caso, tratar o hipotético governador como coautor dos delitos de homicídio perpetrados por policiais. Para tanto, seria necessário prescindir-se, como requisitos da coautoria, tanto da exigência de participação na execução do delito, como também de uma decisão comum para o fato. (22)
A dificuldade dogmática salta aos olhos; mesmo em se admitindo coautoria sem participação na execução do fato típico, (23) a decisão comum para o fato só se poderia dar metafórica ou ficticiamente. (24) A questão de fundo, no entanto, é outra: ainda que se pretenda uma modificação da teoria do concurso de agentes de modo a adequá-la ao contexto fático excepcional, a solução da coautoria terminaria precisamente por equiparar, ou colocar no mesmo nível normativo, condutas que se quer distinguir. O que parece diferenciar esses casos de outros não é a cooperação ou divisão de trabalho entre executor e superior hierárquico, mas sim o fato de que, independentemente do domínio do executor direto, também aquele que dá as ordens é figura central do ilícito, “senhor do fato” (25) – e com isso remontamos à definição de autor da teoria do domínio do fato.
3. Autoria mediata
Em artigo publicado em 1963, (26) depois incorporado à sua tese de livre-docência (Habilitation), Roxin, com os olhos voltados ao processo de Adolf Eichmann, em Jerusalém, propôs considerar como casos de autoria mediata aquelas constelações em que o mandante “dispõe de um ‘aparato’ de pessoas – na maioria das vezes estatal –, com cuja ajuda pode levar a cabo seus crimes sem que sua realização tenha de depender de uma decisão autônoma dos executores.” (27) A organização funciona automaticamente, sem depender da pessoa individual do executor; o executor pode ser substituído a qualquer momento. (28) Roxin fala, aqui, da “fungibilidade” do autor direto, que age, porém, como pessoa livre e responsável.
Ao contrário do que se dá na generalidade dos casos, o mandante possui efetivo domínio do fato ilícito; a distância que ele mantém em relação ao fato, geralmente um indicador de menor domínio ou controle, é compensada por seu domínio de organização. (29) Será ele quem decidirá pela execução, ou não, do fato. Isto se dá, naturalmente, apenas no que se refere àqueles que detêm um real poder de decisão, que estão no centro de comando; aqueles que exerçam apenas uma função consultiva ou forneçam instrumentos para a execução, permanecerão sendo cúmplices, assim como aqueles que determinem o autor direto, mas estejam fora do aparato organizacional, serão apenas instigadores. (30)
Roxin restringe a autoria mediata por domínio da organização aos casos em que o aparato se tenha desligado integralmente da ordem jurídica: “porque na medida em que a direção e os órgãos de execução se vinculem, em princípio, a uma ordem jurídica deles independente, a ordem de praticar ações puníveis não pode fundamentar domínio do fato, eis que as leis têm o status superior e excluem, normalmente, a realização de ordens ilícitas e, com isso, o poder de vontade do ‘homem de detrás.’” (31) O caso mais comum seria, portanto, aquele em que o detentor do poder estatal pratica crimes por meio das organizações que lhe estão subordinadas. (32) Aqui, o direito, que não perde por isso sua validade, deixa de inibir e limitar o exercício do poder. (33)
Mais recentemente, Roxin acresce aos requisitos para a autoria mediata por domínio de organização, por influência de um critério proposto por Schroeder, a “disposição para o fato” por parte do autor direto. (34) Essa disposição é caracterizada por diversas circunstâncias especificamente relacionadas à posição do autor direto na organização, como a tendência à adaptação ao contexto, a vontade de progredir na carreira, a absorção da ideologia mesma que sustenta o regime, o receio de perder sua posição ou de ser desprezado pelos colegas, a consideração de que, se não ele, outro executará a ordem etc. (35)
A teoria da autoria mediata por domínio de organização, que conta com grande número de adeptos na Alemanha e mundo afora, (36) sem excluir a jurisprudência, não está isenta de críticas de diferentes matizes. Parte da doutrina recorre ao chamado princípio da autorresponsabilidade, para negar a possibilidade de domínio da vontade quando o autor direto age com plena liberdade e, portanto, de forma responsável. Não obstante, a pretendida aplicação desse princípio às hipóteses em questão consiste, como bem observou Greco, numa petitio principii, na medida em que a rejeição do domínio de organização é pressuposto de sua própria formulação. (37)
