"O Intercept não é imparcial, Glenn também não é. No atual quadro, ninguém parece ser. Ao rasgar a fantasia de imparcialidade partidária, assumindo um lado, os órgãos da mídia, ao mesmo tempo em que se tornam mais transparentes, decretam o fim do jornalismo ideal", escreve Hildegard Angel, do Jornalistas pela Democracia

Por Hildegard Angel, do Jornalistas pela Democracia
Não podemos ignorar que Glenn Greenwald já tinha Joe Biden atravessado na garganta desde sua perseguição a Edward Snowden. Não é de surpreender que o jornalista, nesse momento crucial para Biden, tenha aproveitado a oportunidade para lhe dar “o troco”. Esse é o aspecto das fraquezas humanas, que envolve o episódio Greenwald-Biden-The Intercept. O que não invalida o aspecto ético profissional da atitude de Glenn, ao romper com The Intercept ante a quebra da cláusula de um contrato, que lhe garantia total liberdade para seus textos e colocações. Não se trata de uma questão de “edição”, mas de “censura”, sejamos sinceros sobre isso.
E não é de estranhar que os trumpistas se aproveitem do calcanhar de Aquiles do oponente - e que calcanhar! – com a Fox News abrindo estúdio, câmeras e microfones para Greenwald expor a Tucker Carlson as suas razões. A Fox está jogando seu jogo aberto de sempre. O peão estranho nesse tabuleiro é Glenn, que não viu problema em ir falar no “campo inimigo”. Assim como a imprensa de esquerda, tradicionalmente combativa, muda de postura e recolhe as garras, como um cão domesticado e sem faro, passando ao largo dos e-mails nos três laptops de Hunter Biden deixados . para conserto numa oficina em Delaware.
Nessa reta final de campanha, qualquer descuido pode significar catástrofe tão grande quanto foi o vazamento dos “e-mails hackeados”, que pode ter custado a Hillary Clinton sua eleição em 2016. O que também expôs a conspiração contra Bernie Sanders pelo Democratic National Committee – DNC, desfazendo ilusões (se havia) de que nessa contenda existam éticos e bonzinhos.
Sim, os vazamentos dos e-mails de Hillary eram de interesse público e deveriam ter sido publicados de qualquer maneira. A política é uma disputa permanente entre a corrupção e a transparência. Ganha a democracia, quando a transparência é vencedora. A imprensa está agora confrontada com o mesmo impasse. Por mais que possa prejudicar Biden, o artigo de Glenn Greenwald também é de interesse público, e esse fato precisa ser esclarecido. Deixar a tampa sobre o lixo nem sempre evita o mau cheiro.
O The Intercept sabe disso, e não costuma se acanhar diante de fatos controversos. Seu acanhamento é que é o fato novo.
A liberdade jornalística está posta em questão, quando um site como o The Intercept, considerado um baluarte da liberdade de opinião, trai as próprias convicções ou - vamos ser mais realistas - trai a imagem da própria marca.
O Intercept não é imparcial, Glenn também não é. No atual quadro, ninguém parece ser. Ao rasgar a fantasia de imparcialidade partidária, assumindo um lado, os órgãos da mídia, ao mesmo tempo em que se tornam mais transparentes, decretam o fim do jornalismo ideal, sem preconceitos, no qual, mesmo se dele houvesse apenas o verniz, muitos ainda acreditavam.
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