Ilustrativa, ainda, é a crítica de Renzikowski, para quem a teoria do domínio da organização apresenta – ao basear-se, pelo critério da fungibilidade, na maior probabilidade fática de realização do delito – uma imperfeita combinação de aspectos fáticos e normativos, o que geraria imprecisão conceitual. (38) Mas é exatamente a modificação teórica a partir da constatação da inadequação do modelo em face da realidade que parece constituir o maior atrativo da teoria. Sendo assim, nada se teria a obstar à revitalização da figura do mandatum, proposta por Haas e preconizada por Renzikowski, (39) desde que ela proveja as mesmas vantagens que a teoria do domínio de organização e neutralize as mesmas dificuldades de outras abordagens, nomeadamente a insatisfatória consideração de que o mandante de delitos, no caso da criminalidade estatal, é mero partícipe. (40)
Não se trata de modificações ad hoc de teorias, mas de pensá-las de modo consequente tanto com o contexto social de ação, que afinal é quem as forja, como com sua própria estrutura normativa, garantindo-lhes coerência interna e sistemática. Fático e normativo se interpenetram na delimitação de figuras dogmáticas.
IV. A responsabilidade penal do governador como autoria mediata
Observado o cenário descrito em I., e tomando-se por verdadeiras e comprováveis as circunstâncias descritas, não restam dúvidas sobre a contribuição causal do governador para as mortes perpetradas pela polícia e a inexistência de razões para excluir a imputação objetiva, desde que se trate de casos que se enquadrem em sua política oficial. Isto deverá ser comprovado, naturalmente, caso a caso, e não significa uma responsabilização genérica por toda morte realizada por policiais. Mas, naquelas hipóteses que correspondam à sua “política de confronto”, como, por exemplo, os disparos feitos por snipers contra quem estiver portando fuzis, o vínculo do governador com o ilícito praticado é inegável. É ele quem detém o poder sobre toda a cadeia de acontecimentos, desde a institucionalização de uma “política de abate”, a ordem dada diretamente aos policiais, a decisão sobre quem a executa, passando pelo controle dos meios, até a garantia expressa de que os executores não serão processados criminalmente.
A ideia de um “autor por detrás do autor” surge plenamente aplicável ao contexto. Também no cenário descrito parece haver a utilização do aparelho estatal, desvinculado do direito, para a prática sistemática de crimes, de modo que a lei perde sua capacidade de limitar o exercício do poder. Como bem anota Tiago Joffily em contexto similar, o cenário é de ruptura com o Estado de direito, sua vigência sendo suspensa a partir do momento em que é o chefe de governo quem, em termos puramente fáticos, decide sobre a vida e a morte dos indivíduos. (41)
Também naquele cenário tem o “homem de detrás” o domínio da organização, de modo que sua distância em relação ao fato é compensada pelo controle da organização.
Também ali se pode falar em fungibilidade, sendo o policial mera peça substituível na engrenagem de uma organização destinada ao cometimento sistemático de delitos.
Também ali se pode partir de uma especial “disposição para o fato” do policial executor, corroborada pela observação da histórica prática policial de extermínio, campo frutífero para estudos criminológicos. (42) Nesse contexto, ressaem tanto a influência de uma cultura corporativa autoritária como a formação de um discurso social, sustentado anos a fio pela grande mídia, que legitima e enaltece, ao arrepio da Constituição e da lei, o “combate” ao crime por meio de uma política de extermínio, cujo alvo preferencial, a população pobre e negra, é previamente conhecido. E esse discurso está a tal ponto sedimentado que mesmo o Ministério Público, responsável pelo controle externo da atividade policial, resta inerte e se omite de denunciar o caráter delitivo da política oficial do governador, contribuindo para um cenário de desorientação normativa. Entre estímulo e condescendência, a conjuntura é propícia à sistemática do extermínio.
A conclusão sobre a autoria mediata do governador não implica retirar-se do autor direto a responsabilidade pela execução do crime. A vantagem do modelo consiste precisamente em fazer subsistir, paralelamente, a responsabilidade de ambos como autores: do superior hierárquico que dá as ordens e daquele que as executa.
Se a autoria mediata por domínio da organização é o modelo dogmático adequado para tratar esse tipo de casos, ou se um modelo alternativo, situado entre a instigação e a autoria mediata, poderia ser uma solução preferível – essa questão parece, a um só tempo, demandar um estudo mais aprofundado e carecer de imediata relevância prática. O fundamental, e isto está dito, é imputar ao mandante, aqui representado na figura do governador, uma participação no delito de patamar não inferior ao do executor direto. Vale dizer: a responsabilidade penal do governador não é menor do que a do policial que aperta o gatilho.
Antônio Martins é professor adjunto de Direito Penal e Criminologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutor em Direito pela Goethe-Universität Frankfurt am Main, na Alemanha.

2 V. art. 144, § 6º da Constituição Federal.
3 A respeito e sobre outros temas que aqui serão abordados, cf. o ilustrado parecer elaborado por YAROCHEWSKY, Leonardo Isaac. “Snipers​: sua legalidade e responsabilidade do governador do Estado do Rio de Janeiro”, disponível em https://www.conjur.com.br/dl/parecer-responsabiliza-witzel-mortes.pdf.
4 Chama atenção o número de matérias jornalísticas a respeito. Para citar apenas algumas: https://veja.abril.com.br/politica/wilson-witzel-a-policia-vai-mirar-na-cabecinha-e-fogo/; https://oglobo.globo.com/rio/witzel-usa-uniforme-do-bope-da-tiro-de-sniper-pela-vida-dos-cidadaos-de-bem-postou-assessor-23844341; https://oglobo.globo.com/rio/snipers-ja-estao-sendo-utilizados-so-nao-ha-divulgacao-diz-witzel-sobre-acao-da-policia-23563496; https://extra.globo.com/casos-de-policia/witzel-diz-nao-fazer-ideia-de-quantos-foram-mortos-por-snipers-nao-faz-parte-do-meu-trabalho-acompanhar-23591730.html; https://www.youtube.com/watch?v=q0xHhyvef8I; https://veja.abril.com.br/brasil/witzel-celebra-pm-e-cobra-acoes-de-snipers-em-comunidades-do-rio/; https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/04/01/witzel-snipers-comissao-direitos-humando-alerj-mp-operacoes-investigacao.htm; https://www.msn.com/pt-br/noticias/brasil/witzel-celebra-pm-e-cobra-ações-de-snipers-em-comunidades-do-rio/ar-AAG47ke; https://www.terra.com.br/noticias/brasil/cidades/witzel-sobe-em-helicoptero-com-atirador-de-elite-e-causa-polemica,0b107d79aa61ac85cb70ef9a691d69f7gnmzuvqr.html; https://oglobo.globo.com/rio/atirador-do-bope-mata-sequestrador-de-onibus-na-ponte-rio-niteroi-apos-mais-de-3h-de-cerco-23888722; https://www.youtube.com/watch?v=DCt8SDl9ghE.
5 https://oglobo.globo.com/rio/witzel-diz-que-vai-promover-atiradores-por-bravura-pm-preparada-para-preservar-vidas-1-23888944; https://br.noticias.yahoo.com/sequestro-ponte-rioniteroi-snipers-promovidos-witzel-132356989.html; https://veja.abril.com.br/brasil/decreto-de-witzel-retira-estimulo-a-diminuicao-de-mortes-pela-policia/; https://brasil.estadao.com.br/noticias/rio-de-janeiro,witzel-acaba-com-incentivo-para-reduzir-letalidade-policial,70003022970.
6 https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2019/09/20/no-rio-numero-de-mortes-por-policiais-em-2019-e-recorde.ghtml; https://brasil.estadao.com.br/noticias/rio-de-janeiro,alta-de-mortes-pela-policia-do-rio-nao-esta-ligada-a-menos-crime-apontam-dados,70003030545.
7 https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/08/14/secretario-de-governo-do-rj-diz-que-politica-de-seguranca-esta-correta-e-lamenta-futuras-mortes.ghtml.
8 https://brasil.elpais.com/brasil/2019/04/03/politica/1554246098_836562.html.
9 https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/09/23/entenda-como-foi-a-morte-da-menina-agatha-no-complexo-do-alemao-zona-norte-do-rio.ghtml.
10 De lege lata e no cotejo com a história do instituto, chega a ser constrangedor ter de esclarecer que a legítima defesa não se presta a justificar condutas que se realizem previamente a agressões atuais ou iminentes. Faça-se, em todo caso, a ressalva, considerando que o próprio Ministério da Justiça apresentou proposta de alteração legislativa nesse sentido. Cf. a respeito, JOFFILY, Tiago. “Política criminal zumbi: ou o totalitarismo ‘legítimo’ da defesa contra agressões futuras, pp. 203 ss.; FERRAZ, Hamilton Gonçalves; MONTEIRO, Luana de Azevedo; CHAVES, Sabrina Ribeiro. “A legítima defesa no ‘Projeto Anticrime’: considerações críticas”, pp. 87 ss.; também MARTINS, Antonio. “A erosão do direito penal pela política criminal da segurança”, pp. 51 ss., 63 ss., todos em: SANTORO, Antonio Eduardo Ramires; MARTINS, Antonio; JOFFILY, Tiago (orgs.). Projeto de lei anticrime: Análise crítica dos Professores de Ciências Criminais da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, Belo Horizonte: D’Plácido, 2019.
11 Cf., por todas, as exposições detalhadas de TAVARES, Juarez. Teoria do crime culposo, 5ª ed., Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2018, pp. 358 ss, 366 ss.; idem. Fundamentos de teoria do delito, Florianópolis, Tirant lo Blanch, 2018, pp. 200 ss.
12 Para um panorama v. MAIWALD, Manfred. “Täterschaft, Anstiftung und Beihilfe – Zur Entstehung der Teilnahmeformen in Deutschland”, in: HOYER, Andreas et alii (orgs.). Festschrift für F.C. Schroeder zum 70. Geburtstag, Heidelberg: C.F. Müller, 2006, pp. 283 ss.
13 Cf. a clássica monografia de BATISTA, Nilo. Concurso de agentes, Rio de Janeiro: Rio de Janeiro: Liber Iuris, 1979, pp. 24 ss.
14 Cf., com nuances argumentativas, BATISTA. Concurso de agentes, op. cit., pp. 29 ss., 34 ss., 44 s.; GRECO, Luís; TEIXEIRA, Adriano. “Autoria como realização do tipo: uma introdução à ideia de domínio do fato como o fundamento central da autoria no direito penal brasileiro”, in: GRECO, Luís; LEITE, Alaor; TEIXEIRA, Adriano; ASSIS, Augusto. Autoria como domínio do fato, São Paulo: Marcial Pons, 2014, pp. 47 ss., 68 ss.; CAMARGO, Beatriz Corrêa. A teoria do concurso de pessoas, São Paulo: Marcial Pons, 2018, pp. 225 ss.;
15 Cf. BATISTA. Concurso de agentes, op. cit., pp. 139 ss. Para distintas definições, partindo de um modelo causal, v. a extensa exposição de CAMARGO. Teoria do concurso de pessoas, op. cit., pp. 258 ss. Partindo da diferenciação entre razões operativas e razões auxiliares proposta por Jospeh Raz, a autora alvitra conceituar instigação como “responsabilidade pelo estabelecimento de razões para agir que exigem do sujeito uma atitude prática e sentido crítico, isto é, razões que possuam força normativa, as quais irão constituir um valor, um interesse, um desejo e até mesmo uma norma de conduta com capacidade de motivar o indivíduo a agir.” (Ibidem, p. 291). Em resumo, trata-se da “responsabilidade pela criação de uma razão operativa para o agente praticar o crime” (ibidem, p. 323).
16 YAROCHEWSKY, no parecer citado, conclui pela imputação penal por instigação do governador do Estado do Rio de Janeiro.
17 Cf. MAIWALD, “Täterschaft, Anstiftung und Beihilfe”, op. cit., p. 288.
18 Cf., por todos, KÖHLER, Michael. Strafrecht. Allgemeiner Teil, Berlim: Springer, 1997, pp. 510 s.
19 Segundo a formulação clássica do Tribunal do Reich alemão (RGSt 3, 181), enquanto o autor quer “realizar seu próprio fato, o cúmplice quer apenas ajudar na consecução de um fato alheio, o do autor.” Cf. BATISTA. Concurso de agentes, op. cit., pp. 51 ss.; STRATENWERTH, Günter; KUHLEN, Lothar. Strafrecht. Allgemeiner Teil, 5ª ed., Colônia: Carl Heymanns Verlag, pp. 265 ss.
20 Podem-se citar, entre outros, JESCHECK, Hans-Heinrich; WEIGEND, Thomas. Lehrbuch des Strafrechts. Allgemeiner Teil, 5ª ed., Berlim: Duncker & Humblot, 1996, p. 670, sem maiores fundamentações; JAKOBS, Günther. Strafrecht. Allgemeiner Teil, 2ª ed., Berlim: Walter de Gruyter, 1993, p. 649.
21 JAKOBS. Strafrecht, op. cit., ibidem.
22 Para a crítica, cf. ROXIN, Claus. “Organisationsherrschaft und Tatenschlossenheit”, in: Zeitschrift für Internationale Strafrechtsdogmatik 7/2006, pp. 293 ss., 294 s.
23 Entre nós, por exemplo, BUSATO, Paulo César. Direito Penal. Parte Geral, 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2015, p. 718.
24 Nesse sentido, ROXIN. “Organisationsherrschaft und Tatentschlossenheit”, op. cit., p. 295.
25 Cf., por exemplo, GALLAS, Wilhelm, “Täterschaft und Teilnahme”, in: Beiträge zur Verbrechenslehre, Berlim: Walter de Gruyter, 1968, pp. 78 ss., 90, representante de uma das versões da teoria do domínio do fato.
26 ROXIN, Claus. “Straftaten im Rahmen organisatorischer Machtapparate”, in: Goltdammer’s Archiv zum Strafrecht, 1963, pp. 193 ss,
27 ROXIN, Claus. Täterschaft und Tatherrschaft, 9ª ed., Berlim: Walter de Gruyter, 2017, p. 242 s.
28 Ibidem, p. 245; ROXIN, Claus. Strafrecht. Allgemeiner Teil, vol. II, Munique: Beck, 2003, p. 47.
29 ROXIN. Täterschaft und Tatherrschaft, op. cit., p. 247.
30 Ibidem, p. 249.
31 Ibidem, p. 249.
32 Roxin estende a autoria mediata por domínio da organização a casos de organização criminosa em que surja um “Estado dentro do Estado” (ibidem, p. 250); o exemplo típico parecem ser as máfias. A utilização da teoria, aqui, no entanto, parece depender de outras considerações de ordem criminológica que contextualizem as diferenças profundas entre ambas as constelações. O autor nega, entretanto, estender a figura aos casos de organizações empresariais. Cf. ROXIN. Strafrecht. Allgemeiner Teil II, op. cit., pp. 55 ss. Sobre essa questão, v. GRECO, Luís; ASSIS, Augusto. “O que significa a teoria do domínio do fato para a criminalidade de empresa”, in: GRECO et alii (orgs.). Autoria como domínio do fato, op. cit., pp. 81 ss., 99 ss.
33 ROXIN. Täterschaft und Tatherrschaft, op. cit., p. 250. V. SCHROEDER, Friedrich-Christian. Der Täter hinter dem Täter. Ein Beitrag zur Lehre von der mittelbaren Täterschaft, Berlim: Duncker und Humblot, 1965.
34 ROXIN. “Organisationsherrschaft und Tatentschlossenheit”, op. cit., pp. 298 s.
35 Ibidem, p. 299.
36 Não cabe aqui, por razões de espaço e por fugir ao interesse imediato deste trabalho, referir em detalhes a recepção doutrinária e jurisprudencial dessa teoria. Para um panorama e crítica dessa recepção, v. ROXIN, Claus. Strafrecht. Allgemeiner Teil II, op. cit., pp. 47 ss.; SCHÜNEMANN, Bernd. “Schrumpfende Basis, wuchernder Überbau? Zum Schicksal der Tatherrschaftsdoktrin nach 50 Jahren”, in: HEINRICH, Manfred et alii, (orgs.). Strafrecht als Scientia Universalis. Festschrift für Claus Roxin zum 80. Geburtstag am 15. Mai 2011, Berlim: De Gruyter, 2011, pp. 799 ss.; cf., também, SCHILD, Wolfgang. “§25”, in: KINDHÄUSER, Urs et alii (orgs.), Nomos Kommentar zum Strafgesetzbuch, tomo I, 5ª ed., Baden-Baden: Nomos, 2017, pp. 1193 ss. Sobre sua aplicabilidade ao ordenamento jurídico brasileiro, cf. ALFLEN, Pablo Rodrigo. Teoria do domínio do fato, São Paulo: Saraiva, 2014, pp. 219 ss.
37 Para detalhadas análise e crítica v. GRECO, Luís. “Domínio da organização e o chamado princípio da autorresponsabilidade”, in: GRECO et alii (orgs.). Autoria como domínio do fato, op. cit., pp. 203 ss., 210, 214.
38 RENZIKOWSKI, Joachim. “Zurück in die Steinzeit? – Aporien der Tatherrschaftslehre”, in: HEFENDEHL, Roland et alii (orgs.). Streitbare Strafrechtswissenschaft. Festschrift für Bernd Schünemann zum 70. Geburtstag am 1. November 2014, Berlim: De Gruyter, 2014, pp. 495 ss., 504 ss.
39 HAAS, Volker. Die Theorie der Tatherrschaft und ihre Grundlagen, Munique: Beck, 2008, p. 85; RENZIKOWSKI. “Zurück in die Seinzeit?”, op. cit., p. 507.
40 Nada obsta, portanto, de pensar formas alternativas de imputação, que pretendam dar conta da realidade social. A figura do mandato parece, de fato, ocupar uma posição intermédia entre autoria mediata e outras formas de instigação. A proximidade com hipóteses que hoje consideraríamos de autoria mediata resta clara, por exemplo, na exposição de Tobias Barreto, criativa na exata medida de certa imprecisão conceitual: seguindo a dicção do art. 4º do Código Criminal do Império, aparece o mandato como forma de autoria, mas, em suas palavras, “não chega somente até onde chegam as ideias, que vulgarmente acompanham essa palavra, porém muito além.” (BARRETO, Tobias. “Mandato criminal”, in: Estudos de Direito, Campinas: Bookseller, 2000, pp. 335 ss., 349). E é assim que se diferencia o mandato da autoria “propriamente dita” porque “naquele a ação punível cometida e a vontade criminosa do mandante são mediatizadas pela vontade criminosa do agente físico, ao passo que nesta o crime tem sua causa única na vontade do autor.” (Ibidem, p. 352). Repare-se, por outro lado, que um autor como Köhler, que defende a punição de fatos praticados no contexto de criminalidade de Estado por instigação, pretende conceituá-la normativamente como “instigação determinante da vontade ou autoria ‘intelectual’”, alçando, portanto, a instigação a um patamar normativo de mesma gravidade que a autoria. Cf. KÖHLER. Strafrecht. Allgemeiner Teil, op. cit., p. 511.
41 JOFFILY, Tiago. “Política criminal zumbi”, op. cit., pp. 211 s.
42 Cf., respeito, os estudos de VERANI. Sérgio. Assassinatos em nome da lei: uma prática ideológica do direito penal, Rio de Janeiro: Aldebará, 1996; e ZACCONE, Orlando. Indignos de vida. A forma jurídica da política de extermínio de inimigos na cidade do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro: Revan, 2015.

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